A Sombra do Pistoleiro escrita por Danilo Alex


Capítulo 9
O Início de uma Caçada


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal!
Finalmente vamos começar a acompanhar os primeiros passos concretos da jornada de Enrico em direção à sua tão sonhada vingança.
Espero que gostem!

Quero aproveitar aqui para expressar meu carinho aos amigos Matheus Braga, Jessica e ArveeneNymeria, que além de lerem esse meu rascunho insano, ainda se dão ao trabalho de comentar, o que sempre me deixa muitíssimo feliz.
Também quero agradecer a todos que nos acompanham até aqui mas nunca se manifestaram.
Enfim, chega de papo! rs

Boa leitura!!!



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Quando deixou a cidade de Piedras Negras, Enrico De La Cruz já tinha alguma ideia do que fazer para descobrir o paradeiro de Francisco Herrera, o homem que mais odiava nesse mundo. O jovem rumou diretamente para o sul do México e galopou obstinadamente para Monterrey.
Afastou-se de Piedras Negras, localizada na fronteira com os Estados Unidos, e embrenhou-se novamente no México. Precisava voltar para Monterrey, sua cidade natal. Ali, com certeza ele encontraria pistas que indicassem a localização de seu inimigo. Era apenas o início de uma perigosa caçada, de uma jornada imprevisível. Podia levar meses ou até anos, ou podia durar dias, semanas. Só o destino diria. Podia ser que morresse sem se encontrar com Francisco Herrera. Podia ser que o bandido já estivesse morto. As probabilidades pareciam diversas. Entretanto Enrico não ia parar. Não, ele não desistiria.
Galopou durante dias a fio, enfrentando o calor, a poeira e o cansaço. Nada disso importava. Poderia ter feito aquela viagem a bordo de um trem, confortavelmente instalado numa boa cabine, refestelado numa poltrona, sabendo que seu amigo Muchacho estaria perfeitamente seguro no compartimento para animais.
Mas Enrico De La Cruz não nascera para o luxo. Por escolha própria ele decidiu seguir nos cascos de seu veloz alazão, talvez o cavalo mais rápido que ele já montara e ouvira falar.
Enrico sentia uma imensa sensação de liberdade quando curvado sobre a sela de seu cavalo, o qual, como se tivesse asas nos cascos, voava vencendo distâncias, fazendo milhas e milhas se perderem na nuvem de poeira erguida por onde passavam.
Enrico sentia que sua montaria era parte dele. Era como se Muchacho fosse a continuação de suas pernas.
Era como se ambos se fundissem em um só ser. O rapaz sorria ao pensar nisso. Alegrava-se.
Contornaram colinas e gigantescas montanhas, cruzaram campos, vales, planícies, pradarias e desertos.
Atravessaram rios e riachos.
Enrico passou noites mal dormidas no deserto, acomodado o melhor que podia no chão arenoso, deitado ao redor de uma fogueira. Aprendeu a viver entre as criaturas do deserto, e a defender a si e a seu cavalo de serpentes e escorpiões, e de todo tipo de perigo por parte de animais selvagens. Existiam também os riscos de ser atacado por índios ou bandidos do deserto. Na verdade, Enrico gostava de sentir fortes emoções. A adrenalina despejada em seu sangue o fazia se sentir mais vivo, mais lúcido.
As sensações de medo e perigo constantes despertavam nele a sua animalidade interior, seus mais primitivos instintos de sobrevivência.
Esse tipo de instinto seria de vital importância quando se visse em apuros, muito em breve cercado pelos inimigos.
Após sete penosos dias de viagem, os quais pareceram uma eternidade, os olhos negros e, naquela altura, muito cansados de Enrico, divisaram ao longe a silhueta de sua cidade natal recortada contra o horizonte tingido de vermelho pelo entardecer. Meia-hora depois, quando cavalgou pela rua principal de Monterrey e deteve seu cavalo diante do saloon, o jovem De La Cruz notou que a cidade não mudara muito nos seis anos que estivera ausente.
Apeou de Muchacho e deixou-o amarrado ao alpendre diante do estabelecimento. Em seguida, olhou ao redor atentamente.
Na verdade, em termos de estrutura, Monterrey se parecia muito com Piedras Negras. Apresentava as mesmas ruas estreitas e poeirentas, a idêntica escassez de casas comerciais, o mesmo emaranhado de ruas; podia-se ver nas construções a mesma arquitetura modesta de Piedras Negras, as mesmas pessoas de pele morena e roupas humildes. A única diferença gritante entre ambas era que em Monterrey quase não se viam forasteiros.
