Remember Me escrita por Miaka


Capítulo 4
Cilada


Notas iniciais do capítulo

Capítulo saindo um pouco mais cedo, pessoal! ^^ Quero agradecer ao maravilhoso feedback de vocês, comentários, tudo! Meu imenso combustível para escrever! Espero que gostem!



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Revirou-se debaixo dos lençois sentindo o corpo pesar.

Abrindo os olhos, pôde notar pela claridade que adentrava as janelas que já havia amanhecido completamente, apesar do céu completamente nublado.

Tinha ido dormir tão exausto após aquela longa conversa com os príncipes do Império Kou que nem havia se lembrado de como havia parado ali.

Rapidamente se levantou e começou a se arrumar, afinal, aquele seria um dia especial. O segundo e último dia que passaria naquele país. E se não fosse a saudade que sentia de seu rei, Ja’far agora se sentia tranquilo e realmente instigado a passar mais tempo em Kou. Gostaria de conhecer mais sua cultura, seus costumes… Mas agora tinha certeza de que haveriam outras oportunidades. Certamente, em breve, voltaria ali e na companhia de seu rei.

Encarou-se no espelho que havia diante daquela cômoda rústica feita em mogno. Ajeitando os fios alvos, ele colocou seu keffiyeh antes de buscar aquele grosso cachecol azul com detalhes em branco, a típica estampa de Immuchak.

Aquele adorno tinha um significado extremamente especial para Ja’far, afinal, havia recebido aquele presente diretamente das mãos de Rurumu há muitos anos atrás. E ao sentir a brisa gélida que adentrava pelas frestas das janelas e da porta de seus aposentos, ele tinha certeza de que seria prudente utilizá-lo.

Assim que terminou de ajeitá-lo em seu pescoço, ouviu um barulho o qual não estava acostumado. Só após o terceiro toque, Ja’far se deu conta de se tratava do artefato mágico que provinha sua comunicação com Sindria. Mas assim que caminhou para atender aquela chamada, ouviu duas batidas na porta. Droga, não teria como atender agora!

Mordeu o lábio inferior e correu, indo até debaixo do travesseiro, de onde tirou aquele aparelho para, imediatamente, desligá-lo.

— Me desculpa, Sin! - ele sussurrou.

Suspirando aliviado, devolveu-o para onde estava e seguiu em passos largos até à porta. Provavelmente era alguma serva vindo trazer o café-da-manhã, algo do tipo.

Mas assim que abriu a porta, de uma forma um tanto quanto abrupta, os olhos esverdeados se arregalaram ao encontrar aquele homem que era bem mais alto que ele. Vestindo um kimono bastante simples branco com detalhes vermelhos, o primeiro príncipe de Kou estava apoiado ao batente, parecendo curioso quanto sua demora em atender.

— K-Kouen-sama!

Estando completamente desprevenido quanto á presença do ruivo ali, Ja’far, exasperadamente, se curvou para cumprimentá-lo, voltando a se erguer logo em seguida.

— Bom dia, Ja’far. - a voz rouca ressoou.

— Bom dia, alteza. - ele se recompôs e abriu um sorriso. - Não esperava que viesse a meus aposentos e ainda estava me arrumando quando bateu à porta. Me atrasei muito?

— Não, fique à vontade. Também acordei há pouco. - explicou. - Na verdade vim buscá-lo para darmos uma volta pelo palácio.

O conselheiro de Sindria piscou. Ainda era tão estranho ser recebido de uma forma tão calorosa naquele país… - ele refletia.

— Quero que conheça nossas instalações. Creio que é bastante diferente para quem sempre viveu em… Parthevia e Sindria, não é?

— S-seria um prazer, alteza.

A ideia não poderia ser melhor e Ja’far se animou. E ele pensava que ficaria entediado durante aquele pouco tempo antes da reunião.

— Então vamos logo! Pode deixar o quarto aberto, afinal, as criadas irão arrumar tudo. - Kouen pontuou e o conselheiro não notou o sorriso de canto que ele esboçava.

— Claro!

