HL: Pocket Girl - How Heroes are Born escrita por Mini Line, Heroes Legacy


Capítulo 33
As lágrimas de um anjo


Notas iniciais do capítulo

Enfim, o fim.

(É a terceira vez que eu estou escrevendo isso. o Nyah não queria que eu postasse de jeito nenhum)

Olá, meus amores.
É com um nó na garganta e lágrimas nos olhos que eu trago para vocês o último capítulo de PG.
Eu estou realmente sem palavras para dizer o que tudo isso representa para mim. Então é melhor pular para os agradecimentos.
Ao pessoal do HL, que me apoiaram por todo esse longo ano de desafios, lágrimas suor e sangue, sem falar das noites sem dormir. Vocês são incríveis.
E claro, aos leitores, fantasmas ou não, que me deram forças a cada view e review.
Não vou prolongar, já que eu estou muito irritada com o Nyah e o capítulo já está grande demais kkkk
Sem mais enrolação...
Boa leitura ^^



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Do céu, completamente coberto por nuvens acinzentadas, os flocos de neve desciam devagar, traçando seu caminho até o chão. As pessoas apressadas pelas ruas de Nova York faziam suas últimas compras na véspera de Natal, buscando um presente esquecido ou algum ingrediente que faltou para a ceia. Entre elas, a jovem Harper admirava uma vitrine repleta de globos de neve, de diversos tamanhos e formatos. Alguns tinham miniaturas da Estátua da Liberdade, do Empire State, crianças brincando, casais apaixonados… Mas o que mais lhe chamou a atenção foi o de uma garotinha segurando a mão de seus pais, que olhavam um para o outro, dizendo em silêncio qual o verdadeiro sentido da palavra “felicidade”.

Seus olhos presos no enfeite faziam sua mente criar algumas lembranças falsas, de como poderia ter sido sua vida, principalmente sua infância. Mas tudo sumiu de seus pensamentos, quando ouviu seu nome ser chamado em meio a multidão, por uma voz feminina, da qual não reconheceu.

Ao se virar, sentindo o coração tentar sair pela boca, viu um jovem casal abrindo espaço entre os pedestres, com nada além de desespero estampado em seus rostos. Um instante depois, foi obrigada a olhar para baixo, ao sentir alguém puxando seu casaco. Era uma menina de não mais do que quatro anos, escondendo-se atrás de suas pernas.

 

— Alice! Volta aqui, filha!

— Hey, vai com calma, pequena. — A Harper sorriu, abaixando-se para olhar a criança

— Mil perdões, moça. — A jovem mulher respirou aliviada, fazendo com que uma névoa saísse de sua boca, graças ao frio. — Alice, nunca mais faça isso! Alexander e eu ficamos tão preocupados!

— Mas mamãe…

— Sem mais, filha! — foi a vez do pai dizer, firme.

— Eu não quero colocar o chapéu! — a pequena cruzou os braços, exagerando ao fazer um biquinho.

— Alice é o seu nome? — a Pocket perguntou, assentindo para os pais, antes de voltar a atenção para ela.

— Sim.

— Por que você fugiu, Alice?

— Porque eu não quero colocar o chapéu! Ele é feio! — Apontou para a boina na mão da mãe.

— Eu não acho feio. Combina com seu casaco. Tudo bem. Eu sou professora. — Estendeu a mão para a jovem, que, receosa, lhe entregou o acessório. — Veja essas flores. São lindas. E também está frio. Não quer ter as orelhas congeladas, quer?

 

A pequena Alice balançou a cabeça rapidamente, arregalando seus olhinhos castanhos e assustados, o que fez o seu pai sorrir, abraçando a esposa de lado. A Harper sorriu e colocou a boina na garotinha, ajeitando seus cabelos encaracolados em seguida.

 

— Agora sim. Está mais linda ainda e aquecida.

— Por que você não usa um chapéu também? — perguntou a pequena.

— Ahn… Eu me atrasei um pouco e acabei me esquecendo. — Alice fez uma careta, rindo baixinho. — Agora meu cabelo está cheio de neve! — a garotinha riu e ajudou a moça a tirar os flocos da cabeça.

— Você sabia que os flocos de neve são as lágrimas dos anjos lá do céu? — a menina perguntou, erguendo o indicador para as nuvens.

 

Alice olhou para o céu enegrecido e suspirou, antes de voltar a atenção para a pequena.

 

— Não. Eu não sabia. Isso é muito lindo, Alice. — A Harper sorriu, melancólica, suspirando. — Agora, para deixar os anjos alegres, você precisa segurar na mão da mamãe e do papai, okay?

 

A garotinha assentiu e correu para o lado dos pais, pedindo desculpas tão baixo, que mal pôde ser ouvida. A jovem mulher agradeceu Alice pela ajuda e partiu, junto de sua família.

 

— Feliz Natal, moça — disse a menina.

— Feliz Natal, Alice. — A Harper sorriu, observando, ao vivo e a cores, a mesma cena do globo de neve.

 

~*~

 

A casa dos Johnson era uma das mais lindas da rua. As luzes natalinas enfeitavam toda a fachada e os dois pequenos cedros de cada lado do portão. No interior, o grande pinheiro era destaque na sala, embora ainda não estivesse totalmente decorado. Benny ainda colocava os enfeites nos galhos, contando com a ajuda de Annie. Jessica insistiu para que a garota ficasse com eles naquele dia, justamente para não deixá-la sozinha em seu apartamento. Os dois riam alto, brincando mais do que trabalhando na decoração. Eles se enrolavam nos pisca-pisca e Annie pendurou um laço na orelha do amigo.

Depois de um longo trabalho, Benny ergueu a garota pela cintura, para que ela colocasse uma estrela no topo da árvore. Logo depois, a desceu devagar, fitando seus olhos verdes e profundos. Mas ela não deixou o contato permanecer por muito tempo. Desviou o olhar e riu baixinho, dando leves tapinhas no braço de Benny, enquanto se afastava.

Sentaram-se em silêncio, observando o crepitar das chamas na lareira, enquanto o cheiro da comida preparada por Jessica enchia suas bocas d’água. O desconforto era evidente entre eles, principalmente quando os suspiros de Annie ficavam mais frequentes, e pelo modo com que Benny procurava uma nova forma de roer o toco das unhas.

 

— Sério que vamos acabar desse jeito? — ela comentou, virando-se para ele.

— Desse jeito como?

Desse jeito. Como dois estranhos. Qual é, Benny? Já faz uma semana e as coisas mudaram desde então. Não parece mais que somos melhores amigos.

— O que você queria? O que rolou foi… especial — ele sussurrou, segurando as mãos da garota.

— Não, não foi. Aquilo foi só sexo. Estávamos bêbados e não tinha nada de especial. Pelo menos, não para mim. — Annie puxou as mãos e desviou o olhar, tentando convencer, não só o garoto, mas a ela mesma. — Seja sincero comigo. Você está apaixonado… sabe, por mim?

— Eu? Não! Claro que não! — Benny abaixou a cabeça e a balançou, negando. — E você, está? Digo, por mim?

— Oh, céus, Benny! Não seja ridículo. É óbvio que não. — Ela revirou os olhos, mas não teve coragem de encarar o garoto.

 

Mais uma vez o silêncio na sala ficou sufocante. Ambos sabiam que tudo dito ali era mentira, embora fosse melhor acreditar nelas. Por que complicar o que era tão simples? Por que estragar tudo o que foi construído em anos, em apenas uma noite? Esquecer era a melhor coisa a ser feita, mesmo sabendo que era impossível.

O som da campainha foi a resposta às preces dos adolescentes, que não conseguiram evitar o suspiro aliviado. Benny fez menção de se levantar para atender a porta, mas Jessica gritou um “estou indo”, aproximando-se da entrada. Mas não imaginava ela que, ao abrir, não encontraria um de seus convidados, mas a razão de muitos dos seus pesadelos.

 

— Eu preciso de ajuda, Jessica! Por favor, me deixa entrar!

 

Ali, parado em sua frente, da maneira mais deplorável que um dia imaginou encontrá-lo, estava Jared Harper. A barba mal feita e os cabelos bagunçados não eram nada comparados a expressão desesperada em seu rosto, destacada ainda mais pelas olheiras sob seus olhos azuis. A urgência em sua voz segurava o choro, embora seus olhos vermelhos denunciassem o ato que não demoraria a acontecer. Por um breve momento, ela quase sentiu pena do homem. Quase.

