O Último Dragão escrita por Mary


Capítulo 3
O Caminho de um Cavaleiro em Treinamento


Notas iniciais do capítulo

Admito que esse capítulo tá gigante, mas acho que depois desse todos terão um tamanho padrão então... Desculpe =/



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Não era nem de longe o que ele imaginara. O castelo era enorme como ele sabia que seria, mas aquilo era demais! Passaram por salas tão grandes quanto o campo em que sua casa ficava, depois lhe instalaram em um quarto que poderia abrigar todos os moradores do vilarejo. Para que qualquer um precisaria de tanto espaço? E para piorar a sala do trono tinha tanto ouro que poderia tirar todo o país da miséria. Isso o fez pensar em como a rainha estava usando o dinheiro dos impostos.

— Dan Morita, você foi trazido à presença da rainha por pedido de vossa majestade para tratar do incidente do treino com o Kanpeki. Ajoelhe-se.

Dan o fez sem pensar duas vezes. Além dele e de um homem com roupas enfeitadas demais para o gosto de Dan, estavam no cômodo os cinco Kanpeki e dois guardas um de cada lado do trono. Assim que o menino ajoelhou todos os outros fizeram o mesmo e então a rainha entrou no cômodo. Era uma senhora muito velha com os cabelos grisalhos e a pele enrugada acompanhado de uma menina de cabelo tingido de azul claro como o céu. A rainha estava enfiada em um vestido nem um pouco prático verde com bordados cor de ouro e a menina em vestido vermelho com bordados negros.

— Levantem-se – E todos o fizeram de imediato – Agora… Apresente-se garoto.

— M… Meu nome é Dan Morita, segundo filho de Gabriel e Ana Morita, membro da guarda desde os doze anos e candidato a seguir os passos de meu pai – Ao terminar Dan precisou apertar as mãos nas costas para não tremer diante da figura da idosa. Ao que ele sabia ela não convocava guardas comuns todos os dias.

— Gabriel… Sim eu me lembro de Gabriel, capitão da guarda entre os anos de 113 e 127. Ótimo sujeito… Não sabia que ele havia adotado um garoto – Mais uma vez o garoto tremeu. Ninguém se atrevia a dizer que ele era dotado na sua frente, era a primeira vez que alguém verbalizava aquilo que ele já sabia a anos – Recebi um relatório dizendo que você atacou Margareth durante o treino conjunto. Explique-se.

— Eu não sei o que aconteceu, me senti tão mal por não conseguir ser um adversário bom para ela que quis tentar novamente…

Ele falou e falou incessantemente sobre o quão inútil se sentiu naquele momento e no quanto queria ser bom o bastante. Contou sobre os treinos com Mei e sobre sua vontade de ser tão bom quanto seu pai e a rainha ouviu com um interesse que Dan não imaginava que ela poderia ter. Quando terminou ele respirou fundo e abaixou a cabeça.

— Entendo… Espero que compreenda, Dan, que este não é um comportamento que desejo incentivar entre os meus soldados. Se todos resolverem desafiar a competência do Kanpeki, bem, teríamos que controlá-los de uma forma mais… Violenta – A rainha se mexeu no trono enquanto a menina que permanecia de pé ao lado do trono revirou os olhos, aborrecida com toda aquela conversa – Mas conhecendo sua procedência e admirando sua ousadia, pedi ao Kanpeki que avaliasse sua habilidade com a espada e recebi resposta positiva por maioria de votos. Gustavo se ofereceu para ser seu mentor pessoal e eu lhe autorizei.

Aquela parte o menino sabia. Gustavo lhe contou que tinha pedido isso para a rainha e que cuidaria de seu treinamento dali por diante, mas era mais do que isso. Agora Dan teria que morar no castelo, era bem mais do que ele jamais pensou em fazer. Ser o capitão da guarda já lhe seria um sonho realizado, mas ser treinado por um Kanpeki… Bem a maioria dos guardas adorariam isso. Dan achava que não gostaria de ficar no meio daqueles mauricinhos mimados.

— Você ficará nas acomodações do castelo e treinará todos os dias com Gustavo. Te darei um dia para que traga o restante de seus pertences para o castelo. Estão todos dispensados.

