Torna-te Minha Rainha escrita por kalliope


Capítulo 9
CAPÍTULO VIII {Quinze Minutos}




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Fazia muito frio naquele fim de tarde. Por sorte, Aimee Holder possuía variadas opções de roupas — aquelas que foram gentilmente doadas pela princesa Rakel. Vestiu, por fim, um sobretudo de cores amadeiradas, com uma saia preta e uma meia-calça de lã. Ela sentia-se agraciada pela generosidade de Rakel, mas sabia que faria pano de chão daquelas vestes caríssimas e usaria os vestidos dela para uma bela fogueira de comemoração.

Naquele estratégico momento, com a visão mais aberta e o coração longe de armadilhas amorosas — exceto o cachecol escondido de Edward, Aimee se via milhões de anos luz a frente de seus sonhos. E foi com esse pensamento que ela se dirigiu até Rakel com uma bandeja de chá. Seu trabalho ainda era costurar, porém, fazia toda questão de estar sempre próxima da princesa pretendente ao trono.

"Pretendente" — repetia para si mesma. "Não significa que vá conseguir".

—  Querida, você está linda! — exclamou Rakel na mesma hora em que Aimee adentrou seu aposento.

— Graças a você, princesa. — Aimee estava com uma mansidão falsa estampada em seu rosto. Lutava contra a tentação de virar o bule de água fervente na cabeça dela enquanto a servia. — Como foi seu dia? – perguntou esporadicamente, ao terminar de servir o chá.

Rakel desabafou as peculiaridades de sua manhã e contou sobre sua tarde relaxante. Ao fim, fez questão de esmiuçar sua ansiedade em ser rainha ao lado de Edward. Aimee quase não pode resistir a seu impulso de derramar aquela água e vê-la se retorcer de dor.

— O que você me diz? Será que ele vai gostar de mim? — ponderou Rakel.

Aimee segurou as mãos dela e olhou em seus olhos azuis com firmeza e doçura.

— Eu tenho certeza que Edward irá te amar. Vocês serão muito felizes juntos — votou Aimee.

Emocionada como nunca, Rakel a abraçou forte.

— Quando eu estava pronta para partir à Londres, nem sequer minha mãe chegou a me oferecer tanto carinho e segurança — de coração, confessou. — Muitíssimo obrigada, minha querida.

— Tenho imenso prazer em poder apoia-la no que for, minha princesa ­— blefou.

Radiantes, como amigas de longa data, as duas se levantaram de onde estavam. Aimee, como vã serviçal que sempre foi, simplesmente pegou a bandeja e andou em direção à porta. Antes que saísse de fato, Rakel a inquiriu de forma simpática.

— Como é mesmo seu nome, querida? Eu ainda não sei.

— Lizzie Harper, senhorita — mentiu.

E, como sempre, Aimee Holder obteve sucesso em seu perfeito disfarce — às custas de uma morta. A pobre menina Harper.

Bem lá no fundo, Aimee até que gostava da princesa Rakel, mas sabia que aquela norueguesa adocicada tinha que morrer, caso contrário, ela a atrapalharia diretamente seu objetivo de se tornar a nova rainha da Inglaterra.

Os dias que se passaram após aquele foram tediosamente iguais. Rakel cada vez mais se abria à presença de sua nova melhor amiga, "Lizzie Harper", e ela, por sua vez, demonstrava grande afeto e boa disposição em ajudar, atitude que ganhou a confiança da princesa.

Numa chuvosa tarde de sexta-feira, Aimee se encontrava sentada em uma poltrona mogno desconfortável demais para seus quadris esguios. Pensativa, ela observava os pingos de chuva caindo na grama verde-limão do jardim bem cuidado. Eram 14:45pm. Dentro de exatamente quinze minutos, a princesa Rakel entraria em sua majestosa banheira para o banho das 15pm, e Aimee sabia disso. Ela sabia tudo sobre Rakel, desde seus horários de banho à sua paleta de sombras favorita.

— E agora... mais nove minutos — sentenciou Aimee, após verificar seu relógio de pulso.

Nove minutos. Era o que restava de vida à jovem Rakel que, àquele momento, assistia a sua empregada preparar seu banho com todo o esmero.

Quando seis minutos se passaram, Aimee levantou-se daquela poltrona e começou sua caminhada até a suíte de Rakel, o que durou, no máximo, dois minutos...

Um minuto. E era todo o tempo de que ela precisava.

— O que você está fazendo aqui?! — espantou-se Rakel, inutilmente cobrindo seu corpo desnudo com as palmas das mãos.

Aimee tinha um olhar frio e calculista. Sua respiração estava controlada. Com uma mão, ela segurou o queixo trêmulo da moça na banheira, e com a outra, empurrou o topo de sua cabeça para baixo d’água, utilizando-se de toda a força que tinha. Descontou todo o ódio concentrado que existia dentro de si naquele bonito rostinho norueguês. Sentiu um culpado prazer ao vê-la se debater.

Cinquenta e oito segundos. Foi o tempo suficiente para fazer com que os pulmões da princesa se enchessem de água. Em dois segundos, Aimee inspirou e expirou um ar de contentamento enquanto seus olhos contemplavam aquela majestosa banheira. O corpo de Rakel agora estava plácido, assim como as águas que o cobriam. Tudo quieto e sem vida.

— Nada pessoal. É que você ficou no meu caminho. Não pude evitar... — explicou-se Aimee ao corpo na banheira.

Após aquilo, ela foi-se pelo corredor do Palácio. Um pequeno rastro de água a seguia, culpa de Rakel, que tanto se debateu antes de morrer, espalhando água por todo lado.

The night is black and I am blue, that’s why I am whisteling in the dark... — cantarolou Aimee enquanto ouvia os gritos e o alvoroço vindos da suíte da princesa.

Aimee Holder ria ao ver os inúteis esforços da guarda do Palácio em aumentar a segurança e a vigilância. Mal sabiam eles que a responsável por aquela sucessão de mortes assustadora estava bem embaixo do nariz britânico deles. Uma simples garota de Dartmoor, magrinha e de adoráveis olhos verdes.

Edward VIII voltou à sua amada Londres dois dias depois do trágico ocorrido. Faixas e homenagens fúnebres ainda estavam sendo levantadas por toda a cidade e, principalmente, na Noruega. A nação de Rakel estava mergulhada num respeitoso luto.

A paixão que aflorou no peito de Aimee quando ouviu a notícia da volta de Edward foi sufocada pelos seguintes pensamentos:

"Ele com certeza caiu de amores por alguma nova-iorquina de corpo curvilíneo e lábios vermelhos".

"Se não se encantou com qualquer americana, então deve estar de luto por Rakel".

...

"Ele não vai notar a existência de uma mísera costureira".


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