Amy Tokisuru em Portland escrita por AJ


Capítulo 24
Capítulo 24 - Preso


Notas iniciais do capítulo

SURPRESAA



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JAU

Jau avistou Amy. Ela estava chorando. Jau odiava vê-la chorando. Com cautela, ele se aproximou dela e enxugou suas lágrimas delicadamente com as pontas dos dedos.

— Ei, o que foi? — ele perguntou, em tom sereno.

— O que eu vou fazer sem você? — ela respondeu, ainda chorando.

— Do que está falando, Amy? Eu estou bem aqui. — Jau a abraçou. Seu coração estava apertado e dolorido. Ele mal conseguia respirar.

— Você não pode morrer, por favor — Amy dizia, enquanto chorava no ombro do amigo.

— Amy, eu não entendo — ele disse, quase entrando em prantos também. — O que está acontecendo?

— Anda, acorda!

Então Jau acordou. Acordou em um lugar muito escuro e malcheiroso. Amy não estava mais ali. Fora apenas um sonho. Embora ainda estivesse com uma forte dor no peito. Dessa vez não era uma dor emocional, mas sim algo cem por cento físico, como se tivesse recebido uma facada.

Jau percebeu que estava em cima de uma cama, dentro de um quarto sem nenhuma iluminação. Aquilo não fazia sentido. Pelo o que lembrava, ele havia dormido junto de Amy na noite anterior, na floresta dos Rubis. Será que ele ainda estava sonhando? Se sim, parecia muito real.

Levantou-se e tentou procurar por uma saída. Depois de longos minutos apalpando as paredes do lugar escuro, ele finalmente tocou em algo frio e metálico, que provavelmente era a maçaneta de uma porta. Girou-a com cuidado e abriu a passagem. Logo, uma luz fraca e amarela que vinha do outro lado banhou o quarto onde Jau estava. Mesmo tênue, a luz machucou os olhos do garoto, fazendo com que ele colocasse a mão em frente as vistas.

Após se acostumar com a luminosidade, Jau deu uma olhada no novo local. Havia uma mesa de madeira escura encostada na parede, e uma cadeira ao lado dela, feita do mesmo material. Sobre a mesa, jaziam vários livros e uma vela em cima de um castiçal, aparentemente feito de cobre.

Cautelosamente, ele se aproximou da mesa, pegou um dos livros e começou a folheá-los. Haviam muitos textos escritos nele, mas Jau não conseguiu lê-los. Desde que acordara, sentiu que sua visão estava muito embaçada e dolorida. Fechou o livro e virou-se de costas. Então levou um susto.

Um senhor de mais ou menos cinquenta anos estava parado em sua frente, o encarando com insatisfação, e o pior, segurando uma faca.

— Então, você ainda está vivo, TR — o velho disse, deixando Jau ainda mais assustado. Por que diabos ele o chamara de TR?

— Do que está falando? — Jau respondeu, tentando manter a calma. — Ei, calma. Eu sou da paz.

— Não tente me enganar, TR. — O velho avançou alguns passos à frente, se aproximando cada vez mais de Jau com aquela faca afiada.

— Eu não sou esse tal TR, eu juro. — Jau queria recuar, mas estava encurralado pela mesa que tinha acabado de inspecionar. De alguma forma ele tinha que acalmar aquele velho maluco.

— Ah, claro. Você não é TR. Você é um garoto que está andando com um ferimento enorme no meio do tórax.

Jau lembrou-se da dor que estava sentindo no coração. Ele checou, passando a mão por cima de seu peito esquerdo. Ao levar sua mão de volta ao seu campo de visão, quase entrou em desespero. Havia muito sangue ali, e só agora ele tinha percebido. Mas, apesar de todos esses fatos, não havia nenhum grande ferimento como o velho descrevera. Seu tórax estava em perfeito estado.

— Ei, eu não tenho nenhum ferimento, olha. — Jau retirou sua camisa para que o homem armado acreditasse nele. — Viu? São só manchas de sangue. Sem ferimentos.

