Backstage escrita por Fe Damin


Capítulo 3
Capítulo 03


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal, mais um capítulo para vocês. espero que gostem :)



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Acordei no meio da manhã no domingo ainda no sofá da sala, mas ao invés de estar com o corpo todo doendo pelo local não muito apropriado para dormir, percebi que eu estava muito bem ajeitada. Tinha um travesseiro embaixo da minha cabeça e eu estava coberta com o edredom que estava na minha cama. A única explicação era que o Ron tinha me deixado o mais confortável possível antes partir como era de praxe. Sorri ainda sonolenta, pensando na delicadeza do gesto. Me espreguicei e tomei coragem de sair do casulo tão fofinho e aconchegante em que eu me encontrava. Joguei a coberta para o lado e quando levantei notei um bilhete me esperando na mesa de centro:

“Você estava dormindo tão bem que não quis te acordar, deixei a chave no lugar de sempre. Beijos Ron.”

A letra dele era o garrancho de sempre, mas eu já era versada naqueles hieróglifos. Coloquei o bilhete de novo na mesa e fui recolher do chão a chave que ele tinha usado. Decidi que eu devia a mim mesma um bom café da manhã, então parti para a cozinha com o intuito de preparar uma bela refeição. Eu estava entre colheradas do meu iogurte no momento em que eu escutei o celular emitir o som característico de mensagem. Curiosa com o que poderia ser em um domingo, me levantei para buscá-lo. Voltei a me sentar à mesa da cozinha, e deslizei o dedo na tela para ler o conteúdo da mensagem que para minha surpresa era do Ron.

“Bom dia, espero que você esteja melhor hoje.”

Respondi rapidamente:

“Estou, graças a você. Obrigada mais uma vez por me escutar.”

“Se precisar dos meus ouvidos de novo é só avisar. Boa semana, vai dar tudo certo.”

Desejei a ele uma boa semana também e fiquei olhando para a conversa que tinha acabado de se desenrolar. Ele tinha que parar com aquilo, primeiro ele fica horas e horas me escutando reclamar dos meus problemas, depois fica assistindo um filme comigo só para no fim das contas me ajeitar com uma coberta e travesseiro e por último me manda uma mensagem para ver se eu estava bem. Aquilo não era normal para nós, tínhamos um acordo tácito, um protocolo, mantido por anos, de total falta de compromisso e justo agora que ideias confusas estavam se embrenhando em minha mente, ele agia assim e começava a embaçar todas as linhas bem delimitadas da nossa relação.

A verdade era que eu tinha ficado ridiculamente feliz com toda essa atenção, mas ao mesmo tempo eu não conseguia determinar se isso era algo sensato. Eu e o Ron nos conhecíamos há tanto tempo que eu não sabia precisar exatamente quando eu comecei a imaginar o que poderia ser, e o pior de tudo era não ter a menor ideia do que eu queria. Meus sentimentos estavam emaranhados e eu não era capaz de desfazer o nó para poder compreender a mensagem contida neles. Respirei fundo e decidi que por hora o melhor a fazer era não pensar naquilo. Melhor ainda seria esvaziar a cabeça dos meus devaneios relacionados ao ruivo de sorriso lindo e preenchê-la com todo o trabalho que eu tinha pela frente.

E foi exatamente o que eu fiz, passei o restante do dia atolada em planilhas e rascunhos para ver se eu adiantava, nem que fosse um pouco, o trabalho da segunda feira, parando apenas para comer nas horas adequadas. A noite chegou mais rápido do que eu esperava então decidi que eu merecia um descanso para encarar a maratona que me esperava. Recolhi todo o meu material e fui me acomodar no sofá, procurando algo de interessante para ver na televisão.

Não consegui impedir a minha mente de buscar as lembranças da noite anterior, passada no mesmo local. Senti uma vontade enorme de ligar para ele só para escutar sua voz e me repreendi mais uma vez. Eu nunca tinha tido vontade de vê-lo tanto em tão pouco tempo e me deixava ligeiramente alarmada que essa não tenha sido nem a primeira vez que o fato tinha ocorrido. Escolhi um filme leve de comédia e me forcei a prestar atenção, quando ele acabou fui dormir para ter disposição no dia seguinte.

A segunda-feira começou ainda mais cedo do que o normal e obviamente terminou mais tarde. O Ced me acompanhou durante o período todo, eu estava realmente admirada com a força de vontade dele de chegar tão cedo. Os dias foram passando como se estivessem emendados uns nos outros, eu sentia que o tempo que eu passava em casa era de apenas alguns minutos, pois no momento em que eu colocava minha cabeça no travesseiro, o despertador anunciava que eu tinha mais um dia inteiro pela frente.