E assim que Ja’far seguiu Kouen por aquele corredor, afastando-se daquele quarto, alguém rapidamente adentrou a porta entreaberta.

Kouha tinha que ser rápido e seguir corretamente as instruções de seus irmãos, afinal, não podia decepcioná-los. Estava tão determinado que levou um imenso susto ao ver o magi que adentrava pela janela daquele lugar.

— Judal-kun!

— Não precisava ter vindo. Eu vinha revirar tudo.

Hm? - Kouha arqueou uma sobrancelha.

— É muito mais arriscado você entrar assim no quarto do que eu entrar pela janela. - Judal apoiou os punhos nos quadris, falando aquilo com a naturalidade de quem dizia o óbvio.

Mas Kouha ficara nitidamente cabisbaixo ao ouvir aquilo, aliás, ao ver Judal ali.

— Eu quero ser útil para o Mei-nii e o En-nii! Quero ajudá-los a conquistar Sindria também! - ele encarou o magi. - Por favor, Judal-kun, deixe que eu faça isso sozin…

— Relaaaaaxa. - Judal cantarolou, tocando no ombro do rapaz que, apesar de ter quase a mesma idade dele, era bem mais baixo. - Se acharmos algo, foi VOCÊ que encontrou, ok? - o moreno deu uma piscadela.

Os belos olhos rosados brilharam quando Kouha assentiu e, determinado, ele começou a revirar todo aquele quarto junto de Judal. As bagagens que ele trouxera, as gavetas… Passou meia-hora e o sacerdote, impaciente como era, já estava cansado daquilo.

— Aaaaah, que saco! - ele bufou, sentando-se na cama. - Cansei!

— Não foi você que disse para o En-nii que sentiu uma magia diferente?

— Bah, deve ter sido coisa da minha cabeça. - Judal coçou a cabeça. - na cara que não tem nada aqui, Kouha! - e inclinou-se para deitar. - Já enchi de ficar procurando iss...

Judal mal encostou a cabeça no travesseiro e sentiu algo rígido ali. Algo que não combinava com as roupas de cama luxuosas do Império. E ao sentir que havia algo, ele imediatamente voltou a se sentar, como se tivesse sido repelido e retirou o travesseiro do lugar, revelando assim aquele objeto estranho.

Os olhos escarlate piscaram e ele, um tanto quanto assustado, apontou sua varinha. A mão trêmula enquanto ele afastava o rosto caso aquilo pudesse vir a explodir.

— O que é isso?

E completamente alheio a qualquer receio que o magi nutria diante daquele artefato mágico, ou o que quer que fosse aquilo, Kouha o tomou em suas mãos, fazendo Judal corar diante de tanto temor que expusera. O magi rapidamente fez sua varinha desaparecer e se apoiou às costas do terceiro príncipe que analisava de forma curiosa aquele objeto.

— É um ítem mágico, Judal?

— S-sim… - ele ainda se escondia atrás de Kouha.

— O que será que isso faz?

Kouha indagava enquanto apertava aquele único botão. Sentindo o objeto tremer, o rapaz o levou até a altura do rosto, de onde havia detectado um pequeno barulho que pôde ouvir melhor daquela forma. Judal fez o mesmo, os rostos dos dois quase colados.  Quatro, cinco vezes… Aquilo só fazia soar aquele estranho barulho? - o magi e o príncipe indagavam.

— JA’FAR?

A voz de Sinbad surpreendeu ambos, mas muito mais Judal, que conhecia muito bem a voz do rei de Sindria. Kouha imediatamente cruzou os lábios com o indicador, pedindo que Judal fizesse silêncio e o magi permaneceu ali, atônito, a observar aquele objeto.

— Ja’far, está me ouvindo? - ele perguntava. - Algum problema? Oe! Ja’far?!

Em Sindria, um aflito Sinbad andava de um lado para o outro do lado de fora da sala de reunião. Será que havia algum problema no aparelho? Ja’far já não tinha lhe atendido antes e agora não dizia nada ao lhe chamar. Mas conseguia ouvir uma respiração. Será que haviam descoberto que estavam se comunicando?

