Remember Me escrita por Miaka


Capítulo 30
Ameaça


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal! ♥ Eu estou com reviews do capítulo passado para responder, mas dessa semana não passa. Que agradecer muito a todos que estão acompanhando e, sinceramente, não há prazer maior do que ver vocês curtindo, comentando e se divertindo com a fic! ♥



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— O príncipe Kouen já está esperando na sala de reunião, Sinbad.

Todos se atentaram à voz daquele que adentrava os aposentos reais.

— Obrigado, Drakon.

O rei, sentado à beira daquela enorme cama, ao lado de seu adormecido conselheiro, apenas assentiu enquanto afagava uma daquelas finas mãos.

Como queria que Ja’far despertasse para conversarem antes de ir falar com Kouen. Ele devia estar tão assustado, tão confuso para passar por um surto tão intenso.

Não. Aquela reação não era somente devido à presença de Kouen e à toda pressão que estava sofrendo; ele já sabia bem. Precisava ajudar Ja’far a desmistificar toda aquela verdadeira loucura na qual ele acreditava piamente.

E como se suas preces fossem atendidas, ele viu o par esverdeado se abrir lentamente.

— Ja’far! - ele chamou, atentando-se à expressão confusa do alvo. - Como se sente?

Deveras desorientado enquanto ouvia aquela voz - a voz de Sin, Ja’far piscou antes de olhar ao redor e confirmar que estava no quarto do rei. Mas por quê? Kouen não tinha chegado a Sindria? Lembrava-se de ver os dois reis se confrontando. Era tudo um sonho?

Apoiando os cotovelos sobre a cama a qual estava deitado, Ja’far tentou se erguer, mas foi impedido pelas fortes mãos de Sinbad. Ele se viu refletido naquelas gemas douradas que exprimiam bastante preocupação.

— Oe! Não pode se levantar ainda! - o rei o advertiu.

— Mas… O que aconteceu?! - Ja’far ainda tentava se sentar quando viu que todos os generais estavam ali com uma expressão tão consternada quanto a do rei de Sindria.

— Você… teve uma daquelas crises e desmaiou. Disseram que precisa descansar. - Sinbad foi sucinto. - Não quero que saia dessa cama até se sentir bem. Nos deixou muito assustados!

Havia repreensão em seu tom de voz e, ao se ver alvo dos olhares preocupados de seus amigos, ele voltou a se deitar. Desviando o olhar, Ja’far mordeu o lábio inferior.

— Me desculpem. Não queria dar problemas… de novo.

— Não nos deu problema algum. - a mão de Sinbad apertou firme a sua antes de ele se voltar aos demais. - Poderiam nos deixar a sós?

Ja’far engoliu a seco, um tanto quanto receoso, quando os generais assentiram e foram, pouco a pouco, deixando os aposentos reais. Sobre o que o rei queria falar de forma tão particular?

Enquanto isso ele observava sua mão, tão pequena, sendo coberta pela de Sinbad. Em silêncio ele agradeceu por ninguém estar olhando como ele corava. E mesmo que ele não pudesse se ver, o calor em suas bochechas condenava que estava bastante encabulado com aquele gesto. Era simplesmente… maravilhoso ficar assim com Sinbad. Sentia-se protegido e tranquilo, bastante diferente de como se sentiu quando viu, em sonho… En.

— Peça que o sirvam bem! Eu já estarei indo ao encontro dele!

Masrur era o último a sair quando a porta se fechou e Ja’far voltou a encarar Sinbad, que tinha um sorriso gentil, mas um tanto quanto diferente em seu rosto. A preocupação ainda presente em sua expressão, confrontando a sua que condenava o quão confuso estava.

— Sente-se mal? Está com fome?

Ja’far apenas balançou a cabeça e esboçou um fraco sorriso. Odiava preocupá-lo.

Fazia tanto tempo que não tinha aquelas crises.

— Você se lembra do que aconteceu antes de desmaiar?

Foi a vez da mão do conselheiro apertar mais a de Sinbad.

— Na verdade não. Eu… tive um sonho tão estranho. Minha cabeça doía tanto! - ele levou a mão livre ao topo dela. - Como quando… quando acordei naquela… cela.

— Cela?! - Sinbad arregalou os olhos.

— Sim… Quando eu acordei em Kou eu estava em uma cela. Foi lá que vi o En pela primeira vez…

Sinbad sentiu seu sangue ferver por um minuto. Ja’far havia sido colocado em uma cela?

