A Garota da Lua escrita por calivillas


Capítulo 33
O JAVALI – A promessa quebrada


Notas iniciais do capítulo

NOS CAMINHOS DO ORIENTE



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— Você me traiu, Diana! – A voz dela demonstrava tristeza e mágoa. – Eu era uma princesa e deixei tudo por acreditar nas suas ideias e você quebrou nossa promessa de nunca se entregar a um homem, mas foi isso que você fez e, ainda, deu a ele a maior dádiva, um filho!  

Eu olhava a figura da bela mulher alta, com um corpo forte, cabelos louros quase branco que voavam a sabor da brisa fresca da noite, para o seu rosto marcado pela dor da decepção. Ela se vestia como umas amazonas, uma caçadora, com uma túnica curta e meia armadura, com um arco e aljava nas costas e uma espada na cintura, a clareira da floresta onde estávamos era iluminada pela imensa lua cheia, dando a tudo uma luz prateada fantasmagórica, atrás dela, podia ver a muro escuro que a mata fechada formava.

— Perdoe–me, Calisto! – eu implorava, com minhas mãos voltadas para ela em súplica. – Eu não pretendia, mas foi mais forte do que minha vontade.

— Não, eu nunca a perdoarei, Diana. Você terá que pagar pela sua fraqueza! Eu esperei por você todo esse tempo!

Acordei sobressaltada, como há muito tempo não acontecia, corri para o quarto de Alexandre, que dormia profundamente no seu berço, suspirei aliviada quando o vi. Não consegui dormir, novamente.

Havíamos mudado para o Canadá, em busca de ALGUMA tranquilidade, pelo menos, por algum tempo, pois era uma terra jovem, não muito visada pelos imortais. Nossa casa estava protegida pelo amuleto que minha mãe havia me dado, impedindo a entrada de quem não fosse convidado. Além do mais, Gabriel havia nos protegidos com o feitiço que impediam que visitantes indesejáveis não se lembrassem da localização da casa.

Para me ocupar, eu havia aberto uma pequena livraria, voltada principalmente a livros de História e Artes, seria mais uma distração, pois não tínhamos problemas financeiros, descobri que entre vários negócios, Gabriel era um grande investidor em energia eólica, o que eu achei bem provável, já que o vento era um dos seus elementos. Nós não tínhamos exatamente um casamento, pois ele passava a maior parte do tempo viajando, negociando entre o Oriente e o Ocidente, tentando evitar conflitos, mas que, às vezes, eram inevitáveis, nos jornais mortais apareciam como atentados terroristas, guerrilhas e massacres, apesar da maior parte deles serem causados pelos próprios humanos, no entanto, tinha o dedo de nossa gente, por trás de alguns destes episódios.

Como toda manhã, eu andava até a minha loja, que ficava algumas quadras da minha casa, ainda relembrando o sonho que tivera, curiosa sobre quem seria Calisto, então, pensei em perguntar a Jane mais tarde, foi quando eu o vi de relance, o que para os mortais passaria por uma simples sombra na parede, porém, se observassem com cuidado, saberiam que não poderia haver aquele tipo de sombra ali, àquela hora do dia, contudo, sabia que era um dos espectros do  mundo de Eres, mas não tinha ideia do que ele estava fazendo, naquele lugar, talvez, me vigiando para a sua senhora, teria que ficar mais atenta agora.

A minha loja tinha um estilo tradicional, com uma porta de madeira com janelinhas de vidro e uma grande vitrine cheia de novidades, lá dentro o ambiente era acolhedor com poltronas e mesas, para que os clientes pudessem folhear seus livros e fazer a melhor escolha, tinha a ajuda do meu assistente Bob, um cara meio estranho para os padrões normais, mas, que possuía uma energia intensa, que não conseguia entender muito bem, por isso, eu o contratei, já que nos demos bem logo de cara.

Naquela manhã, ao chegar a livraria, que acabou de abrir, depois de tirei o meu casaco e guardei minha bolsa, encontrei Bob com uma feição um tanto desconfiada.

— Bom dia, Diana. Tem um cara aqui esperando por você — ele sussurrou, um tanto desconfiado.

— Bom dia, Bob. Ele falou o que queria?

— Não, ele só falou que queria conversar com a Dama da Lua. Falei que não tinha ninguém com esse nome aqui, então, ele disse que queria falar com a senhora Gale. – Esse era sobrenome falso que usava, atualmente, uma brincadeira de Gabriel, pois significava vendaval em inglês.

— E onde ele está? – Atenta, perguntei, olhando em volta, não vendo ninguém.

— Ali, na sessão de livros de artes orientais – Bob respondeu, apontando para uma área mais reservada.

