Os Três Reis escrita por Deusa dos Yatos


Capítulo 3
Capítulo 3




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“Viver e sobreviver é por isso que nascemos. Outras vidas que também tentam sobreviver sou eu quem as tira para que não tirem a minha. O presente é sombrio e o futuro é uma utopia que só existe em sonhos perdidos e falsas profecias.”

 

Recostado a uma das janelas de seus aposentos, Namjoon mantinha seu olhar vazio no pátio do castelo. Jamais em toda sua vida sequer cogitara a possibilidade de derramar sangue inocente e agora estava ali, matando pessoas com quem riu um dia, pessoas com quem partilhou sua comida. Sentia-se sujo e indigno.

O que mais o assustava era o que ainda poderia acontecer dali em diante. Talvez Jungkook o obrigasse a matar muitos outros, ou talvez os desse um destino pior que a morte. Depois de tudo só uma pessoa vinha à sua mente em meio a todo esse caos: Yoni. Sua filha, tão linda, tão gentil, tão inocente. Tinha os mesmos olhos puxados do pai mais suas íris eram acinzentadas como as da mãe. Seus cabelos compridos e claros estavam sempre trançados dando-lhe um ar de graça angelical. Namjoon a via ainda bebê em sua mente, as mãozinhas macias e delicadas tocando seu manto ou quando ocupava o trono querendo subir em seu colo. Ele ainda sentia a felicidade de recebê-la e seus braços pela primeira vez, achava que essa felicidade nunca ia passar não importava o quanto Yoni já tivesse crescido.

O rei ouviu batidas na porta e logo pediu que entrassem. Era Catarina.

—Está tudo bem contigo? _ela perguntou com voz macia.

—Sim está tudo bem_ Namjoon tentou parecer calmo, mas o que transpareceu foi sua tristeza.

—O que está acontecendo? Esse tipo de atitude não é típico de ti.

—Do que está falando?

—Estou falando do ocorrido de hoje com Baltazar.

—Não havia nada que pudesse ser feito, você ouviu Catarina. Ele estava sendo acusado de traição._ Namjoon não olhava para Catarina, não conseguia encará-la.

—Oh! Esse não é o governante indulgente que eu conheço_Catarina estava certa. Aquele Namjoon não tinha nada a ver com o rei que em tempos passados transformou acusados em servos reais ou em praticantes de caridade._Foi Jungkook não foi? Ele parecia petulante, estava te obrigando a algo, não estava? Pra falar bem a verdade não se parece em nada com o Jungkook que nós conhecemos, tem algo de errado acontecendo Namjoon.

—Isso é fantasia de sua cabeça, Catarina. Jungkook é só..._ele se virou e deixou o olhar vaguear pelo céu cinzento que anunciava tempestade. Depois de um momento de silêncio ele finalmente completou_ele é só o guarda real, nada mais.

Catarina suspirou e relutante assentiu. Então se aproximou do marido. Entrelaçou seus dedos aos dele e apoiou o queixo em seu ombro olhando para o reino lá em baixo.

—Muito bem, se essa é a decisão de Vossa Majestade, vamos confiar nela.

...

A sala de dança do castelo estava vazia e escura, um tanto quanto assustadora. Só algumas tochas iluminavam a figura de um homem alto e encorpado em frente ao enorme espelho que ali se encontrava. A figura de Jungkook era estonteante, ele era cobiçado pelas mulheres e temido pelos homens. Mas a parte que mais se destacava em todo o seu ser era o rosto. Ah, era seu rosto que lhe trazia ganhos, o fazia parecer bom, inocente, confiável. Já perdera as contas dos favores que ganhara através da persuasão de sua beleza.

Ele piscou e nessa fração de segundos uma nova figura surgiu atrás da sua no espelho. Um homem alto com bonitos olhos castanhos e lábios fartos. Vestia um manto marrom com capuz, mas os cabelos alourados caiam insistentemente no rosto. Ele tinha as mãos escondidas nas mangas da longa veste.

—Há quanto tempo!_Jungkook disse para o reflexo no espelho.

Jin só o encarou com olhos impassíveis. Jungkook sorriu, com aquela maldade que havia adquirido com o tempo.

—Vejo que tem feito bem, meu querido irmão mais novo._Jin ainda o encarava fixamente como se já soubesse seu próximo ato. O mais novo se empertigou.