 

— Eu vou chamar a Polícia! — disse alto, tentando fechar a porta, mas ele a impediu.

— Por favor, Jessica. Me deixa ao menos explicar! Eu não sei mais a quem recorrer! Por favor, eu preciso de ajuda!

— O que está acontecendo?! — Benny viu o homem tentando entrar e recuou um passo, arregalando os olhos. — Você é o pai da Alice! Você está preso!

— Benny, não…

— Não me chame de Benny! — bradou, caminhando até Jared e o puxando para dentro. — Eu sou o agente Johnson e você está sob custódia da Nexus e do governo dos Estados Unidos da América!

— Alice está em perigo! — Jared disse devagar, puxando o filho para perto. — Por favor, garoto, você precisa deixá-la segura. Precisa salvar ela.

— Benny, o que está havendo? — Annie perguntou, assustada

— É a filha do Phil! — Jared sussurrou, caminhando rápido até a garota. Seus olhos presos aos de Annie.

— Não toque nela!

 

Sem conter a fúria, Benny acertou um soco no maxilar de Jared, fazendo-o cair de costas no sofá. O cientista massageou o local e riu baixinho, olhando nos olhos do garoto.

 

— Se você se aproximar da Annie de novo, eu mato você! — disse devagar, cerrando os punhos.

— Se você não fizer nada, vai morrer antes de viver um romance com a filha do meu melhor amigo. Eu não me importo se você me odeia. Tem motivos para isso. Motivos dos quais você nem imagina. — Olhou para Jessica, fazendo-a abaixar a cabeça. — Mas se você quiser ter a chance de dar mais um beijo na garota que ama, vai ter que me ajudar!

 

Antes que Benny pudesse responder, fortes batidas na porta foram ouvidas, fazendo o sangue de Jared gelar. Sua respiração rápida fazia seu peito subir e descer, enquanto alternava o olhar entre eles.

 

— É ela — sussurrou, tremendo a cada batida. — Leve a sua namorada para um lugar seguro, filho, e chame ajuda. Rápido!

— Nunca mais me chame assim, Harper! — disse baixo, antes de puxar Annie pelo braço e levá-la para o seu quarto.

 

Jessica encarou o homem por um instante, antes de fazer um sinal com a cabeça para que ele se escondesse. Jared tentou tocar o rosto da mulher, mas ela o impediu, dando-lhe um tapa em sua mão. Naquele momento, o cientista perguntou-se se algum dia Jessica poderia perdoá-lo, enquanto ela, ao fitar aqueles olhos azuis, que conquistaram seu coração em apenas um instante, questionou aos céus o motivo dele ter feito tudo o que fez. Ela desviou o olhar, ajeitou o vestido de lã vermelha e passou a mão nos cabelos, ensaiando um sorriso gentil antes de ir atender a porta. Já o homem, tratou de se enfiar atrás de um armário, dentro do quartinho de vassouras.

 

— Pois não? — disse Jessica, mantendo-se natural como uma estrela de Hollywood.

— Você é a Jessica? Jessica Johnson? — A jovem mulher sorriu, observando a dona da casa. — A vadia que dormiu com o meu marido quando eu estava morta?

— O que?!

— É um prazer finalmente conhecê-la.

 

~*~

 

Em seu quarto, Benny trancou a porta, embora soubesse que aquilo não impediria uma ameaça das que já estava acostumado a enfrentar. Jogou seu telefone para Annie e começou a trocar de roupa, sem se preocupar com os olhares da amiga.

 

— O que diabos você está fazendo, Benjamin?

— Manda uma mensagem para o Will, para a Rachel e para a Delilah também. Escreve só S.O.S. Eles vão entender e vir para cá — explicou, enquanto colocava um comunicador no ouvido e puxava a echarpe azul de uma gaveta. — Eu não queria te contar sobre isso dessa maneira, mas não posso me dar ao luxo de esconder por mais tempo.

— Você é o Spotlight dos hologramas! Eu… eu mostrei o seu próprio vídeo no YouTube para você! — Annie quase gritou, arregalando os olhos.

— Eu queria mesmo te explicar tudo isso agora, mas eu não tenho tempo. Só se esconde e pede ajuda — disse baixo, acariciando o rosto da garota.

 

Suspirando, ele sorriu, antes de puxá-la pela cintura e dar-lhe um beijo rápido, erguendo sua máscara improvisada em seguida.

 

— Hora de salvar o dia, Annie. Só, por favor, não tenha nenhuma visão! E não duvide da nossa amizade!

— Seu uniforme é ridículo! — A garota desviou o olhar, sentindo o rosto esquentar.

— Eu sei! — Ele riu, se afastando. — Faz eu me lembrar de você!

— Estúpido!

— Besta! — Benny piscou, fechando a porta atrás de si.

 

Antes mesmo de descer as escadas, o som do grito de Jessica fez seu sangue gelar, ao mesmo tempo que seu coração acelerado tentava rasgar-lhe o peito.

 

— Mãe! — chamou o garoto, mas era tarde.

 

Jessica estava no chão, imóvel e com os longos cabelos negros cobrindo seu rosto.

 

— Mãe! Não! Mãe, fala comigo! — gritou, puxando-a para seus braços.

 

Apavorado, a primeira coisa que Benny fez foi chorar, abraçando Jessica com força, enquanto acariciava seu rosto. E foi assim que ele percebeu que sua mãe estava respirando regularmente, sem emitir nenhum ruído. Ver seu peito subindo e descendo, foi como tirar o peso do mundo sobre seus ombros. Ela estava viva. Era tudo o que importava.

Ao perceber que as coisas se acalmaram, Jared saiu de seu esconderijo, receoso, e um frio percorreu sua espinha ao ver aquela cena em frente a porta de entrada. Ele correu até o filho, mas o garoto o empurrou, antes de se levantar com a mãe nos braços.

 

— Isso tudo é sua culpa, Jared Harper. Tudo! Sua sorte é que nada aconteceu com ela, senão hoje seria seu último dia infectando essa Terra!

 

O olhar cheio de rancor do garoto fez o cientista abaixar a cabeça, sentindo um nó em sua garganta. Mais uma vez, entre tantas outras, foi incompreendido, mas não conseguia se acostumar com isso. Doía. Apesar de tudo, Jared sabia que aquele não era o momento ideal para lidar com suas frustrações e rancores. Sua mulher estava solta pela cidade, e não iria descansar enquanto não o encontrasse. Só que esse era o menor de seus problemas, embora ainda não soubesse disso. Jared era apenas uma ponte para que Meredith alcançasse seu verdadeiro objetivo. Aquele pelo qual foi trazida de volta dos mortos.

Enquanto Benny ajeitava Jessica no sofá, dois estrondos seguidos por um clarão, foram ouvidos por toda a cidade. Delilah e Rachel usaram uma de suas habilidades eletrocinéticas, que é se transportar através dos raios. Apesar de ser uma aluna desbocada, GreyThunder estava se saindo bem ao aplicar aquela técnica, deixando a Fada Violeta um tanto orgulhosa. William, por não possuir esse tipo de técnica, foi carregado por Rachel, e precisou de mais alguns segundos para se acostumar com o chão sob seus. Mas quando seus olhos focaram em Jared, um ódio crescente tomou conta de si, cegando-o completamente. Antes que o cientista pudesse reagir, o Netuno já estava acertando um soco em seu maxilar e segurando-o pelo colarinho em seguida.

 

— Will, não mate ele! — disse Rachel, em tom despreocupado. — O Harper me deve uma pequena fortuna de direitos trabalhistas. Posso até processá-lo por ter ficado meio louca trabalhando naquele lugar.

— Qual a emergência, Spotlight? — Will perguntou ao soltar o homem, sem desviar o olhar dele.

— Eu não sei. Esse maluco chegou aqui gritando e dizendo que todos estavam em perigo e que ela estava vindo e que a Lice estava em perigo, então eu fui esconder a Annie, mas a minha mãe gritou porque ela atendeu a porta, aí…

— Benjamin, respira! — Rachel interrompeu, revirando os olhos.

— Não precisa ficar assim Benny. — Delilah sorriu, colocando a mão em seu ombro. — Vai ficar tudo bem.

— Não vai, Fada Violeta. Não vai — disse Jared, pensativo. — Meredith não vai parar até ter a Alice de volta!

— Quem é Meredith?

