Remember Me escrita por Miaka


Capítulo 3
Persuasão


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal! ♥ Fiquei muito feliz com o feedback que me deram tanto no prólogo quanto no capítulo 1! Estou adorando escrever essa fic e sabendo que estão gostando, fico mais animada para prosseguir! Milagrosamente estou conseguindo conciliar os capítulos semanais tanto dela quanto de Escape, que espero que estejam curtindo também! ♥



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Afastando as cortinas da pequena abertura daquela pomposa carruagem que o conduzia, os olhos esverdeados observavam as ruas daquele país. Afinal, de todo o mundo, o único território que nunca tinha visitado sem restrições era o de Kou. A curiosidade do conselheiro de Sindria chamou atenção de sua única companhia naquele veículo.

— Está surpreso?

A voz grossa o tirou de seus devaneios e Ja’far voltou seu olhar para o ruivo. Era difícil acreditar que estava sendo acompanhado pelo próprio primeiro príncipe daquele império, o qual fizera questão de ir buscá-lo no porto.

— Na verdade… - o alvo sorriu. - fico curioso sobre como as pessoas dos países que não conheço vivem. Me desculpe se pareci alheio à vossa consideração, alteza. - ele sutilmente meneou a cabeça para frente.

Kouen sorriu de canto e o sarcasmo no rosto daquele homem deixou Ja’far um tanto quanto receoso.  

— Não precisa ser tão formal. - respondeu o príncipe. - Creio que imaginava que, por apoiarmos a escravidão, nossa população era completamente escravizada e torturada. - ele ria.

— Na-não, de forma alguma. - Ja’far corou. - Jamais tive essa ideia, e justamente por compreender a grandeza do Império Kou.

— Mas Sinbad repudia nosso posicionamento, certo?

Aquela pergunta deixara Ja’far um tanto quanto atônito. O que ele pretendia com aquela conversa? E, demorando muito a respondê-lo, Kouen prosseguiu. Parecia disposto a encurralá-lo.

— Sei que Sinbad pretere toda forma de opressão ao seu povo. Creio que tenha até mesmo asco de nosso sistema político.

Tinha de ser rápido. Não podia permitir alimentar aquela ideia, ainda mais estando ali para assinar um acordo de paz.

— De forma alguma, alteza! - Ja’far se manteve firme, encarando-o. - Temos aliança com países com diversos sistemas políticos e econômicos, ideologias, religiões. Aceitamos todas as nossas diferenças. Por favor, não pense mal de minha majestade.

Os olhos miúdos do príncipe analisavam com precisão cada gesto, cada palavra, cada movimento entre os lábios de Ja’far. Ele era extremamente bem articulado e não parecia ter sido instruído em relação à nada. Era até mesmo difícil acreditar que aquele homem era o astuto assassino que lhe informaram que tinha sido até mesmo chefe do grupo assassino mais perigoso de Parthevia.

Notando ser o alvo do olhar de Kouen, Ja’far corou. Desviou o olhar por um instante. Droga, aquilo não estava saindo como esperava! - pensava consigo mesmo.

— Entendo. - aquilo estava ficando divertido e Kouen queria mais. - Perdoe minha indiscrição, mas me decepcionei muito com o fato do rei Sinbad não comparecer a nossa convocação. Creio que é um momento importante tanto para Kou quanto para Sindria.

Era óbvio que Kouen estava mentindo, afinal, havia marcado o encontro para debaterem e assinarem aquele tratado justamente para a semana a qual sabia que haveria um compromisso inadiável para Sinbad. Tudo estava conforme planejado e, justamente por causa disso, decidira se divertir com o conselheiro daquele país.

— Eu peço as mais sinceras desculpas em nome do meu rei, Kouen-sama. A reunião da Aliança dos Sete Mares foi marcada há dois meses. Eu espero que, na próxima reunião, já possamos contar com a sua presença. - ele esboçou um suave sorriso. -  Seria um imenso prazer! Meu rei lamentou muito não poder comparecer e, confesso que eu mesmo insisti para que não viesse porque eu poderia assinar esse acordo por ele. - explicou.