O velho olhou atentamente para o tórax de Jau, parecendo incrédulo. Ele abaixou a mão que segurava a faca e a deixou cair no chão, fazendo um som agudo de metal batendo em pedra lisa.

— Isso é impossível — disse, com a expressão mais assombrada que Jau já tinha visto. — Você está morto.

— Eu? Morto?!

O que aquele velho estava dizendo parecia loucura, mas era estranho... Jau era bom em saber quando as pessoas estavam mentindo, e ele diria que o velho não estava. As únicas explicações plausíveis eram: ou ele mentia muito bem, ou estava completamente louco.

— Qual a última coisa que você se lembra? — perguntou o velho, recuperando-se de seu espanto.

— Eu e a Amy na floresta dos Rubis — Jau chacoalhou a cabeça, confuso. Não era só isso. Tinha algo mais. Mas por alguma razão ele se sentia como se uma parte de sua memória tivesse sido arrancada de sua mente. Uma parte muito grande.

— Espera um pouco. — Jau vestiu novamente sua camisa. — Onde está a Amy? O que fez com ela?

— Escuta, rapaz. — O velho se aproximou de Jau e o tocou nos ombros. — Não precisa ter medo, tudo bem? Você deve se lembrar de mim. Eu cuidei de uma garota que você trouxe aqui há dois dias.

Só então Jau se deu conta. Ele não havia percebido antes pois sua visão ainda estava meio turva. Aquele era Berto. Um curandeiro que conhecera quando trouxera Anny, uma garota ferida, para que ele cuidasse dela.

— Eu me lembro agora — Jau respondeu, perdendo um pouco mais seu medo. — Mas eu não entendo. O que eu estou fazendo aqui?

Berto olhou para o rapaz com uma expressão de pena. Depois, puxou a cadeira que estava ao lado da mesa para a frente.

— É melhor se sentar.

Aflito, Jau aceitou o conselho de Berto e se sentou na cadeira, aguardando respostas.

— Preste muita atenção. — Berto olhou o garoto nos olhos. — Você foi possuído por um espírito maligno chamado TR. Ele usou o seu corpo para fazer coisas... coisas ruins.

Jau ouvia a tudo atentamente. Berto ainda o olhava nos olhos, um sinal de que ele provavelmente dizia a verdade, mas, sinceramente, Jau desejou que dessa vez estivesse errado.

— Enquanto TR usava seu corpo, uma pessoa, que achou que você era o vilão, acabou por enfiar uma adaga no seu peito. Então você morreu.

Loucura. Aquele velho só podia estar senil. Como alguém poderia morrer e depois voltar como se nada tivesse acontecido?

— Sei que é difícil de acreditar, mas por que eu inventaria uma história como essa para você? — Berto completou.

Jau fechou os olhos e respirou fundo. Ele não queria mais ouvir sobre aquelas histórias. Somente uma coisa importava.

— Onde está Amy? — ele repetiu a pergunta que havia feito antes.

Berto suspirou. Jau teve a impressão de que se estivesse em pé, o velho mandaria ele se sentar novamente.

— Sua amiga voltou para a Terra.

— Mentira. Amy nunca iria sem mim. — Jau cerrou os punhos, com raiva. Por que parecia tanto que Berto estava falando sério? Aquilo não podia ser sério.

— Ela achou que você estava morto. — Berto fez uma pausa antes de prosseguir. — Todos nós achamos.

Mais uma vez aquela história de que Jau estava morto. Ele começou a se enfurecer com isso. Contou até dez mentalmente e manteve sua respiração constante. Vagarosamente, ele falou:

— Tudo bem, então. Eu quero ir para a Terra. Eu vou atrás da Amy e explicar tudo.

Berto encarou o chão. O que poderia ser agora? Que tipo de mentiras ele iria contar de maneira tão verossímil dessa vez?

— Não há como voltar para a Terra. Não mais.

— Está vendo? — Jau sorriu, sem humor. — Se não há como voltar então como a Amy está lá?

