O Grande Inverno da Rússia escrita por BadWolf


Capítulo 10
Aposentadoria Para Quem?


Notas iniciais do capítulo

Olá,


Depois de um começo bem calminho, teremos alguma agitação.
Boa leitura!



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Sussex Downs. 3 de Maio de 1910.


            -Mr. Holmes, o Inspetor Greenwall está aqui e deseja vê-lo.

            -Deveras? – perguntou Holmes, surpreso. Abandonando seu café – praticamente intocado – Holmes se levantou à procura do oficial de polícia. Embora já estivesse em Sussex há alguns anos, Holmes jamais tinha estado com a força policial da região. Aliás, Holmes até suspeitava que sua presença ali, em Sussex, fosse completamente desconhecida por eles. Ao menos, isso ajudava a entender o porquê da calmaria que cercava sua vida nos últimos tempos, sem aparição repentina de policiais trazendo casos medíocres e simplórios à sua porta.

            Ao chegar à sala de estar, Holmes encontrou o inspetor mencionado. Um homem jovem, de cerca de trinta anos, mas já aparentando falta de forma e, especialmente, um quê letárgico em seu semblante. Sua juventude não o impedia de ser preguiçoso, deduziu o detetive. Será que a Scotland Yard está abarrotada deles agora?

            -Com licença, meu senhor... Acaso se chama... – começou o inspetor, colocando desajeitadamente os óculos e lendo um pedaço de papel. – Sherlock Willian Scott Holmes?

            -Sim, sou eu. – respondeu Holmes, tranquilamente.

            -Impressionante. Então os boatos são verdadeiros.

            Holmes rolou os olhos.

            -Espero, inspetor, que sua visita não seja para averiguar a veracidade de boatos.

            -Não, mas é claro que não!  Jamais ousaria incomodá-lo em sua... Aposentadoria, se assim posso dizer. O que me traz aqui, Mr. Holmes, é uma evidência encontrada junto a uma recente vítima do Quebra-Ossos e...

            -Espere, Quebra-Ossos?! – questionou Holmes.

            -S-Sim, acaso não soube? Parece que Quebra-Ossos, um maléfico marginal de Londres, está rondando nossa região.

            Holmes assentiu. Conhecia bem Quebra-Ossos, ou melhor dizendo, Paul Flint. Foi um de seus últimos casos, antes de se aposentar. Matador de aluguel, o marginal tinha por marca registrada quebrar todos os ossos de suas vítimas à marretadas, e depois os desovava nos esgotos e guetos da cidade. Apenas um homem sobreviveu, apesar de ter tido 50% de seu esqueleto quebrado, e pôde contar em tribunal as atrocidades cometidas por Flint, até então um mero trabalhador de pedreira. Holmes conseguiu colocar Flint atrás das grades, e agra estava surpreso com sua reaparição, depois de terem se passado anos após sua condenação.

            -Então, não foi a primeira vez que Quebra-Ossos agiu aqui, não é? E por quê os jornais não estão noticiando o fato?

            -Abafamos tudo. Não foi difícil, tendo em vista que só temos um único jornal. Não queríamos alarmar a população de Sussex ou trazer mais fama para Quebra-Ossos. Isso poderia incitá-lo a cometer mais crimes.

            -Deveriam ter avisado Londres.

            Holmes percebeu que o inspetor se desagradou com a idéia.

            -Podemos ser caipiras, Mr. Homes, mas não somos incompetentes. Podemos aprisionar Quebra-Ossos outra vez. Não, nada de chamar aqueles engomados e arrogantes da cidade.

            -O Comissário Lestrade e seus homens conhecem o Modus Operandi dele. Pode ser doloroso admitir, Inspetor Greenwall, mas a polícia londrina é mais preparada para lidar com esse tipo de meliante do que vocês, que se ocupam a prender eventuais bêbados ou ladrões de carneiros.

            -Estás me ofendendo, Mr. Holmes...

            -Não deveria. É a mais pura verdade. De todo modo, o que meu nome completo está relacionado? Espero que não seja Mr. Simpson...

