Amy Tokisuru em Portland escrita por AJ


Capítulo 1
Capítulo 1 - Efeito Colateral


Notas iniciais do capítulo

Olá gente. Primeiro capítulo de uma história que eu escrevi faz um tempo e finalmente criei coragem pra postar. Espero que curtam!



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AMY

Amy acordou de um sonho estranho. O despertador alto de seu celular fez ela se levantar abruptamente. Tentou se lembrar sobre o que estava sonhando, mas não conseguiu. Aquilo a enfureceu. De repente, a vela que estava sobre o criado-mudo ao lado de sua cama começou a pegar fogo. Amy a havia deixado lá na noite passada graças à queda de luz, causada por um raio de uma tempestade.

— Que droga. — Ela aproximou seus lábios da vela e soprou as chamas, fazendo com que elas se apagassem.

Não bastaram dois segundos e a vela voltou a se acender. Dessa vez, o fogo estava mais alto e mais intenso.

— O quê? — Ela tentou evitar entrar em pânico e apagou a vela novamente.

Porém foi inútil. O pavio do objeto de cera entrou em combustão mais uma vez, fazendo Amy ficar realmente irritada.

— Tudo bem então. — Ela não soprou o fogo de novo. Ao invés disso, olhou com intensidade para a pequena fonte de energia.

De início, nada aconteceu, mas conforme Amy ia ficando mais concentrada, o fogo ia diminuindo seu tamanho, até se extinguir completamente. Respirou aliviada e voltou a se deitar. No entanto, lembrou-se de que já estava na hora de trocar de roupa e ir para o colégio.

Levantou-se preguiçosamente e foi ao banheiro do lado de seu quarto. Lavou o rosto e se olhou no espelho. Percebeu que os orbes de seus olhos estavam com um tom de azul mais escuro que de costume, e que em seu cabelo castanho-escuro despenteado havia uma mecha de fios ruivos.

— E essa agora? — Amy pegou a mecha e a inspecionou. Apesar da estranha coloração, parecia apenas cabelo comum.

Deve ser algum efeito colateral dos meus poderes. Este pensamento a afligiu. Se seu cabelo estava reagindo às suas habilidades, então seu corpo também poderia estar sofrendo mutações. Amy poderia dormir numa noite e amanhecer com a pele vermelha e escamosa, ficando mais parecida com um dragão do que com um ser humano.

Ela despiu seu pijama cinza-claro e verificou sua pele branca e macia. Não havia nada de estranho nele, deixando-a um pouco mais aliviada. Logo após isso, entrou debaixo do chuveiro e ligou o registro. A água estava bem quente, do jeito que ela gostava — o que significava que a energia já havia voltado.

Após o banho, voltou para o seu quarto, enrolada numa toalha de cor azul-claro e pegou o uniforme escolar do guarda-roupa, que era pequeno. Amy não via motivos para ter um guarda-roupa grande já que não tinha muitas roupas e não era muito de sair para fazer compras. Ela possuía apenas o necessário. Seu quarto também não era muito espaçoso. Cabia apenas sua cama, seu guarda-roupa e o criado-mudo onde guardava seus livros escolares.

O uniforme da escola consistia em uma camisa branca com detalhes azuis nas mangas, e uma calça jeans escura. Vestiu-se em pouco tempo e já estava pronta para sair.

Antes de ir embora, Amy foi verificar se seu pai já havia acordado. Abriu a porta de seu quarto cuidadosamente e viu que a cama dele estava vazia e arrumada, o que era estranho. Será que ele não dormiu em casa? Ela tentou afastar esse pensamento por hora e saiu de casa, pois já estava alguns minutos atrasada.

O caminho não era extenso, e o clima nesta manhã estava bastante agradável. Nem parecia que havia chovido no dia anterior.  O vento batia no rosto de Amy e a refrescava. Apesar de preferir o calor, aquela sensação de friozinho a fazia relaxar e esquecer todos os seus problemas. O caminho já estava quase seco, então ela não teve problema com as poças d’água que poderiam sujar os seus sapatos.

Na metade do caminho ela passava pelas docas. Vários homens musculosos e com barbas malfeitas já estavam acordados e trabalhando duro, descarregando containers dos barcos que chegavam periodicamente. Amy podia ouvir os seus murmúrios de longe. Coisas como “cuidado com essa mercadoria”, ou “pare de olhar para o vento e volte ao trabalho”. Todas as embarcações navegavam no rio Glacial, chamado assim porque quando chegava o inverno, suas águas ficavam tão gélidas que era quase impossível para um ser humano nadar ali sem morrer congelado.

Após passar pelas docas, Amy geralmente se encontrava com seu melhor amigo. Ele morava por aquelas redondezas e esperava ela chegar para lhe fazer companhia. Neste dia não foi diferente. Lá estava Jau, olhando para ela sempre com um sorriso no rosto. Ele era um pouco mais alto que Amy, tinha cabelos negros e olhos castanho-escuros. Ela tinha quase certeza de que Jau gostava dela mais do que como amiga, mas tentava ignorar isto. Não queria pensar em ter namorados até concluir o ensino médio e entrar na faculdade.

