Uma bela coincidência escrita por irritabiliz0u


Capítulo 13
13 - Ela




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Acordo sem saber onde estou. Olho pela primeira janela que encontro e é de noite, e depois me dou conta que é o quarto de Rafael. Ele está deitado na cama mas de posição oposta.

E aí que vem as memórias da manhã. Depois que ele me bateu, mesmo que sem intenção, as coisas que mais tento e me forço a esquecer virem a mente. Épocas negras da minha vida que eu era agredida e perdi o que mais era importante à mim. Me levanto lentamente mas acabo tropeçando em um dos seus livros fazendo barulho e Rafael acorda.

—Catherine? – merda.

—Oi.

—Oi. – ele se levanta e me olha sem saber o que fazer. Estava dormindo também, aparentemente.

—Então... me desculpa?

—Sim – concordo com a cabeça, perdoa-lo ou não, isso é um dos meus menores problemas agora – tenho que ir embora... desculpa...

—Não Catherine.... Me conta o que te assombrou tanto.

—Não é nada.

—Catherine você ficou em modo catatônico, sim algo te assombrou. – Reviro os olhos voltando para a ponta da cama sem olha-lo. Nesse meio tempo avalio se conto ou não o que aconteceu.

Rafael me contou o que mais assombra sua consciência. Não digo que o meu foi pior, por que ele se culpa do que aconteceu, mas foi anos pós ano acontecendo e todos fechavam os olhos para o que passava como um filme na sua frente.

—Quando eu estava na Europa era agredida pelo meu padrasto. Satisfeito? Todas as segundas, quartas e sextas ele voltava do trabalho e me prendia no quarto, me dando chicotadas com o cinto. Só nunca abusou de mim, porque eu falei que se ele tirasse minha virgindade eu matava ele, tanto que já tentei. No dia que... Enfim, tento deixar essas coisas dispersas na minha memória como se não fosse nada por mais que seja muito mais que apenas parece, então quando você pegou e bateu no meu rosto... tudo veio à tona.

Como eu expeli essas palavras eu não faço ideia, mas foi tão fácil dizer a ele tudo, ou pelo menos uma parte, do que eu guardava apenas para meu coração, minha mente. Escondia esses indícios, como se de algum modo, se as pessoas não percebessem eu também não perceberia.

—Catherine... Eu sinto muito não deveria ter feito aquilo... Não sei o que dizer.

—Não precisa falar nada Rafa, eu só... – coloco as mãos no rosto – Nunca falei isso à ninguém e você não sabe como é um alívio mais alguém saber. – sem eu perceber, mas ele se levanta e me abraça, como se quisesse me confortar, ser um abrigo. Bem estranho da parte dele.

Ele

Por que caralho eu estou fazendo isso não tenho ideia, mas só achei que a machucada Catherine precisasse de um abraço. Sei que nesse momento ela chora baixinho, por mais que queira parecer forte, é um vidro.

Uma fragrância adocicada semelhante ao champanhe invadiu minhas narinas e foi logo que descobri que o cheiro pertencia às suas belas mechas douradas. Seu corpo pequeno em comparação ao meu se encaixa de forma tão decadente que me dá vontade de passar o dia dessa forma.

Nesse momento esqueço de todos os meus problemas e concentro os de Catherine na minha mente. O que esse canalha fazia com ela é imperdoável, e agora eu nem me comparo com sua força. Como ela conseguia ser tão forte, colocar um sorriso no rosto e ter todas essas memórias? Eu tento superar há dois anos e sempre recorro para as piores formas de conforto.

Ela

Estranho da parte dele, mas uma sensação boa em mim. Foram anos chegando em casa com medo do que aconteceria, com medo de não saber se amanhã eu ainda estaria viva, ou podendo me locomover.

Uma das piores sensações, que hoje entendo perfeitamente das pessoas suicidas, é sua alma se encontrar toda despedaçada como se qualquer um chegasse e pisasse nela, rasgasse com os dentes e deixasse de qualquer maneira jogada, e na frente das pessoas ter que falar: Está tudo bem. Separo meu corpo do de Rafael depois de alguns momentos e enxugo as lágrimas.

As pessoas que tentam se matar, que se matam, não querem tirar a vida. Querem tirar o sofrimento, o arrependimento, a desgraça que se faz abundante em algo que é miseravelmente raso, e confesso que muitas vezes já quis entrar nesse grupo.

Depois de perder o chão que me deixava em pé, mas ao mesmo tempo me faia flutuar alguns meses atrás, não sei como sobrevivi. Ainda tenho as cicatrizes que poucas pessoas já viram tanto externamente como internamente. O pior que Rafael foi a pessoa para quem mais me expus. E esses meses que trabalho para ele, com várias pessoas transitando por aqui pude perceber que elas fazem o que eu fazia, escondem o desgosto com um sorriso. Confesso que foi mais fácil voltar para São Paulo, onde tenho boas memórias, e esquecer o que aconteceu em Londres, ou pelo menos enterrar na minha cabeça.

—Tenho que ir mesmo... Vivian deve estar arrancando os cabelos.

—Eu falei com ela Catherine.

—Você o quê?

—Ela ligava sem parar que nem uma doida, depois que disse que você estava dormindo na cama daqui de casa ela relaxou mais e mandou você aproveitar.

—Essa menina é muito idiota – coloco as mãos no rosto, minha autoestima se eleva mais e rio fraco – Ainda assim, não quero te atrapalhar – desço as escadas me explicando – eu nem devia estar aqui – chego ao fim da escada – eu não vou te denunciar nem nada...

—Você não me atrapalha menina.

—Claro que atrapalho, essa é a sua casa. Não a minha – quero sair daqui logo, cadê meu celular?

—Cala a boca Catherine - Uma voz rouca diz milésimos de segundos antes de meu corpo girar em sua direção encostando os dois, consigo sentir daqui o cheiro de menta do seu hálito e o perfume forte masculino que insiste em usar para tudo. Minha respiração está descompassada e as pedras verdes perdidas nos meus lábios, e algum momento que não me recordo sua boca encontra a minha, como se quisesse deixar o gosto marcado em cada centímetros, principalmente a sensação do piercing frio contra nossa pele quente. Suas mãos descem para as minhas costas e meu pescoço e eu consigo alcançar para o pescoço.

O que está acontecendo aqui? Ainda bem que ele não me prometeu que nunca iria tentar me beijar, pois se tivesse feito isso seria a pessoa que menos tem palavra aqui. Ele me avisou pelo menos, e eu tô pouco me importando com isso.


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Notas finais do capítulo

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