Se eu achava que estava cansada antes, aquela semana veio me provar que eu estava errada, era possível sim ficar ainda mais esgotada. Para melhorar ainda a situação na quarta eu amanheci com um belo de um resfriado, que de acordo com meu assistente era culpa minha por não manter uma dieta balanceada, principalmente incluindo cinco porções diárias de frutas e legumes. Eu não tinha tempo de comer nem uma maçã sequer sem que eu pensasse que mais uma parte do meu trabalho poderia estar sendo feita, quando ele queria que eu arrumasse tempo para cinco?

A sexta-feira chegou já sabendo que não era nem um pouco bem vinda por mim. Pelo menos a minha gripe tinha melhorado, me restava apenas uma leve dor de garganta, contudo o restante do trabalho não ia ser concluído a tempo no horário de sempre.

—Não vai dar, Ced, só se eu passar a noite aqui, tudo tem que ser entregue até amanhã de manhã – falei exasperada colocando as mãos no rosto no momento em que meu assistente entrava em minha sala para trazer as pastas que eu tinha requisitado.

—Pois então vai dar sim! A gente fica até a hora que precisar, eu sempre quis uma festa do pijama, olha que divertido – ele sorriu tentando me animar.

Um pouco da seu bom humor conseguiu amenizar meu pânico momentâneo, porém eu não ia pedir que ele fizesse aquilo, já bastava o regime escravo no qual ele tinha trabalhado durante toda a semana.

—Não mesmo, você vai para casa, já estou começando a ver umas rugas ao redor dos seus olhos – eu sabia que ele não ia gostar nem um pouco da insinuação de que ele estava com a aparência menos do que exuberante de sempre, mas eu tinha que tentar convencê-lo a ir embora descansar.

—Mentiras não são o seu forte, chefinha. Eu continuo belo como sempre e passar a noite aqui não vai me matar, muito pelo contrário, se for pra mostrar para aquela vaconilda que nós somos a dupla mais eficiente dessa empresa eu fico aqui até o fim de semana inteiro – ele terminou seu discurso dramático com o dedo em riste, como se estivesse falando para uma plateia de admiradores e nem adiantava tentar não rir da palhaçada toda.

—Você devia ter tentado a carreira de ator, Ced. Sua estante estaria cheia de Oscars. – ele me olhou todo satisfeito, sabendo que eu tinha sido vencida com seu monólogo – vamos precisar de comida, você pode ir comprar alguma coisa para nos abastecer?

—Não precisava nem pedir. Você está com cara de quem está precisando de açúcar – ele fingiu me observar atentamente.

—O que aconteceu com o “alimente-se bem e não esqueça as cinco porções de vegetais”? – frisei a incoerência em seus conselhos.

—Chefinha, chocolate vem do cacau então se enquadra perfeitamente na categoria de vegetal – era tão absurdo que até ele caiu na risada.

Continuamos trabalhando noite a dentro, com uma bela porção de comidas nada saudáveis ao alcance de nossas mãos. Todos já haviam ido embora, então eu decidi me livrar dos meus sapatos e jogar longe o lenço que antes adornava o meu pescoço em conjunto com a blusa que eu estava usando. O Ced deciciu vir trabalhar de frente para mim em minha mesa, para facilitar a troca de informações. Não preciso nem dizer que ele continuava tão impecável como quando chegou naquela manhã, outro de seus super poderes.

As 20:30, aproximadamente, uma mensagem do Ron apareceu no meu celular.

“Olá, conseguiu terminar tudo? Quer ir jantar em algum lugar?”

Quem me dera eu pudesse sair dali e ir a qualquer lugar que fosse com ele, infelizmente eu tinha uma noite diferente pela frente.

“Bem que eu gostaria, mas vou ter que passar a noite trabalhando, se eu não entregar esses layouts até amanhã, vai atrasar a produção e nada estará pronto para o desfile.”

—Está falando com quem, chefinha? – ele perguntou curioso, mas emendou antes que eu pudesse responder – Nem precisa responder, só pode ser com o Sr. Incêndio.

Revirei os olhos e me juntei à sua risada em virtude daquele comentário péssimo, se um dia o Ced descobrisse que o Ron era ainda por cima ruivo, ele nunca ia largar o apelido. Nem me preocupei em confirmar as suspeitas dele e retornei meu olhar ao celular para ler a nova mensagem que tinha chegado.

”Mas você vai ficar sozinha ai?”

A preocupação dele me trouxe um sorriso aos lábios e pela nova gargalhada que o Ced deu, ele devia estar me observando atentamente.

“Claro que não, o Ced está comigo.”

“Ced? Quem é Ced?”