— Sinbad deve confiar muito em você para que tenha autoridade suficiente para assinar um tratado que define o destino do país dele, não é? - Kouen foi direto.

O rubor nas bochechas tão claras foi inevitável e aquilo não passou despercebido aos olhos de Kouen. E ele já estava completamente ciente de que tipo de relação o rei e o conselheiro de Sindria tinham.

— A-apenas tento ser eficiente em meu serviço, alteza.

Aquilo era péssimo! - Ja’far pensava. Estava gaguejando, sem conseguir evitar se constranger quando aquele apontamento foi feito. De certa forma, talvez por ter tanto dedo para lidar com aquele poderoso país, o qual sempre foi visto como um inimigo do seu, estava sucumbindo à tensão. Não era aquele tipo de postura que havia aprendido a ter quando fosse tratar assuntos diplomáticos. Definitivamente Rurumu se decepcionaria se o visse vacilar tanto.

— Mesmo assim. - Kouen prosseguiu para total desespero de Ja’far. - Afinal, você poderia receber uma proposta melhor em um país com relações hostis e querer trair…

— Isso nunca aconteceria!

Ja’far interrompeu imediatamente aquela insinuação. Não conseguiu evitar transparecer o desagrado em sua expressão. Por mais que estivesse tentando ser cordial, ele jamais permitiria tamanha ofensa.

Kouen arqueou uma sobrancelha, um tanto quanto surpreso com a abrupta resposta do audacioso conselheiro.

— Me perdoe interrompê-lo, alteza, mas minha fidelidade ao meu rei é algo inatingível.

Ele retomou a compostura e esboçou um leve sorriso, tentando amenizar o pesado clima que subitamente instaurara.

Kouen correspondeu da mesma forma, afinal, estava tendo diante de si a confirmação de todas as informações que recebera quanto àquele rapaz. Extremamente leal, o cachorro fiel de Sinbad. E pela atitude inesperada dele, conseguia ver que aquela doce e angelical expressão poderia se transformar num leão furioso… Ou seria uma cobra?

Aquele silêncio incomodara um tanto quanto Ja’far e ele realmente estava preocupado se não havia, com seu desacatado, desagradado o primeiro príncipe. Se estava preocupado por estar recuando demais, agora ele se preocupava por ter sido agressivo demais. Sua cabeça latejava, nunca estivera tão tenso assim.

O ruivo, então, se inclinou para frente, os cotovelos apoiados nos joelhos abertos. Os olhos estreitos encararam aquele par de esmeraldas como se fossem capaz de ver através delas. O suficiente para intimidar ainda mais Ja’far.

— É admirável. - ele suspirou. - Confesso que invejo Sinbad por ter alguém tão fiel ao seu lado.

Ja’far piscou, não sabendo o que responder, mas foi no exato momento em que o balanço daquela carruagem cessou. Haviam finalmente chegado e ele podia ver pela fresta daquelas cortinas a imponente arquitetura daquele palácio.

— Adoraria conversar mais e saber como criou laços tão fortes com seu rei, mas infelizmente, teremos que deixar para depois.

Apenas assentindo o alvo viu o primeiro príncipe sair da carruagem e estender a mão para si. Mais uma vez o rubor em seu rosto foi inevitável. Teria de dar a mão aquele homem? Enfim, não poderia negar aquela gentileza.

Kouen sentiu a mão quase minúscula, de longos e finos dedos, em contato com a sua. Não pôde deixar de notar o quão compridas e afiadas eram as unhas, típicas de um assassino.

Assim que Ja’far desceu, a mão dada a Kouen, surpreendeu-se com um extenso corredor que o exército daquele país formava. Todos devidamente alinhados e posicionados rigidamente para receber aquela autoridade do país do extremo sul. Eram centenas de homens posicionados apenas para recebê-lo?

— N-não precisava tamanha recepção. Nem ao menos sou nobre, alteza.

E enquanto dizia aquilo, Ja’far se questionava porque Kouen ainda não havia largado sua mão.

