Cristal escrita por Mia


Capítulo 6
Capítulo 5 - Sombras


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura ^^



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Isaac escondeu os punhos fechados dentro dos bolsos da jaqueta mais por habito que uma necessidade real de mantê-los aquecidos, era uma noite fria e especialmente escura, parecia um cenário perfeito para o que iria acontecer dali a alguns minutos – ou estava acontecendo, dada a pressa com que Thor saiu da sua pequena reuniãozinha – e embora aquilo poderia ser desastroso, naquele instante preciso, Isaac não conseguia se importar.

Ele moveu seus ombros e fingiu respirar quando ouviu os passos leves e hesitantes esmagarem a grama molhada, fechou seus olhos, concentrado, e conseguiu ouvir um coração palpitante e uma respiração pesada. Ele quase riu, se não temesse tanto que qualquer gesto brusco pudesse assustá-la e afastá-la pra longe de novo.

Pareceram horas até que a coragem de Luciana reacendesse e ela cruzou a linha imaginaria que a mantinha a salvo, Isaac estava parado e quase imóvel, seus olhos claros brilhavam enquanto a sondavam, e então ela parou colocando bons passos entre eles e cruzou os braços claramente desconfortável.

Claro que isso não passou despercebido pelos olhos brilhantes e concentrados, uma sobrancelha clara fora erguida.

— Você sabe que – ele disse, seus lábios mal se moviam – se eu quiser te atacar, eu irei, né?

Luce corou e desviou o rosto, de repente se sentia patética pela falsa segurança a qual havia se agarrado.

— O que você quer com a Lana? – ela empertigou-se voltando a encarar Isaac.

Seu rosto de repente estava duro e seus olhos estreitos encarando Luce como se ela fosse um quebra-cabeça ou alguém extremamente irritante.

— Por que isso não me surpreende? – ele disse por fim, debochado – Desde quando você se interessa pelos meus... Assuntos?

— Por que Lana é diferente e eu não confio em você.

— E o que te faz pensar que eu diria algo a você? – Isaac pareceu que avançaria um passo, movendo-se preguiçosamente, mas no segundo seguinte sua respiração fria e seu cheiro centrado invadiram o espaço pessoal de Luce, no susto seu corpo arqueou pra trás encostando na árvore onde havia se escondido mais cedo – Que tipo de poder você acha que tem sobre mim?

O peito duro de Isaac a pressionava, sentiu seu coração cair em um buraco escuro e medonho, Luce entreabriu seus lábios mas o medo aprisionou sua voz. A meses ela não ficava tão perto dele, desde que descobrira o que de fato estava escondido por baixo daquele rosto bonito e atraente, a verdade transformou o possível sentimento que nutria em um bolo grande de medo e asco, ela não o queria tão perto, as lembranças daquele dia terrível ainda dançavam por trás dos seus olhos nos dias escuros, a assombrando como um bilhete que dizia que não estava segura, talvez nunca estaria.

Isaac sentiu algo dentro de si quebrar, embora não soubesse o que, era como se um bolo apertasse sua garganta, ele sabia o que aquele olhar representava e quando ergueu sua mão para pegar uma lágrima no rosto de Luce, ela se espremeu contra a arvore como se fosse o diabo quem tentava a pegar, por um instante, Isaac imaginou que de fato o fosse.

— Você prometeu que manteria distancia – ela conseguiu murmurar enquanto fechava seus olhos com força, esperou minutos intermináveis até que a respiração pesada e fria sobre seu rosto fosse cessada, uma brisa gelada preencheu o espaço entre ele, quando Luce abriu seus olhos viu Isaac assomar sobre si, seu rosto vazio e os lábios crispados, como se ele fosse feito de gelo.

— Então não fique mais no meu caminho – ele disse simplesmente desviando o rosto pro outro lado.

Luce queria dizer algo mais, mas estava nervosa e ligeiramente bêbada, não sentia mais seus pés, parecia pisar em nuvens, não queria passar uma imagem frágil para Isaac ou deixa-lo consciente da enorme diferença entre seus poderes. Ela devia ficar fora do seu caminho. Como havia prometido. Já tinha advertido Lana e mesmo assim a garota não só correspondeu a ele como também deixou que ele a beijasse. Luce sabia o quanto Isaac podia ser persuasivo quando queria, mas não isentava Lana da culpa de ser tão displicente e ignorar os avisos quase celestiais de uma amiga.