— A mãe da Lice — Rachel respondeu baixo, fitando o cientista. — Ela está viva?

— A Lice não disse nada? Ótimo. Agora ninguém está preparado para contê-la. — Ele suspirou e passou as mãos pelo rosto, caminhando de um lado para o outro. — Eu revivi minha esposa e agora ela quer a família de volta. Acontece que eu não consigo mais controlá-la, e a minha filha está em perigo.

— Você merece o prêmio de Pai do Ano. — Benny balançou a cabeça, enquanto William ligava para Alice. — Tem ideia de para onde ela foi?

— Rockefeller Center — Jessica disse baixo, acordando. — Ela disse que estaria esperando a Alice por lá e se ela não for, o Natal de Nova York terá um tom de vermelho sangue nas ruas.

— Então é para lá que eu vou — a voz de Alice chamou a atenção deles para a porta, embora a garota já estivesse saindo. — Não quero ninguém atrás de mim. Ela é meu problema. Vou conversar com ela e vai ficar tudo bem.

 

~*~

 

Rockefeller Center é um grande complexo comercial, que conta com dezenove edifícios comerciais. Em Dezembro, uma exuberante árvore é montada em frente a um grande prédio, enfeitando a pista de patinação no gelo logo abaixo do símbolo natalino. As luzes e enfeites dão um ar festivo ao largo corredor entre os dois prédios mais baixos, pouco à frente do arranha-céu, onde fontes de água cristalina são dispostas em fila, até a pista de gelo.

Ali, famílias e amigos se divertiam, esperando começar a missa na Catedral de St. Patrick. Em meio a multidão, a pequena garotinha, acompanhada de seus pais, se equilibrava na beirada de uma das fontes, exibindo sua habilidade de permanecer na ponta dos pés. O pai da menina, encantado com sua pequena, a pegou no colo e a ergueu, fazendo a boina com detalhes floridos cair.

Antes que a mãe pudesse se abaixar para pegá-la, outra pessoa o fez, entregando-a, com um sorriso gentil no rosto.

 

— Obrigada. — A moça sorriu, antes de voltar-se para a filha. — Alexander, deixa eu colocar a boina da Lice!

— Alice? — A mulher sorriu para a menininha, que escondeu o rosto, assustada. — É o mesmo nome da minha filha.

— Ela está por aqui? Poderiam brincar juntas.

— Não, ela ainda não chegou. Mas enquanto isso, acho que eu vou brincar com sua Alice.

 

O olhar gentil da mulher tornou-se frio, assim como o esboço do sorriso sombrio em seu rosto.

 

~*~

 

William fez menção de seguir Alice, mas Rachel o impediu, balançando a cabeça. A Grey sabia que ela não ia gostar que se intrometessem em seus assuntos de família. Mas o estranho comportamento de Jared deixou Benny apreensivo. O garoto percebeu que Jared segurava o choro, dificultando até mesmo sua respiração.

 

— Benny? — Annie chamou, do topo da escada.

 

Sua expressão não era nada animadora.

 

— Annie, você viu alguma coisa? — O garoto correu até ela, segurando em suas mãos frias e trêmulas.

— Não. Mas… Eu sinto. Algo terrível está para acontecer. Por favor, Benny, não me deixa sozinha. Eu estou com medo. Não quero perder você! — sua voz entrecortada arrepiou o garoto, embora ele continuasse a sorrir.

— Você não vai! Eu vou sempre estar com você, Annie. Sempre! Mas agora, a Lice precisa de nós. Aqui você estará segura com a minha mãe.

— Ninguém está seguro! — bradou o Harper, socando a parede. — A Mery vai esmagar cada um! Nada vai ser capaz de detê-la!

— Acalme-se, Jared. Cruzes! — Rachel disse alto, encarando o homem. — A agente Meredith era uma espiã. Não tinha nem metade do treinamento físico que a Jordan tinha. O que te faz  pensar que uma mulher que passou vinte anos morta vai conseguir deter uma equipe de heróis?

— Porque ela é mais poderosa do que vocês. Eu fiz isso com ela. Eu dei poderes à ela. E agora o ódio dela será o combustível para destruí-los completamente! — gritou o homem, tão alterado que as veias de seu pescoço e têmporas destacavam-se sob sua pele.

— Você é um monstro! — Benny disse entre os dentes, seguindo para fora. — Não vou deixar minha professora sozinha.

— Ela é muito mais do que sua professora, Benjamin!

— É! Eu sei. Ela é minha amiga e ela é louca. Por isso vou ajudá-la. — Sem nem olhar para o homem, Benny passou por ele, decidido a ignorá-lo.

— Alice é sua irmã.

 

As palavras de Jared paralisaram o garoto, que sentiu o chão desaparecer sob seus pés. Ele se virou para o cientista, reparando nos olhares assustados, embora ninguém expressasse o mínimo de surpresa.

 

— O que?! — disse baixo, quase sem conseguir tirar as palavras de sua garganta.

— Benny, eu sou seu pai.

— Mãe? — ele chamou, embora não desviasse o seu olhar do homem.

 

Jessica observou Rachel e William, procurando algum conselho silencioso ou um modo de escapar daquela situação, mas tudo o que recebeu foi um sorriso fraco e um balançar de cabeça, encorajando-a a resolver de uma vez por todas aquela situação. Afundando o rosto entre as mãos, ela respirou fundo, antes de assentir para o filho, que fechou os olhos com força.

 

— É verdade, querido. Eu sinto muito.

 

Benny não respondeu. Não porque não quisesse, mas porque as palavras não passavam por sua garganta, deixando-o tonto, nauseado e com falta de ar.

Will ajudou o garoto a se manter de pé, dizendo em seu ouvido que agora ele teria que ser ainda mais forte, pois sua irmã precisava dele. Assentindo devagar, Benny deu alguns tapinhas no ombro do rapaz e caminhou para fora, deixando o clima ainda mais tenso dentro da casa.

 

— Perdoem-me a intromissão, mas precisamos de um plano — Delilah falou suavemente, colocando a mão no ombro de Jessica, que não parava de chorar. — Posso pedir suporte na Nexus. Talvez o John possa encontrar um meio mais fácil para evitarmos uma batalha.

— O John está afastado, Fada. A Diretora Jones não vai gostar nada se metermos ele nisso. — Will suspirou, cruzando os braços.

— Não temos tempo para pedir reforços. — Jared balançou a cabeça, voltando a caminhar pela sala. — Só preciso entrar na mente dela e desligá-la, então vou poder consertá-la devidamente.

— Sua mulher está morta! Não precisa de conserto, precisa descansar em paz! Acorda, Jared. É o fim da sua amada!

— Se você pudesse trazer o August de volta, não faria tudo para isso?

— Só se fosse para matá-lo com as minhas próprias mãos em seguida! — Rachel se aproximou do homem, fazendo as luzes da casa piscarem. — E posso fazer o mesmo com você.

— Grey, para! Precisamos dele por enquanto. — disse Will, sem humor algum. — O Spotlight poderia entrar na mente da morta e alterar as memórias dela ou ao menos deixá-la paralisada.

— Impossível. O cérebro dela está conectado à várias máquinas. Os códigos de acesso se perderam dentro da consciência da Meredith. Nenhum telepata conseguiria invadir.

— E se um hacker e um telepata tentasse?

— Talvez. Mas as chances são mínimas. E somente de um dos meus computadores seria possível o acesso.

— Isso não é problema. — William puxou Jared pelo braço, prendendo uma algema no pulso do cientista. — GreyThunder, Fada, vocês ajudam a Lice. Spotlight e eu vamos para o antigo laboratório. E você, Harper, não tente nenhuma gracinha.

— Eu não vou com você, Netuno — disse Benny, encostado na porta. — Eu preciso ver a Lice.

— Não temos tempo para…

— Eu preciso ver minha irmã! — gritou, cerrando os punhos.

— Teimosia é genética, pelo jeito. — Rachel revirou os olhos, seguindo para fora. — Dá para transportar os três, Fada?

— Facilmente. — A garota sorriu, enquanto nuvens carregadas se formavam apenas sobre a residência dos Johnson.

