O Grande Inverno da Rússia escrita por BadWolf


Capítulo 40
Uma Parada Não Programada


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal!!


Finalmente saiu o cap dessa semana.
Boa leitura!



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Holmes esticou os braços, mais uma vez. O balanço daquele trem com destino aos Montes Urais, precisamente Ecaterimburgo, o fazia sonolento. O frio acentuava seu cansaço. Já estava a alguns dias viajando, graças a problemas ferroviários provocados pela nevasca. Ouvira entre um ou outro passageiro o quão ruim era viajar sob tamanha neve a cair sem parar, mas o detetive sabia que não poderia se dar ao luxo de esperar o inverno passar.

Era meio de tarde quando os olhos cinzentos de Holmes se voltaram mais uma vez para a janela. Rios, florestas e pequeninos casebres de madeira despontavam pela paisagem repleta de neve.

Grigori estava sentado no outro banco de sua cabine. Parecia ter achado algo interessante no pequeno relógio de bolso que o detetive comprara para ele, mas Holmes sabia que seu interesse ali era um mero desviar de seu foco de algo que o aborrecia. Aquela viagem, por exemplo. Desde o momento em que a mesma foi anunciada, Grigori se calara. Sua personalidade zombeteira e extrovertida haviam desaparecido. Holmes tinha lá suas suspeitas. Lyovikh, a cidade que abrigava a fábrica de aço de onde Grigori fugiu, não ficava muito longe de Ecaterimburgo. Talvez uma estadia em São Petersburgo não fosse tão desconfortável e suscetível a despertar lembranças ruins quanto a ir para as proximidades dos Montes Urais. Holmes sentiu-se culpado em trazer o menino para tão perto de seus pesadelos, mas era necessário. O que quer que estava prestes a acontecer em Ecaterimburgo, era algo importante ou mesmo perigoso, o detetive entendia os riscos. Apesar disso, ele não poderia deixa-lo sozinho em São Petersburgo, muito menos fazê-lo voltar a Londres ou Sussex por conta própria.

—Quer que eu peça biscoitos? – ofereceu Holmes, incomodado pelo semblante sério  do menino. Como resposta, Grigori desviou seus olhos azuis do relógio, voltou-os para Holmes, e depois os fechou, puxando o cobertor para mais perto de seus braços e embarcando em mais algumas horas de forte soneca.

Holmes suspirou. Como se não bastasse carregar o semblante emburrado – que ele provavelmente aprendera de Emily Watson – Grigori também passara boa parte daquela viagem dormindo, tentando se proteger do frio com um pesado cobertor. Acordava apenas para comer – e comer bem, notava o detetive. Decerto o desgosto acentuava sua fome. Chocolate quente e bolo, seus preferidos, ou uma sopa bem quente. Ao menos ele não estava reclamando da comida servida na viagem.

Rendido pelo comportamento temperamental do menino, Holmes decidiu voltar suas atenções à leitura. Retirou do bolso um jornal em russo, onde pôde se atualizar de notícias que deveria ter acontecido há um mês em seu país natal, mas que naquele jornal adquira ares de novidade.

Entediado da leitura, Holmes percebeu que o trem reduziu sua velocidade mais uma vez. Provavelmente, outra estação. Após cinco minutos parado, Holmes notou o trem voltar a andar novamente.

—Curioso... Essa parada foi um tanto... Rápida.

Fechando a porta de sua cabine, Holmes caminhou pelo corredor. Notou pelo vidro das outras cabines ao lado, que os poucos passageiros que havia no trem desapareceram. Nada mais havia no trem do que o silêncio, cortado pelo agitar e trepidar do trem pelo trilho.

Alarmado, o detetive pensou em chamar Grigori, mas logo foi surpreendido por um golpe por trás de sua cabeça, que o fez desmaiar imediatamente.