Não. Não. Não. Tudo aquilo era invenção de sua mente. E agora tudo fazia ainda mais sentido. O temor de Ja’far ao ir para o Império Kou tendo em vista um tratado de paz havia lhe gerado um receio tão forte que, ao sofrer um trauma, tudo aquilo havia se tornado o começo de um delírio.

Tentando se acalmar, por mais difícil que fosse distinguir a realidade do que o que Ja’far falava, Sinbad tomou a outra mão de seu conselheiro e juntou as duas entre as suas. Queria transmitir força a ele. Desta vez o rei percebeu a vermelhidão crescente naquele rosto.

— Ja’far, eu já sei tudo o que está acontecendo e quero que você confie em mim! Quanto ao Kouen, não se preocupe. Ele não vai te tirar de mim, ele já disse!

Aquele sussurro assustou Ja’far. O que Sinbad estava querendo dizer com aquilo?!

E o pior: não era um sonho? De fato Kouen estava em Sindria e havia chegado no meio do festival daquela noite? Ele arqueou uma sobrancelha e, por um instante, instintivamente teve vontade de se soltar do moreno.

— Do que está falando?!

— Eu sei que… a amnésia não é a única coisa que está lhe perturbando, Ja’far. Você está precisando do meu apoio, do nosso apoio, e vai ter ele todo, meu amor!

Balançando lentamente a cabeça para os lados, Ja’far tentava recolher as mãos enluvadas pelas do rei.

— Não entendo… o que está querendo dizer com isso, Sin…

— Já sei que Kouen e você não se apaixonaram e que… tudo isso é um reflexo da sua mente debilitada. Kouen mal o conhece e veio aqui a negócios.

— Não! - Ja’far exclamou. - Por que eu mentiria sobre essas coisas todas?! Eu contei sobre… os meses que vivi em Kou!

— Ja’far, Kouen nos disse que nada aconteceu entre vocês e… - Sinbad respirou fundo. - todo seu comportamento desde que o trouxe de volta tem nos apontado como está confuso. Mas já evoluímos bastante, não?! Convivendo conosco você já lembrou de tanto e suas crises têm diminuído!

— Está dizendo que eu devaneei tudo que o contei?! Tudo o que eu vivi?! - Ja’far estava indignado. - Não acredita no que disse?!

Era o pior que poderia acontecer; Ja’far estava reagindo da pior maneira. - era o pior medo de Sinbad: afastá-lo. Então, rapidamente, o moreno tentou envolvê-lo em seus braços para acalmá-lo.

— Não, meu amo…

— ME SOLTA!

Ja’far exclamou ao mesmo tempo em que empurrou o rei de Sindria. Mas sua cabeça ainda doía e tudo o que ele pôde fazer foi levar as mãos até aquela região. Latejava enquanto ele pensava nos momentos que viveu ao lado de Kouen. Não era mentira! Ele tinha mais certeza do que nunca. Mas tudo parecia tão confuso ultimamente...

— Ja’far, olhe para si mesmo! - Sinbad insistiu. - Está debilitado! Precisa de ajuda! Nós vamos cuidar de você!

Era demais para Ja’far. Havia confiado plenamente em Sinbad e dividido com ele tudo o que se lembrava, de sua vida em Kou como ministro da economia, de como o primeiro príncipe havia lhe cativado. Havia escutado as histórias do rei e seus generais, aqueles a quem pensou tê-lo acolhido como uma família. Mas eles não acreditavam no que havia dito? Não confiavam nele?! Ja’far sentiu ser tomado pelo arrependimento e, principalmente, pela ira.

— EU PRECISO É DO EN! - urrou Ja’far ao encarar o moreno.

Sinbad sentiu como se uma estaca fosse fincada em seu coração. Os olhos verdes centelhavam em fúria. Se Ja’far estava tentando atingi-lo, ele conseguia facilmente.

— Eu acreditei em você! Contei tudo o que aconteceu e no final das contas você está desconfiando de mim! O EN JAMAIS DESCONFIARIA… Tsc, droga!

Sinbad suspirou angustiado ao ver Ja’far puxar os próprios cabelos. Ele parecia sofrer tanto! E aquela era a prova que precisava: Ja’far estava perturbado. Ja’far precisava de ajuda e não adiantava tentar falar com ele.