 

~*~

 

A Polícia chegou no Rockefeller, mas sua pior missão foi afastar os curiosos, que gritavam ao redor de um dos edifícios menores. No parapeito do telhado, Meredith estava sentada com a pequena Alice ao seu lado. Apavorada, a menina chorava e chamava pelos pais, enquanto a mulher arrumava os cabelos castanhos da pequena. A Harper usava um macacão de mangas longas branco, com o símbolo da Nexus no peito, em azul, assim como uma faixa que enfeitava sua cintura, por cima do cinto, onde guardava duas pistolas e uma katana. Sua boca estava coberta por uma máscara branca, com alguns detalhes azuis. O uniforme parecido com o da Pocket Girl criou especulações entre os curiosos, que desconfiavam de que a heroína tivesse virado uma vilã. Outros defendiam, com toda convicção, a vigilante de Nova York, que nunca decepcionou a população, trazendo esperança e segurança para todos.

Posicionados ao redor do pequeno edifício, os policiais esperavam as ordens de seu comandante, que se pôs a frente deles, segurando um megafone.

 

— Atenção, senhora. Desça e traga a criança em segurança, ou não teremos escolha, a não ser atirar — disse ele, mal enxergando a mulher e a menina.

— Vocês querem a pequena Alice? Eu também quero! — Meredith gritou, fazendo menção de jogar a menina. — Onde você está, sua mal criada?

 

Sem dizer uma única palavra, a Pocket Girl colocou a mão sobre o ombro do comandante da Polícia e mostrou seu distintivo da Nexus, assentindo uma única vez, com o sorriso melancólico escondido pela máscara. A garota pegou o megafone e subiu em uma viatura, enquanto colocava um aparelho em sua orelha direita que, ao apertá-lo, transformou-se em um monóculo, permitindo que ela enxergasse perfeitamente sua mãe e a garotinha que conheceu pela tarde.

 

— Oi, mãe — ela começou, levando a outra mão na cintura. — Você não deveria estar preparando o peru ao invés de assustar criancinhas? Okay, okay. Você é uma zumbi, mas não precisava levar isso tão a sério.

— Respeite-me, garota! — bradou a mulher, irritada. — Vamos para a casa, agora!

— Ah, não vai dar não. Vou passar o Natal com uma ex-namorada do pai. Ela é bem legal. Bem… viva, sabe?

— Não me provoque!

— Ou o quê? Vai comer o cérebro de todo mundo aqui? — Alice riu, voltando-se para a multidão. — Queridos nova iorquinos, é melhor começarem a correr para a casa se não quiserem ser vítimas de um apocalipse zumbi. Veja como a Mamãe Zumbi é perigosa! Vocês não estão morrendo de medo?

 

Em resposta a provocação da Pocket, os curiosos começaram a rir e vaiar, só fazendo aumentar a ira de Meredith.

 

— Vamos, mãe. Não para a antiga casa, mas para sua nova, na prisão. Sequestro é crime, sabia?

— Ah, querida. Seu pai faltou em te educar direito. Ele deveria ter te dado algumas palmadas! — Meredith riu alto, levantando-se, enquanto segurava a menina pela mão.

 

Tudo o que Alice fez em resposta foi jogar o megafone no chão e se virar de costas. Chamou a mulher com o indicador, antes de dar dois tapinhas na bunda, deixando sua mãe no limite, e as pessoas eufóricas.

Meredith empurrou a menina para trás, antes de pular do prédio, tirando um uníssono som de espanto de quem assistia. Mas o silêncio seguinte começou a se transformar em desespero, quando a pequena mulher começou a dobrar inúmeras vezes de tamanho, antes mesmo de atingir o chão.

Alice arregalou os olhos e recuou um passo, observando sua mãe ficar cada vez maior, atingindo um pouco mais do que a altura do prédio do qual estava.

 

— Essa batalha vai ser bem maior do que eu imaginei — Alice comentou consigo mesma, engolindo seco e respirando fundo.

 

Os curiosos começaram a gritar e correr, aumentando ainda mais a tensão do local. Pessoas derrubavam umas às outras, sem importar-se com quem estavam machucando. Por um instante, a Pocket Girl sentiu-se perdida. Derrotada antes mesmo de começar a batalhar. Mas o grito da jovem chamando por sua filhinha, que ainda estava no topo do prédio, deu-lhe forças para encarar a mãe e sorrir de canto, sob a máscara negra. Nova York era sua filha e também era sua mãe, já que nas ruas daquela cidade, aprendeu tantas lições boas e dolorosas.

A Pocket Girl deu alguns passos em direção a gigante, fitando seus olhos inexpressivos, embora percebesse que Meredith também mantinha um sorriso discreto.

 

— Sabe que não precisamos disso, filha. Ninguém precisa se machucar mais do que já estamos. Só vamos para casa, querida. Vamos viver como se nada tivesse acontecido.

— É uma proposta muito tentadora, mãe. Mas eu não posso ignorar os vinte anos em que você esteve ausente — disse firme, tentando evitar que o nó em sua garganta a sufocasse. — Mas eu não culpo você. Céus, você estava morta! Não era nem para estar aqui, atrapalhando o Natal dos outros. Mãe, por favor. Você carrega no seu peito o símbolo da justiça que nós duas acreditamos. Siga esse caminho mais uma vez.

— A Nexus traiu a nossa família! — bradou a mulher, fazendo sua voz ecoar pelas ruas.

— Não! Você traiu o meu pai! Ele era perigoso, você fez um ótimo trabalho, mas ele descobriu tudo e matou você!

— Mentirosa! — Mais uma vez Meredith gritou, voltando ao seu tamanho normal.

 

Flashs de suas memórias verdadeiras invadiam sua mente, embora continuasse acreditando que aquilo tudo era apenas manipulação de sua filha. Furiosa, a mulher encarou Alice, cerrando os punhos com força.

 

— Você tem uma família, garota. Seu pai fez de tudo para isso, então você vai ser grata e aceitá-la por bem ou por mal!

 

Meredith mal se moveu, e um raio atingiu o solo, dividindo-se em dois. A Fada Violeta, o Spotlight e Jared param à direita de Alice, enquanto o Netuno e a GreyThunder ficavam do lado oposto, encarando a mulher. As pernas trêmulas do cientista vacilaram depois da breve viagem, fazendo-o ir de encontro ao chão, respirando rapidamente.

William deu um passo à frente, sendo observado cuidadosamente pela ex-espiã, que permaneceu imóvel, após trocar um breve olhar com Delilah.

 

— A Pocket Girl tem uma família. Nós!

— Quem é você? — ela perguntou devagar, semicerrando os olhos.

— Eu sou o Netuno. Namorado da sua filha. — O rapaz estufou o peito, orgulhoso do título.

Wow! Ninguém falou em namoro! Vamos com calma! — Alice fez um x com os braços, arregalando os olhos. — Ignora ele, mãe.

— Obrigado por destruir minha moral com a sogra!

— Ela não é sua sogra! — A Pocket ergueu o punho fechado para o rapaz, comprimindo os lábios para não xingá-lo.

— É nessas horas que eu prefiro a companhia de uma garrafa de tequila. — Rachel revirou os olhos, entediada.

— Vocês estão desperdiçando meu tempo — disse a mulher, recuando alguns passos, enquanto se notava a diferença em sua altura gradativamente. — É meu único aviso. Saiam daqui, se não quiserem ser esmagados, juntos com qualquer um que surgir em minha frente.

— Pocket — Benny chamou, desviando a atenção da heroína para ele. —, nós temos um plano. Mas vai precisar aguentar algum tempo sozinha enquanto Netuno e eu consertamos isso.

— Spotlight…

— Fica com isso — disse baixo, entregando a echarpe azul para a garota e usando seu controle da luz para esconder o rosto. — Só para você saber que seu irmão está do seu lado. É eu já sei de tudo — ele suspirou, segurando as mãos de Alice. —, mas agora não temos tempo para falar sobre isso. Só saiba que foi o melhor presente que eu poderia receber neste Natal. Agora vai lá e distraia ela. Podemos demorar um pouco, mas vamos conseguir, juntos!

 

Alice não conseguiu dizer nada. Apenas assentiu e abraçou o garoto rapidamente, antes de se voltar para a gigantesca Meredith.

Rachel e Delilah não perderam mais tempo e começaram a evacuar toda a área, tirando pessoas das ruas e prédios ao usarem a velocidade aumentada, deixando apenas vultos cinzas e violetas serem vistos.

Benny olhou uma última vez para a irmã, que carregava um olhar confiante, enquanto amarrava a echarpe em sua cintura. Ele seguiu com William e Jared para o Mini Móvel, e logo saíram pelas ruas de Nova York, rumo ao laboratório abandonado do cientista.