            O inspetor Greenwall ergueu uma sobrancelha.

            -Quem é Simpson?

            -Meu cocheiro. Foi demitido esta semana. Eu entreguei a ele um cheque de dez libras. E como acabara de mencionar meu nome completo, então...

            -De fato, deduzira correto. O que tenho aqui é mesmo um cheque, mas não esteva de posse deste Mr. Simpson.

            Holmes ergueu uma sobrancelha.

            -Não? Mas com quem estava meu cheque, então?

            O inspetor engoliu em seco, antes de continuar.

            -Com uma criança.



            A carruagem da Scotland Yard fez uma boa viagem, de cerca de algumas horas por Sussex, até chegar à cena do crime. Já devidamente agasalhado, visto que ventava muito por aquelas paragens, Holmes observava as aparentes tranquilas colinas de Sussex da janela daquela carruagem policial. Durante a viagem, tinha sido colocado à par do caso, com a ajuda do inspetor. A criança, com quem foi encontrado seu cheque, era a terceira vítima em dois meses. Todas foram encontradas com pernas e braços quebrados por golpes de um objeto pesado, aparentemente uma marreta. O mesmo Modus Operandi de Quebra-Ossos.

            -Ele é um assassino de aluguel, e jamais o vi matar crianças. Creio estar sendo pago para isto. – concluiu Holmes ao inspetor. – Notou alguma semelhança entre elas?

            -Er, sim. Todas possuem o cabelo negro.

            Holmes suspirou, levemente.

            -Mais alguma coisa? Pois isso me parece vago, Inspetor.

            -Receio que não. Espere, acabamos de chegar.

            Ao descer da carruagem, Holmes percebeu que Londres estava apenas a alguns quilômetros dali. Mais uma evidência de que a polícia londrina precisava ser chamada.

            Dando passagem por entre os oficiais da Scotland Yard, Homes se aproximou do corpo, já pálido, caído sobre a grama.

            Era um menino, na faixa dos doze anos. Tinha a pele já pálida, o que demonstrava que ele estava morto há algumas horas. Seus olhos estavam abertos e esbugalhados, e sua expressão facial denotava dor extrema. Sem dúvida, teve seus ossos quebrados ainda vivo, mais um Modus Operandi de Quebra-Ossos. Usava roupas simples, mas bem cuidadas, notou Holmes.

            -Creio que examinaram os bolsos.

            -Sim. Achamos o seu cheque, alguns xelins e uma passagem de trem para Londres, comprada ontem e não-utilizada.

            -Nada de documentos?

            -Não, senhor.

            Holmes se aproximou das mãos do menino. Ao pegar uma delas, percebeu que havia sangue entre suas unhas. Obviamente, houve resistência.

            -O que você fazia com o cheque de Simpson? – questionou Holmes, intimamente, olhando para o cadáver do menino.

            -Tem alguma idéia a respeito da identidade do menino, Mr. Holmes?

            -Er, sim. Tenho uma teoria, mas gostaria de confirmar uma coisa ou outra antes de citá-la. Creio que será necessário fazermos uma visita à Mr. Simpson, o verdadeiro dono deste cheque.

            -Parece que não será necessário, Mr. Holmes. – interrompeu um uniformizado. – Alguns policiais acabam de chegar aqui com o próprio Mr. Simpson.

            O inspetor Greenwall ficou surpreso.

            -É espantoso!

            -Não para mim. – retrucou Holmes. – Vejamos o que o meu ex-cocheiro tem a dizer sobre isso.

            Holmes e o inspetor se distanciaram do cadáver, e logo observaram um transtornado Mr. Simpson, acompanhado de outros policiais.

            -Então, o senhor é o Mr. Simpson?

            -Sim, eu mesmo. Fu até a delegacia esta manhã para tratar a respeito do sumiço de um de meu filhos, Christopher. – disse o sujeito, chapéus nas mãos e semblante triste. – Por favor, não digam que meu filho... Que ele...