— Vou pedir que lhe dêem algo para essa dor passar. - ele avisou.

— Onde… Onde está o En? - Ja’far disse entre gemidos.

O coração de Sinbad falhou novamente. Não podia correr o risco de ser humilhado na frente do príncipe do Império Kou. Já havia sido o bastante e o rei de Sindria estava perdendo a paciência, por mais que refletisse que não poderia agir assim. Ja’far estava doente, afinal, ele pensava.

— Ele já foi, Ja’far.

— É MENTIRA! - rebateu Ja’far.

— Não é! Ele foi enquanto estava inconsciente. - o moreno cerrou os punhos. -  Eu sinto mui...

Não houve tempo para completar. Sinbad teve de desviar de um travesseiro que Ja’far arremessou em sua direção. Ele respirou fundo, recolhendo-o do chão e o levando de volta à cama, onde seu conselheiro praticamente rosnava.

— Por que tudo isso está acontecendo, Ja’far?

O coração do alvo se apertou ao ver os olhos marejados de Sinbad. A voz embargada condenava como ele estava tentando prender o choro. Mas Ja’far não se daria por vencido. Estava tão frustrado! Havia confiado tanto nele!

— Eu te odeio, Sinbad! - cuspiu Ja’far. - Você não é digno da minha confiança!

Sinbad apenas respirou fundo e assentiu antes de dar meia-volta e marchar até a porta.

Assim que ele a atravessou, batendo-a para se recostar naquela superfície de madeira, ouviu o exclamar que vinha dali de dentro.

— EU TE ODEIO!

Suspirando ele secou os cantos de seus olhos com as pontas dos dedos.

— Noite difícil, não?

Erguendo seu rosto o rei encontrou Hinahoho. Nem havia percebido que seu amigo estava ali. Ele tinha os braços cruzados ao se aproximar de Sinbad.

— Cuide do Ja’far para que ele não saia daqui!

— Talvez tudo seja verdade, Sinbad…

— Talvez, Hina! Talvez! - ele reafirmou. - Mas como posso acreditar quando Ja’far está agindo dessa maneira?! Ele nunca teria falado assim comigo! Ele não está em seu juízo perfeito!

— Fique calmo, Sinbad. Tudo vai se resolver. Mas… eu acho que não devia ir sozinho falar com esse príncipe.

— Ele não vai fazer nada contra mim, Hina. - Sinbad farfalhou os fios de cor púrpura. - Está sozinho e se me matar vai ter que lidar contra todos vocês!

— E daí? Ele já vai ter te matado.

Sinbad bufou ao massagear as têmporas.

— Hina, “vai ficar tudo bem” - você disse isso, não?

O robusto homem apenas assentiu.

— Então vou acreditar em você.

Foi tudo o que Sinbad disse antes de se dirigir à sala de reunião.

Ele ajeitou um pouco o cabelo e alinhou as vestes antes de dar duas batidas naquela porta e adentrar o lugar para encontrar o ruivo.

Kouen estava de costas observando, por uma das amplas janelas, o movimento da festa que acontecia nos jardins do palácio. Ele parecia, inclusive, distraído.

— Alteza?

— Hm?

Piscando o primeiro príncipe virou de frente para Sinbad. Ele tinha um gentil sorriso em seus lábios.

— Gosta de festivais? - o moreno perguntou, nitidamente constrangido após o que acontecera há uma hora atrás.

— Na verdade é a primeira vez que venho a um. - riu Kouen.

— Vim pedir desculpas pela forma como o tratei. - ele foi direto. - O tempo em que Ja’far esteve longe, em que pensei que ele estava morto foi terrível para todos nós. Ele é muito querido em nosso país. Mas isso não me dá o direito de destratá-lo como fiz, alteza. O pior que posso fazer é que com que alguém se sinta mal em meu reino! - o rei se curvou. - Me perdoe!

Kouen teve de segurar o riso que quase escapou por entre seus lábios. Sinbad não negava ser a personificação do adjetivo que sempre vinha a sua mente quando pensava no soberano daquela ridícula ilha: patético.

Sinbad se reergueu e estendeu a mão para cumprimentá-lo. Kouen o fez sem deixar esmaecer aquele doce sorriso.

— Imagino que passaram por muitos problemas. Esteve em Kou procurando-o também, não? - demonstrando interesse, Kouen lembrou.