A resposta dele veio em velocidade recorde, e eu franzi as sobrancelhas debatendo se aquilo era algum indício de ciúmes. Desconsiderei rapidamente o pensamento, provavelmente eu estava lendo demais as entrelinhas que nem existiam.

“Já te falei várias vezes do meu assistente, Cedrico.”

“Eu já ouvi falar de um Cedrico, não do “Ced”, aposto que você se divertiria mais comigo.”

Será que eu estava doida mesmo em pensar que ele tinha ficado com ciúmes? Claro que ele não tinha o que se preocupar no que se relacionava a mim e ao Ced, mas era no mínimo engraçado receber uma mensagem daquelas.

“Não vou nem responder essa besteira.”

“Vou te deixar trabalhar em paz, me manda uma mensagem quando você chegar em casa.”

Aquilo me soou estranho, fiquei curiosa para saber o motivo do pedido e rapidamente respondi:

“Para que?”

“Só pra eu saber que você chegou bem”

Li aquela frase umas três vezes só para ter certeza de que eu não tinha desaprendido as sílabas, um debate se formou instantaneamente em meu cérebro para julgar se aquelas palavras tinham algum significado além do literal, mas como sempre não cheguei à conclusão nenhuma. Respondi confirmando que eu o avisaria assim que chegasse e coloquei meu celular de volta a mesa.

—Ah, chefinha... – o Cedrico falou suspirando, o olhar dele me encarava sonhador.

—O que foi? – indaguei.

—Nada não, é só que você fica mais linda ainda sorrindo assim- só então percebi que eu estava sorrindo igual a uma boba.

Fiz um gesto de dispensa com a mão em sua direção e fingi nem levar em consideração o seu comentário, no entanto não passou batido por mim que até mensagens estavam me deixando feliz ultimamente.

A noite foi longa, mas fomos capazes de terminar todo o serviço a tempo. Antes mesmo que os primeiros funcionários madrugadores chegassem, todo o meu trabalho já estava devidamente no lugar e eu e o Ced pudemos partir para casa e aproveitar o nosso tão merecido descanso. Me despedi do meu fiel escudeiro e ele me lembrou que estaríamos de férias durante três semanas a partir da próxima, o que me deixou ainda mais ansiosa por sair daquele prédio e esquecer dos tormentos dos últimos dias ao menos por três gloriosas semanas.

Meu sono era tanto, que ao chegar em casa eu só fui capaz de tomar um banho rápido e me jogar na cama, o relógio marcava quase oito horas da manhã e não era exagero dizer que meu corpo não estava nem um pouco acostumado a ir dormir nesse horário. Me esqueci totalmente de avisar ao Ron que eu tinha chegado, eu teria dormido direto se meu telefone não tivesse tocado momentos antes de eu pegar no sono.

—Alô – atendi sonolenta, sem nem conferir quem estava me ligando, só não podia ser ninguém da empresa, pois eu me recusava a voltar lá hoje.

—Ainda não está em casa? – uma voz grave e familiar chegou ao meu ouvido, cheia de uma preocupação não tão familiar assim.

—Oi Ron, desculpa, esqueci de te avisar. Acabei de chegar, dez minutos atrás, já estou jogada na cama. – senti uma pontada de culpa por não ter mandado uma mensagem, não era como se fosse me custar alguma coisa.

—Você está muito cansada, não tem problema. O que vale é que você já chegou, conseguiu entregar tudo? – ele parecia genuinamente sincero, não tinha ficado chateado comigo.

—Aham – foi tudo o que eu consegui responder, meus olhos já estavam fechando involuntariamente.

Escutei ele rindo da minha resposta monossilábica antes de ouvir a sua resposta:

—Vou te deixar dormir, descanse bem. Beijos – não sei nem se eu me despedi.

Acordei mais tarde, bem depois da hora do almoço. Minha sorte era que eu estava oficialmente de férias, pois eu não conseguiria reorganizar meu sono tão rapidamente. O resto do dia foi passado em uma bolha de preguiça, eu me dei ao luxo de literalmente não fazer nada o sábado todo: assisti tv, emendando um filme no outro, e quando chegou a hora do jantar, nada me faria cozinhar, então pedi um lanche pelo telefone. O único esforço aceitável do dia seria descer para buscar a minha comida.

Domingo passaria na mesma morosidade, contudo eu não conseguia ficar muito tempo sem fazer nada, então decidi colocar em prática pequenas tarefas que eu tinha relegado ao segundo, ou ainda terceiro, plano de importância na minha lista de prioridades. A primeira delas foi reorganizar minha estante de livros, ler era um dos meus passatempos favoritos, mas ultimamente eu tinha me tornado um tanto relapsa na organização dos meus queridos objetos, deixando vários deles fora da ordem cuidadosa com a qual eu gostava de guardá-los. Seguiram-se outros afazeres do mesmo gênero, arrumar meu guarda roupa, limpar todos os sapatos e assim por diante.