E novamente todos se ajoelharam, então Dan os seguiu. A rainha se levantou e saiu balançando seu enorme vestido com a menina de cabelo azul logo atrás, então todos se levantaram e Dan seguiu o Kanpeki para fora da sala do trono. Era estranho pensar que em vez de uma punição ele recebera uma promoção. Quando chegaram em uma sala comprida e sem móveis Margareth se virou para ele com a mão no cabo da espada que descansava em sua cintura.

— Não me agrada sua presença, fedelho, se dependesse de mim você seria decapitado em praça pública. Não espere minha ajuda jamais… Não sou tão mole quanto esse imbecil aí.

E sem dar tempo de receber resposta ela se afastou a passos largos, desaparecendo por uma porta lateral em questão de segundos. Gustavo balançou a cabeça e sorriu para Dan enquanto Luci, a de cabelo rosa, seguia Margareth.

— O que deu na cabelo de grama?

— Ela não gosta de ser desafiada – Respondeu Mirian, a de cabelo cinza – Mas vai ficar tudo bem. Só não se aproxime demais.

— Ela é muito baixinha para ser tão marrenta.

— Você também é muito baixinho para ser suicida, rapaz – Comentou Cai com um sorriso – Mas aqui estamos não é?

É. Dan pensou em Mei e em como dizer que teria que se mudar. Ao menos era melhor do que dizer que iria ser executado.

— Posso perguntar uma coisa? - Como todos concordaram, Dan continuou – Aquela moça de cabelo azul claro é a dama de companhia da rainha?

— Aquela “moça” é a nossa princesa e futura rainha Diana. A rainha a está treinando para assumir o trono em breve – Respondeu Cai.

— Mas ela parece tão jovem!

— Só parece – Comentou Mirian – Ela é mais velha que eu, tem uns 23 anos mais ou menos. Mas é a única filha da rainha… Coisa triste, ela perdeu duas crianças antes que Diana vingasse. É tratada como uma deusa então não a contrarie senão não vai existir Gustavo nenhum que possa te salvar da forca.

— Mas vamos, vou te mostrar seu quarto.

 

(…)

 

 

— APRENDIZ DE UM KANPEKI? VOCÊ?

Mei nunca foi dada a escândalos mas aquela era uma notícia estranha demais para se controlar. Ela passou todo o tempo tentando não chorar imaginando os horrores ao que o irmão mais novo seria submetido e agora ele voltava dizendo que seria treinado pelos melhores? Sentiu-se um pouco enciumada, afinal era melhor que Dan em combate, só não era tão burra a ponto de atacar a guarda pessoal da rainha. Antes fosse…

— Mas você nem gosta deles!

— Gustavo, Cai e Mirian são até legais. Achei que seriam mais metidos, mas só a baixinha de cabelo de grama é que me tratou mal. E Luci me deu o tratamento do silêncio… 3 de 5 não é tão ruim.

— Dan você sabe o que significa? Você vai acabar se tornando um deles! Meu irmão, um Kanpeki… Nossa isso vai render vários descontos no mercado…

— Haha! Mais fácil te render uma surra.

Mas isso não importava para Mei. Agora ela se imaginava frequentando o castelo, assistindo treinos secretos e conversando com aquele bonitinho de cabelo azul que viu na porta de casa quando Dan foi levado. Talvez a vida melhorasse afinal… Talvez enfim aquele idiota do Dan fosse ser útil afinal

 

 

(…)

 

 

A caverna era muito mal iluminada à noite. Eva gostava de ficar bem na entrada olhando as estrelas enquanto o sono não vinha, mas naquele dia o dragão tinha despertado antes do normal e ela estava cantando para ele parada bem em frente a pedra que ele usava de cama.

Desde que nascera estava ali sendo ensinada a exercer seu trabalho, mas só faziam alguns meses desde que fora deixada sozinha. Sua mãe, aquela que cuidara dela desde pequena, morrera durante uma noite em um acesso de tosse. Mesmo as roupas grossas que a rainha mandava não serviam contra o frio da pedra em que a caverna era esculpida, e o pequeno lago que havia ali dentro também não ajudava em nada.