— Que eu saiba, nem seu rei é.

Apesar de aquilo ser uma verdade, de certa forma Ja’far se sentiu ofendido. Por si só ele, sutilmente, recolheu sua mão. Mas aquela brisa gélida que anunciava, junto das nuvens escuras que os cobriam, uma forte tempestade, fez com que o conselheiro abraçasse a si mesmo, atritando as mãos contra os braços na tentativa vã de se aquecer.

Mas aquele frio não durou muito. Sentiu uma pesada manta cobrir seus ombros.

— Anh?

Ja’far olhou para trás e viu que o primeiro príncipe havia retirado sua longa capa e estava a usando para lhe aquecer.

— Na-não precisa se preocupar!

— Não deve estar acostumado com o clima frio daqui. - ele pontuou.

— Eu trouxe agasalhos. Por favor, não se incomode. - novamente Ja’far se via constrangido.

— Até descarregarem sua bagagem do navio vai acabar se resfriando! Por favor, aceite!

Aquela preocupação… De certa forma a saudade fez com que Ja’far visse seu rei nos olhos daquele homem.

Não querendo prolongar aquela situação que já o fizera ficar envergonhado, o alvo apenas se agasalhou melhor naquela capa de veludo.

— Vamos!

Ouviu a voz imperativa e, assim sendo, seguiu pelo corredor feito por aquelas centenas de homens que trajavam pesadas armaduras e se curvavam, cada fileira, assim que passava acompanhado do príncipe daquele país.

Adentraram o palácio e Ja’far se surpreendeu com a beleza daquele lugar. As cortinas tinham a mesma cor do carpete vermelho que seguia por todo aquele caminho. Apesar de ser pouco iluminado, tudo era decorado com muito gosto.

— Bem, creio que queira descansar um pouco da viagem. Os criados irão conduzi-lo aos seus aposentos e logo jantaremos.

— Obrigado, alteza. Mas eu pretendo voltar amanhã mesmo para Sindria.

— Hm?

Aquilo não era nada bom para seus planos e Kouen contorceu os lábios.

— Peço desculpas pela visita rápida, mas preciso voltar.

— Entendo. - ele suspirou, disfarçando o desagrado com um sorriso. - Então teremos um bom jantar essa noite e amanhã cedo faremos a reunião. Gostaria de levá-lo para conhecer o reino antes de sua partida.

— Seria ótimo! - Ja’far correspondeu sorrindo da mesma forma. - Pretendo partir apenas à noite. Podemos aproveitar o impulso da maré alta para nos afastarmos da costa mais rapidamente.

— Ah, vejo que tem bastante conhecimento sobre navegação também… - o ruivo parecia admirado. Estava forçando qualquer assunto para que o alvo se afeiçoasse a ele.

— Na verdade só o básico!

— Bem, conversemos mais no jantar, então.

— Sim. - o alvo se curvou. - Com licença.

E assim que se curvou, Ja’far foi conduzido por dois criados até seus aposentos. Outros que vinham atrás traziam parte de sua bagagem. Não havia trazido quase nada, tendo em vista que planejara uma breve estadia.

Assim que se viu acomodado naquele amplo quarto e após se ver sozinho ali, Ja’far suspirou aliviado, tirando seu keffiyeh. Cerrou os olhos e se atirou de costas à enorme cama que ficava no centro daquele ambiente. A tensão fazia com que seus ombros estivessem doloridos.

Encarou o teto e esboçou um sorriso de satisfação. No final das contas, talvez todo seu nervosismo não tivesse o menor fundamento. Ren Kouen havia se mostrado um homem de fortes convicções, como imaginava, mas extremamente agradável. Tão diferente do que ouvia falar…

Seria bom dar aquelas notícias a seu rei o mais rápido possível. Então rapidamente foi até o baú que havia sido trazido pelos criados e o abriu. Revirando algumas roupas, encontrou aquele objeto retangular. Era uma ótima oportunidade de experimentar o novo item mágico que Yamuraiha estava desenvolvendo. O Olho do Rukh não serviria para uma comunicação entre pontos tão distantes, mas a maga havia garantido que aquele aparelho, que ainda estava em fase de testes, era capaz de fornecer contato entre eles. - Apesar de Ja'far temer que aquele artefato explodisse em sua mão. - Segundo Yamuraiha, se os experimentos dela dessem certo, até pessoas sem a capacidade de usar magia poderiam utilizar itens mágicos para se comunicar.