—Namjoon está em minhas mãos, as tropas dele são minhas agora e em breve todo o império estará sob o meu comando. É brilhante não é? O que o amor pode fazer com uma pessoa. Ele luta para salvar o que chama de família, o que ele não sabe é que vou acabar matando-as de qualquer jeito.

—Não se sente mal? Levando em consideração que foi ele quem te acolheu quando não tinha pra onde ir? Nossos pais não nos ensinaram a sermos gratos?_Ele riu com desdém.

—Não me sinto mal por isso, é normal querer ter coisas. Eu só quero algo um pouco maior do que as outras pessoas querem. Eu quero ajuda-lo Jin.

—Como vai conseguir?_Jungkook virou-se para seu irmão mais velho e o encarou em dúvida. Jin ainda se mantinha atento e transparente como sempre foi, porém havia algo a mais, um pequeno detalhe, uma sombra muito tênue que oscilava em seu olhar cor de ônix.

—O que quer dizer com isso?

—A verdade é que você não tem nenhuma estratégia meu irmãozinho. O governo de Namjoon ainda é forte. As pessoas confiam nele.

Como se ele se importasse com o que o povo queria. Na verdade a única coisa em que pensava era em tomar o poder e ser o rei, por título e sangue. Apenas o que tinham que fazer era assistir sua posse e lhe dar as boas vindas. Ele não gostava dos pobres por serem pobres e miseráveis, não gostava dos sacerdotes porque não acreditava em Deus, não gostava da nobreza por ter tudo que ele nunca teve, não gostava dos anciãos por acharem que tinham as respostas do universo. Na verdade não sabia mais do que gostava, não sabia nem se gostava. Talvez ele sentisse ódio demais para perder tempo com sentimentos bonitos.

—Dominar também não vai dar certo, você sabe que Galarda é uma terra ligada a outros dois reinos que podem muito bem intervir.

—Lendo meus pensamentos de novo? Isso é muito feio, irmão. Mas devo reconhecer que és o melhor feiticeiro._Jin passou por Jungkook e se postou em frente ao espelho. Ele observou o arco que se fazia acima deles. Examinou as bordas do espelho e finalmente se voltou para sua figura.

—Eu tenho a solução._Jungkook observou o reflexo de Jin;

—E qual é ela?

—A filha do rei. Você pode enfeitiça-la._ Jin puxou um frasco transparente da capa. Suas mãos ficaram a mostra e em seu dorso tinham escritos e símbolos que Jungkook podia jurar que não estavam lá antes._dê três gotas disto a ela e faça com que repita as palavras gravadas no frasco.

—O que é exatamente isso?

—Amor líquido. Obsessão líquida. Paixão líquida. Três gotas e até o homem mais endurecido cairia de amores por quem o ministrar. Esse é o meu plano, com a princesa loucamente apaixonada por você, case-se com ela e expulse a família real do castelo tomando o posto do rei. Ela vai te apoiar cegamente.

Jungkook sorriu. Sorriu com todos os dentes, aquele sorriso cheio de algum propósito. De repente pareceu aflito e olhou com um certo desespero para seu irmão mais velho. Jin percebeu sua mudança. Era o velho Jungkook querendo voltar, tentando dar ar de sua graça. O feiticeiro fez uma nota mental de que deveria aumentar as doses do veneno que vinha dando à Jungkook.

—E Jilian, como ela está?

—Sim._Jin voltou-se novamente para si. Não precisou dizer nada para que Jungkook entendesse o que aquilo significava. Logo sua face maldosa se desfez em uma expressão estranha, nas pessoas normais seria chamada de tristeza. A boca contorcida e o cenho franzido faziam o feiticeiro parecer outra pessoa realmente.

—Jilian está morta? Isso é impossível, irmão!

—Foi Namjoon quem a matou, se é o que quer saber. Eu lamento muito.

Jungkook podia jurar que sentiu o chão se mover. Esperou que Jin dissesse algo, mas ele não disse nada até que percebeu que ele se fora. Estava ali sozinho e com frio. Por que estava com frio? Assustou-se ao perceber que chorava com os braços abandonados ao lado do corpo. Aos poucos o pranto foi cessando até que o guarda real mergulhou em um abismo profundo de onde seria difícil sair. O menino que foi brutalmente tirado de sua infância agora assistia a sua própria morte, saindo de cena, indo para um plano distante que talvez nem mesmo o próprio Jungkook pudesse alcançar. Assim como um menino morria junto com sua amada, o homem sem amor se reerguia, forte e imponente. Ali nascia o homem sem fé, ali nascia o início do fim.


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