Ela que se virasse com a encrenca em que havia se metido.

— E eu vou ficar. – ela murmurou andando sorrateiramente de costas, ganhando distancia para que corresse para algum lugar seguro.

Isaac a encarou de novo.

— Não me procure mais. Nunca mais.

— Não precisa se preocupar com isso. – Luce girou e correu, o máximo que conseguia, saindo daquele espaço escuro e verde, encontrando com certo alivio o jardim. Ela pensou ter ouvido resmungos femininos enquanto corria até o prédio do seu dormitório, mas a muito deixou de se importar com as coisas que aconteciam nos escuros daquele internato. Ela só queria chegar ao seu quarto e acalmar o frenesi que sentia no seu corpo.

ººº

Thor puxou o braço dela com uma força desnecessária quando encontrou resistência. Ele queria fazê-la passar por aquela porta, mas Lana não estava inclinada a testar o quão valioso e confiável era o caráter dele, ele já tinha a arrastado até ali, descido escadas, entrado em corredores desertos e agora parado ali, no que parecia ser o fundo do prédio, ela tinha certeza que aquele não era seu quarto, e mesmo que o fosse, ela não estaria mais ou menos segura.

— O que você quer comigo?! – quase gritou agarrando-se ao braço dele quando ele tentou fazê-la passar de novo. Lana não queria espiar o cômodo por temer encontrar coisas macabras e estranhas. Quando agarrou o braço de Thor, ficando na frente dele, percebeu o quanto sua resistência o enfurecia. Engoliu em seco.

— Se você falar um pouco mais alto talvez alguém te escute, sua idiota.

Isso. Alguém tinha que escutá-la.

— Olha aqui seu bastar-

Thor pressionou a mão livre na boca dela com violência fazendo sua cabeça ir pra trás. Lana largou seu braço e com as duas mãos tentou livrar a boca. Thor era tão mais alto, mais forte, e seus olhos estavam enfezados de raiva. Raiva dela. Tentou a todo custo se livrar dele, dando socos no seu peito, pontapés, mas ele parecia uma rocha ainda mais dura e forte do que Isaac tinha parecido.

— Estou tentando te tirar daqui sua idiota – ele resmungou por cima dos protestos nada sutis dela, Thor prendeu seus pulsos com a mão livre e com corpo prendeu as pernas dela, antes que Lana conseguisse machuca-lo de verdade. – Essa porta é a de serviço, é por ela que os convidados entram, eu vou abri-la e você vai sair das minhas vistas, entendeu?

Lana demorou pra assentir, não confiava nele, mas estava assustada demais pra pensar em algo melhor do que concordar. Thor imediatamente a livrou e, como prometera, abriu a porta com uma chave pequena que tirou do bolso. Lana não se mexeu.

— Por que me trouxe aqui? – era tudo o que conseguia pensar em dizer.

— Você faz o inferno pra se livrar e quando consegue fica parada feito uma ameba me fazendo perguntas idiotas? Inacreditável.

Ela devia se sentir ofendida, certo? Mas o medo estava começando a deixa-la, principalmente por está tão perto de uma rota de fuga, e Lana se sentia cada vez mais segura de enfrenta-lo, talvez conseguisse respostas e um plano de como lidar com ele dali a diante.

— Bem, quando você responder eu te deixo em paz.

— Porque você é irritante e intrometida, não bastasse ter que ficar topando com você o tempo inteiro nos corredores, ainda tenho que ficar na mesma sala que você, todo os dias, e você ainda se meter nos meus assuntos. Agora – Thor agarrou seu braço de novo, aparentemente com mais força, e a empurrou pra porta – Cai fora.

Fora o bastante pra Lana sentir aquela velha massa de cólera explodir dentro dela. Seu temperamento era horrível e Deus sabe o quanto ela se maldizia por isso, mas no momento agradecia imensamente por ele, graças a isso encontrara forças pra erguer o dedo em riste e apontar no rosto de Thor.