Minha primeira semana de férias começou e eu já não tinha mais nada para fazer dentro de casa, me dei conta que eu vinha de um ritmo tão acelerado de trabalho que eu nem sabia mais ficar de férias. Depois de cozinhar um almoço mais elaborado do que o normal para ocupar o meu tempo, decidi sair um pouco pela tarde. Liguei para a única pessoa que eu sabia que também estava de férias e o convidei para ir tomar um café em uma cafeteria charmosa que tinha aberto recentemente aqui perto de casa. O Ced também não estava fazendo nada em casa e em menos de meia hora estávamos juntos sentados à mesa da cafeteria, esperando os nossos pedidos chegarem.

—Sabe que ainda não caiu a minha ficha que estamos de férias? – o Ced comentou assim que a atendente veio trazer o nosso pedido.

—Pois eu acho que já estou até ficando entediada – falei rindo, eu sabia que ele iria reclamar da minha declaração.

—Entediada, chefinha? Ficar sentado num café no meio da tarde com seu assistente muito simpático é várias vezes melhor do que estar atolado de trabalho com a bruxa Dolores fungando no seu pescoço, mesmo que o assistente simpático também esteja junto – ele falou me desafiando a discordar, principalmente da parte que se referia a ele.

—Um dia você vai me contar da onde você tira tantas besteiras, Ced – coloquei a mão na boca tentando abafar meu riso, se continuássemos assim por muito tempo, os outros clientes iam começar a nos olhar feio pelo estardalhaço.

Ficamos conversando por mais algum tempo e ao final da tarde, nos despedimos com a promessa de nos encontrarmos novamente mais para o fim da semana. Cheguei em casa e de noite acabei me entretendo com uma maratona de uma série que eu costumava acompanhar o que me fez ir dormir bem mais tarde do que o de costume, mas o que importava? Eu estava de férias.

Acordei tarde na terça-feira e consequentemente o café da manhã foi tomado quase na hora do almoço, decidi sair para fazer umas compras rápidas no mercado que ficava ali perto e quando voltei encontrei a minha vizinha saindo de casa. A Ginny me convidou para almoçar com ela, como eu havia acabado de comer há pouco tempo, concordei em acompanha-la apenas pela companhia.

Fazia tempo que não nos falávamos, seu horário habitualmente atribulado raramente batia com o meu, então fiquei feliz de colocar o papo em dia. Eu achava que estava sendo muito discreta em disfarçar toda a confusão interna que eu vinha sentindo nos últimos tempos, mas o olhar atento da minha amiga não deixou escapar e ela chegou a me perguntar a razão do meu semblante não muito animado, pergunta para a qual eu devolvi uma resposta o mais vaga possível, apesar de eu ter certeza que ela sabia exatamente o que eu não estava dizendo. Para minha sorte ela não insistiu no assunto e mudamos o tópico para coisas mais banais.

Contei a ela sobre a finalização da arte do desfile e cheguei a mostrar alguns previews que eu tinha no celular. Ela elogiou bastante o trabalho, o que nunca deixava de me dar uma pontada de orgulho e eu comentei que os meus pais provavelmente viriam para o lançamento que seria na nossa cidade esse ano, prometendo que conseguiria ingressos para ela. Ela terminou de comer e foi direto para o hospital, eu voltei para casa.

No meio da tarde a minha paz tão recentemente adquirida foi despedaçada por um telefonema da empresa: os diretores tinham pedido algumas mudanças de última hora, queriam adicionar várias coisas e a minha chefe “pediu o meu retorno”.

—Eu sei que você está de férias, Srta. Granger, mas preciso de você aqui pelo menos até o fim da semana, de preferência já a partir de hoje – foi o pedido delicado que recebi.

—Entendo a emergência, Sra Umbridge, mas existem outras pessoas no escritório que podem cuidar disso no meu lugar – respondi incisiva, a minha vontade de voltar para lá antes das minhas três semanas era nula.

—Você não esta entendendo, querida. Não temos tempo a perder, tem que ser você – sua voz adotou um tom de adulação que soava falso até de longe.

Tudo o que eu conseguia pensar era ela me dizendo que eu era uma decepção e agora estava ali me pedindo para voltar das férias. Saber que ela, de um jeito ou outro, estava admitindo a minha eficiência me deixou satisfeita além dos limites, mas o que eu queria mesmo era poder jogar isso na cara dela. Semana passada ela ameaçou o meu emprego e agora me chamava de volta.