O tempo pareceu congelar, assim como o clima daquela noite. Alice respirou fundo e soltou o ar devagar, que se transformou em uma fina névoa em contato com o frio. Os segundos se arrastavam lentamente, enquanto ambas erguiam os punhos, embora nenhuma das duas realmente quisesse lutar. Mas era necessário.

Meredith diminuiu aos poucos sua altura, até voltar ao tamanho normal, enquanto se aproximava da filha. Alice pensou em tentar convencê-la mais uma vez, porém mal teve tempo de abrir a boca e um chute lhe atingiu, lançando-a para trás. A força dela era equivalente, ou até mesmo superior, à de Alice em seus cinco milímetros. A Pocket Girl diminuiu seu tamanho antes de atingir o edifício do lado oposto, atravessando a parede como uma bala, embora a destruição fosse um pouco maior.

Não demorou para a heroína de Nova York sair dos escombros, que mais pareciam com um cenário de guerra por sua perspectiva, soltando um gemido baixinho. O impacto não foi o suficiente para quebrar nenhum osso, mas não a livrou de uma dor intensa nas costas. Aproveitando-se da parede, Alice usou-a como apoio para pegar um impulso, saltar em uma velocidade maior e atingir sua mãe no estômago, fazendo-a recuar e bater as costas na grande árvore natalina.

Meredith massageou a barriga, observando Alice já em seu tamanho normal. Aquilo havia tirado-a realmente do sério. Irritada, ela lançou o punho fechado contra o tronco da árvore, que não resistiu ao golpe e caiu, lentamente, causando um som alto ao atingir o chão.

A Pocket Girl ergueu os punhos, mesmo tendo recuado um passo. Os olhos frios e inexpressivos da mulher causavam um certo desconforto na heroína, e ela se perguntou se essa era a mesma sensação que teria caso apresentasse uma nota baixa em sua infância.

Sem demonstrar medo, Meredith começou a desferir alguns socos, defendidos com maestria pela filha, mas a força da mulher era muito maior do que Alice podia aguentar, quebrando enfim sua guarda. Em um golpe rápido, Meredith acertou um tapa no rosto da filha, fazendo-a virar o rosto e esvoaçar seus cabelos castanhos.

Alice, ofegante, colocou a mão no local atingido, antes de olhar nos olhos de sua mãe, com algumas lágrimas já atrapalhando sua visão.

Aquele tapa doeu mais do que qualquer um poderia imaginar ou sentir. Doeu em sua alma.

Mais uma vez, Meredith tentou segurá-la pelo braço e levá-la para casa, mas a Pocket se afastou em um movimento brusco, sem dizer nenhuma palavra. Elas não eram necessárias.

Magoada, Alice não segurou mais sua força, atingindo dois socos no rosto de sua mãe e um chute giratório em seu abdômen, lançando-a vários metros à frente.

 

— Pocket, como estão as coisas por aí? — Will perguntou pelo comunicador, assim que chegou no antigo laboratório de Jared.

— Estou bem, eu acho. Por favor, Netuno, dê um jeito de “desligá-la” o quanto antes.

Certo. Não hesite em pedir ajuda! Você não está sozinha aí.

— Todos estamos com você, Pocket Girl — foi a vez de Benny falar, tirando um sorriso de sua irmã. — Agora vai lá e mostra de quem são as ruas de Nova York!

 

~*~

 

A sala secreta dentro do laboratório, assim como todo o restante do prédio, estava sem energia e coberta de poeira. Apenas a luz produzida pelos olhos de Benny iluminava o local. Mas isso não era um verdadeiro problema. William pediu uma mãozinha para Rachel, que não demorou mais do que alguns segundos para chegar até o prédio e energizá-lo, voltando no mesmo instante para o ritmo constante da evacuação.

Benny mantinha uma pistola apontada para a cabeça de Jared, enquanto o cientista conectava alguns eletrodos em um painel ao lado do computador em que Will estava concentrado em entender o complexo Projeto Y.

Aproveitando-se da inexperiência do filho com armas, Jared facilmente a tomou das mãos do garoto, fazendo-o arregalar os olhos. O cientista sorriu, apontando para William, que não expressou nada, para a surpresa dos dois.

 

— Abaixa a arma — disse simplesmente, enquanto lia algumas informações sobre o controle cerebral de Meredith.

— Você não está em condições de dar ordens agora, rapaz. Se quiser sair vivo daqui, vai fazer o que eu disser e vai deixar minha mulher fugir depois que ela voltar ao normal!

 

Revirando os olhos ao suspirar, Will se virou na cadeira giratória e encarou o homem por um momento, antes de assoprar suavemente, direcionando o ar para a pistola, que começou a congelar no mesmo instante, forçando Jared a soltá-la, antes que seus dedos congelassem juntos.

 

— Se quiser sair vivo daqui, vai fazer o que eu disser. Então comece a trabalhar. — Virando-se para Benny, o rapaz sorriu, embora seu tom de voz continuasse com a mesma firmeza de antes. — Spotlight, preciso de toda a sua concentração.

 

O garoto apenas assentiu, antes de sentar-se em uma das cadeiras, enquanto Jared distribuía os eletrodos por sua cabeça. O cientista facilitou o trabalho do hacker, passando os primeiros códigos corretamente, até se conectar ao cérebro e as memórias de Meredith.

 

— Eu não sei se vou conseguir — a voz de Benny saiu trêmula como suas mãos. — Ver as memórias através dos olhos é fácil, mas conectado à máquinas? Isso é… Bizarro!

— Eu sei, filho, mas…

— Já disse para não me chamar assim!

— Por favor, me escuta. — Encarou o menino, respirando fundo. — Você vai conseguir, mas não vai ser fácil. Ela vai resistir e isso pode doer, mas você é o único que pode fazer isso, certo?

 

Assentindo mais uma vez, Benny engoliu a saliva e suspirou, fechando os olhos. William apertou por fim um botão ao lado do painel, conectando o garoto à Meredith.

 

~*~

 

Os donos dos veículos estacionados em frente ao Rockefeller Center teriam muitos motivos para chorar no dia seguinte, assim como a prefeita de Nova York. Os carros que não estavam completamente amassados, já não tinham mais vidros, e o calçamento da rua estava todo esburacado, devido aos impactos contra ele.

As duas baixinhas, ainda em seu embate violento, já apresentavam cortes no rosto e alguns hematomas.

Alice, tentando acabar de vez com a luta, permanecia mais em seu tamanho diminuto, dificultando os golpes de sua mãe. Mas isso não seria um problema para a mulher. Ela também podia encolher.

Surpreendendo Alice, Meredith ficou tão pequena quanto a filha em poucos segundos, deixando o mundo ao redor das duas assustadoramente enorme, embora Alice já estivesse acostumada a ver tudo como se fosse uma simples formiguinha. Elas não perderam tempo com palavras ou negociações, iniciando uma luta invisível a olhos nus. Mas os estragos, não.

Sem dificuldade para suportar peso, Meredith ergueu um pedaço de concreto que se desprendeu da parede e o atirou contra a Pocket, que conseguiu desviar ao rolar no chão. A garota não esperou mais objetos voadores em sua direção e correu até ela, desviando dos belos flocos de neve, em seus mais diversos formatos. Agora com golpes mais rápidos e fortes, não precisavam de mais do que um chute para mandar a adversária alguns centímetros para trás, que pareciam mais como metros para elas naquele tamanho milimétrico. Com o máximo de sua força, um soco de Alice foi o suficiente para lançar a mulher alguns metros à sua frente. Ela acabou atingindo um paquímetro, e uma chuva de moedas quase do tamanho delas ecoou por seus ouvidos, causando um zumbido incômodo, devido ao som do metal atingindo o chão e rolando entre elas, em uma frequência quase insuportável para as pequenas mulheres.

Aproveitando-se da inexperiência de Meredith com os ruídos ensurdecedores, a Pocket Girl atingiu um soco no maxilar da mulher, na intenção de finalizá-la, que mais uma vez voou em direção ao prédio mais baixo, quebrando outra parede ao atingi-la, já em seu tamanho normal.

Alice, um tanto cansada, também voltou para sua altura máxima, mantendo seu olhar melancólico na mulher que mal se movia.

 

— Mãe, já chega! Eu não vou permitir que você continue com isso, mas também não vou com você. Entregue-se!