Fui até lá, ainda sem minhas armas, pois não sabia o que eu poderia encontrar, fiquei surpresa, quando deparei com um rapaz de feições típicas do extremo oriental, de cabelo espetados e com as pontas pintadas de azul e vestido uma jaqueta bem estilosa roxa, calças justas e tênis de cano alto pretos, parecendo mais um jovem moderno, que folheava um livro de história japonesa bem antigo, contudo, ele emanava uma energia estranha e poderosa.

— Bom dia. Você gostaria de falar comigo? – Ao ouvir minha voz, ele levantou em um pulo, fechando o livro.

— Dama da Lua?

— Por favor, aqui, só me chame de Diana. O que quer de mim?

— Meu nome é Susa-no-o, mas pode me chamar de Su, o nome que uso, atualmente, e preciso da sua ajuda.

— Da minha ajuda? Para quê?

— Preciso da sua habilidade em acalmar as conturbações e convencer as pessoas, como fez antes com o Senhor do Oriente.

— Lamento, não sei do que você está falando, eu sou apenas uma dona de livraria – disse, isso segurando minha pedra de turquesa, que por várias vezes usei para convencer e acalmar os outros.

— Por favor, Dama da Lua, nós sabemos do que eu estou falando, e tire a mão dessa pedra.

— Por quê? – Eu o desafiei e, de repente, um forte vento escancarou a porta da livraria, livros se abriram e papéis voaram. Bob correu para fechar a porta, com dificuldade.

— Por isso! – Su respondeu, de um jeito provocador. – Você acha que só seu amante tem o poder da tempestade e dos ventos? – Soltei o meu pingente em resposta.

— O que eu posso fazer por você?

— Ajude-me a resolver um problema de família

— Onde está sua família?

— Minha família está do outro lado desse oceano. – Sabia que ele se referia ao oceano Pacífico, então seria no extremo-oriente.

— Qual seria este problema?

— É um mal-entendido entre mim e meu pai e minha irmã.

— Não posso me meter nos seus problemas familiares. É a sua família, converse com eles.

— Você não entende! Eles não me ouvem! – Enraivecido, ele gritou e, de novo, começou a ventar lá fora, podia ouvir a porta escancarar, outra vez, pelo vento.

— Tudo bem aí, Diana? – Bob perguntou do outro lado da estante, ao ouvir os gritos de Su.

— Tudo! Está tudo sobre controle, obrigada, Bob.

Então eu o ouvi, quando saiu para fechar novamente a porta.

— Mas, o que você quer exatamente de mim?

— Quero que venha comigo e converse com minha irmã e com meus pais.

— Só isso.

— Sim.

— Então, posso telefonar para eles.

— Não, você tem que ir até lá! Agora!

— Eu não posso largar tudo e ir para o extremo-oriente, assim desse jeito!

— Claro, que pode! – Depois, ele mudou o tom de uma forma sinistra. – Pois, seria uma pena essa linda cidade ser destruída por uma terrível tempestade e, ainda, seria pior se o Senhor dos Ventos levasse a culpa. Seu pai ficaria furioso, poderiam haver retaliações. Não seria nada bom para essa paz tão delicada, que vocês têm atualmente.

— Você está me ameaçando, Su?

— Se você pensa assim? Você vem comigo? – Olhei em volta, poderia lutar, mas seria arriscado, pois, não conhecia aquele ser, que parecia muito antigo e poderoso, e não sabia do que ele seria capaz, não queria arriscar, principalmente, a cidade onde meu filho estava.

— Eu vou com você! Mas, preciso avisar a Bob, senão, minha família ficará muito preocupada – decidi, Su me olhou desconfiado.

— Está bem! Mas, lembre-se que estarei do seu lado, quando fizer isso. Não queremos fazer nenhum mal ao seu assistente – Ele me ameaçou, mais uma vez, e saímos juntos de trás da estante, peguei minha bolsa e quando colocava meu casaco, avisei a Bob.

— Bob, vou dar uma saída com o senhor Su.

Bob parecia não entender aquela minha atitude estranha.

— Você vai demorar? Porque tem aquela remessa de livros novos para chegar agora, pela manhã – ele me avisou.

— Provavelmente, não voltarei hoje. Cuide disso para mim, Bob. – Ele me olhou surpreso, mas não perguntou mais nada e eu e Su saímos.

— Agora, você pode me explica como iremos falar com sua irmã e com seus pais.

— Voando!

E aquela resposta não foi surpresa para mim, pois, era assim que sempre acontecia, mas primeiro ele me levou até um estacionamento, onde estava uma moto fantástica, toda azul metálica, parei, admirada, olhando para ela.

— É uma Z1000, edição especial, e com mais alguns acessórios que os mortais desconhecem. Ela é linda, não é?