— Olha aqui seu desgraçado, eu não lembro de te ver tantas vezes assim, e na maior parte do tempo simplesmente esqueço meu enorme azar em ter que dividir a mesma sala que você. A culpa não é minha se você é um enorme covarde que sente prazer em atormentar a vida ou ameaçar outras pessoas como fez com Jasmim hoje. Apenas nos esqueça e nos deixe em paz. Esqueça a intrometida aqui e garanto que esquecerei o cretino sem escrúpulos que você é.

Ela se sentiu grata quando viu o rosto dele desmoronar, mesmo que minimamente, e seus olhos estreitarem-se, Lana o tinha atingido, se sentia tão orgulhosa por isso que sentiu vontade de dançar, torceu que fosse o suficiente, que a troca de ofensas fosse ira-lo o suficiente pra ele esquecer dela e de Jasmim, que passasse a evita-las tamanho o desprezo que pudesse sentir. Ela viu sua deixa quando ele permaneceu calado, antes que fosse tarde Lana saiu por aquela porta entrando na noite fria, deixando de lado o fato que provavelmente não sabia onde era seu dormitório, que estava escuro demais e as luzes externas, geralmente acesas, estavam escassas e deixavam tudo mortalmente escuro. Ela sequer conseguia ver nitidamente onde pisava.

Lana andou com mais pressa seguindo a diante, deveria ser o suficiente pra encontrar o lugar ou o caminho certo, mas o salto de um dos seus sapatos prendeu em um amontoado de galhos jogados e ela se desequilibrou, caindo de bunda no chão, de um jeito tão humilhante que agradeceu a Deus por não ter ninguém presente pra ver, ou alguém além dela e de Thor, que chegava por trás rindo sem cerimonias nenhuma. Lana olhou pra cima e o viu encarando-a com um ar sádico e divertido, se ela não tivesse visto os galhos antes de cair poderia jurar que isso era obra sua.

Resistiu ao impulso de mostrar a língua e ficou de pé, arrancando sem delicadeza alguma as sandálias de tiras e vendo aliviada que não havia quebrado. Recomeçou a andar, ignorando Thor e seu riso, mas a medida que andava a gargalhada dele ganhava força, não bastasse a humilhação que havia passado Lana pensou que poderia piorar, ela virou de frente a ele, erguendo os sapatos de saltos finos em sua direção como se fosse uma arma letal e perigosa.

— O que foi agora?!

— Sua... – ele respirou, esperou – sua bunda está... Está toda suja.

A desgraça sempre vem acompanhada. É impressionante. E ali estaria o fim da sua simplória vitória, o riso alto e frouxo de Thor era a prova disso. Ela sentiu um ímpeto quase incontrolável de silenciá-lo de um jeito letal que causasse dor. Muita dor.

— Me faça um favor, vá pro Inferno – Lana segurou seus saltos com mais força e seguiu adiante, podia sentir as fumaças saírem dos seus ouvidos, sua pele esquentar e ficar irritantemente vermelha, mas quanto mais andava mais a consciência da presença de Thor ficava fraca, ela parou e olhou por sobre o ombro dando-se conta de que estava de fato sozinha.

— Você não é muito boa em fugir, aparentemente – sua voz estava de novo séria enquanto ele tapava a boca de Lana com força, ela não teve tempo nem de tomar consciência da sua presença ali antes que fosse silenciada, o grito preparado ficara preso na sua garganta – Você quer o que, que todo mundo saiba que estamos aqui?

Lana balançou a cabeça e o chutou, Thor a soltou quase imediatamente.

— De onde você saiu? Pensei que tinha ido embora.

— Você é lerda, eu estava do seu lado o tempo todo.

Ela estreitou os olhos.

— Mentiroso.

Thor enfiou as mãos nas calças jeans e olhou ao redor deles, mesmo que estivesse escuro e a visibilidade quase nula, ele parecia ter uma visão clara de onde estavam, também havia surgido literalmente do nada, tão silencioso quanto um felino.

— Você não vai conseguir chegar ao seu dormitório – ele murmurou indiferente, voltando a encará-la depois de um longo tempo observando absolutamente nada.

Lana ainda olhava pra ele com desconfiança, tinha seus saltos em um aperto firme e dessa vez não temia em quebra-los caso fosse preciso.

— E o que você tem com isso?

— Se você se perder vai ser achada por alguém, talvez um dos vigias, se isso acontecer vão estranhar você está vestida assim e quase imediatamente meu nome será adicionado a uma lista irritante de suspeitos.