Um tanto quanto curioso com o formato daquele objeto, Ja’far se lembrava vagamente da moça lhe ensinando a utilizá-lo enquanto voltava à cama, onde se sentou aos pés da mesma.

Assim que apertou um dos botões que havia naquele objeto estranho, Ja’far o levou até a altura do rosto, uma das pontas encostada em sua orelha direita.

Ouviu um toque estranho soar dali uma, duas, três vezes… Não devia estar funcionando.

— JA’FAR?!

O alvo se surpreendeu ao ouvir a tão bem conhecida voz de seu rei. Um largo sorriso cruzou seus lábios, afinal, fazia duas semanas que não falava com ele. Mas… estava tão baixo.

— S-Sin? Não consigo ouvir direito?

Foi só então que Ja’far notou que a voz de Sinbad saia na outra extremidade do aparelho, a qual estava na altura de seus lábios. Notando seu erro, ele rapidamente inverteu o objeto e pôde ouvir sua majestade com perfeição.

— Está me ouvindo agora, Ja’far?

O sorriso crescia ainda mais.

— Sin! Estou te ouvindo! Parece que o novo experimento da Yamuraiha-san é um sucesso! Avise a ela.

Não houve necessidade de cumprir o pedido de Ja’far. Ele já podia ouvir os berros da maga que saltitava ao redor de Sinbad, claramente extasiada em ver o sucesso de sua nova invenção. Ja’far apenas riu ao notar a animação de Yamuraiha.

— Acho que já sabe que não vai ser preciso. - riu Sinbad. - Mas me diga, como está? Já aportaram em Kou?

— Sim! Chegamos faz uma hora, aproximadamente.

— E como está sendo tudo ai? - era possível notar o tom preocupado na voz do rei.

— Muito melhor do que eu imaginava. - Ja’far olhou de canto a porta e começou a sussurrar. - Estou sendo tratado como rei.

— É o mínimo que devem fazer! - Sinbad resmungou.

— Não seja bobo. É verdade. É muito estranho porque Ren Kouen está sendo extremamente gentil comigo.

— Tome cuidado. Ele insinuou algo?

— Sim, algumas coisas, mas de uma maneira informal…

— Tome cuidado… em especial com o que come e bebe aí. - advertiu.

— Eu vou. - Ja’far respondeu. - Disse que terá um jantar para minha recepção e combinamos de amanhã assinarmos o acordo.

— Então você volta amanhã mesmo? - ele parecia ansioso.

— Ao menos partiremos daqui ao anoitecer. - o alvo respondeu. - E a reunião, como está indo?

— Todos chegaram hoje. Amanhã começaremos os serviços.

— Recepcionaram todos os reis bem? Todos seguriam as instruções que deixei?

— Ja’far… - Sinbad suspirou. - já disse para não se preocupar.

— Não deixem que nada dê errado, ok?

— Ja’far… - ele tentava desconversar. - como tem passado as noites sem mim?

— QUÊ?! - exclamou. - Do que está falando?!

— Não se faça de ingênuo, sabe do que estou falando! - Sinbad o provocou.

— Estou passando muito bem, descansando bastante, Sin! - Ja’far cerrou os olhos e franziu o cenho, como se seu rei pudesse vê-lo. - Espero que voc…

— Mas eu não. - Sinbad o interrompeu. - Não aguento de saudades de dormir com você. Minha cama está tão solitária…

— Pois chame uma das concubinas! - Ja’far provocou.

— Ah, você quer isso? - Sinbad revidou.