— Sim. Nós o encontramos por lá e ele estava bastante desorientado e… desmemoriado.

— Nossa! - uma expressão de espanto indefectível confrontou Sinbad. - Ele perdeu a memória?! - o rei assentiu àquela pergunta. - Sinto muito! Deve estar sendo difícil mesmo. Estimo a melhora de seu conselheiro, rei Sinbad!

— Muito obrigado, alteza! - o moreno sorriu. - Mas sente-se! Temos negócios a tratar, não é? Fique à vontade!

— Já estou. - ele voltou a esboçar aquele sorriso. - Sabendo do pacifismo que prega em seu reino, rei Sinbad, nem ao menos trouxe meus metal vessels!

Bastante surpreso com a demonstração de confiança do príncipe, Sinbad o via abrir os braços, mostrando que não portava suas armas. Mas ao mesmo tempo ele só pôde se lembrar de quando Ja’far manifestou aquele poder naquela espada que dizia ter ganho de Kouen. Um poder que jamais poderia vir de algum djinn seu, e sim… de Kouen. Então…

— Rei Sinbad?!

A voz de Kouen lhe arrancou daquela súbita distração, porém a expressão do moreno condenava que ele estava, novamente, apreensivo com relação àquela visita, àquele homem. O fato de Ja’far possuir um poder que vinha de um djinn que tinha contrato com Kouen era a prova de que… ele estava falando a verdade.

— Está pálido. - reparou o príncipe.

Sinbad apenas balançou a cabeça para os lados mas, de fato, nem ao menos escutara as palavras que Kouen havia proferido. Como havia sido estúpido, mais uma vez, com Ja’far? E o pior de tudo: quais eram as intenções daquele homem ali? Precisava se conter e ser prudente para não cometer nenhum erro a mais.

— Aceita um vinho?

Era nítido como Sinbad estava transtornado ao caminhar até aquele aparador de onde tirou duas taças para servi-los. As mãos trêmulas, ao despejarem o conteúdo daquela garrafa, acabaram deixando entornar um pouco do líquido escuro sobre a fina toalha de renda branca. Mas ele simplesmente ignorou aquilo e, entregando uma taça ao astuto homem, que parecia ler seus movimentos, sua mente, ele bebeu em um só gole o conteúdo do seu copo.

— Os rumores são bem verdade, não?

— Anh?! - o que o ruivo queria dizer com aquilo?

— Dizem que o Rei Sinbad é uma ótima companhia para beber! Estou feliz por ter a honra de beber ao seu lado!

O sorriso indefectível não saia dali e intimidava cada vez mais Sinbad, que só podia correspondê-lo com uma tentativa forçada de ser gentil.

— Estou muito interessado em importar algumas especiarias de seu país. - ele começou. - Em especial ervas e temperos.

Sinbad assentiu enquanto tentava prestar atenção no que ele dizia.

— A especialidade do nosso país é turismo, alteza. As ervas e temperos que comercializamos geralmente são de nossos países aliados como Heliohapt e Reim.

— Mas não posso comercializá-los sem antes vir até o “chefe” desses países, não é?

— Hm?! O que quer dizer com isso?

— ME SOLTA! EU JÁ DISSE QUE VOU VER O EN!

Aqueles gritos chamaram a atenção dos dois. Sinbad foi tomado pelo pânico enquanto que Kouen teve de conter a alegria que sentia ao ouvir aquelas palavras. Então Ja’far não havia sido seduzido por Sinbad, como ele temia. Ainda o amava. Ainda queria vê-lo.

— Sinbad disse que ninguém pode entrar agora, Ja’far! - a voz de Drakon vinha do corredor.

— FODA-SE O SINBAD! EU QUERO FALAR COM O EN AGORA!

Sinbad e Kouen se entreolharam e foi inevitável que o príncipe notasse o forte rubor que tomava conta do rosto do rei de Sindria. Ele se sentia… humilhado. Tão humilhado que abaixou a cabeça e evitou encarar o ruivo que não escondeu uma risada baixa.

As portas duplas se abriram com violência quando Ja’far invadiu a sala de reunião. Atrás dele, Drakon e Sharrkan, que tentavam evitar que aquela situação chegasse a tal ponto. Tarde demais.