Eva sabia a importância de seu trabalho e se esforçava muito para não falhar; considerava-se uma espécie de guardiã do mundo e gostava de imaginar que as pessoas sabiam de sua existência e agradeciam todas as noites por seus serviços. Mas mesmo assim ninguém veio vê-la desde que nascera. Ninguém além dos guardas mudos com os quais ela logo aprendeu a não tentar manter contato.

Seus lindos olhos azuis estavam fechados enquanto cantava a belíssima Canção do Tempo pela milionésima vez com sua voz de cristais ao vento. Sua mãe costumava elogiá-la constantemente por sua bela voz e dizia que talvez o efeito da canção fosse prolongado de tão bela era a forma como ela cantava, mas não… O dragão acordava sempre uma ou duas vezes por dia como sempre fizera. Estava tudo bem, ela gostava de cantar. Assim que terminou ela passou a mão pelo longo cabelo loiro e voltou para a entrada da caverna. Ao contrário de sua mãe ela gostava de conversar com o dragão mesmo que ele estivesse dormindo. Ela lhe contava de como estava o céu, de seus sonhos, do que o guarda lhe trouxe para comer, tudo.

— Hoje é lua nova, Gaia – Dirigiu-se ao dragão que ela apelidou de Gaia quando era mais nova – Você iria gostar de ver. É uma pena não poder.

Incrivelmente ela não temia o gigante escamoso como sua mãe e todos os guardas pareciam temer. Durante seus quatorze anos ela aprendeu a imaginá-lo como um ser bondoso e racional, embora não estivesse disposta a arriscar a segurança do mundo nesse palpite. Ela olhou a silhueta do castelo ao longe e sorriu pensando nas pessoas dormindo em segurança lá em baixo. Imaginou como era a vida delas, se comiam coisas gostosas ou se tinham camas quentes. Ela manteria o mundo seguro para elas… Sim, sabia que manteria. E sorriu novamente ao pensar nisso.

 

 

(…)

 

 

Gustavo brandiu o machado acima da cabeça e desferiu um golpe que acertou o escudo de Dan. Este, por sua vez, atacou com o machado de baixo para cima e conseguiu arrancar o capacete de Gustavo da cabeça antes de se jogar em cima dele e simulou um golpe certeiro na cabeça do seu mentor. Machados eram a praia de Dan, com certeza… Machados e lanças. Gustavo riu e empurrou-o para longe, então ele retirou seu próprio capacete sorrindo. Dan se tornou um homem muito bonito e habilidoso com o passar dos anos. Seu cabelo continuava curto mas sua expressão, agora bem mais “máscula”, não lembrava o menino de rosto arredondado que ele fora.

— Já estamos 2 a 0. É só isso o que sabe fazer, mestre? - A voz de Dan estava bem mais grossa agora que seu corpo saíra da puberdade.

— Estou te dando uma dianteira garoto, para te humilhar mais quando vencer.

Gustavo apanhou o capacete do chão sorrindo. Dan crescera tanto nos seis anos em que estavam treinando juntos que ele mal podia acreditar. Era como um filho agora. Um filho muito convencido. Assim que Gustavo colocou seu capacete Luci surgiu no pátio e desviou a atenção da dupla.

— Se já terminaram, garotas, precisamos nos reunir nos aposentos da rainha.

A rainha não estava bem a alguns dias e ao que o médico dizia não duraria muito tempo, então todos estavam muito apreensivos quanto ao futuro. Diana não era um exemplo de mulher… Era mimada, irresponsável, ambiciosa, nada era bom demais para ela. Em nada lembrava sua mãe que era conhecida como uma rainha bondosa e ponderada. Os dois retiraram os capacetes e deixaram as armas no chão para seguir Luci até o quarto da rainha, onde já estavam todos os outros Kanpeki além da princesa e alguns membros da corte.

— Não farei cerimônias neste momento. Estou morrendo – Todos estavam em silêncio e de cabeça baixa naquele momento. De fato a rainha não parecia nada bem: estava pálida e seus olhos estavam vermelhos, as mãos trêmulas e o corpo magro e envelhecido demais – Os reuni aqui por que quero agradecer a todos pelos anos de lealdade que me deram, e para pedir-lhes que sirvam a minha filha com a mesma devoção que me serviram.