— Não há como voltar porque foi ela quem pediu à Bart e Alice que não houvesse mais maneiras de viajar entre os mundos — Berto respondeu imediatamente. — Para garantir isso, o casal acompanhou Amy até a Terra. E é isso. Essa foi a última viagem dimensional. Você está preso em Portland para sempre.

Por quê? Por que aquele velho insistia tanto com aquelas mentiras?

Mas não era isso. Era Jau quem estava insistindo. Ele não queria acreditar que nunca mais voltaria a ver sua melhor amiga. Justo agora que eles estavam indo tão bem. Jau e Amy iriam voltar para a Terra, e ele então finalmente iria criar coragem para pedi-la em namoro...

— É mentira — ele balbuciou. — É MENTIRA.

Jau correu em direção à porta de saída da casa de Berto. Quando saiu, continuou correndo, sem rumo. Ele não se importava para onde estava indo, apenas queria correr para o mais longe que conseguisse, como se estivesse correndo também para longe de seus problemas.

Ele acelerou mais e mais. Correu até sair do vilarejo e adentrar na floresta. Como estava a noite, e sua visão muito embaçada, Jau tropeçou mais de uma vez. Mas sempre que caia, se levantava e voltava a correr. Após muitos minutos fazendo isso, ele não aguentou mais. Já estava sem fôlego. Seus membros inferiores estavam todos doloridos. Ele se apoiou numa árvore e curvou a coluna, para facilitar a respiração. Depois de recuperar as forças, sentou-se no chão usando a mesma árvore de antes como apoio. Então, começou a chorar. Aquilo não era um sonho. Era real. Ele realmente nunca mais voltaria a ver Amy. Afundou sua cabeça entre os joelhos e chorou por muito, muito tempo.

Quando não tinha mais lágrimas para derramar, ergueu sua cabeça e tentou avistar a floresta. Infelizmente, Jau estava praticamente cego ali. Como Portland não possuía uma lua e muito menos estrelas, enxergar qualquer coisa ali seria um desafio, mesmo para alguém com visão perfeita. Aquele lugar... aquele planeta era horrível. Jau não iria conseguir viver ali. Ia acabar enlouquecendo.

Pegou uma pedra no chão e a jogou longe para frente. Entretanto, estranhamente ele não conseguiu ouvir a pedra batendo no chão ou em qualquer outra coisa. Com cautela, Jau se levantou e andou alguns passos para frente. Catou outra rocha do chão e a jogou mais uma vez, mais fraco que anteriormente.

Dessa vez ele pôde ouvi-la, mas num volume muito baixo, como se ela tivesse caído em um lugar muito fundo. Jau atirara algumas outras só para garantir, até que teve certeza. Definitivamente tinha uma espécie de precipício ou penhasco há poucos metros dali. Se Jau não tivesse parado de correr...

Talvez aquilo fosse um sinal. Era exatamente nisso que estava pensando. Ele nunca mais voltaria a ver Amy. A maior parte de sua memória passada foi apagada de sua mente. Não se lembrava de quase nada além de sua melhor amiga. Tudo estava perdido. Teria que ficar para sempre em Portland, o lugar mais assustador e perigoso que poderia existir. Tinha algum motivo para ele continuar vivendo?

Com cuidado, ele avançou em direção à queda. Mesmo sem enxergar, ele sabia que estava perto. A julgar pelo tempo que as pedras demoravam para chegar ao chão, o penhasco devia ter no mínimo uns dez metros de altura. Se ele caísse, seria o fim de sua vida, definitivamente.

— Então quer acabar com sua vida também?

Jau levou um susto. Ele olhou para os arredores tentando avistar pelo menos o vulto da pessoa que acabara de dizer aquilo. A voz era feminina e rouca e, de certa forma, familiar.

— Quem está aí? — ele gritou, nervoso.

— Já nos vimos antes. Você deve reconhecer minha voz.

O vento soprou mais forte. Jau entendera o significado daquilo.

— Sofia.

Após procurar mais um pouco, ele finalmente conseguiu focar no vulto da garota. Sofia estava sentada e, se Jau não estivesse enganado, ela estava sentada à beira do precipício.