— Nunca! — Sua voz foi cortada por um gemido alto, enquanto ela levava as mãos até a cabeça.

 

Benny já vasculhava as memórias de Meredith, mesmo que isso causasse náuseas e uma dor de cabeça cada vez mais intensa. A resistência mental que Jared desenvolveu para ela era forte demais para ele, embora não ousasse desistir antes de tentar derrubá-la. Os códigos secundários não levaram muito tempo para serem quebrados por Will, que mal piscava, concentrado em seu trabalho.

Ignorando o invasor em sua mente, a mulher ergueu-se em meio aos escombros, olhando nos olhos de Alice.

 

— Por que, Pocket Girl? Por que? — disse com desprezo o codinome da filha, franzindo o cenho. — Você pode ter o que nunca teve! Eu voltei! Voltei para você e para o seu pai. Por que você não está feliz?

— Porque você morreu! — Alice gritou e cerrou os punhos. — Você foi assassinada, tirada de mim! Você virou uma mera experiência em um laboratório clandestino por vinte anos, porra! Como você quer fingir que nada disso é bizarro demais para seguir como se nada tivesse acontecido?! Eu não posso ignorar o fato do meu pai ser um assassino! Não posso ignorar o que ele fez comigo! Ele me usou da mesma forma doentia que usou seu corpo! Ele não nos ama!

Isso não é verdade, Lice! Eu amo você! Amo vocês mais do que tudo! — Jared choramingou pelo comunicador, sentindo o coração apertar com as palavras duras da filha.

— Cala a boca! — Ela gritou ainda mais alto, levando as mãos trêmulas até os ouvidos, sem mais conter as lágrimas. — Eu queria uma mãe. Eu queria ser normal, ter amigos na infância, não uma nove milímetros e treinamentos exaustivos aos dez anos. Eu poderia ter tudo isso, mas vocês dois, a Nexus, a Nêmesis… Todos vocês tiraram isso de mim! Por vinte anos eu vivi sufocando a dor de ser a menina estranha da escola, com medo até da própria sombra, com medo de não ser capaz de fazer algo de bom, além de roubar e matar em nome da ciência. Mas aqui estou. — A heroína secou os olhos, borrando ainda mais a maquiagem que marcava a parte exposta de suas bochechas com duas linhas pretas. — Eu sou a Pocket Girl! Eu sou a heroína de Nova York, a esperança desta cidade, e eu vou protegê-la!

 

As palavras de Alice não foram o suficiente para alcançar o coração de Meredith, embora seu esforço mental para afastar Benny de suas memórias a deixasse um pouco mais cansada. Ainda assim, permaneceu resoluta em seu propósito. Teria sua família de volta, independente do que teria que fazer.

 

— Proteger uma cidade, enquanto deixa a sua família ser destruída? — Meredith balançou a cabeça devagar, deixando as palavras saírem lentamente de sua boca. — Não vejo nobreza nenhuma no seu ato de heroísmo.

— Porque essa não é você! A agente Ward não pensou duas vezes antes de aceitar espiar o próprio marido, mesmo amando ele! Eu não odeio você, mãe! Você é a maior vítima disso tudo, será que não percebe?

— Você tem razão — disse a mulher, começando a crescer. — Sou vítima da sua ingratidão!

— Mãe!

— Calada! — bradou, fazendo a Pocket recuar um passo. — Cansei disso, garota! Será que você não percebe que está magoando sua mãe? Acha que eu não tenho sentimentos só porque eu estava morta? Você não sabe de nada!

 

Meredith, já em seu maior tamanho, bateu o pé no chão, causando um pequeno tremor, assim como rachaduras na pista de gelo e nas paredes dos prédios. Alice custou para manter-se firme e precisou recuar o mais rápido que conseguiu, para não ser atingida por um bloco de concreto. Nada daquilo assustou a heroína.  Porém, um único som que foi capaz de fazer a Pocket Girl paralisar por um instante, gelando completamente seu sangue. A voz que gritava por seu nome, não tão irreconhecível agora. A mesma voz daquela mãe que chamava por sua filha.

 

— Não! — a Harper sussurrou, olhando por todos os lados em desespero. — Fada? GreyThunder? Onde vocês estão?

Estamos bem — Delilah disse, ofegante. — Meus poderes falharam de novo, mas a Grey conseguiu terminar.

— Não! Ainda tem gente aqui!

Desculpa, Pocket. Eu não consigo trocar um passo. Desculpa! — Rachel sussurrou, sem evitar um gemido no final de sua frase.

— Spotlight? Netuno? Depressa! — gritou, tentando encontrar a garotinha em seu campo de visão.

— Eles te deixaram sozinha, pequena. Mas eu estou aqui. Eu estou aqui para você, querida! — Por baixo da máscara, Meredith sorriu, abrindo os braços. — Você ainda é fraca. Não pode proteger essas pessoas, mas eu posso proteger você.

— Fica longe dela, sua feiosa! — a voz infantil fez o coração de Alice disparar. — Ninguém pode machucar a Pocket Girl!

 

A menininha fujona estava aos pés da gigante, atirando pedras, que mal acertavam sua canela. Dando uma gargalhada, Meredith observou a garotinha de pé sobre os escombros, e ergueu lentamente a perna, apenas para ver o desespero nos olhos da filha.

 

— Corra, Alice, corra! — gritou, embora a menina nem se movesse. — Spotlight, por favor!

Eu estou tentando! — gritou também, contorcendo-se na cadeira. — Ela é forte! Desculpa!

— Você não pode protegê-los, Pocket Girl. E eu vou te mostrar quão pequena, fraca e impotente você é!

 

Mesmo em seu maior tamanho, a Pocket Girl sentiu-se realmente minúscula, fraca e impotente. Por mais rápido que corresse, os metros entre a heroína e a garotinha, tão desesperada quanto ela, pareciam estender-se cada vez mais.

Tempo.

Tudo era uma questão de tempo. Em poucos segundos uma criança seria brutalmente assassinada, sem que ninguém pudesse impedir. Em poucos segundos, a Pocket Girl falharia em seu propósito; proteger os moradores de sua cidade. Proteger a pequena Alice.

— Não!

O brado da heroína ecoou pelo corredor de prédios, como reflexo de sua última tentativa de impedi-la, sem sucesso. O estrondo e a nuvem de poeira encerraram a corrida de Alice, que deixou os braços penderem ao lado do corpo. O choro não saía por sua garganta, deixando-a sufocada.

Mas, do meio da poeira, ouviu-se uma risada, da qual Alice conhecia muito bem, assim como os rastros luminosos azuis, que iam de um lado para o outro.

 

— Não se preocupe, tia Pocket, a cavalaria chegou! — uma voz feminina chamou a atenção de Alice, enquanto a poeira baixava. — Nossa, olha o tamanho desse pé, Max! Imagina como deve ser o chulé dessa Godzilla aí.

— Eu chamaria de Chernobyl Dois — respondeu um rapaz que a acompanhava, rindo baixo.

— Trajetória! — mais uma vez Alice gritou, sem evitar o sorriso em seu rosto ao ver os rastros azuis se aproximando.

Nos braços de Taylor, a pequena Alice estava com os olhos bem fechados, enquanto segurava firme na heroína de Vivid City.

— Pronto, querida. Já acabou. Logo você estará com sua mamãe — disse gentilmente, antes de pegar a menina e abraçá-la.

É a Trajetória?! — Benny arregalou os olhos. — Estou indo falar com ela! Não a deixe escapar!

— Foco, Spotlight! Preciso de você  concentrado aí! — Alice trocou um olhar rápido com Taylor, suspirando.

— Max, tira a mini Lice e a mãe dela daqui — disse para o rapaz ao seu lado. — Teleporte-se para longe. Está na hora de derrubar esse Megazord.

— Certo! — Max pegou a menina e desapareceu no mesmo instante, deixando uma névoa escura onde estava.

— Não importa quanta ajuda você receba, garota! Você vem comigo! — Meredith observou as pequenas silhuetas, lembrando apenas bonecas de pano, e sorriu sob sua máscara, enquanto cerrava os punhos. — E você, menina, vai se arrepender de ter atrapalhado ao invés de ficar com seus pais.

 

Taylor levou o olhar para a mulher no mesmo instante em que ouvira sua frase final, o que a fez assumir um semblante sério. Olhando para o cronômetro em seu pulso esquerdo, ela iniciou a sua contagem regressiva, começando em quinze minutos.