Ja’far, que até então estava tão afoito para entrar ali, subitamente paralisou ao encontrar Kouen. Ofegante ele se aproximou do ruivo bem lentamente, como se existisse hesitação em cada passo que deu até o príncipe. Tudo aquilo sob o olhar vigilante de Sinbad, que decidiu não intervir. No final das contas, se realmente tudo o que Ja’far disse era verdade, só lhe restava aceitar a decisão que cabia a seu conselheiro, somente a ele.

— E-En...

Ja’far gaguejou ao chegar tão perto dele. Suas mãos estavam quase tocando o rosto daquele que era bem mais alto, mas o encarava como se estivesse bastante confuso. O alvo respirou fundo antes de abrir um sorriso, por mais que as lágrimas rolassem pelas maçãs de seu rosto enquanto segurava as laterais do de Kouen. Como era bom sentir aquela pele novamente, por mais que ali estivesse um pouco áspero, com uma barba que voltava a nascer.

— En, você veio me buscar?!

Kouen entreolhou Sinbad, como se procurasse nele a resposta daquela pergunta. Como deveria agir? Mas o rei estava tão atordoado com aquela cena que apenas a assistia, certo de que sua participação nela era completamente dispensável.

— En, me diz! Eu senti tanto sua falta!

— Ja’far-san. - os olhos avermelhados pairaram sobre o alvo, que abriu um sorriso. - Eu sinto muito, mas acho que está confundindo as coisas.

— Anh?! - o par esverdeado cresceu.

— Não nos vemos desde que saiu do meu palácio há mais de quatro meses. Não se lembra?

— En…

Era como se as forças de Ja’far tivessem sido sugadas. Ele soltou as bochechas de Kouen e deixou seus braços caírem aos seus lados. Kouen havia se esquecido dele? Não. Não era possível. Mas durante aquele momento de questionamento, Ja’far se perguntou se, realmente, não esteve acreditando em coisas que não haviam acontecido. Tudo estava tão confuso.

Encarando Sinbad ele viu o moreno desviar o olhar. Era como se o rei de Sindria temesse ser insultado... novamente.

— Por que está… acreditando nas mentiras dele?! Você sabe o que vivemos! Eu estive ao seu lado até que… - Ja’far apontou Sinbad. - que esse homem me tirou de você! - havia fúria em suas palavras. - Se Sinbad não tivesse me afastado de você, continuaríamos felizes como éramos em Kou!

— Ja’far-san, eu não entendo do que está falando!

— Por que está mentindo para mim, En?! - a voz embargada perguntou.

Kouen sentiu o peito apertar ao ver uma a uma, aquelas lágrimas caindo. Como Ja’far estava sofrendo e estava… confuso, perdido em uma trama a qual ele, sendo o personagem principal, não tinha conhecimento de seu real papel.

— Acalme-se. Soube que anda bastante frágil e é melhor que descanse! Não acha, rei Sinbad? - o ruivo cruzou os braços.

Era como se o rei fosse incapaz de decidir qualquer coisa. Temia por falar algo que contrariasse Ja’far e ele o humilharia mais… Ainda mais na frente de Kouen. Mas ele precisava dizer algo, fazer algo e a mão pesada de Drakon, sobre seu ombro, lhe lembrou daquilo.

— Por favor, levem o Ja’far aos aposentos dele e dêem um chá para que ele se acalme.

Foi o suficiente para que, enfurecido, Ja’far se voltasse ao moreno.

— Até quando vai querer me fazer de louco?! - esbravejou ele. - Eu confiei em você! Mas agora que En chegou aqui, você está inventando mil coisas para que… que eu não volte com ele! Convenceu ele a me deixar aqui, não é?! Ofereceu o quê?! - Ja’far pausou, os punhos cerrados ao encarar o rei que não ousava a cruzar o olhar com ele. - Há! Já imagino que um acordo comercial, não é? Porque suas ambições valem mais do que tudo, até mais do que a vida de um… ex-assassino como eu, não é?!

Sinbad não sabia o que responder, tampouco o que fazer. Apenas observava Ja'far, que parecia alguém totalmente diferente de quem amava e estimava tanto, a lhe ofender.

— Você está magoando o Sinbad, Ja’far! - Drakon interviu.

— Você é podre mesmo, Sinbad! Eu me enganei! - ele se voltou ao ruivo. - E você também… Kouen! Por ter aceitado… me vender.