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Holmes não fazia a menor idéia do que tinha acontecido quando acordou. Tonto, e sentindo uma forte dor de cabeça, o detetive abriu seus olhos, e notou que estava sentado. Suas mãos estavam amarradas. Ao tentar movê-las, ele sentiu o atrito da corda. Aquele tinha sido um nó firme, mas não infalível. Apenas era um nó que requeria um bom esforço para se soltar, e só.

—Vejo que voltou a si. – disse um homem, de forte sotaque russo.

—Quem é você? – questionou o detetive.

—Um amigo, é tudo que importa. – disse o homem, puxando uma cadeira para se sentar. – Eu represento a Agência, se isso te conforta.

Forte sotaque russo. Não falante do Inglês. A gravata é elegante, mas está desalinhada. Claramente, ele não é acostumado a lidar com este tipo de indumentária. Suas mãos são calejadas, mãos de um agricultor, porém são mãos que já não lidam com a terra há muito tempo. Dentes podres. Pele e órbitas oculares amareladas. Sintomas de cirrose, provavelmente provocada por bebedeira.

Este homem é qualquer coisa, menos um Agente Britânico.

—Não acredita em mim, não é? Não o culpo. Um detetive como você, o grande Sherlock Holmes, é acostumado a ser desconfiado. Está vendo? Eu sou um Agente do Serviço Secreto de seu irmão, Mycroft Holmes. De que outra forma eu saberia essas coisas?

—Por meio dos livros de Arthur Conan Doyle, para começar. – retrucou Holmes.

O sujeito riu.

—Você realmente é bom.

O sujeito deu mais alguns passos. Holmes permaneceu a encará-lo. Logo, um pensamento ocorreu-lhe à sua mente dolorida pela pancada.

—Onde está o menino?

—Oh, o menino? Ele está bem, dormindo como um bebê em sua cabine, não se preocupe. Tivemos apenas de dar um remedinho para ele. Pobre rapaz, ficou bastante agitado com nossa presença, especialmente quando viu o senhor desmaiado. Mas não se preocupe em demasia, creio que ele já terá acordado quando este trem chegar a São Petersburgo.

—São Petersburgo? – questionou Holmes.

—Sim, meu caro. São Petersburgo. Contatamos o seu irmão a respeito de suas recentes estripulias, sendo preso pela Okhrana e participando de ações comunistas, e ele se mostrou bastante insatisfeito com seus últimos feitos...

Mentiroso.

—Foi o próprio quem solicitou que arranjássemos uma forma de fazer você voltar para Londres. Ele nos avisou que você apresentaria resistência, por isso tivemos de agir com tamanha truculência. Mas a truculência pode acabar, se você se mostrar mais receptivo à alternativa proposta por seu irmão. Dar por encerrada sua busca e retornar para Londres.

—Estou amarrado em uma cadeira. Não chame isso de alternativa. – resmungou Holmes, forçando mais o nó e sentindo sua pele queimar pelo atrito de seu esforço. Ele duvidava muito que realmente estava indo para São Petersburgo. Na verdade, ele duvidava muito que seu irmão fosse capaz de permitir tamanha violência, nem mesmo com seu envolvimento com bolcheviques, algo que o próprio Holmes deixou Mycroft ciente quando prestes a ir para a Rússia. Algo ali não estava certo

Para onde quer que esteja indo, sair dali havia se tornado uma questão de sobrevivência.

—Eu chamo do que quiser. Você não está em condições de solicitar qualquer coisa. – respondeu o sujeito, mais impaciente.

—Você é qualquer coisa, menos um Agente do governo. Pare com teatro e diga do que se trata todo esse impropério!

Suspirando, com leve irritação, o sujeito deu as costas a Homes, se dirigindo até uma mesa, onde o detetive notara que havia uma pasta.

—Mycroft havia solicitado que apenas te revelássemos isso quando em último caso, mas diante de sua impaciência e grosseria diante da hipótese de voltar para casa, eu não vejo escolha senão mostrar-te isto.