— Hora do show — Assentiu ela, antes de avançar, sem temer a gigante.

 

Os rastros azuis prenderam a atenção da ex-espiã, que estudava os movimentos de Taylor, procurando um padrão. Por mais que seu esforço mental para manter Benny longe de suas memórias fosse enorme, ela ainda conseguia raciocinar perfeitamente durante a batalha.

Ao perceber que a garota atacaria pelas costas, ela girou, já desferido um chute. Sua canela acertou o corpo todo de Taylor, lançando-a na pista de gelo. O impacto foi mais forte do que a Trajetória havia calculado, mas não o suficiente para machucar a heroína de Vivid City. Pelo menos não naquele momento. Porém, seu novo problema era a pista, que lentamente cedia com o seu peso, aumentando as rachaduras pequenas, causadas pela gigante. Tendo que correr como sua opção mais viável, Taylor deslizou pelo gelo, segundos antes dele quebrar sob seus pés. Já de pé no calçamento, a garota soltou um suspiro aliviado antes de voltar a ajudar a pequena heroína.

— Hey, King Kong sem pelo! — bradou ela, colocando as mãos ao redor da boca para que sua voz saísse mais alta. — Eu conheço um magrelo que chuta melhor que você!

— Olha como fala com a minha mãe! — Alice cruzou os braços e virou o rosto, sem disfarçar o biquinho sob a máscara.

 

Sem perder tempo com a conversa das heroínas, Meredith tentou pisar em cima delas mais duas vezes, embora elas esquivassem facilmente. Aquele tamanho não colaborava muito com sua velocidade.

Conseguindo evitar o próprio esmagamento mais uma vez, Taylor correu pela avenida já repleta de crateras, enquanto procurava pensar em algo. Do outro lado, a heroína de Vivid City pôde ver a sua ex-professora usar o seu controle de tamanho com maestria, enquanto esquivava como podia. Aproveitando as brechas criadas pelo tamanho de Meredith, Taylor correu até Alice, ficando ao seu lado.

— Pocket, lembra de quando estávamos jogando baseball e eu fiz o Benny desmaiar ao acertar ele com a bola? — disse rápido, um pouco ofegante.

— Claro que lembro. Pensei que ele estava morto! — Assentiu, observando a gigante fechar os olhos com força, enquanto levava a mão até a cabeça. — Acha que consegue repetir a proeza?

— Fácil, só espero que o vento não atrapalhe você — devolveu, com um sorriso de canto ao estender a mão para a mulher. — Se joga, Pocket, literalmente.

 

Sorrindo de canto, Alice segurou na mão de Taylor, já diminuindo seu tamanho. Era difícil ignorar o frio na barriga, embora estivesse ansiosa para sentir a adrenalina do lançamento.

A Parker então fechou a mão com cuidado, respirando fundo, antes de soltar o ar lentamente. Olhava para Meredith, que, ainda atordoada, balançava a cabeça, com os olhos fortemente fechados. E então, após entender um certo padrão de movimento, Taylor entrou em posição, levantando e dobrando a perna esquerda, antes de lançar a pequena heroína, torcendo para não ter exagerado na força.

Alice não conseguiu evitar que um grito de empolgação saísse de sua garganta, movendo-se tão rápido quanto uma flecha. Era a primeira vez que voava e era incrível.

Ao aproximar-se do alvo, Alice aumentou seu tamanho, acertando os dois pés na testa da gigante, que perdeu o equilíbrio, caindo de costas lentamente. Porém, a gravidade também agiu sobre a heroína, que despencava rumo ao chão.

 

— É minha!

Graças aos óculos que detectavam assinaturas de calor, Taylor pôde correr atrás da professora, que apenas aumentava a velocidade de sua queda. Com um leve impulso, Trajetória, pulou, enquanto pegava a ex-professora no ar. De volta ao chão, a Parker precisou dar alguns passos à frente, antes de conseguir parar, com Alice em seu colo.

Ela segurou firme no pescoço da garota e abriu os olhos devagar, certificando-se de que ainda estava viva.

— Sabe, que essa imagem parar nos jornais, vai aumentar o número de fanfictions shippando a gente!

— Nem ligo muito, mas prefiro as que me fazem ser par romântico do Capitão América. — Taylor riu baixo, colocando-a no chão. — E então, ganhamos?

— Eu não faço ideia — Alice disse baixo, observando a gigante, desacordada, diminuir aos poucos.

Pocket — William chamou —, eu consegui derrubar o terceiro portão, e o Spotlight já tem o controle das memórias da sua mãe. Acabou.

 

Aliviada, ela respirou fundo e fechou os olhos, relaxando os ombros. Aproximou-se da mulher e ajoelhou-se ao seu lado, antes de afastar os fios do rosto de sua mãe. A respiração constante dela deixou a heroína mais tranquila, embora não soubesse qual futuro estaria reservado para Meredith. Ela estava morta, de certa forma.

No laboratório, William recostou na cadeira e passou a mão no rosto, tentando livrar-se da tensão de minutos antes. Jared observava o Netuno em silêncio, enquanto Benny permanecia com os olhos fechados, navegando nas águas escuras e confusas das memórias da agente Ward.

Aos poucos, o garoto foi restaurando o passado da mulher, mesmo que não fosse nada fácil. Doía.

 

— Acabou, mãezinha. — Um sorriso tristonho se formou no rosto de Alice, enquanto ela beijava a bochecha da mulher. — Eu sinto muito.

 

Antes que pudesse pegar a mulher nos braços, um grito inesperado de Benny, vindo do comunicador, fez a garota fechar os olhos com força, soltando um gemido baixinho. No mesmo instante, Meredith segurou a Pocket Girl pelo pulso e a puxou para perto, sem dar-lhe chance de defesa. A mulher a segurou pelos cabelos e atingiu dos socos em seu rosto. Em um movimento rápido, puxou a máscara da Pocket Girl, danificando o tecido.

Alice precisou chutar o abdômen de Meredith para escapar, rolando para trás, enquanto cobria o rosto e ativava a invisibilidade. Taylor não demorou para atacar a mulher, dando algum tempo para que a Pocket se recuperasse.

 

— Spotlight, o que aconteceu?

Ele está sangrando, Alice! Eu não sei o que fazer! — William disse rápido, segurando a mão do menino, que rangia os dentes, evitando mais um grito de dor. — Você precisa finalizar isso logo. Ele não vai resistir desse jeito!

— Não! Eu consigo! Não vou decepcionar você, Pocket Girl! — Benny mal terminou a frase e se contorceu na cadeira, tentando não chorar.

— Benny, para! — ela sussurrou, observando o embate da Trajetória contra sua mãe. — Você já fez o bastante!

Não! Posso fazer mais, por você! Só me dá uns minutos.

— Ela destruiu minha máscara, não sei se eu consigo.

Não é hora para se preocupar com sua identidade! — Netuno quase gritou, irritado. — Você precisa fazer isso. Agora!

— Não é sobre a minha identidade! É sobre meu tamanho. Não posso respirar sem a máscara no tamanho milimétrico! — explicou, enquanto tirava a echarpe de Benny da cintura e amarrava-a no rosto, engolindo seco. — Mas você tem razão. Eu vou terminar isso. Agora.

 

O cronômetro da Trajetória já estava em seus últimos segundos, quando a Pocket Girl atingiu Meredith com dois chutes no peito, derrubando-a no chão. Ela trocou um olhar com a ex-aluna e assentiu, agradecendo em silêncio pela preciosa ajuda.

O som da katana, que pertenceu a agente Ward, sendo tirada da bainha, arrepiou a heroína. Mas ela não se mostrou abalada. O olhar firme em sua mãe mostrava o quão forte ela era em seus propósitos. Um defeito dos Harper? Talvez.

 

— Vai levar isso a sério, filha?

Sim, mãe.

Já estava na hora.

 

Meredith se levantou e limpou o sangue do nariz, antes de sacar a própria espada e atacar a filha, fazendo as lâminas se chocarem com uma velocidade impressionante, ecoando o som do metal.

Benny continuava em sua luta mental contra as lembranças falsas da mulher, enquanto William secava o suor do rosto do garoto, que fazia seus cabelos negros grudarem em sua testa. Seus ouvidos e nariz sangravam, devido ao esforço, deixando Netuno ainda mais preocupado.