A voz se perdeu entre as lágrimas e, vendo-se só naquele momento, Ja’far marchou até a saída. Sinbad estava completamente transtornado enquanto Kouen suspirava meio sem ação.

— Eu sinto muito, rei Sinbad. - foi tudo o que ele disse. - Eu irei embora amanhã mesmo para evitar mais problemas.

— Não se preocupe. - o moreno se esforçava para engolir o choro. - Vamos tratar de negócios e… eu converso com o Ja’far mais tarde.

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Depois de uma longa conversa onde Sinbad se esforçou para manter o foco em uma negociação amigável com o príncipe Kouen, ele praticamente se arrastou até os andares mais altos do palácio. Precisava ver como Ja’far estava e conversar com ele, dizer que acreditava nele já que havia a prova agora que ele havia se tornado um subordinado de Kouen.

— Tudo bem, majestade?

Assustando-se com a abrupta aparição de sua maga, Sinbad se recompôs.

— O que faz acordada a essa hora aqui, Yamuraiha?

Ela apertou o cajado em suas mãos e mordeu o lábio inferior.

— Não consegui dormir depois do que aconteceu hoje, então fiquei no meu laboratório.

— Entendo… - suspirou Sinbad. Tinha sido um dia difícil para todos.

— Queria ver como está o Ja’far-san. - ela disse.

— Eu também vou ver isso.

Os dois seguiram pelo palácio. Mas assim que chegaram àquele corredor, Sinbad notou que a porta dos aposentos de Ja’far estava entreaberta. Ele ainda não tinha ido dormir? Até mesmo os servos já tinham se recolhido após o término do festival.

A cama, no centro daquele amplo e arrumado quarto, ainda estava feita. Não havia sequer uma dobra nos lençóis. Ele se assustou.

— Meu Deus! Será que…

— Não! Fique calmo. Tenho certeza de que ele não fugiria…

— Quero que todos procurem o Ja’far imediatamente, Yamuraiha! - o rei a interrompeu. - Por favor, convoque todos agora mesmo e peça que tranquem os portões do palácio!

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No chafariz central do jardim do palácio, Ja’far, sentado naquela mureta, observava o próprio reflexo naquela água em movimento. Encarando seu rosto inchado pelo choro ele acabou abraçando a si mesmo. Uma brisa gelada vinha do mar que cercava a ilha e ele sabia que o melhor a fazer era retornar para o lado de dentro e ir dormir. Dormir para esquecer que Sinbad não confiava nele. Dormir para esquecer que Kouen havia vendido seu amor, sua vida, por algum acordo que beneficiasse seu país.

Apertando os olhos com força, Ja’far desejou não abri-los mais. Se tivesse um pouco mais de coragem… - ele pensava ao sentir a cabeça latejar. Nem ele mesmo sabia mais no que acreditar, se era verdade ou mentira tudo aquilo que acreditava ter vivido. Nem em si mesmo ele poderia confiar.

No dia seguinte ele poderia pensar melhor sobre o que fazer e, como Sinbad estava disposto a abrir mão dele, o encararia e pediria para deixar aquela ilha. Não para voltar para Kou, mas para ir para qualquer outro lugar. Um lugar onde não existisse nem Sinbad… e nem Kouen.

Ja’far se levantou e suspirou. Tentando reerguer os ombros caídos ele passou pelo salão de entrada para atravessar os corredores. A maioria das tochas suspensas já havia sido apagada, em especial aquelas que seguiam pelo corredor que era cercado pela ampla varanda que dava a volta naquela torre. Estava tão escuro que ele não percebeu presença alguma quando uma mão, subitamente, cobriu seus lábios. Puxando-o para trás ele bateu a cabeça em um peito rígido.

Tentando se soltar, temendo por sua vida, Ja’far se debateu e tentou gritar, o que resultou em um gemido abafado. Então ele ouviu foi um chiado que o mandou se calar. Aquela sombra que nem ao menos o luar revelou o puxou para dentro de uma daquelas salas.

A porta bateu e Ja’far se viu naquele amplo salão de carpete vermelho e cortinas esverdeadas. Aquele lugar que ele identificava como o escritório de seu rei.

Sendo solto ele se virou e pôde encontrar, agora sim, o olhar doce e terno daquele que o acolheu e o cuidou. Foi impossível não se emocionar ao encontrar o sorriso que ele conhecia plenamente, tão diferente do que havia se mostrado ao lado de Sinbad.

— EN!!!