Sofia... Fora aquela mulher que trouxera ele e Amy para Portland contra a vontade deles. Era tudo culpa dela. Ela estava à beira de uma queda mortal de dez metros. Bastava um empurrãozinho de Jau e então...

Não. Jau não era um assassino frio. Bem, ele matara Jake. Mas foi diferente. Jake estava prestes a matar Amy. Tudo o que Jau fizera foi salvar a vida dela.

— Por que ainda está aqui? — Sofia perguntou. — Achei que já estaria na Terra a essa altura, junto de sua amiguinha.

— Mas não estou — Jau respondeu, secamente. — Tudo isso graças a você.

— Eu sei. — Sofia disse, indiferente. — Eu sou uma pessoa terrível. — A voz de Sofia estava diferente de quando Jau a conhecera. Parecia mais pesarosa.

— Eu vim aqui para acabar com tudo — ela continuou —, mas sempre que eu estou prestes a bater no chão, uma onda de medo toma conta de mim e eu controlo os ventos para me trazer de volta ao topo. — Ela sorriu sem humor algum. — Olha só para mim. Sou uma inútil. Não consigo tirar nem a minha própria vida.

Então Sofia fora até ali para cometer suicídio, a mesma coisa que Jau estava pretendendo fazer. Mas quais seriam os motivos para ela fazer isso? Foi exatamente isso o que ele perguntou.

— Eu perdi alguém — ela respondeu. — A única pessoa com quem eu realmente me importava. — Sofia suspirou. — E você? Por que está aqui?

Com todo o cuidado, Jau se abaixou e sentou-se à beira do precipício também, alguns centímetros afastado de Sofia.

— Amy foi embora — disse. — Ela foi para a Terra sem mim.

— Sério? Então ela te largou? — Sofia balançava as pernas enquanto conversava. Obviamente ela não tinha nem um pouco de medo, afinal, mesmo que ela caísse, como ela já disse que tinha feito, controlaria os ventos para que a salvassem de uma queda mortal.

— Um espírito chamado TR possuiu meu corpo, então... Coisas ruins aconteceram. — Foi tudo o que Jau disse. Não precisava dar detalhes, até porque nem mesmo ele sabia desses detalhes. Sabia somente o que Berto havia lhe contado.

— Entendo. TR é um monstro. Tudo o que ele toca se transforma numa desgraça.

Jau pensou no que Sofia disse. Talvez TR também fosse o motivo da perda dela. Aquele espírito que ele nem sequer conhecia fora o motivo de tanta dor e sofrimento de pessoas que de certa forma estavam interligadas.

— Bem. Acho que vou embora. — Sofia se levantou. — Sugiro que pense bem antes de pular. Se amarelar no meio do caminho, não vai ter os ventos para te salvar.

— Eu não teria nada a perder — Jau respondeu, com tristeza.

— Tem certeza? Pelo menos você sabe que sua amiga está viva e está em casa. — Sofia já tinha virado as costas, mas continuou falando. — Se eu fosse você, faria de tudo para ver ela mais uma vez.

Jau refletiu sobre aquilo. Sofia tinha razão. Amy não estava morta. Muito pelo contrário. Ela estava na Terra, provavelmente feliz por ter reencontrado seu pai e retomado sua vida normal. Não valia a pena ficar se lamentando por isso. Jau se sentiu um estúpido por cogitar tirar a própria vida por causa disso.

Rapidamente, ele se levantou e sacudiu a poeira de suas calças.

— Muito obrigado, Sofia.

Então a garota continuou andando, até que Jau não pudesse mais ver o seu vulto.

De uma coisa ele tinha certeza. No tempo em que ficasse em Portland, Jau iria encontrar, de algum jeito, uma forma de voltar para casa. Não importava quanto tempo demorasse, ele iria conseguir. Ele ainda veria Amy mais uma vez.


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Notas finais do capítulo

Agora acabou -qq
Vai ter segunda temporada ~wee
Vou tentar postar o primeiro cap dela já amanhã
Espero ver todos que acompanharam a história até aqui por lá também >.



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