Os gringos estavam mais presentes em Piedras Negras, pois ela é uma cidade fronteiriça, perto da terra deles.
Enrico viu alguns rostos conhecidos, mas ninguém pareceu reconhecê-lo.
Também, não era para menos; ele estava muito diferente fisicamente e, naquele momento, tinha poeira dos pés à cabeça. Além disso, pelo que padre Emanuel lhe contara muito tempo antes, as pessoas ali de Monterrey tinham dado o rapaz como morto.
Nesse caso, era um fantasma que se achava agora, de pé, observando o movimento crescente de pessoas que apareciam à rua àquela hora. O sol estava completamente escondido no horizonte e a noite se avizinhava. A primeira pessoa que Enrico pensava procurar era o xerife; porém, estava muito cansado para qualquer coisa. Além do mais, era tarde para incomodar o representante da lei. Faria isso no dia seguinte, pela manhã. Precisava encontrar alguém capaz de lhe fazer um grande favor e atualizá-lo, colocá-lo a par das novidades do povoado.
Enrico teve um estremecimento quando o vento frio e cortante, vindo do deserto, atravessou seu corpo. Estavam em agosto de 1874, e aquele mês prometia trazer consigo muito frio. O vento gelado que vinha do deserto, assobiando, varria as ruas de Monterrey naquele início de noite. As diversas tochas acesas nas ruas, responsáveis pela iluminação das vias, foram atingidas por uma forte lufada de vento. As chamas tremularam, quase se apagando, e no fim, valentemente resistindo à ação do vento, se mantiveram acesas. Aquela era a forma de iluminação pública da época no lugarejo, os postes eram os suportes de madeira onde eram postas as tochas. Essa fraca iluminação proporcionava um ar soturno à cidadezinha.
As pessoas passando nada mais eram do que vultos castigados pela ventania, sombras difusas se arrastando, encurvadas, enfrentando a ventania.
Enrico logo se esqueceu delas e se virou, olhando para o saloon “La Buena Muerte”.
Um saloon era o local ideal para se obter informações, para saber da vida de uma cidade, de seus habitantes, os últimos acontecimentos. Muito mais do que um profissional em servir bebidas, um barman costumava ser um especialista na vida alheia. Pensando desse modo, Enrico De La Cruz empurrou a dupla portinhola vai-vem e entrou. Seu olhar cruzou com o do barman que, ao vê-lo franziu um pouco a sobrancelha.
O homem atrás do balcão chamava-se Eusébio.
Era alto, gordo e moreno. Apesar de seu tamanho e peso, era um sujeito pacífico, seu rosto redondo revelava simpatia, e ele sempre ostentava um largo sorriso atrás da vasta bigodeira escura. O cabelo que tinha no bigode faltara na cabeça; a calvície de Eusébio só não era total porque havia alguns fios remanescentes no topo de seu crânio.
Eusébio devia ter uns quarenta anos. Seus olhinhos negros e atentos se detiveram em Enrico, examinando-o enquanto ele se encaminhava calmamente para o balcão. O barman apenas observava.
Ficou curioso ao ver aquele rapaz alto e moreno, forte como um touro.
Era mexicano, sem sombra de dúvida. Aparentava uns vinte anos no máximo. Apesar disso, sua figura era impressionante: imponente, digna, firme.
Usava uma bota de cano alto preta de couro, típica de vaqueiros, mas, havia um detalhe que chamou a atenção de Eusébio: o rapaz não usava esporas. Devido esse fato, o gordo barman chegou a duas conclusões: ou aquele rapaz não montava a cavalo, ou sabia fazer isso tão bem que não precisava usar esporas. Isso significava que seu cavalo entendia todos os seus gestos, mesmo os mínimos. Para não usar esporas, um homem precisava ser verdadeiramente amigo de seu animal, tinha de saber se comunicar perfeitamente com seu cavalo. E Eusébio sabia, por experiência própria, que isso não era tarefa fácil.
Impressionado como estava, o barman preferiu acreditar na segunda opção e prosseguiu seu exame.
Além das botas, o rapaz usava calças de brim, camisa bege com as mangas dobradas até o cotovelo, um colete marrom de couro e um chapéu marrom pendendo para suas costas, preso ao redor do pescoço por um grosso cordão de couro trançado. Ao redor do pescoço trazia amarrado um lenço escuro, com o qual protegia a boca e o nariz da poeira quando cavalgava pelo deserto.