— Shhh!

Ele exclamou e o príncipe levou um dedo aos lábios, pedindo que Ja’far fizesse silêncio, mas a emoção era maior. Seu ministro e amante se lançou aos seus braços.

— En, por que agiu daquele jeito?! - o alvo envolvia a cintura de Kouen com seus braços.

— Eu que pergunto porque agiu daquela forma! Quase pôs tudo a perder! - ele depositou um beijo carinhoso no topo dos fios brancos.

— O quê? - confuso, Ja’far se afastou para encará-lo, mas não desfez aquele enlace.

— Eu vim buscá-lo! Vim completamente desarmado e forjei aquela cena toda para que não desconfiassem! Antes tinha feito de tudo para preparar uma frota para invadirmos esse maldito país, mas…

— Não, não! - Ja’far o interrompeu. - Por favor, En, não faça nada com as pessoas desse país e… nem mesmo com o Sin!

— “Sin”? - o questionamento do ruivo demonstrava a insatisfação que ele sentia ao ouvir aquele apelido que denotava tanta… intimidade.

— Digo… - o alvo corou. - Sinbad não é uma má pessoa, En! Eu passei muito tempo com eles e… eu queria muito dizer isso a você! Ele não vai se importar que me leve também! Ele mesmo disse que eu poderia escolher!

— Como pode achar isso? Eles o tiraram de mim!

— Você também me tirou do Sin.

A resposta de Ja’far foi certeira. Kouen suspirou bastante incomodado.

— Estou vendo que fizeram bastante a sua cabeça aqui.

— En…

As mãos suaves de Ja’far deram a volta em seu pescoço. Ele ficou nas pontas dos pés para encará-lo com um doce sorriso enquanto que Kouen não escondia o quão incomodado - e enciumado - estava.

— Você também fez a minha. - ele foi direto. - Mas… Eu o perdoei, En. Assim como perdoo o Sinbad. Ele só me queria de volta e, bem ou mal, ele achou que eu ficaria melhor com ele!

— E você ficou melhor com ele?

A pergunta de Kouen foi o bastante para deixar Ja’far pensativo, mas ao se lembrar de Sinbad desconfiando de tudo o que havia contado, ele logo balançou a cabeça negativamente.

— Eu não pertenço a esse lugar, En! Eu quero que conheça essas pessoas maravilhosas que o povo de Sindria, os generais, são! - Kouen piscou. - Mas eu te amo! Isso é diferente! Não quero que traga exércitos e invada esse país maravilhoso! Eu aprendi muitas coisas aqui que… quero que façamos em Kou! Viu as pessoas tão felizes? - Ja’far parecia deslumbrado e Kouen não estava gostando nada daquilo. - Podemos dar essas alegrias às pessoas de Kou tam…

— Ja’far, eu vim aqui buscar você! - o ruivo o interrompeu. - Vamos embora amanhã mesmo!

Aquela frase fez o coração de Ja’far falhar uma batida. Ir embora? Deixar Sindria? Deixar… Sin? Ele engoliu a seco e a apatia em seu olhar assustou Kouen. Mas não era hora de se deixar intimidar. Ele havia ido longe demais para recuperar o que era somente seu.

— En, eu… Eu preciso pensar. - ele gaguejou, bastante confuso.

Kouen arqueou uma sobrancelha. Não podia acreditar no que estava ouvindo.

— Pensar?! Você me mandou uma mensagem pedindo socorro e eu fiquei semanas, melhor, meses enlouquecendo pensando em como te recuperar! Não me ama mais?

— Claro que te amo!

Aquela resposta saiu de uma forma tão automática de seus lábios que Ja’far duvidou se o que estava dizendo era o que, de fato, ele sentia.

— Então… - Kouen tomou as mãos do alvo e o encarou fixamente, sem chance de Ja’far deixar o olhar vacilar. - vamos voltar para casa, você e eu!

“Eu já estou em casa…” - ele mordeu os lábios para que aquela resposta não saísse de sua boca enquanto encarava, tão angustiado, a expressão obstinada de Kouen.

E era tão nítido que Ja’far se sentia ameaçado que o príncipe pensou estar fazendo mal. Então, suavemente, ele deixou uma mão deslizar pelo braço de Ja’far e chegar até sua cintura, puxando-o para perto e deixando os corpos colados.

— Senti tanto sua falta...