— Isaac disse que isso realmente não era um problema.

— Isaac é muitas coisas, mas certamente confiável não é uma delas – Thor girou e começou a andar calmamente – Vamos logo.

Lana conseguia ver apenas o fraco reflexo da sua camisa negra quando começou a segui-lo, - com uma pontada no seu orgulho percebeu que o caminho que tinha em mente não estava de todo certo – Thor era tão silencioso quanto imaginou que fosse, suas costas eram largas e seu corpo esguio, não tinha um porte exagerado, parecia o tipo nadador e sua pele era pálida, pálida demais para alguém saudável. Daquele jeito, no escuro e silencioso, ele poderia facilmente interpretar um vampiro.

— Não gosto quando ficam me encarando – ele disse de repente, olhando por sobre o ombro e flagrando-a.

— Não há muito pra onde olhar. – Lana cruzou os braços e apressou os passos, ficando ao lado dele.

— Gostou do que viu?

— Você disse que não me queria no seu caminho, isso significa que vai me deixar em paz? – ele ergueu uma sobrancelha percebendo seu fracasso em desviar sua pergunta. Lana continuava fingindo observar o caminho aonde ia, devagar demais para alguém que não queria ser encontrado, ela tampouco queria responder ou ser pega em uma mentira. Ela gostou do que viu, de observar as costas e o andar elegante de Thor, apesar de cínico e insuportável ele não era feio, e Lana tinha uma queda patética por garotos bonitos.

— Não lembro de ter dito algo exatamente assim.

— Isso é sério?

— Jasmim me meteu em encrencas demais, nunca terei paz se deixar ela impune.

— O que isso significa?

Thor suspirou alto como se estivesse perdendo a paciência.

— Você é tão irritante quanto ela, deve servir – ele deu de ombros – Nela eu não podia fazer muita coisa, já você...

— Eu o quê? – Lana parou.

Thor parou alguns centímetros depois, virando de frente pra ela, seus olhos pareciam duas fendas cinzas e misteriosas. Lana não gostou daquela expressão, como se ele realmente estivesse avaliando o que fazer com ela, por onde começar.

— Com você posso fazer o que eu quiser. É isso o que significa.

— Nem ferrando – foi tudo o que conseguiu dizer antes de começar a andar, aliviada por reconhecer a pequena trilha iluminada que direcionava até o jardim, se sua memoria não estivesse tão errada Lana jurava que só mais alguns passos e poderia chegar ao seu dormitório. Sentiu uma mão grande puxa-la pelo braço antes de entrar de vez na trilha – O que você está fazendo?

Thor a puxou pra mais perto, escondendo-os atrás de uma das arvores, Lana estava pressionada entre ele e a arvore, mas conseguiu ouvir uma movimentação repentina no jardim, mesmo que não visse coisa alguma.

— Acho que já pode me soltar. – ela murmurou. No susto tinha deixado os saltos caírem, Lana olhou pros sapatos desolados e se sentiu mais vulnerável do que nunca.

Thor pegou seu queixo com força e a forçou a olhá-lo de volta, Lana não pode fazer muito quando ele desceu seu rosto e pressionou seus lábios com brusquidão, aquilo não era um beijo, estava machucando-a e a assustando, ela se debateu com força e sentiu um pânico crescer dentro do peito. Thor a liberou, seus olhos estavam tão hostis e apáticos quanto antes.

— Viu? Posso fazer o que eu quiser. Lembra disso na próxima vez que duvidar de mim.

— Você... Você é extremamente desprezível.

— Sim. Sou um pedaço de merda – ele disse ainda com sua voz baixa – Esse pedaço de merda aqui vai está ciente de todos os seus passos a partir de hoje. Se fosse você tomava cuidado.

Thor a soltou, refazendo seu caminho e sumindo aos poucos, pouco se importando com a garota tremula que tinha deixado pra trás.


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Notas finais do capítulo

E então, acertaram com quem Isaac tinha ido se encontrar tão desesperadamente? Tomara que eu tenha conseguido surpreender vocês >
Domingo, Terça e Quinta terá capítulo novo, provavelmente na parte da tarde.

Sugestões? Críticas? Elogios? Não sejam apenas leitores fantasmas, interajam >



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