Depois de ler algumas páginas acabei dormindo sem perceber. Ultimamente eu andava mais cansada que o normal, com tanto trabalho e tendo que acordar tão cedo. Era um estilo de vida do tipo que esgota suas energias, bem mais difícil do que eu estava acostumada.

Despertei com batidas na porta, o que logo fez com que eu obrigasse meu corpo a se movimentar. Do lado de fora, as três criadas esperavam em silêncio. Quando me viram, todas elas fizeram uma reverência.

— Entrem, por favor — falei, escancarando a porta e dando passagem para passarem.

Me fizeram tomar banho novamente, em uma banheira maravilhosa e bem espaçosa. Foi um ótimo banho, mesmo eu me sentindo um tanto envergonhada por ficar sem roupas na frente de desconhecidas. Percebi novamente que Ana evitou qualquer contato comigo. Por que ela estava fazendo aquilo?

Usei um vestido bordô de alcinha e feito de ceda. Bianca fez uma maquiagem típica da noite — sem exagerar — e Gisele prendeu metade do meu cabelo, deixando a franja solta. Eu estava começando a me acostumar com a sensação de me sentir linda o tempo todo.

— Ah não, as bijuterias não estão aqui — disse Gisele depois de terminar meu cabelo.

— Eu pego — anunciou Ana, fazendo uma reverência curta e saindo rapidamente.

Soltei um suspiro. Eu não conseguia entender ela.

— Meninas — comecei, passando a mão na nuca. — Será que... será que vocês sabem me dizer o motivo de Ana agir assim? Digo, é alguma coisa que eu fiz?

Elas ficaram em silêncio, e percebi que uma olhou para a outra numa conversa silenciosa.

— Me desculpe, senhorita. Acontece que Ana foi escolhida para servi-la por causa de seus nomes semelhantes. Acharam que por você ser chamada de Anna e ela também, seria legal ficarem juntas — disse Bianca, suspirando em seguida.

— Sim, mas a Ana não gosta e nunca gostou da Seleção, então automaticamente também não gosta das Selecionadas — completou Gisele.

Então era por isso. Meio injusto a colocarem comigo por uma semelhança que nem é lá grande coisa. Afinal, meu nome era Annalise, mas é claro que todos sabiam que informalmente eu era conhecida apenas como Anna.

— Entendo — falei, no mesmo momento em que Ana retornou com algumas caixinhas nos braços.

Enquanto elas avaliavam o que ficaria melhor com meu vestido, comecei a pensar em formas de me aproximar de Ana. Estava certo que ela não ia com a minha cara, e eu entendia isso. Mas também sabia que continuar daquela forma não seria mais possível por muito tempo, e eu queria fazer de tudo para  mudar.

Alguns minutos depois das seis, Silvia bateu na porta do quarto com outras quatro garotas atrás dela ­— incluindo America. Fomos direcionadas para o salão, onde esperamos as demais meninas e então pudemos ir ao Salão das Mulheres. Eu estava com uma certa dificuldade para me portar da maneira certa usando aquele tipo de roupa, mas quem não estava, não é mesmo?

O Salão das Mulheres passara por uma completa transformação na nossa ausência — no lugar de espelhos e cabides, haviam mesas e cadeiras preenchendo o salão. Além de mais uns sofás muito bonitos, do tipo que eu encontraria na casa de uma pessoa da classe alta no meu mundo.

Me sentei perto de Marlee e Meri, e quando todas já estavam acomodadas eles ligaram a TV para assistirmos o Jornal Oficial. Começou com as notícias habituais de sempre — a situação econômica e política do país, ataques rebeldes ­— para então dedicarem os últimos trinta minutos aos comentários de Gavril sobre as imagens do nosso dia.

— Aqui vemos a senhorita Celeste Newsome se despedir de seus muitos admiradores de Clermont. Essa adorável garota precisou de mais de uma hora para dizer adeus aos fãs.

Celeste sorriu convencida ao se ver na TV.

— E as outras garotas do meio leste também são muito populares. A atitude calma e refinada de Ashley Brouillette a define imediatamente como uma dama. Sua expressão humilde ao caminhar em meio à multidão não é muito diferente da expressão da própria rainha. E Marlee Tames, de Kent, estava toda eufórica em sua partida hoje, tendo até mesmo cantado o hino com a banda enviada ao local.

Fotos de Marlee sorrindo e abraçando a multidão da sua província natal apareceram na tela.

— Ela é uma das favoritas de muitas pessoas que entrevistamos hoje.

Marlee olhou para nós — America e eu ­— e sorriu. Se não soubesse de tudo o que aconteceria mais tarde, e não fosse pela Meri, eu com certeza torceria por ela.

— Quem também viajou com a senhorita Tames foi America Singer, uma das quatro Cinco a chegar à Seleção — várias imagens da Meri também passaram, mostrando os momentos antes de chegarmos no palácio. — Sabemos que castas nada significam na Seleção, e parece que não devemos desprezar a senhorita America. Assim que aterrissou em Angeles, tornou-se a queridinha da multidão, atrás somente da nossa outra Selecionada, a senhorita Annalise Living. Esta bela moça ganhou o coração do povo de sua província com seu maravilhoso discurso. E não vou mentir, foram belas palavras, dignas de uma verdadeira princesa que conhece a importância de seus súditos.

Então o discurso em vídeo rodou na tela, mostrando meu ”glorioso” momento.

E meu queixo caiu.

Que história era aquela de que America estava atrás de mim?

Percebi que a maioria das garotas me olhavam feio.

Mas não devia ser eu.

Respirei fundo, tentando manter a calma. Aquilo não significava nada, Maxon não se interessou em Meri por sua popularidade. Não era com isso que ele se importava — pelo menos eu esperava que não.