O sussurro de Kouen antecedeu o momento em que o príncipe cobriu sua boca com os lábios. Mas, instintivamente, Ja’far tentou cerrá-los. - Por que agia assim? - o alvo perguntava a si mesmo antes de ceder e sentir a língua quente do ruivo deslizar por dentro de sua boca.

Há quanto tempo não sentia aquele gosto? Era tão mais ardente e intenso que o de Sinbad. O beijo de En... Tinha mais desejo.

Mas os braços de Kouen não o envolviam, tampouco seus lábios eram doces como os de Sin, que... Tinha mais amor.

E por mais que Ja’far tentasse se entregar, ele se sentia… sujo.

Kouen, ainda naquele abraço, o girou e o deitou sobre aquela mesa comprida. A escrivaninha do rei de Sindria. Ja’far engoliu a seco ao encarar o olhar apaixonado daquele que tinha todas as intenções do mundo.

Foi quando ele sentiu a mão larga do príncipe levantar suas vestes e apalpar certas partes, deixando as bochechas do alvo completamente rubras. Mas naquele instante Kouen percebeu que havia algo errado, parando imediatamente o que fazia.

— Sempre quando eu começava a te beijar… você logo ficava… mais animado. Agora eu o toco e… nada?

Ja’far estava mais constrangido do que antes. Se é que havia como ficar ainda mais envergonhado. De alguma forma não se sentia mais tão à vontade na presença dele. E afinal, teria mesmo que explicar a excitação que o beijo de Kouen não mais lhe causava?

— Eu… Eu estou nervoso, En. - foi a primeira desculpa que lhe veio à mente. - Alguém pode entrar e…

— E você, por acaso, se apaixonou de novo pelo Sinbad? - o ruivo foi direto.

— Não! - Ja’far balançou a cabeça negativamente.

Kouen se afastou daquela mesa e, consequentemente, do conselheiro que se sentou para realinhar suas vestes. O perfume do príncipe, que só deveria existir nas terras de Kou, estava impregnado em suas vestes. Esperava não cruzar com Sinbad mais pelo resto da noite.

— Então faremos o seguinte… - Kouen se virou para ele. - Eu estarei indo para Balbadd amanhã. Como você sabe, Balbadd é, atualmente, uma colônia do Império Kou. Daqui se pode chegar até lá em três ou quatro dias no máximo. - Ja’far ouvia aquelas instruções bastante assustado. - Continue fazendo Sinbad acreditar que está transtornado e…

— Eu não estou mentindo nada para ele!

— Me escute! - Kouen se impôs. - Faça com que ele confie em você o suficiente para que possa ir ao porto e… Há muitos navios que saem daqui, todo dia, para Balbadd por causa das negociações que Sinbad tinha com o falecido rei. Eu estarei o esperando lá!

Ja’far não sabia o que responder. Não poderia contestar aquela decisão. O melhor a fazer era colocar algum obstáculo no caminho para que o príncipe desistisse daquela ideia.

— Podem me descobrir, En, e isso não vai ser bom!

O ruivo balançou a cabeça negativamente.

— Não se preocupe, pois se passar uma semana e você não chegar em Balbadd, Ja’far… - Kouen o encarou. - eu vou ter certeza de que alguém… ou algo o impediu. Então vou ordenar que as tropas de Kou, que estão em Balbadd, destruam de uma vez por todas essa ilha!


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Notas finais do capítulo

Uffa! Aquele capítulo que eu fiquei pisando em ovos. Eu pensava que quando chegasse no encontro com o En, finalmente, eu teria tudo definido, mas foi bem assustador escrever. - têm sido, aliás. Fora que lidar com o En falsiane é terrível hahaha. Tenho medo de que ele fique ooc - mas é por um bem (ou melhor "mal"?) maior que é a paixonite dela pelo Ja'far.

E Ja'far pisou na bola... de novo. Mas também, tão confuso e problemático que ele anda, pensar que Sin não acredita no que ele disse? Por mais que as intenções do Sin sejam boas, realmente... Mas nada justifica as ofensas do Ja'far.

Agora não há mais saída. Ja'far é praticamente um refém do En. Ou ele conta tudo para o Sin e coloca a vida do En em risco, ou... acompanha o En para proteger Sindria!

Espero que estejam gostando! ♥ Mandem reviews, comentem, critiquem, adoro ler o que vcs tem a dizer! o/



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