— Majestade! - era Pipirika que aparecia na porta da sala que estava lotada com os reis da Aliança. - Já está na hora, majestade!

Tsc, peça que aguardem, Pipirika!

Sinbad estalou a língua, extremamente irritado, enquanto saia apressado pelos corredores. Teve de ter cuidado para não esbarrar em alguém, tendo em vista que o palácio estava recebendo a visita não só dos reis dos países aliados, mas também seus ministros, conselheiros e servos que vinham juntos, acompanhando seus governantes, àquela ilha.

Oe, Ja’far, está me ouvindo agora?!

O rei ainda insistia tentando fazer com que Ja’far respondesse quando chegou ao laboratório de Yamuraiha. A maga se surpreendeu ao ver seu rei abrir as portas sem a menor discrição. Ele não devia estar na reunião?

Um tanto quanto surpresa, a mulher que estava sentada de costas para a porta, virou-se de frente a ele. Seria uma emergência?

— Majestade? - ela piscou os olhos azuis.

— Yamuraiha, isso não está funcionando! - apreensivo, ele estendeu o artefato que era idêntico ao de Ja’far à maga.

Hum?

Tomando-o em mãos, Yamuraiha levou o item na altura do rosto e só pôde detectar aquele silêncio antes da chamada cair.

— Majestade, está funcionando perfeitamente. - a moça estendeu o aparelho de volta à Sinbad. - Inclusive, se a pessoa não atender após o sétimo toque, é possível deixar uma mensagem breve para que, quem não atendeu a ligação, possa ouvir depois.

— Como?! - Sinbad estava nitidamente irritado. - Não consegui ouvir Ja’far e tentei falar com ele mais cedo e não funcionou!

— Estava funcionando, mas ninguém dizia nada! - Yamuraiha concluiu de forma simplória.

Sinbad bufou, batendo a ponta daquele item em sua fronte. Se estava estressado e sem dormir já pelo simples fato de estar se corroendo em preocupação com Ja’far, agora tudo aquilo parecia fazer mais sentido. Não era um pressentimento bobo, então?

— Sei que não tenho nada a ver com isso, mas será que não é mais prudente se acalmar, majestade? - a maga, receosa, perguntou.

Finalmente o rei de Sindria parou de caminhar em círculos como estava fazendo desde que chegara até aquele laboratório e suspirou. Os olhos dourados, de canto, encararam a maga antes de ele assentir. Yamuraiha tinha razão.

— Ja’far-san entrou em contato com você ontem e relatou que estava tudo bem. - prosseguiu. -  Pode ser que esteja apenas ocupado e nós mesmos o instruímos a não permitir que soubessem que estamos nos comunicando por acharmos perigoso.

— Tem razão. - o moreno balançou a cabeça.

— Que eu saiba seu dia está cheio de reuniões. O melhor a fazer, majestade, é cumprir seus compromissos e se distrair neles! Essa angústia quanto à viagem do Ja’far-san está fazendo mal a você mesmo!

Mais uma vez ela estava completamente correta. E só então Sinbad colocou os pensamentos em ordem e se lembrou de todos aqueles reis que estavam lhe aguardando na sala de reunião. Seria um dia inteiro de debates e acordos e, certamente, se Ja’far estivesse ali, seu conselheiro teria cuidado de tudo, até mesmo de quantas horas de sono seu rei teria para se preparar para aquele dia. Por que não parava de se questionar como tudo estaria sendo se Ja’far estivesse ali? E não era a primeira vez que ele viajava sozinho… Estava enlouquecendo.

— M-me desculpe, Yamuraiha. Cheguei aqui extremamente preocupado, acabei sendo rude com você.

— Não se preocupe, majestade. - a maga sorriu. - Sei como está sofrendo com a ausência do Ja’far-san. É nítido.

—-------

Enquanto isso, em Kou, o terceiro príncipe e o magi continuavam a observar aquele objeto. Será que ainda poderiam ouvi-los? Entreolhavam-se extremamente preocupados e receosos em dizer qualquer coisa.