— Se for do seu agrado e estiver sentindo falta de SEXO e não de MIM… - ele enfatizou. - Que seja feita a vontade de minha majestade!

— Ai, Ja’far, você me broxa quando começa a falar desse jeito...

Ja’far suspirava quando ouviu um leve bater na porta.

— Sin, tenho que ir! - ele sussurrou cobrindo os lábios para que sua voz não se propagasse.

— Certo. Não deixe que ninguém saiba que estamos nos falando, certo?

— Sim! Amanhã quando estivermos saindo e terminado a reunião volto a falar com você!

— ...

Ambos ficaram calados, como se faltasse algo para aquela despedida. As palavras pareciam entaladas na garganta de um e na de outro. Aquele “eu te amo” que parecia grandioso demais para ser dito nesse momento inoportuno. Mas havia oportunidade melhor? Por que era tão dificil assumir que a saudade estava lhe corroendo?

— Até, Sin!

E sem dar chance para que Sinbad ousasse proferir as palavras que ele também continha, Ja’far logo desligou o aparelho, escondendo-o em seguida por debaixo de um dos travesseiros daquela cama antes de ir até a porta e abri-la. Era uma das servas do palácio.

— Ja’far-sama, a alteza pediu que o levasse até a sala de jantar.

Conduzido por aquela jovem, Ja’far seguiu por longos corredores até chegar a uma ampla sala. O assoalho era revestido de madeira, como todo o resto do palácio e uma extensa, porém baixa mesa de mogno era coberta por diversos pratos que Ja’far não conhecia. De fato, Kou tinha uma cultura, e até mesmo culinária, extremamente distinta.

Assim que chegou ali, o primeiro príncipe já estava sentado junto de seus dois irmãos mais novos. O mais velho à cabeceira da mesa, estendeu a mão para que Ja’far se sentasse bem à sua frente, na outra extremidade.

Ja’far assentiu e o fez, pondo-se de joelhos sobre aquela almofada estampada em azul marinho.

— Aceita uma taça de vinho?

Foi a primeira coisa que Kouen perguntou enquanto a serva ao lado do conselheiro de Sindria já se preparava para depositar a bebida em seu copo. Lembrou-se atentamente das palavras de Sinbad e fraco como era para alcool, era melhor não arriscar.

— Não, obrigado. Não bebo.

Aquela atitude não coincidia com toda a descrição que Judal havia feito. Franziu de leve a fronte e voltou a beber.

— Pensei que o príncipe Hakuryuu e a princesa Kougyoku estariam presentes, além de… - ele pausou. - é claro, a Imperatriz.

— A Imperatriz não deve se mostrar à visitas. - Koumei foi direto.

— Hakuryuu está fora há bastante tempo, assim como sua irmã. E Kougyoku não tem o costume de jantar conosco.

— Entendo. - Ja’far desviou o olhar. - Espero que os dois príncipes tenham gostado de sua estadia em Sindria. Nos esforçamos para recebê-los tão bem quanto estou sendo recebido aqui. - ele tentou ser simpático.

— Kougyoku disse que adorou Sindria. Que até mesmo Sinbad a convidou para ficar lá.

Ja’far piscou ao ouvir as palavras de Kouha.

— É que a princesa Kougyoku ficou muito encantada com nossos festejos. - Ja’far sorriu.

— Talvez seja a tentativa de persuação do país inimigo que conversávamos mais cedo, Ja’far?

Kouen foi direto. O suficiente para que o conselheiro se engasgasse com sua bebida.

— N-não entendi, Kouen-sama. - ele tentou se recompor.

— Quero dizer que, será que seu rei não estava tentando absorver minha irmã para seu lado? - o ruivo não deu trégua.

— Posso garantir que não. - Ja’far declarou. - Sin ja… digo, meu rei jamais faria isso. - ele se remendou antes de prosseguir. - Apenas demos a escolha à princesa. Se ficar em nosso país a fizesse feliz… Inclusive a maioria de nossos generais são príncipes de outros países que se sentiram felizes em nosso território.