—Tudo bem, eu vou, mas quero ser recompensada por esses dias perdidos num outro período de minha escolha – falei firme para não restarem dúvidas de que eu não ia voltar atrás nessa decisão

—Certo, quero você aqui dentro da próxima meia hora, ah! E aquele seu assistente também, – ela desligou sem nenhuma cerimônia, essa mulher era infernal mesmo.

O ritmo lento que tinha se instaurado na minha vida foi substituído novamente pela correria, me arrumei sem nem prestar muita atenção no que estava fazendo e ao mesmo tempo liguei para dar a má notícia ao Ced. Ele atendeu ao primeiro toque.

—Oi chefinha, já sei do ocorrido, a monstra nos quer de volta – sua voz estava distante o que me indicava que ele também estava usando o viva voz para se arrumar concomitantemente.

—Desculpe por isso, Ced?

—E a culpa lá é sua? Não temos como evitar ser absolutamente maravilhosos no nosso trabalho, nascemos assim – eu podia imaginar o sorriso convencido que ele devia ter no rosto no momento – Eu só queria poder dizer isso com todas a letras para nossa chefe.

—Nem me fale, tem vejo daqui a pouco – interrompemos a ligação e eu me dirigi ao estacionamento, ainda me restavam 20 minutos para chegar ao trabalho, ia ter que dar tempo.

Voltei à minha rotina normal de trabalho, felizmente não tão radical quanto a anterior, mas mesmo assim todas as vezes que eu lembrava que podia estar longe dali, eu sentia um peso no estômago. Na quinta feira eu recebi uma mensagem do Ron durante a tarde.

“Olá, Mione. A Ginny vai estar trabalhando esse sábado, você está livre para comemorar comigo?”

Eu estava tão aérea nos últimos dias, com a recente reviravolta nos meus planos que não compreendi a mensagem dele, respondi perguntando qual era a ocasião para comemoração e a sua resposta curta e direta me banhou em culpa por ter esquecido.

“É o meu aniversário”           

“Meu Deus, desculpa Ron, estou tão atribulada com o serviço que perdi a noção dos dias, nem notei que fevereiro já estava no fim”

Eu esperava sinceramente que a minha gafe pudesse ser remediada, eu era muito boa em me lembrar de datas, nunca tinha esquecido o aniversário dele antes, por mais que nem sempre nós comemorássemos no dia exato, pois ele costumava sair com a irmã quando ela estava disponível.

“Tudo bem, você vai estar trabalhando no sábado também?”

“Não, estou livre. Aonde você quer ir? Pode escolher, além do outro item também.”

Não registrei que naquele momento o meu assistente tinha entrado na minha sala e se colocado atrás da minha cadeira, claramente observando o que eu estava escrevendo, se eu tivesse percebido, teria feito alguma graça sobre sua falta de pudor em espionar a privacidade dos outros e o mandado ir procurar o que fazer, mas não foi o caso.

“Deixo a escolha do restaurante por sua conta, só não me inventa nada muito fresco, quanto a sua outra pergunta, a mesma do ano passado.”

“Assim não vale, você está repetindo.”

Sorri ao lembrar da comemoração do aniversário dele do ano anterior, tinha sido memorável.

“O que eu posso fazer? Encontrei a minha favorita.”

Suspirei, meu argumento tinha sido derrotado.

“Ok, o aniversariante escolhe. Te mando o nome do restaurante mais tarde, mas vá bem vestido, não quero ver nem a sombra de uma camiseta!”

Ele com certeza reviraria os olhos com o meu último comentário, mas eu tinha certeza de que ele acataria o pedido. Ele se despediu dizendo que já estava ansioso para o sábado e eu voltei a minha atenção ao ambiente ao meu redor.

O Ced tinha tido a decência de se sentar na cadeira a minha frente enquanto me esperava terminar a conversa, eu levantei meus olhos em sua direção e falei:

—Preciso de ajuda Ced, tenho que reservar um restaurante urgentemente para o sábado – minha cabeça já estava procurando todas as opções que eu conhecia, mas eu sabia que o meu amigo teria muito mais.

—Qual a ocasião, chefinha? – ele se fez de desentendido, mas eu resolvi não levantar o assunto.

—É aniversário do Ron – respondi sem rodeios

—Tem que ser um lugar romântico então – ele colocou a mão no queixo, se perdendo em pensamentos.

—Ele não é meu namorado – frisei, não tinha porque ser um restaurante todo romântico, só um lugar legal, com comida gostosa.

—Você já disse isso – ele me olhou como se não acreditasse na minha declaração, o que me deixou um pouco irritada - Então quer dizer que você leva pra jantar todo mundo da sua vida? Como eu nunca ganhei um jantar no aniversário? – ele rapidamente mudou o foco da conversa e fez uma cara de vítima abandonada.