— Oe, Kouha. - Judal sussurrou.

Shhh! - ele levou os dedos aos lábios. - Vamos deixar isso onde estava e avisar ao Mei-nii. - foi a vez de Kouha sussurrar, depositando o artefato debaixo do travesseiro no qual haviam o encontrado.

Rapidamente saíram dos aposentos do conselheiro e Judal, sorrindo sarcasticamente, chamou a atenção do rapaz.

— Oe, Judal-kun, do que está rindo?

— Nada, é que está ficando cada vez mais divertido. - ele jogou os braços para trás da cabeça. - Saber que aquele rei idiota está vigiando os passos do franguinho, com medo de ele cair no ninho de cobras. - o magi gargalhou.

—------xxxxxxx-------

Ja’far estava maravilhado com aquela refinada arquitetura, além de toda a organização dos processos administrativos daquele palácio. Imaginava como seria incrível se os oficiais de Sindria fossem tão disciplinados e dedicados ao trabalho como os de Kou.

Vira ali um ambiente calmo e silencioso de árduo trabalho enquanto passavam pelas áreas respectivas às finanças do país.

Saíram daquele último lugar para chegarem a um belíssimo jardim de inverno. A arquitetura do palácio era completamente harmonizada com aquele ambiente natural, onde via uma pequena fonte desembocar em um lago redondo cercado por pedras simetricamente alinhadas. As mesmas que formavam um caminho pela grama úmida e verde e chegavam até a pequena ponte que fazia a travessia naquele pequeno lago onde podia ver grandes peixes coloridos, os quais Ja’far não conhecia.

Ficou ali, debruçado à mureta daquela ponte, a admirá-los.

— Não conhecia carpas?

— Anh? É o nome desse peixe? - Ja’far perguntou sem tirar os olhos d’água.

— Sim. Não deve conhecer porque esse peixe só vive em água doce, em rios por essa região. - explicou.

— São muito bonitos… - o conselheiro admirou.

Kouen observava cada detalhe do rosto pálido do rapaz.

A pele branca não possuia imperfeição alguma que não fossem aquelas sardas, que davam um ar único para ele. O nariz fino, arrebitado, era modelado perfeitamente com os lábios pequenos e os olhos esverdeados pareciam um par de esmeraldas.

Não tinha como negar que, de certa forma, agora ele entendia como um homem tão poderoso como Sinbad, que poderia ter a mulher que quisesse, havia se apaixonado por Ja’far.  Além de tantas qualidades fisicas, Ja’far era extremamente inteligente, hábil, disciplinado… Era dificil não se encantar por ele.

Perdido naquela análise, Kouen quase se esquecia do que deveria fazer. E divertindo-se em como seu truque estivava, ironicamente, voltando contra a si mesmo, ele soltou um risinho que fez com que Ja’far o encarasse, curioso sobre o motivo daquela alegria.

— A-alguma coisa aconteceu? - Ja’far perguntou de forma ingênua.

— Não. Nada em especial. - o príncipe encarava o horizonte. - Acho que podemos começar em breve a reunião para a assinatura do acordo, então?

— Claro!

Ja’far abriu um largo sorriso.

Afinal, mesmo se sentindo á vontade ali, nada lhe traria mais alívio e segurança do que a plena certeza de que tinha um acordo feito com aquele país. Era como se ansiasse por um presente que levaria ao seu rei.

E após passarem boa parte do dia conhecendo as instalações daquele palácio, a reunião teve de ser adiada para o fim da tarde, após um grandioso banquete que fora oferecido como homenagem à união daquelas duas potências.

Passava das cinco quando Ja’far se viu na mais pomposa sala de reunião daquele palácio. Provavelmente o lugar mais bem decorado e belo que já tinha visto ali.

Estava cercado de ministros, conselheiros e, claro, do primeiro e do segundo príncipe daquele país. Mas ele não se sentia intimidado de forma alguma, muito pelo contrário. Aos seus olhos, aqueles não eram mais os príncipes do país inimigo de Sindria.