Diante do rosto de Holmes, foi colocado uma fotografia. Nela, havia um corpo despido, feminino, em uma mesa de autópsia.

Ao que tudo indicava, o corpo de sua esposa, Esther.

—Não... Isso... –I-I-Isso é uma farsa...

—Não é farsa alguma, Mr. Holmes. Sua esposa andou mexendo em um vespeiro, enquanto estava atrás da criança. Acabou se metendo com bandidos daqui da Rússia, e teve esse trágico destino. O corpo dela foi encontrado nas margens do Rio Neva, há três meses atrás...

—Não... – murmurava Holmes, não podendo conter as lágrimas. Embora não quisesse olhar para aquela fotografia, ainda posta diante de si, o detetive não pôde conter. Seus olhos percorreram a fotografia, em busca de qualquer detalhe, qualquer evidencia. De que aquela fotografia era uma fraude, uma farsa. Porem, tudo que os olhos de lince de Sherlock Holmes puderam observar naqueles segundos a analisar a fotografia confirmavam que era mesmo Esther.

Seu rosto, com fortes olheiras, decerto pelas preocupações e pelos rumos de vida que ela tomara ultimamente, atrás da criança, e especialmente por duas cicatrizes que ela possuía, em lugares íntimos que só o detetive poderia conhecer. Havia alguns hematomas em seu rosto, que davam a dimensão de que ela sofrera algum tipo de acidente – não espancamento ou tortura, o detetive descartou com alívio tais hipóteses – mas nenhum desses hematomas eram graves o bastante para impedir o reconhecimento de seu rosto.

De fato, era ela.

O sujeito parecia frio, diante da comoção de Holmes, guardando a fotografia do corpo mais uma vez na pasta.

—Não... Isso só pode ser uma farsa. Uma farsa montada por sua quadrilha, que me quer ver longe de minha investigação. Mas saiba que estando Esther morta ou não, eu irei até o fim disso. Eu devo isso a ela.

—Comovente, Mr. Holmes. Pena que você não está em condições de escolher o que fazer. Por sinal, deveria estar grato por voltar para sua casa vivo, em virtude do tipo de agitação e baderna em que você esteve se metendo.

Holmes suspirou.

—Se Esther estava morta todo este tempo, por que não me contaram antes?

—Estávamos prestes a revelar nossa descoberta, mas seu irmão pediu cautela. Disse que queria que o corpo dela fosse reconhecido antes, pedindo cópias das fotografias. Ele mencionou o seu amigo, o Dr. Watson, para confirmar a identidade dela. O corpo foi enterrado, mas faremos o translado dos restos mortais, não se preocupe. Sua esposa terá um digno enterro cristão na Inglaterra.

Espere... Enterro “cristão”?!

Com o semblante furioso, Holmes voltou seus olhos ao sujeito.

—Pare com esta encenação. Você não me convence mais.

Impacientemente levantando-se na direção de Holmes, o sujeito retirou de seu bolso uma seringa e sem qualquer cerimônia, a aplicou com grande truculência sobre a coxa de Holmes, que tudo que pôde ouvir foi um “descanse agora, idiota”, dito em russo fluente, antes de ficar completamente inconsciente.


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Notas finais do capítulo

Ihhhh.. Que furo do Agente secreto de mentirinha...


Então, será que esse cap deixou mais perguntas do que respostas?
E Esther?? Parece que ela está morta, mas será que está realmente morta?
E esse falso Agente? Como ele poderia saber de tanta coisa? E quem, afinal, ele está representando?


Infelizmente, só saberemos nos próximos capítulos...

E para ajudar na teoria de vocês: o próximo cap será o da Esther. Teremos mais detalhes da investigação dela. Preparem-se!

Obrigada por acompanharem e até o próximo sábado! E deixem reviews, eles são muuuuito importantes!



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