            -Ainda não sabemos, Mr. Simpson. – retrucou Holmes. – O cadáver que encontramos estava com o cheque que te dei há dois dias atrás e...

            -Oh, meu Christopher! Só pode ter sido ele! – chorava o cocheiro. – Ele estava descontente, sabe? Dizia que queria conhecer Londres, que queria uma vida melhor que limpar estrume de animais... Oh, meu Chris...

            -Acalme-se, bom homem. – pedia o inspetor. - Precisamos que o senhor faça o reconhecimento cadavérico. Por favor, nos acompanhe.




            O reconhecimento cadavérico não foi nada facil.

            De fato, como Holmes deduzira, a criança era mesmo Christopher Simpson, filho de seu cocheiro. O homem estava inconformado, entrando em estado de choque. Contou que o menino estava aborrecido com seus vícios, e sempre dizia que iria fugir. Não levou nada a sério, até encontrar a cama desocupada e um bilhete de despedida. Boa parte de seus pertences ficou na casa, pois o menino decidiu levar apenas o que dava para carregar discretamente. O cheque de dez libras também tinha desaparecido. Desesperado, Simpson precisou ser levado dali por três policiais.

            A história deixara Holmes surpreso. Após anos de calmaria, um caso interessante, sangrento e misterioso apareceu de repente, diante de si. Após liberarem o corpo e coletarem as escassas evidências, Holmes acompanhou o delegado até a Delegacia de Sussex. Verificou os inquéritos e chegou a conclusões melhores que a Yard.

            Holmes sabia que as mortes não foram aleatórias. Havia um padrão nas três vítimas. Quebra-Ossos executava o seu trabalho em troca de dinheiro, não por mero prazer, o que tornava óbvio de que ele tinha sido contratado para matar um menino, de idade entre doze e catorze anos, de cabelo negro e pele branca. O problema é que Holmes duvidada que este menino era o filho de Mr. Simpson.

            -Mais mortes irão acontecer, inspetor, se não pegarmos Quebra-Ossos primeiro.

            -Isso é inaceitável! Se a população de Sussex descobrir sobre isto...

            -Receio que não poderá esconder os últimos fatos por muito tempo, inspetor. Cedo ou tarde, saberão.

            -Se isso chegar aos ouvidos do Superintendente... Será meu fim. Ele já anda descontente com meu trabalho. Se souber que há um assassino deste nível à solta, em minha região, e que não estou conseguindo detê-lo... Tenho certeza de que serei rebaixado, mandado para Cornwall ou algo assim. Não posso deixar isso acontecer. Já sei! Mandarei meus homens vasculharem por marretas!

            Holmes riu da ingenuidade do Inspetor.

            -Seria como achar uma agulha no palheiro. Ou mesmo poderia levar algum inocente à cadeia. De todo modo, eu creio que fiz tudo que pude, por agora.

            Holmes se despediu do inspetor, saindo da delegacia. Caminhou pela rua, pensando nos últimos acontecimentos. Seria bom se ele prestasse apoio à investigação, que ao que tudo indicava, seria feito em meio à desespero e pressa. Para que mais mortes não acontecessem, Holmes sabia que precisava agir. Mas com cautela.

            Quando prestes a embarcar em um cabriolé de aluguel, de volta para casa, Holmes percebeu uma pequena confusão, bem próximo dali.

            -Ladrão! Alguém pega aquele moleque! – gritava um velho, esbaforido, que Holmes reconheceu como sendo o quitandeiro da cidade. Apesar do apelo do quitandeiro, já era tarde. Quem quer que fosse o ladrãozinho, já tinha se debandado.

            Claro. Obviamente, algum gatuno andou roubando frutas daquele homem. Parece que nem a pacata cidade de Sussex está à salvo dos crimes mais comuns de cidade grande.


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Notas finais do capítulo

Ih, parece que o caso sempre bate à porta de Holmes, quando ele menos espera...
Veremos como o detetive lidará com essa nova ameaça chamada Quebra-Ossos.

Até o próximo!



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