—Para com essa cara! Eu prometo que te levo esse ano – dei uns tapinhas de leve no seu ombro, tentando conter o riso com todo o teatro.

—Agora sim! Eu vou cobrar, mas você sabe que diferente do seu belo, eu que vou escolher, né? – ele levantou uma das sobrancelhas em ar de desafio

—Não esperaria nada diferente de você, Ced – era a mais pura verdade.

—O que você vai dar de presente? – a curiosidade estava estampada nos seus olhos castanhos.

—Nós não trocamos presentes – respondi sem me dar ao trabalho de esconder, ele ia ficar insistindo até saber.

—Mas eu vi você dizendo que alguma coisa era igual ao ano passado, não era presente?

—Que indiscreto de sua parte, ficar lendo a conversa dos outros! E não, não era – ele não demonstrou um pingo de ressentimento por ser chamado de indiscreto, acho que aquela palavra nem constava no seu vocabulário.

—O que era então? – claro que ele não ia se contentar com a resposta.

—Nada que te diz respeito seu abelhudo – senti minhas bochechas esquentando e de repente eu não queria olhar em sua direção.

—Chefinha, acho melhor você me dizer o que é porque a minha imaginação está correndo solta nesse momento – ele me deu um sorriso tão maldoso que me indicou por onde seus pensamentos andavam.

—Ai meu deus, tenho medo até de perguntar... Mas não é nada disso é só... é um... costume... Eu deixo ele escolher a cor... - parei no meio da frase, encabulada.

—Ahhhh já entendi! – ele juntou as mão em comemoração, parecia que algo de muito importante tinha acabado de acontecer -Temos que sair daqui pro shopping, então, e comprar a lingerie mais linda do estoque.

Fiquei boquiaberta, literalmente o meu queixo caiu, ele adivinhava as coisas de uma maneira impressionante, mas estava maluco se achava que eu o deixaria me acompanhar.

—O que? Você está sonhando se pensa que vai comigo – fiz um sinal de negativa com a cabeça.

—Claro que vou, entendo tudo de lingerie e tenho um gosto maravilhoso, além disso, amigos são para essas coisas – seu tom não me deu espaço nem para retrucar - Como eu perdi isso nos anos anteriores? Você parte meu coração assim...

—Eu não acredito nisso – desatei a rir, no final das contas eu sempre acabava concordando com os argumentos distorcidos dele - tudo bem, pode ir, mas você vai ter que se controlar.

—Prometo – ele fez um sinal de escoteiro - Alias qual é a cor desse ano?

—Vermelho.

—Já gosto mais do senhor Weasley – seu sorriso maldoso deu as caras novamente.

Depois do último comentário, dispensei o Ced de volta para sua mesa, ainda tínhamos trabalho a fazer naquele dia. Ele se foi, não sem distribuir mais algumas frases sugestivas e se comprometer a encontrar um restaurante legal para eu levar o Ron. Combinamos o horário que sairíamos do trabalho para ir ao shopping e voltamos aos nossos afazeres, contudo eu não conseguia mais me concentrar. Por algum motivo, o fato de ter o Ced me acompanhando no tipo de compras que eu iria fazer, me deixava nervosa. Meu amigo poderia até negar, mas era a pessoa menos controlada que eu conhecia, e eu estava sentindo que ia passar boa parte do passeio envergonhada com seus comentários, eu só não podia negar que a outra parte eu passaria rindo, pois se tinha algo que o meu assistente conseguia fazer bem, era ver humor em tudo o que acontecia.

Quando o relógio exibiu o horário de terminar meu serviço, eu desliguei o computador e juntei minhas coisas, colocando minha bolsa sobre o ombro e indo em direção à mesa do Ced para chamá-lo. Ele obviamente já estava pronto e com cara de ansiedade, parecia uma criancinha esperando os presentes de natal, balancei a cabeça ao ver o olhar de expectativa que ele me lançou, e soltei um riso involuntário.

—Vamos logo, chefinha, estou ansioso com nossas compras – ele passou o meu braço por dento do dele, me levando pela mão até o elevador.

—Tudo isso é medo que eu não te deixe ir? – olhei na direção que ele prendia o meu braço e ergui a sobrancelha.

—Eu não vou perder isso por nada, vou usar todos os métodos possíveis! – ele se justificou, sorrindo com toda a confiança de quem sabia que eu não seria capaz de impedi-lo de ir.

—Fico contente em satisfazer suas vontades – observei sarcástica, ele apenas riu em resposta.

O caminho para o shopping estava congestionado devido ao horário, aproveitei o momento de lentidão para perguntar se ele tinha achado algum restaurante legal.