Assistiu com gosto o ruivo assinar aquele acordo, o qual Ja’far havia lido e relido inúmeras vezes, mesmo naquele curto tempo, assegurando-se de tudo o que havia sido acordado ali.

Kou respeitaria todos os países da Aliança dos Sete Mares, tendo permissão de comercializar e transitar livremente entre eles com a condição de que menos de 5% de seu exército adentrasse o território alheio. Era uma forma de garantir aquilo.

Naquelas ressalvas, Kou se comprometia a diminuir seu poderio militar e a debater futuras mudanças em suas políticas com o líder da Aliança, o rei Sinbad. Aquele trecho, em especial, lhe trazia esperanças de que talvez a escravidão pudesse ser abolida naquele Império.

Quando Kouen passou aquele pergaminho para o conselheiro de Sindria, Ja’far retirou a pena do tinteiro e pôde sentir sua mão tremer quando se inclinou para dar sua assinatura.

Passava o dia inteiro assinando documentos e contratos de Sindria, mas agora era diferente. Naquele momento ele sentia um grande peso sobre suas costas e ao mesmo tempo uma intensa euforia.

Teve de se controlar para manter a firmeza ao assinar o acordo que selava o sonhado tratado de paz entre Sindria e Kou.

— Bem, com isso acho que está concluída a reunião!

E assim sendo, Kouen estendeu a mão para Ja’far, que a apertou, um tanto quanto nervoso. Era a primeira vez que sentia tamanha responsabilidade. Tendo aquela experiência, ele refletia que talvez devesse ser mais brando com Sinbad quanto as suas tarefas e responsabilidades.

— Eu agradeço imensamente pelo o que está fazendo, alteza! - Ja’far se sentia ridículo, mas era impossível conter a animação estampada em seu rosto. - Esse tratado será motivo de muita festa em Sindria e espero que possamos, em breve, recebê-lo em nosso país para festejar em sua companhia!

— Aguardarei ansiosamente o convite do rei Sinbad. - ele sorriu de canto

— Tenha certeza de que será o mais breve o possível. - o alvo se curvou. - Agora, infelizmente, eu devo me preparar para partir.

O sorriso que emoldurava os lábios de Kouen subitamente esmaeceu ao ouvir aquelas palavras. Ele cruzou os braços.

— Por que não parte amanhã pela manhã? - ele sabia que Ja’far não aceitaria.

— Sinto muito, alteza, ma...

Os lábios de Ja’far foram selados por dois dedos que o ruivo pousou sobre eles.

— Kouen. Apenas Kouen. - o primeiro príncipe especificou. -  Nesse momento estamos na mesma posição. Somos dois governantes que decidiram o futuro de nossas nações.

As bochechas tão pálidas subitamente coraram.

— M-me perdoe, mas nunca teria a posição de um príncipe.

— Por favor.

Ja’far engoliu a seco.

Não se sentia no direito de tratar Kouen em um nivel de igualdade e não só porque ele era um príncipe, mas também por toda a diplomacia envolvida naquela relação. Mas a forma com que o ruivo o encarava demonstrava que aquilo era, de uma forma pessoal, importante. Talvez ele desejasse romper aquelas paredes que os distanciavam dos países que, normalmente, se sentiam ameaçados por Kou e estava tentando se despir de sua nobreza, tão utilizada para oprimir, para se aproximar.

— C-certo, Kouen-sa…

— Só Kouen. - o ruivo o interrompeu, evitando o uso do honorífico.

— Tudo bem. - Ja’far suspirou. Não era fácil. - Kouen.

Um novo sorriso apareceu no rosto do ruivo e Ja’far, um tanto quanto constrangido, evitou encará-lo. Curvou-se respeitosamente para cumprimentá-lo, era o melhor a fazer.

— Agradecemos imensamente a maravilhosa estadia e a companhia… Kouen.

— Como já disse, quem tem a agradecer sou eu. - o príncipe suspirou, cruzando os braços. - Já vi que não conseguirei convencê-lo a ficar mais um dia, então pedirei que aprontem a carruagem para levá-lo daqui a uma hora, então.