— E você, Ja’far. - o primeiro príncipe chamou sua atenção. - Como conheceu seu rei? Creio que tem uma relação muito especial envolvida entre vocês.

No território inimigo, sendo inquirido pelo mesmo, Ja’far não estava disposto a revelar nada relacionado a seu passado, porém se negar a responder aquilo poderia dificultar ainda mais as relações com Kou. Afinal, parecia que aquilo tudo era um teste. Kouen estava sendo extremamente agradável, mas ao memso tempo sagaz e melindroso em cada questionamento feito e cada posicionamento dado.

— Faz muitos anos. - ele respondeu com um leve sorriso, querendo demonstrar descontração. - Eu era criança ainda.

— Não achei que fosse tão mais jovem que seu rei.

— Na verdade, não. Sin é quatro anos mais velho que eu. Digo, meu rei. - era tarde demais para retificar. 

— Ah, então tem a mesma idade que Koumei. - Kouen tentava ser simpático. 

— Ah, que coindiência. - Ja'far sorriu ao encarar o irmão do meio.

— É verdade que era um assassino em Parthevia?

De uma forma mais do que direta, ao se ver alvo dos olhos do conselheiro, Koumei perguntou despreocupadamente, pegando Ja’far de surpresa. Mas foi no exato momento em que o conselheiro ficou mais pálido que o normal que Kouen espalmou a mesa.

— Isso é pergunta que se faça, Koumei?! - a fúria era nítida nos olhos tão rubros quanto seus cabelos.

— M-me perdoe, meu irmão e rei. - Koumei desviou o olhar voltando a comer.

— Ja’far, peço que perdoe a indiscrição do meu irmão. Creio que foi uma péssima pergunta a se fazer.

Ele estava atônito.

Assim que fora surpreendido por aquela pergunta que, certamente além de lhe trazer péssimas lembranças, era algo que ele via como uma grande vergonha em seu passado, Ja’far ficou pasmo diante da súbita reação de Kouen, que saíra em sua defesa. Ele nem mesmo se preocupara de estar remendando seu irmão na frente de um estranho.

O clima ficara pesado e ele demorou a se manifestar enquanto encarava Kouen. O que aquele homem pretendia? - ele se questionava. Precisava amenizar a situação a qual acreditava ter sido o criador.

— Não há porque discutirem, alteza. Koumei-sama deve ter ouvido falar e é normal que fique curioso. Afinal, nossos países estão se tornando amigos agora, certo? - ele tentou parecer brando. - Mas muito obrigado por se preocupar com meus sentimentos, Kouen-sama.

— Não tem pelo o que se desculpar! - irredutível ele prosseguiu. - Foi uma total falta de decoro! - o primeiro príncipe ainda encarava furioso seu irmão mais novo.

— Mas o Koumei-sama está certo. Eu já fui um assassino da organização chamada Sham Lash. Foi graças ao S… meu rei - bem a tempo. - que me libertei daquela vida, a qual me envergonho muito.

A tristeza era nítida em seus olhos. E Kouen podia sentir a veracidade neles.

— Bem, vamos trocar de assunto e prosseguir o jantar.

Assim como o ruivo ordenou, a partir dali começaram a conversar de trivialidades que acabaram chegando à situação política, econômica e social de Kou. Ja’far, extremamente interessado no que se passava ali, estava surpreso em como eles falaram praticamente sobre tudo o que acontecia naquele país. Dados importantíssimos que ele gostaria de ter anotado, mas que ficariam gravadas apenas em sua mente. Mas ao mesmo tempo, Ja’far se sentia preocupado. Como um país cujo objetivo era a dominação mundial estava abrindo todos os seus planos e estratégias para ele, o conselheiro do homem que eles, certamente, consideravam inimigo?

Aquilo estava estranho e Ja’far sabia muito bem. Era difícil se manter concentrado enquanto tantas dúvidas surgiam em sua mente. Não temiam por ele saber de tudo aquilo?

Mas enquanto aquelas informações eram passadas, Kouen e Koumei enfatizavam em como desejavam mudar a imagem de Kou, até mesmo em abolir a escravatura se fosse possível abrir seu comércio com a ajuda de Sindria.