—Claro que sim, chefinha! Como você me pergunta uma coisa dessas? Já está inclusive reservado no seu nome para duas pessoas – respondeu orgulhoso do seu feito.

—Você reservou sem nem me mostrar o lugar? – de repente fiquei com medo do que viria pela frente, o Ced podia muito bem fazer alguma gracinha.

—Obviamente, você vai gostar, ou vai dizer que eu não tenho um gosto impecável? – nitidamente ele estava esperando a confirmação para sua pergunta, mas o tom empregado me mostrou que ele não tinha dúvida nenhuma de qual seria.

—Seu gosto nunca falhou até hoje – era a mais pura verdade, meu amigo era a epítome de classe e do bom gosto, o que não era verdade para o seu bom senso.

Chegamos ao nosso destino e decidimos comer alguma coisa antes de começar as compras. Demos preferência por um lanche rápido e em menos de trinta minutos já estávamos caminhando por estre os corredores a procura de lojas de lingerie. Entramos em alguns estabelecimentos que acabaram não agradando ao Ced em nada, tentei argumentar em favor de algumas peças, mas ele não se convenceu:

—Não vou deixar você levar isso, chefinha, é muito sem graça e o “Ron” merece mais no aniversário dele – sua determinação estava me reduzindo a gargalhadas sem fim, nada além do perfeito seria aceito por ele, eu só tinha medo do que seria isso.

Finalmente entramos numa loja que pareceu chamar a atenção do meu assistente, realmente era um lugar mais elegante e sofisticado do que os outros e fomos prontamente atendidos por uma vendedora simpática que foi logo perguntando o que estávamos procurando. O Ced, claro, tomou a dianteira:

—Estamos procurando algo vermelho, para uma ocasião especial – ele deu um sorriso atrevido para a atendente, destilando todo seu charme, indicando exatamente o tipo de ocasião especial que ele tinha em mente.

Levei minha mão à testa, exasperada com o comportamento dele e enquanto a moça tinha ido procurar alguns modelos para nos mostrar, eu o puxei para perto de mim e falei baixo:

—Você quer parar com isso? Daqui a pouco essa vendedora estará babando em cima de você, se comporte.

—Ela pode babar o quanto quiser, você sabe que eu não estou interessado, chefinha, além do mais, pessoas felizes trabalham mais eficientemente, não se preocupe – ele me deu uns tapinhas no ombro.

—Você é incorrigível mesmo – eu já tinha me acostumado a ver isso, o Ced deixava sempre um rastro de mulheres de boca aberta por onde quer que ele passasse, ainda mais quando ele estava, propositalmente, sendo charmoso. Aquela mistura de rosto perfeitamente desenhado com uma personalidade magnética era infalível, eu tentava sempre refrear seus surtos de “charme”, eu não precisava lidar com o Cedrico de ego mais inflado ainda, pois ele tinha plena consciência do seu efeito nos outros.

A moça voltou trazendo diversas opções que variavam das mais comportadas às mais escandalosas. Ela nos deixou a vontade para avaliarmos as peças e o Ced foi comentando cada uma, me deixando cada vez mais arrependida de tê-lo trazido junto, onde eu estava com a cabeça? Finalmente ele achou um conjunto que, de acordo com ele, era o escolhido, mas ele estava maluco se ele pensava que eu ia comprar aquilo. A lingerie estava bem longe do que eu usaria, feita de renda vermelha com detalhes em preto, ela deixava bem pouco para a imaginação, apesar de que não tinha como negar que era uma peça muito bonita.

—Eu não vou usar isso, Ced! Tem até cinta liga! – meias pretas rendadas faziam par com o conjunto, e eu achava que era exatamente por isso que ele tinha selecionado aquele, minha objeção o fez me olhar rindo.

—Ah, vai sim, chefinha, o Sr. Incêndio merece! – ele me olhava seriamente decidido, de repente um sorriso desafiador apareceu em seu rosto e eu sabia que estava para escutar algo pior ainda - Tem que ser esse ou eu vou comprar uma fantasia de bombeira pra você, que alias também é vermelha, então não vai estragar o pedido do aniversariante.

—Você só pode estar brincando! – meu assistente realmente estava com um parafuso a menos, eu não tinha estudado tantos anos da minha vida para acabar dentro de uma fantasia ridícula de bombeira.

—Claro que não, vocês não trocam presentes, nada mais justo do que ele poder te desembrulhar, não acha? – ele estava claramente se divertindo às minhas custas, fiz uma nota mental para nunca mais chamá-lo para qualquer tipo de atividade semelhante.

—Ced! Você prometeu que ia se controlar! – falei cerrando os dentes, eu sabia que estava com as bochechas da cor da lingerie que ele tinha nas mãos.