— Ei, você demorou hoje, hein? — ele brincou, assim que Amy chegou perto o suficiente para ouvi-lo.

— Não exagera. — Ela se aproximou mais do amigo e olhou nos arredores para verificar se alguém poderia estar escutando. — Não sabe que manhã estranha eu tive hoje.

Amy contou a Jau sobre a vela que insistia em ficar acesa, e sobre a mecha ruiva no seu cabelo que aparecera de repente.

— Ei, até que não ficou tão mal — Jau elogiou.

— Cara! Estou falando sério. — Amy deu um soco de leve no ombro do amigo. — E se o que eu temia estiver acontecendo? E se eu... estiver me transformando num monstro?

— Amy, ninguém vai te achar um monstro por ter uma mecha ruiva. No máximo vão pensar que você virou punk.

— Não estou falando da mecha. — Ela pegou os fios que estavam ruivos e tentou escondê-los no resto do cabelo castanho. — Estou falando da vela. Ela acendeu sem eu querer, o que significa que estou perdendo o controle da coisa.

— Foi só uma vela — ele falou naturalmente, tentando acalmá-la. — E você mesmo disse que estava estressada essa manhã. Deve ter sido por isso.

— Talvez, mas não quero acordar um dia e ver que incendiei meu quarto ou... A casa inteira. E o pior, posso até machucar o meu pai... — Amy então se lembrou de contar uma coisa. — Falando nele, meu pai não estava em casa esta manhã.

— Sério? Ele não acorda só mais tarde para trabalhar?

— Sim. E se ele dormiu fora de casa essa noite?

— Caramba. — Jau sorriu de leve. — Se ele dormiu fora, a noite dele deve ter sido muito boa.

— Jau! — Amy socou o ombro dele de novo, dessa vez mais forte que anteriormente, fazendo o garoto soltar um gemido de dor.

No entanto, a ideia de que seu pai pudesse ter alguém especial deixava Amy contente. Ele nunca saia com mulheres e nem apresentava namoradas. Ela pensou que, por causa do acidente que matou sua mãe pouco depois de ela nascer, seu pai havia ficado com medo de começar novas relações.

— Enfim — Jau continuou. — Você já contou para ele que tem esse negócio com o fogo?

— Mas é claro que não. Imagina só qual seria a reação dele. — Amy teve calafrios só de pensar em seu pai a chamando de monstro e pedindo para ela ficar longe.

— Amy, ele é seu pai. Ele ama você. Além disso, eu sou o único que sabe o seu segredo e nem por isso te acho uma mutante assustadora.

— Pode ser, mas com você foi diferente. Você praticamente me flagrou quando eu usei os meus poderes pela primeira vez.

Amy lembrava-se como se fosse ontem. Mesmo tendo apenas cinco anos ela se lembrou de estar brincando na pracinha do seu bairro, que estava bem vazio na hora.

De súbito e indefinidamente, ela se viu em um flashback.

Amy estava correndo pelo gramado da praça central, perseguindo uma abelha enquanto gargalhava, até que o inseto pousou em seu indicador e o picou. Uma pequena onda de dor se espalhou pelo dedo. Ajoelhando-se e com lágrimas nos olhos, Amy inspecionou a ponta de seu indicador. Estava vermelho e começando a ficar um pouco inchado.

— Abelha boba! — ela gritou, zangada.

De repente, uma pequena chama tomou conta de seu dedo. A garotinha deixou escapar um gritinho agudo, apavorada, e chacoalhou sua mão desesperadamente, mas o fogo não se extinguiu. Então ela percebeu que aquilo não a estava incomodando. A chama não estava lhe machucando. Ficou olhando fascinada para o seu dedo por alguns segundos enquanto o fogo diminuía até desaparecer.

— Ei, isso foi legal. — A voz repentina a espantou tanto que Amy perdeu o equilíbrio e caiu de barriga ao chão.

— Ai... — Ela virou-se desajeitada, e viu o rosto sorridente de um menino, que não devia ser muito mais velho que ela.

— Me desculpe por assustar você. — O menino então estendeu a mão para ajudar Amy a se levantar. Ela não teve muita escolha senão aceitar a ajuda.

— Ei, como você fez aquilo? — ele perguntou, referindo-se ao fogo que apareceu do nada no dedo de Amy minutos atrás.

— Eu não... eu não... — Amy olhou desconcertada para o garoto. Nem mesmo ela sabia como havia feito aquilo.

— Não precisa se preocupar. Seu segredo está seguro comigo. — O menino estendeu a mão para Amy de novo, desta vez para um aperto amigável. — Meu nome é Jaden, mas pode me chamar de Jau. E você? Como se chama?

— Amy... — ela respondeu, mas não estendeu a mão para apertar a mão do garoto. Mesmo que ela já o tivesse tocado antes e nada tivesse acontecido, Amy ainda tinha receio de que o fogo aparecesse novamente e isso acabasse machucando o garoto.