Eusébio percebeu que aquele devia ser um homem perigoso pelo modo como levava as armas. Estremeceu ao ver o cinturão cruzado, afivelado ao redor do peito musculoso do rapaz, onde havia dois coldres cruzados, dentro dos quais dormiam dois Colts 3.8, mortíferos, prontos para o uso a qualquer instante.
Esse era o modo típico dos melhores atiradores mexicanos carregarem suas armas. A cartucheira estava num segundo cinturão, ajustado ao redor do quadril estreito do jovem. Enrico encostou-se ao balcão. Seus olhos negros estavam cravados nos de Eusébio quando abriu a boca para saudá-lo:
Buenas noches, amigo.
Eusébio esboçou um grande sorriso ao responder:
Buenas noches, forasteiro. Seja bem vindo ao “La Buena Muerte”. O que vai querer?
— Um uísque duplo, por favor. – ao pedir a bebida, Enrico não pode deixar de imaginar o olhar de reprovação do padre Emanuel se visse aquela cena. Na verdade, Enrico bebia muito pouco, quase nunca o fazia. Acabara tendo que aprender um pouco a apreciar o álcool durante o tempo em que trabalhara no rancho. Quem convive com vaqueiros não consegue se safar de tomar uns goles pelo menos de vez em quando.
— Deseja mais alguma coisa, forasteiro? — ouvindo a pergunta do barman, Enrico sorriu misterioso, enquanto olhava com suavidade para seu gordo e simpático interlocutor. Achava engraçado ser chamado de “forasteiro” em sua própria cidade, sua própria terra. Mas o barman não tinha culpa, porque desconhecia esse detalhe, e logo foi perdoado por Enrico.
— Na verdade sim, amigo. Gostaria que me contasse algumas coisas sobre a cidade. Qualquer informação é útil.
Eusébio olhou-o e, antes de responder, comentou curioso:
— Noto que suas roupas estão cobertas de poeira. Parece que veio de bem longe, estou certo?
— Sim, está. Venho de um lugar ao norte daqui, perto da fronteira. Conhece Piedras Negras?
— Já ouvi falar. Vai ficar muito tempo em Monterrey?
— Talvez. – Enrico respondeu sério. – Vai depender do que me disser. Pretendo ficar até saber o que preciso, ver as pessoas que procuro.
— E o que quer saber, exatamente?
— Tudo. – De La Cruz deu um longo gole no uísque e mirou o barman. – Conte-me tudo.
Ali, o jovem descobriu por meio de Eusébio quem era o novo xerife, o atual prefeito, os rancheiros mais poderosos, o padre atual, as mulheres descompromissadas, os homens em quem podia confiar e nos que não podia. Eusébio era uma impressionante fonte de dados. Conversando com ele, Enrico nem reparou no passar do tempo e, quando já se dispunha a ir embora, um tipo esquisito o abordou:
— Olá, garoto. Sabe mesmo usar esses brinquedos que carrega?
Não havia delicadeza no queixo firme de Enrico quando ele rosnou, os olhos cintilando sombriamente:
— Só quando é necessário, senhor.
O homem riu da ameaça velada e explicou:
— Está vendo meu amigo ali? – perguntou apontando para outro sujeito, tão suspeito quanto ele, sentado a uma mesa próxima.
— Sim, estou. – desconfiado, Enrico deu outro gole no uísque. Não estava gostando do rumo daquela conversa.
— Eu apostei com ele que você não seria mais rápido que eu no gatilho.
O silêncio reinou pesado. A música e as conversas cessaram abruptamente. Enrico sentiu a intensidade de vários olhares dirigidos para si. Todos esperavam que algo emocionante acontecesse.
— Acho que você vai perder sua aposta.
Eusébio, apreensivo, interviu:
— Não o ouça, muchacho. Ambrósio é um pistoleiro de renome. Vai matar você brincando.
— Cale-se, Eusébio. Deixe o garoto terminar. Por que vou perder?
— Porque não quero duelar. Recuso-me a lutar com você.
— Quer que as pessoas o taxem de covarde?
— A mim pouco importa o que irão pensar. Não quero brigar. Não tenho motivos.
— Ah, é? – rosnou Ambrósio – Pois eu vou te dar um bom motivo agora mesmo.
Enrico De La Cruz, embora posicionado de lado para Ambrósio, vigiava-o pelo canto dos olhos. Estava atento ao menor indício de perigo. Isso lhe salvou a vida.
Enquanto falava para manter o inimigo distraído, Ambrósio levou a mão ao revólver, traiçoeira e rapidamente. Estava erguendo a arma quando o bico da bota de Enrico atingiu-lhe a mão, num chute fulminante, que lançou seu revólver para o alto. Apalermado, olhou para o rapaz.