— Sim, muito bonita.

— É, eu gosto de velocidade. – Ele continuou, me lembrei como já havia ouvido a mesmas palavras várias vezes, depois, continuou: – Diana, por favor, seu telefone. – Estendeu a mão e eu titubeei, mas seu olhar firme demonstrava que não estava brincando, então, tirei o aparelho da minha bolsa e entreguei, ele esmagou o aparelho transformando em pó, que escorreu entre seus dedos.

— Meu telefone! – gritei, desesperada, vendo minha última chance de comunicação virar um montinho de pó no chão.

— Diana, prometo que assim que tudo isso acabar, darei de presente para você, o melhor e mais moderno modelo das nossas empresas – disse com a mão no peito, fazendo uma leve reverência, mas, naquele momento estava sem palavras, quando sentamos na moto, ele me deu um capacete vermelho e colocou outro, todo preto, fechou a jaqueta – Coloque isso, Dama da Lua, não queremos ser parados, pela polícia, por bobagem.

Enquanto estávamos no perímetro urbano, ele respeitou os limites de velocidade, mas quando pegamos a estrada, parecíamos que levantaríamos voo a qualquer momento, tão grande era a velocidade, entramos para uma área cercada por floresta, andamos por uma certa distância, até chegarmos a uma estrada no meio do nada, onde havia um pequeno avião. Só um imortal, poderia aterrissar algo daquele tamanho em um lugar tão pequeno. Descemos da moto e Su a empurrou para o interior do avião, na verdade, ela levitou até lá impulsionada pelo vento, depois, ele me convidou para entrar.

— Por favor, me acompanhe até a cabine de comando. Teremos tempo de conversarmos.

— Você é quem vai pilotar isso?

— Sim, sou um bom piloto, em pouco tempo, estaremos na casa da minha irmã. Nosso voo durará menos que um voo normal

Su decolou com muita habilidade da pequena e estreita pista improvisada, apesar de saber quem éramos, minha educação mortal ainda pesava muito nessas horas, fechei os olhos para não ver as asas passando juntinho dos troncos das árvores, durante a decolagem e a barriga do avião se arrastando nos galhos mais alto, assim que levantamos voo.

— Afinal, explique-me por que, exatamente, você me trouxe nesta viagem louca. – Exigi após o avião se estabilizou.

— Preciso que me ajude, Dama da Lua. Preciso que converse com minha irmã, pois por causa dela fui punido pelo meu pai.

— Mas, por que você foi punido? O que você fez de tão errado?

— É uma longa história.

— Teremos todo o tempo da viagem para você contar, Su.

— Bem, você deve ter percebido que sou um tanto impulsivo, às vezes, tenho um mau gênio.

— Sim, eu percebi – falei com sarcasmo.

— Eu me comportei mal com minha irmã, e ela ficou muito zangada, pediu aos meus pais que me punisse. – Ele parou como se fosse difícil prosseguir.

— Qual foi a punição? – Não esperava pouca coisa, pois meu próprio pai havia me mandado para o Esquecimento, um lugar entre duas dimensões, onde você se esquece de quem era, fiquei lá por muitos séculos, até que minha mãe me resgatasse, me fizesse nascer de novo e me entregasse para um casal de mortais para ser criada.

— Eles me mandaram para a terra dos adormecidos — revelou com pesar, pois diferente de mim, ele se lembrava daquilo.

— Você fez algo muito grave? – perguntei, pois, o meu erro, que levou a minha punição, foi ter me apaixonado pelo inimigo, Gabriel, e o ter ajudado a fugir.

— Nada demais só um mal-entendido. – Ele foi evasivo, achei que ele não iria me dar detalhes. – Mas, eu cumpri minha punição.

— Então, está tudo bem agora? – Não compreendia qual era o problema, porém ele me olhou de modo triste.

— Quando estive lá e a mulher que eu amava, desapareceu e eles não querem que nós nos encontremos.

— Lamento, Su. Mas não posso ir contra a sua família. É uma situação muito delicada, nós nem pertencemos ao mesmo povo. Talvez, Gabriel possa falar com seus familiares, ele é um bom negociador.

— Não! Eu queria sua ajuda porque você teve uma história parecida com a minha, mas, agora, você e o Senhor dos Ventos estão juntos. Achei que você me entenderia, soubesse como estou sofrendo, preciso que encontrá-la e trazê-la de volta para mim. – Vi sinceridade nos olhos de Su, então, pensei que poderia tentar ajudá-lo

— Qual é o nome dela?

— Eu a chamava de Kushi. Eu prometi que voltaria para ela – Su explicou com tristeza.

— Eu vou tentar ajudá-lo a encontrar sua Kushi – prometi, sem ter muita certeza que conseguiríamos.


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