—Ué, chefinha, esse sou eu controlado – declarou sem nenhum pingo de remorso -Você ainda não viu nada.

Imediatamente ele foi em direção ao caixa e entregou a peça que havia selecionado para ser embalada.

—Eu não vou levar isso! – falei baixo ao seu lado, tentando evitar chamar atenção das vendedoras a nossa volta.

—Já disse que vai, e vai me agradecer depois – eu nunca tinha sentido tanta vontade de bater nele, como naquele momento.

—Você não vai me convencer a pagar por essa peça – cruzei os braços e bati o pé no chão, uma atitude muito pouco madura, mas eu estava realmente atarantada com toda a insistência dele.

—Mi – ele colocou as mãos nos meus ombros e olhou bem nos meus olhos, a utilização do seu apelido “exclusivo”, de acordo com ele, me mostrava a sua seriedade no assunto, geralmente ele preferia o irritante “chefinha” que tanto me enfurecia no começo e que passou a se tornar um hábito e até uma brincadeira entre nós – você não pediu a minha ajuda? Pode confiar em mim, eu tenho certeza do que estou falando, você vai ficar um arraso e o aniversário do senhor Weasley vai ser um sucesso.

—Mas eu não pedi a sua ajuda para isso, apenas para escolher o restaurante – respondi sem rodeios.

—Você pode não ter falado em voz alta, mas eu escutei o pedido mesmo assim – seu sorriso mais carinhoso e inocente estava à mostra.

Pronto, ele tinha conseguido me fazer rir de novo, era impossível ficar brava com ele por mais de cinco minutos, esse meu amigo era tão teimoso! Porém, o fato era que ele nunca tinha errado em nenhum dos seus conselhos antes... Debati comigo mesma por alguns instantes e cheguei à conclusão de que estava sendo boba, eu estava relutando por quê? Sem decidir uma resposta, resolvi aceitar a sugestão um tanto quanto escandalosa do meu assistente.

—Tudo bem, você venceu, vou levar essa – concedi e vi uma animação infantil surgir em seus olhos.

—Isso ai, garota! Você não vai se arrepender e tenho certeza que o senhor Incêndio vai querer que eu continue a minha consultoria nos próximos anos. – ele passou a mão pelos cabelos em um gesto um tanto quanto convencido.

—A única outra coisa que você conseguiu hoje, Ced, foi ser permanentemente excluído de qualquer compra desse tipo comigo – falei irônica, e ao invés de assumir uma expressão de vítima ferida, como eu já o tinha visto fazer tantas vezes, ele riu alto.

—Vamos ver, no domingo você me conta sobre o sucesso da minha escolha – a vendedora já tinha computado a compra e eu passei meu cartão.

O Ced pegou a sacola e saímos da loja, eu esperava sinceramente não voltar mais com ele naquele lugar, eu tinha até medo do que ele me convenceria comprar da próxima vez, ainda bem que não tínhamos visto de fato nenhuma fantasia de bombeira.

Cheguei em casa pouco tempo depois, a sacola com minha mais nova aquisição me encarava do canto do sofá. Só para se certificar de que eu não iria devolver, meu amigo “gentilmente” tirou a etiqueta de troca, de acordo com ele era melhor prevenir, pois eu era muito capaz de dar meia volta e me livrar da lingerie assim que ele não estivesse olhando. Não vou dizer que o pensamento não me passou pela cabeça, mas a verdade era que eu estava curiosa para ver a reação do Ron com a escolha desse ano, sendo sem dúvidas a mais ousada de todas, o que não me surpreende nem um pouco já que existe o toque Cedrico na seleção.

Antes de me arrumar para dormir, enviei para o Ron o endereço do restaurante onde iríamos jantar e combinamos de nos encontrarmos lá as oito horas. Seria difícil conter a expectativa até o sábado, pois por mais que sair para jantar juntos fosse um arranjo normal para nós, aniversários eram sempre ocasiões tradicionalmente especiais, contudo eu me forcei a deitar e fechar os olhos, mesmo que o sono estivesse passando longe, a sexta feira seria longa.


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Notas finais do capítulo

E ai, me digam se gostaram do capítulo! Adoro saber a reação de vocês :)
O que acharam do Ron com ciúmes? E a excursão da Mione e do Ced ao shopping?
Não se esqueçam que Déjà vu será postado amanhã, e alguns desdobramentos desse capítulo podem ser vistos la;

Crossover: vocês querem saber em detalhes como foi o encontro da Ginny com a Mione, ou estão curiosos para ver qual foi a reação do Ron com a Mione esquecendo o aniversário dele? Não percam o capítulo de amanhã de DV. https://fanfiction.com.br/historia/687490/Deja_vu



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