— Ah, certo. — Jau coçou a cabeça, um pouco constrangido. — Está com medo de me queimar, não é? Não precisa. O fogo só vai aparecer quando você estiver nervosa.

— Como você sabe? — Amy perguntou, olhando para o garoto com dúvida.

— Ah, eu...

— Amy! — um homem adulto chamou, gritando. Era o pai de Amy, Thomas Tokisuru. Ele a estava esperando um pouco mais afastado, sentado em um dos bancos da praça. — Vamos querida.

— É o meu pai — ela disse a Jau. — Eu tenho que ir.

— Certo. Prazer em te conhecer Amy. Até logo!

Então Amy correu em direção a Thomas, que se levantou e a pegou no colo. Ela olhou para Jau mais uma vez antes de ir, com a cabeça repousada sobre o ombro de seu pai, e conseguiu esboçar um sorriso. Ele havia segurado sua mão sem ter medo do que acabara de ver.

— Amy, você está me ouvindo? — o Jau do presente a chamou.

Amy ficou tão perdida em pensamentos que nem notou que eles estavam quase chegando na escola.

— O quê? — ela perguntou, chacoalhando a cabeça para colocá-la no lugar.

— Está tudo bem?

— Está sim. Não se preocupa. — Amy sorriu de leve. — Vamos. A aula vai começar daqui a pouco.

Assim que chegaram ao colégio, já entraram e se dirigiram à sala deles. Antes de Amy entrar, foi empurrada de leve para o lado por um garoto do time de futebol da escola. Seu nome era Miller.

— Cabelo legal, Tokisuru. Resolveu virar punk? — ele disse, antes de entrar na sala, sorrindo desdenhosamente.

Então Amy percebeu que a mecha ruiva que ela se esforçara tanto para camuflar estava à mostra outra vez.

— Droga — Amy resmungou, tentando esconder os cabelos vermelhos novamente.

— Viu? — Jau sorriu também. — O que foi que eu falei?

As aulas, como sempre, foram entediantes. A professora de biologia falava em um tom baixo e suave, fazendo com que vários alunos bocejassem ou até mesmo dormissem na carteira. Já o professor de filosofia explicava muito rápido e às vezes falava cuspindo — para o azar de Amy, já que ela se sentava na frente. A última aula foi vaga, o que dava aos alunos a oportunidade de saírem cinquenta minutos mais cedo daquele lugar deprimente. Era tudo o que Amy precisava para se sentir melhor num dia que até agora estava sendo uma droga. No entanto, sua felicidade não durou muito tempo. Uma monitora do colégio passou em sua sala e disse que a diretora queria falar com Amy Tokisuru.

— Droga — ela murmurou para Jau. — O que foi que eu fiz?

— Ei, relaxa. — Jau se levantou e colocou a mochila nas costas. — Eu vou esperar você na saída, certo?

Amy assentiu, pegou sua bolsa também e se dirigiu para a sala da diretora do colégio, que ficava no fim do corredor. A porta estava entreaberta, então ela entrou sem bater. A diretora estava sentada, organizando alguns papéis, mas parou assim que viu Amy entrar.

— Diretora Cristina, a senhora quer falar comigo? — a jovem perguntou, educadamente.

— Sim, senhorita Tokisuru. — Cristina levantou-se da cadeira para apertar a mão da aluna.

A mulher aparentava ter uns trinta e oito anos. Era alta, mais ou menos um metro e setenta e cinco. Sua pele era escura e tinha sempre uma postura ereta.

Amy estendeu sua mão também para apertar a de Cristina.

— Por favor, sente-se — a diretora pediu, e Amy obedeceu, mas Cristina continuou de pé, pegando as folhas que estavam em sua mesa e guardando-as em um armário. — Desculpe-me pela bagunça. No final do ano letivo o meu trabalho triplica e às vezes não dá tempo de arrumar tudo com tanta coisa para resolver.

— Está tudo bem — Amy respondeu, tentando não parecer indiferente. — Diretora, eu fiz alguma coisa de errado? — ela perguntou enfim.

— Ah, não, querida. — Cristina sentou-se.

Amy então notou que alguma coisa estava errada. Além de a diretora não chamar as pessoas de “querida” normalmente, ela estava com um semblante triste.

— Eu chamei você até aqui — ela continuou — porque tenho uma notícia para dar a você. Uma notícia ruim.

Eu sabia, Amy pensou. Ela começou a suar frio, e olhou para a diretora com um pouco de ansiedade e de pavor.

— É sobre o seu pai, Amy — a diretora disse enfim. — Houve um acidente e ele está no hospital.

Então Amy pensou que o seu dia não poderia piorar.


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Notas finais do capítulo

Obrigado a você que leu até aqui! Lembre-se de que todo comentário, crítica, sugestão ou outros são bem-vindos. Próximo capítulo sairá em breve. Até mais!



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