— Eu agradeceria muito se pudesse dar esse adianto a nossa partida. - Ja’far sorriu, contente com a boa vontade de Kouen.

— Será um prazer! Então, até breve, Ja’far. - ele meneou a cabeça para cumprimentá-lo.

Foi inevitável se curvar para cumprimentá-lo. Por mais que quisesse agradá-lo, Ja’far tinha pleno conhecimento de sua posição e tinha de enfatizar aquilo em sua despedida.

— Até, Kouen-sama!

—------xxxxxxx-------

 

Adentrou pela última vez os aposentos onde fora hospedado carregando aquele pergaminho como se fosse seu tesouro mais precioso. Tudo parecia um sonho! Quando Sinbad e ele imaginariam que teriam um tratado de paz com Kou?

Radiante como estava, mal notou que suas bagagens já haviam sido levadas para o navio. O quarto estava devidamente arrumado.

Só então sentiu seu coração acelerar ao se lembrar: haviam levado suas coisas, arrumado aquele quarto, então…

Revirou os travesseiros e suspirou aliviado ao encontrar ali, no mesmo lugar que deixara, o artefato mágico que havia sido mantido em segredo. Como havia sido desatento!

Será que tinha tempo suficiente para falar com seu rei? Sabia que, enquanto estivesse no mar, não conseguiria se comunicar. Não custava tentar.

Voltando até à porta, ele se certificou de que ela estava bem trancada antes de apertar aquele botão e levar o aparelho até a altura do rosto.

Quatro, cinco toques.

Provavelmente Sinbad estava no meio de uma reunião e não estava próximo ao aparelho.

Seis, sete toques.

Foi quando se lembrou das instruções de Yamuraiha. Ele poderia deixar uma mensagem a partir dali. E era o suficiente que seu rei tomasse conhecimento de que estava deixando Kou em completa segurança. Assim, com certeza, Sinbad seria tranquilizado quanto àquela viagem que o deixara tão preocupado.

— Sin, estou voltando e com uma grande surpresa! Deu tudo certo! Comporte-se bem e nada de ficar bebendo demais! … - o silêncio coincidia com a hesitação e o nervosismo que fizeram com que Ja’far apertasse mais o aparelho em suas mãos. - Eu te amo, Sin.

Com o rosto tomado pelo rubor, o conselheiro desligou. Sentia seu coração quase saltar pela boca. Por que havia dito aquilo? Como era estúpido! - ralhava consigo mesmo. Mas agora não tinha mais volta e… não podia negar que pôr para fora aquelas simples palavras havia lhe feito muito bem. E aquele bem-estar era refletido naquele sorriso que ele deixava escapar.

— Ja’far-sama!

Duas batidas à porta chamaram sua atenção e ele, rapidamente, pôs o ítem mágico por dentro de suas largas vestes antes de atender quem o chamava.

— Sim?

— Já está tudo pronto para sua partida. - a serva anunciou.

— Muito obrigado. - o conselheiro se curvou antes de deixar aqueles aposentos.

—------xxxxxxx-------

Seguiu até a entrada principal do palácio escoltado tanto por alguns soldados do Império, quanto pelos poucos guardas de Sindria que ainda permaneciam com ele, afinal, havia dispensado para que todos fossem diretamente para o navio preparar a partida. Ja’far tinha pressa em voltar para seu país e, segundo ele, não havia motivos para tanta segurança ao seu redor.

Lá estava a carruagem que havia sido preparada para o conselheiro.

Nenhum dos príncipes fora se despedir, afinal, já haviam o feito ao fim da reunião. Uma carruagem atrás os acompanharia e conduziria os guardas de seu país que o seguiriam junto de alguns outros soldados de Kou.

Ja’far, então, adentrou o veículo, que era levado por dois homens que conduziam um par de cavalos. Imediatamente ele se recostou em seu assento. Não entendia porque sentia tanto sono desde o almoço. Não faria mal algum fechar os olhos por um instante e descansar um pouco. Será que aquela única taça de vinho que havia bebido estava lhe deixando assim, sonolento?