Diana, a princesa de cabelos azuis, estava sentada ao lado do leito da mãe segurando sua mão enquanto ela falava. Era muito estranho o contraste entre as mãos rosadas de Diana e as mãos pálidas de sua mãe, e mesmo com todos ali estando visivelmente tristes com a situação Diana não demonstrava nenhuma emoção.

No dia seguinte a rainha morreu em sua cama e foi encontrada pela serviçal que lhe foi levar o almoço. O reino entrou em luto e ela foi enterrada com uma cerimônia extremamente luxuosa no fim da tarde. Todos os moradores da vila foram chamados para o enterro e compareceram com roupas escuras e flores para deixar em seu túmulo. Na manhã seguinte Diana foi coroada rainha e os servos refizeram seus votos de lealdade a ela.

Dan não gostava da nova rainha. Desde que fora morar no reino ela não lhe dirigira uma palavra sequer, na verdade não parecia nem mesmo reconhecer sua presença enquanto conversava com o Kanpeki. Apesar do gênio difícil todos se davam bem com ela e Luci parecia especialmente próxima à princesa, sendo uma das que mais conversavam com ela. Dan prestou juramento de joelhos na sala do trono, no exato local em que anos antes ele tinha conseguido seu posto de aprendiz.

Após a cerimônia Dan saiu do castelo e foi levar comida e flores para Mei. Ele vinha fazendo isso a vários anos para que ela pudesse poupar seu salário e comprar coisas para si mesma, mas Mei não gostava da ideia de ter seu irmão mais novo lhe sustentando. Não que fosse algum incômodo já que Dan ganhava o triplo do que ganhava quando era soldado.

— Como foi lá com a megera?

— Normal. Jurei lealdade, ela fingiu que eu não existia, nada de mais.

Mei tinha se tornado uma mulher respeitada em seu batalhão e incrivelmente parecida com a mãe, embora possuísse a força do pai. Ela aprendera a conviver com o Kanpeki por causa de Dan e até se considerava amiga de Mirian, embora jamais tivesse conseguido trocar mais do que duas frases com Luci ou Margareth. Tanto Dan quanto ela concordavam que as duas não eram pessoas com quem ninguém jamais quisesse conviver, mas era preciso. Com o passar do tempo ela e Cai se tornaram muito próximos e, mesmo que a rainha não permitisse, Cai dava aulas para Mei nos tempos vagos. Era bom para Dan que a irmã houvesse encontrado alguém bom para gostar embora nenhum dos dois jamais admitissem que gostavam um do outro.

— Acho que ela vai se livrar de você assim que puder. Vai te mandar de volta pro regimento.

— E você acha que ela vai ter coragem? A mãe dela foi quem me levou para o castelo, ela não vai ter coragem de ir contra a mãe.

— Não contaria com isso, ela não parece ser boa pessoa.

Com isso Dan concordava completamente. Mas o que se podia fazer? Os dois comeram um pouco do pão com passas que Dan levou e continuaram conversando sobre tudo e sobre nada. Tornou-se muito comum as conversas à mesa entre eles, que mais do que nunca se sentiam como irmãos. Não havia mais a pressão de conseguir dinheiro ou os treinos até tarde da noite para tentar subir de vida. Estava tudo como eles sempre quiseram que fosse, e ambos concordavam que seus pais estariam orgulhosos se os vissem agora.

 

 

(….)

 

 

Sentada em seu trono a nova rainha pensava em silêncio sobre os acontecimentos dos últimos dias. O veneno que usara era de efeito lento, é claro, mas ela não imaginou que seria tão lento a ponto de ter que esperar uma semana para que finalmente sua mãe morresse. Mas isso não importava, agora ela estava morta e era o que importava. Diana leu mais de vinte anos de relatórios confidenciais antes de decidir agir, ela sabia muito bem tudo o que acontecia no reino quando resolveu que não bastava ser a rainha de um reino pequeno como Vidalia. Ela queria o mundo. E o mundo seria dela muito em breve...


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Notas finais do capítulo

Alguém aí sacou o sobrenome do Dan? Alguém sabe de onde é? Diz que sim por favor Ç.Ç