Sua última visão naquela noite resumiu-se a Enrico avançando em sua direção, veloz e furioso como um touro enraivecido.
— Foi você quem pediu por isso. – o jovem rugiu ao disparar o punho direito cerrado, com toda a força.
Ambrósio recebeu o terrível soco em cheio no queixo, e seus pés se ergueram do chão. Parecia fulminado por um raio.
Sentiu que voava.
Aterrissou sobre a mesa mais próxima, desmaiado e, quando foi ao chão, levou consigo garrafas, copos e cadeiras. A queda causou grande estardalhaço.
O amigo de Ambrósio, percebendo que ele levara a pior, já se tinha posto de pé e sacado a arma. Apesar de sua extrema ligeireza, não teve oportunidade de abrir fogo. Sua segurança desapareceu ao ouvir dois estampidos, antes que ele pudesse apertar o gatilho uma única vez. Seu sangue gelou nas veias. Um tiro arrebatou-lhe a arma, que voou pelos ares, destroçada. O outro disparo, tão perfeito quanto o primeiro, lançou longe o seu chapéu. O bandido ergueu as mãos trêmulas.
— Pegue o seu amiguinho e dê o fora daqui agora mesmo. Aproveite que estou de bom humor. Depressa! Se demorar muito, vou acabar perdendo a paciência e metendo chumbo nos dois. – Enrico falava com a autoridade e firmeza de um representante da lei. Nem por um segundo qualquer dos presentes duvidou que ele cumprisse sua palavra.
— Não será preciso, senhor. – gaguejou o bandido conforme ajudava Ambrósio a levantar.
Em seguida, arrastando o amigo, ele abandonou o saloon sob o olhar atônito dos demais. Depois, todos olharam para Enrico, cheios de assombro e respeito. Minutos mais tarde tudo se normalizou, o pianista começou de novo a tocar, os jogadores se concentraram nas cartas, os homens voltaram a beber e conversar animadamente, e as coristas recomeçaram a borboletear pelo saloon, visitando mesa por mesa.
Enrico olhou para Eusébio e disse:
— Desculpe pela bagunça, amigo. Mas você mesmo viu que eles começaram.
O gordo barman sorriu indulgente:
— Não se preocupe, todos somos testemunhas que você tentou evitar a briga. Poderia ter sido o pior. Se você os tivesse matado, eu teria que acabar limpando toda a sujeira.
Enrico assentiu, soprou o cano fumegante de seus Colts e os guardou. Em seguida, olhou para o seu copo de uísque, que estava pela metade. Num gesto rápido, apanhou o copo e esvaziou-o de uma só vez. Aquela totalizava a terceira dose da noite. Decidiu que já era hora de parar com os drinques e ir embora.
Enxugando a boca com as costas da mão, olhou para Eusébio, que o fitava com curiosidade:
— Quando você entrou, imaginei que pudesse ser alguém perigoso caso fosse incomodado. Vejo que não me enganei. Se gostar de bons conselhos, forasteiro, aqui vai um: enquanto estiver em Monterrey, mantenha os olhos bem abertos. Aqueles dois são tipos venenosos e não esquecerão facilmente essa lição que você lhes deu.
— Sem dúvida, é um bom conselho. Mas não se preocupe, sei me cuidar bem. – ao passo que falava, Enrico estava pondo a mão no bolso da calça, em busca do maço de cédulas. – Olhe barman, eu não tenho pesos mexicanos aqui comigo. Posso pagar em dólares?
— Sim, aceito a moeda dos gringos.
— Isso deve bastar. – o rapaz colocou dez dólares sobre o balcão.
Eusébio arregalou os olhos:
— Que isso, rapaz? Se vai pagar em dólares, me deve apenas três pelos uísques.
— O restante é meu agradecimento pelas informações. Serão bem úteis.
O largo sorriso do barman aumentou ainda mais:
— Oh, muchas gracias! Obrigado por me ajudar a cuidar de meus filhos. Volte quando quiser, rapaz... Quando quiser!
Enrico sorriu e deixou o saloon.
— Mas que muchacho simpático. – falou Eusébio e, cantarolando, começou a lavar uma pilha de copos.


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Notas finais do capítulo

E aí, será que os dois tipos vão deixar barato o que Enrico fez com eles?
E o xerife de Monterrey, poderá lançar alguma luz sobre o caso dos De La Cruz?

Para saber, continue acompanhando a saga de nosso jovem heroi mexicano.
Por favor, deixe um review com suas impressões. Desde já agradeço!!!

Abraços!!!



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