Após mais ou menos quinze minutos, ele sentia o intenso sacolejar da carruagem. Abrindo os olhos vagarosamente, afastou um pouco a cortina da pequena abertura que havia como janela e reparou estarem em uma complicada descida. Uma área bastante verde, arborizada e com um grande vale além daquela estrada. Não haviam seguido aquele caminho na ida, Ja’far tinha certeza.

Então, olhando mais além, ele podia ver que seguiam na direção contrária à área residencial daquele Império e, por conseguinte, do porto. E ao avistá-lo, os olhos verdes se arregalaram ao ver as bandeiras de Sindria sendo devoradas pelas altas chamas que consumiam o grandioso navio que havia lhe trazido até ali. Desesperados, todos que faziam parte de sua caravana tentavam se salvar. Mesmo ao longe poderia ouvir aqueles gritos de agonia. O navio estava completamente tomado pelo fogo e já começava a naufragar. O que significava aquilo?

O-Oe! - ele tentou se levantar, por mais que a carruagem balançasse. - Oe, o que está...

Subitamente aquele balanço cessou e Ja’far se preparou para sair quando uma flecha invadiu a carruagem. O conselheiro viu a flecha se fixando na parede do interior daquele veículo, não o atingindo por míseros centímetros.

Foi numa atitude automática que ele afrouxou as linhas vermelhas de seus braços para empunhar as afiadas lâminas. Tinha de estar pronto para revidar aquele ataque.

— Será que o acertou? - ele ouvia um dos homens, do lado de fora da carruagem, perguntar.

— Pelo jeito que ele está demorando a sair...

Ja’far tinha de ser rápido. Não tinha noção do que encontraria ali e tudo passava tão rápido em sua mente que mal conseguia processar que, o dono daquela voz, era a mesmo do homem que conduzia os cavalos. Não era possível que…

— Enche essa merda de flechas que aí temos certeza de que ele morto! Kouen-sama vai ficar feliz, quem sabe até nos promove! - ele ria.

Os olhos se arregalaram ao ouvir o nome do primeiro príncipe. Então tudo que passara aqueles dias ali, toda aquela bondade e o tratado eram… uma mentira?

Ja’far balançou a cabeça negativamente, tentando desanuviar sua mente. Não era o momento de pensar naquilo. Tinha de voltar a incorporar o assassino frio que existia dentro de si para sobreviver. Estava mais do que claro o que estava acontecendo e lamentar, definitivamente, não salvaria sua vida.

O som da flecha forçando o arco ao máximo chamou sua atenção. Não tinha tempo para esperar. A única forma de saber de onde aquele guarda estava atirando era se guiando pela flecha que havia adentrado anteriormente a carruagem.

Foi em uma fração de segundo que Ja’far saltou, surgindo da fenda entre as cortinas que, até então, estavam fechadas e surpreendendo os dois soldados. Com o pouco que conseguiu ver, notou que sua intuição estava certa e o arqueiro estava exatamente a sua esquerda.  Não havia distância para soltar suas linhas, então naquele salto mesmo Ja’far tratou de cortar, na diagonal, o corpo daquele homem que urrou ao ter o peito aberto pela lâmina afiada, o arco e flecha caindo de suas mãos.

Tão surpreso ao ver seu amigo ser atingido tão inesperadamente, aquele que o acompanhava e trazia uma espada mal conseguia reagir, mas tentou acertar as costas do alvo, que imediatamente se virou e fincou a única lâmina do par, que ainda estava limpa, no peito do homem.

Ja’far se manteve alerta, mas acabou se esquecendo da carruagem que vinha atrás e, ao vê-la se aproximar, ele mal teve tempo de se preparar para atacá-la, se fosse necessário.

Foi surpreendendo por uma dor lancinante que atravessou sua perna direita. Desviou o olhar para baixo para confirmar que havia sido atingido em cheio por uma flecha.

Não havia tempo de pensar em tirá-la dali ou fugir. Da carruagem, já surgiam os dois soldados devidamente armados, novamente um com um arco-e-flecha e outro com uma espada.

Tsc... Miseráveis...