Claramente animado com aquela ideia, Ja’far garantiu que poderiam adicionar ressalvas naquele tratado que assegurasse que Sindria daria todo o apoio para o livre comércio do Império, o que permitiria que Kou pudesse fazer negócios com os demais países pertencentes à Aliança dos Sete Mares. Também discutiram sobre o fim do militarismo e Ja’far estava extasiado. Não via a hora de contar aquelas novidades para Sinbad. Com certeza ele ordenaria que realizassem um festival! Parecia um sonho...

A conversa durou boa parte da noite e já bem tarde, quando Kouha começou a cochilar sobre o ombro de Koumei, o conselheiro de Sindria decidiu se recolher. Ele estava impressionado em como havia sido agradável e proveitosa aquela conversa. Afinal, como ele mesmo havia dito, eles poderiam estar arrependidos de sua política até aquele momento e estavam buscando alianças, parcerias, uma nova forma de viver. E nada melhor do que buscar ajuda de pessoas que lutavam contra a opressão que Kou insistia em pregar.

— Bom, eu acho que já vou dormir. - ele disse, se levantando. - Eu agradeço muito pelo jantar e pela conversa tão proveitosa. - o alvo se curvou.

— O tanto que conversamos hoje, acho que é o suficiente para que amanhã só assinemos nosso tratado, certo? - Kouen o encarou com um sorriso.

— Com certeza, Kouen-sama! - Ja’far correspondeu com a mesma animação. - Eu estou muito feliz de ter vindo e ter conversado com vocês! Sin também ficará muito feliz! - ele não hesitou mais em chamar seu rei por seu apelido íntimo na frente dos príncipes. - Se me dão licença, boa noite!

— Boa noite, Ja’far. Até amanhã.

Kouen respondeu enquanto Koumei apenas meneou a cabeça. O caçula já estava completamente adormecido e nem ao menos viu a partida do conselheiro de Sindria.

Assim que o alvo os deixou, os irmãos se entreolharam.

Koumei balançou a cabeça com um sorriso comedido.

— É um tolo mesmo. - ele comentou enquanto mexia nas longas mechas ruivas. - Só faltou sair daqui saltitando... Chega a dar pena...

— A pergunta quanto ao passado dele foi ideal. - Kouen se inclinou para trás, apoiando as mãos no assoalho. - Foi nítido como ele ficou admirado por como o defendi. - o ruivo riu.

— Mas, meu irmão e rei, não achou arriscado contarmos tudo a ele? Sobre nossas tropas, onde estão… - Koumei demonstrava preocupação. - Contou até sobre o plano que tinhamos de invadir Sindria há alguns meses atrás.

Foi quando Kouen não se conteve e gargalhou. Os olhos avermelhados cintilavam.

— De que vai adiantar ele saber de tudo se amanhã estará morto?


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Notas finais do capítulo

Primeiro capítulo de Remember Me que vocês devem estar querendo me enforcar no final! - hauhauhu! Estou me surpreendendo muito trabalhando com o Kouen! Estava muito nervosa sobre trabalhar com o núcleo de Kou e, de fato, é a primeira fic que publico em que trabalho com esses personagens de uma forma mais ativa. Uma dificuldade que me surpreendeu foi me ambientar ao cenário de Kou, já que eu trabalho tanto com Sindria que esse ambiente made in China foi um pouco complicado da minha mente processar. XD Confesso que achei uma delicia fazer os diálogos provocativos entre o Ja'far e ele. Deu uma saudadezinha dos barracos Ja'far x Arba de Um Peso, Duas Medidas. Hahaha! Mas não se preocupem que barraco de verdade é o que NÃO VAI FALTAR nesta fic. Semana que vem chegamos a um dos climax dessa fic, o qual estou MUITO ansiosa para escrever! Até lá! ♥
Lembrando que elogios, críticas, comentários sempre são bem-vindos e eu amo as reviews de vcs! ♥



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