Ja’far precisava terminar aquilo rápido e ele teve mais certeza daquilo quando sua vista embaçou. Sentiu a força em suas pernas subitamente desaparecer, fazendo-o cair de joelhos, enquanto os dois se aproximavam, afastando-se da carruagem onde, pela lateral, o conselheiro podia ver, pendurados, os corpos dos guardas de Sindria que estavam lhe acompanhando.

— Como o príncipe Koumei disse, ele não ficaria mais lento só com o que colocaram na bebida! - o que trazia a espada e batia as costas da lâmina contra seu ombro ria.

— Agora não tem que se preocupar. - sua companhia já preparava outra flecha. - Depois do sossega-leão que ele levou agora, não vai mais dar um passo!

Era terrível assumir isso, mas aquele soldado estava certo.

Ja’far sentia suas pernas completamente dormentes, um intenso calor percorrer seu corpo.

Precisava avisar a Sinbad sobre aquela cilada, mas o artefato mágico estava na carruagem. E, infelizmente, no final das contas, seu rei estava certo. Mas mal tinha como se defender, mais uma vez sendo mira de uma flecha que lhe era apontada.

Não tinha saída. Com a pouca de força que sobrava em seus braços, arremessou as duas lâminas que passaram pela lateral de cada um dos soldados, que riram, ironizando o que, segundo eles, era a péssima mira de Ja’far.

! É esse o assassino perigoso que íamos enfrentar?

E enquanto um deles comentava, ele se surpreendeu quando ambos foram subitamente amarrados por aquelas linhas escarlate. Presos o suficiente para que não pudessem fazer nada em relação a suas armas, eles puderam contemplar o sorriso de vitória nos lábios de um enfraquecido Ja’far.

— Bararaq Sei!

E ao proferir aquelas palavras, os dois soldados foram atingidos com a forte descarga elétrica que percorria as armas do conselheiro de Sindria, ou melhor, do assassino, Ja’far.

Como havia feito com os guardas anteriores, ele havia se cuidado para não causar ferimentos fatais, mas agora podia respirar tranquilo. Precisava arranjar uma forma de contornar aquele veneno que o deixava cada vez mais atordoado, mas mal conseguia se arrastar, e foi o que ele fez, apoiando-se em seus cotovelos, seguindo em direção àquela carruagem onde estava sendo conduzido. Avisar a Sinbad o que estava acontecendo, encontrar os sobreviventes daquele ataque e se esconder até a ajuda chegar. Era tudo o que podia pensar, amaldiçoando a si mesmo por ter sido tão ingênuo.

Foi quando sentiu seu caminho ser interrompido e a dor em sua perna aumentar.

Ele gemeu e, confuso, olhou para trás para encontrar, talvez, a pior pessoa que poderia cruzar em seu caminho naquele momento.

Segurando aquela flecha que estava fincada na panturrilha do conselheiro de Sindria, ele abriu um largo sorriso. Ja’far pôde se ver refletir, naquela posição patética em que se encontrava, nos olhos rubros do magi.

— Eu bem que avisei que eles não seriam páreo para um franguinho tão teimoso como você!

Era como se Ja’far estivesse diante de seu pior pesadelo e, de fato, ele estava.

— Era isso que procurava?

Ja’far arregalou os olhos ao ver que ele tinha na mão livre o artefato mágico de Yamuraiha.

— Não pode...

— Acho que posso avisar, pessoalmente, ao seu rei idiota que… você vai morrer aqui e agora!


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Notas finais do capítulo

Por essa o Ja'far não esperava! E eu realmente queria ter andado mais esse capítulo, mas quando eu vi já estava enoooorme! Prometo que tentarei trazer capítulos menores, mas acaba que, para eu dar um bom embasamento nas coisas que irão acontecer, estou tendo que me prolongar um pouquinho! Me perdoem se ficou muito longo!
Confesso que está divertido trabalhar com esse Judal vidaloka! Espero que estejam gostando e lembrando que críticas, elogios, comentários SEMPRE são bem-vindos! Até o próximo capítulo, pessoal! ♥



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