Jared não esperou mais nenhum segundo e saiu sem que ninguém percebesse, levando as chaves do carro. Tinha um terrível pressentimento devido aquela luta, e sabia que teria que impedir uma tragédia. Ou pelo menos tentar.

A Pocket já aparava com dificuldade as investidas de Meredith, obrigando-a a manter-se na defensiva a maior parte do tempo. Sua força em seu tamanho normal não era o suficiente para manter o ritmo acelerado e incansável da mulher. Todo seu combustível para continuar era o esforço de seu irmão. Tudo o que queria era livrá-lo da dor que sentia. Que ambos sentiam.

Meredith derrubou a garota ao empurrá-la com o ombro, e cravou a katana no chão, já que Alice foi mais rápida e rolou para a direita, desferindo um chute no queixo da mulher, lançando-a para trás. Ela cambaleou e fechou os olhos por um instante, mas se recuperou a tempo de evitar um golpe da adversária.

As lâminas cruzadas, medindo suas forças, mantinham as duas próximas o suficiente para que se olhassem nos olhos.

Havia tanto a ser dito, mas nenhuma palavra foi ouvida, além daquelas que permaneciam impressas nos olhares cansados, cheios de lágrimas, mágoa e dor. Porém, de repente, os olhos de Meredith se arregalaram, perdidos em um ponto fixo. Seus braços cederam ao esforço, facilitando as coisas para a Pocket Girl. Alice empurrou a mãe, que recuou apenas um passo, derrubando sua espada.

 

O tempo pode ser relativo, dependendo da perspectiva de quem assiste ou espera. Aquele momento, por mais rápido que pudesse parecer, durou uma eternidade.

 

Mais uma vez, os olhares de Alice e Meredith se cruzaram, selando o destino das duas.

O grito da Pocket Girl ecoou pelas ruas, no momento em que segurou, com as duas mãos trêmulas, o cabo da katana cravou-a na barriga de sua mãe.

 

— Não! — gritou Jared, atrasado, pela primeira vez.

 

Os lábios da heroína se moverem em um pedido de perdão, embora nenhum som saísse de sua boca.

Não houve resposta da parte de Meredith. Apenas seu olhar sereno, assim como um sorriso quase imperceptível, foi notado pela a garota, que soluçava ao chorar.

Alice puxou a espada e a lançou no chão, tirando um gemido contido da mulher, que precisou ser segurada para não despencar.

 

— Mãe…

— Shiii! Está tudo bem, querida. Tudo bem — disse baixo, enquanto a Pocket Girl a ajeitava no chão. — O menino conseguiu. Eu estou livre.

— Ele o que?! Mãe… Ajuda! — Alice gritou, olhando ao redor. — Mãe, eu não sabia. Por favor, me perdoa. Eu vou te levar para o hospital. Você vai ficar bem agora.

— Alice..

— Netuno, como está o Benny?!

Bem, eu acho. Ele desmaiou logo depois de dizer que tinha terminado. Não deu tempo de te avisar. Desculpa.

— Tudo bem. Vai ficar tudo bem! — ela disse rápido, apertando a ferida de Meredith, embora o sangramento continuasse.

— Filha?

— Para, mãe. Não se esforça.

Lice — a mulher sussurrou, acariciando o rosto dela. — Quando você estava na minha barriga, eu ficava imaginando como você seria. Deus, você é linda!

— Para de falar, por favor! — implorou Alice, chorando.

— Não tenho muito tempo. Por favor, escuta. — Lágrimas também rolaram pelo rosto de Meredith, que mal conseguia respirar. — Eu estou muito orgulhosa de você, filha. Você… você é muito melhor do que eu poderia imaginar. Uma mulher… incrível. Forte. Estou tão feliz por ver você! Depois de tudo isso… eu só tenho que agradecer por esses minutos em que eu posso falar com você, ver você.

 

Ela começou a tossir mais sangue, deixando a filha apavorada.

 

— Prometa que vai continuar honrando essa estrela e esse legado. Prometa que vai continuar sendo a heroína que é hoje.

— Eu prometo, mãe. Prometo — sussurrou, entre os soluços.

 

Meredith olhou nos olhos de Alice, e sorriu. Ela já não sentia dor, apenas uma chama em seu coração, trazendo-lhe alívio e uma certa alegria em seus últimos momentos.

A neve continuou caindo sobre elas, fazendo a mulher olhar para o céu por um instante, antes de olhar a garota mais uma vez. Os cabelos de Alice estavam cobertos por flocos brancos, e Meredith começou a tirá-los, embora mal tivesse força para manter a mão erguida.

 

— Seu cabelo… Tem neve nele — balbuciou, sorrindo.

— Não é neve, mãezinha. São lágrimas dos anjos — sussurrou e balançou a cabeça, voltando a chorar. — Os anjos estão chorando.

— É! — Ela assentiu, secando o rosto da filha. — Eu estou vendo.

 

Aos poucos, a mão de Meredith perdeu a força, indo de encontro ao chão, e seus olhos perderam o brilho, paralisados. A respiração entrecortada silenciou-se, dando lugar ao grito de Alice, que tentou usar isso para tirar a dor de seu peito, inutilmente.

Ela abraçou o corpo da mãe com força, balançando-se devagar, enquanto soluçava alto, molhando o rosto da mulher com suas lágrimas.

Taylor, receosa e sentindo um nó na garganta, pôs a mão no ombro da professora, antes de abraçá-la de lado, em silêncio.

Jared, desolado, caiu de joelhos em frente as duas, mal conseguindo respirar.

William conseguiu falar com a Fada, e ela, ainda sem o potencial de seus poderes zarydianos, conseguiu levá-los de volta para o Rockefeller, embora o esforço para isso fosse muito maior. Benny ainda estava desacordado e o Netuno o ajeitou no chão mesmo, cuidando para que seu rosto continuasse coberto.

 

— Filha… — Jared disse baixo, mas não completou a frase, recebendo um soco na boca.

— Não sou sua filha!

 

Um sentimento de revolta e mágoa tomou conta da Pocket Girl, fazendo-a deixar o corpo da mãe e avançar contra Jared. Não foi difícil derrubá-lo. Alice sentou-se em seu abdômen e acertou mais um soco no rosto do pai. E mais um. E mais um.

 

— Eu não sou mais sua filha! Eu não sou nada sua! — bradou, sem parar de bater em Jared. — Você destruiu tudo! Tudo! Eu odeio você!

 

O som das pancadas fez Taylor desviar o olhar e William a abraçou, escondendo o rosto da Trajetória daquela cena lamentável. Mas ao perceber que Alice não parava, ele fez menção de impedir que ela continuasse, porém, Rachel o impediu.

 

— Ela vai matá-lo!

— E essa é uma escolha dela! — A GreyThunder fitou o rapaz, antes de soltá-lo.

 

Jared já estava quase inconsciente, devido aos machucados em seu rosto, quando Alice levantou o punho mais uma vez, mas não prosseguiu.

 

— Eu poderia te matar agora mesmo, Jared Harper. Talvez eu devesse fazer isso mesmo, mas não vou. Eu não sou como você!

— Não, Alice — ele gemeu, sem se mover. — Você é mais parecida comigo do que possa imaginar.

— Você está sob custódia da Nexus e dos Estados Unidos da América — disse simplesmente, ao ouvir as sirenes mais uma vez.

 

A Nexus foi rápida em remover o cientista e o corpo de Meredith, embora William estranhasse o curioso interesse de Rachel em ajudar a colocá-la na ambulância.

Alice e Taylor permaneceram ao lado de Benny até que ele acordou, recebendo um abraço capaz de esmagá-lo.

 

— Acabou, Benny. Acabou!

— Eu sinto muito, Lice. Eu não fui rápido o suficiente. Desculpa! — ele lamentou, acariciando os cabelos da irmã.

— Não foi culpa sua, querido. Não foi culpa de ninguém. — Alice assentiu, afastando-se. — Eu pude falar com a minha mãe graças a você e ao Will. Nunca vou conseguir agradecer o suficiente.

— Uma pizza de Natal seria um ótimo agradecimento. Estou faminto! — Ele riu fraco, tirando um sorriso de sua irmã.

— Manter essas orelhas enormes deve gastar mesmo muita energia. — Taylor sorriu de canto, dando um soco no braço do garoto.

 

Em resposta, ele a surpreendeu com um abraço apertado, aproveitando para sentir o perfume de Taylor mais uma vez.

 

— Eu senti sua falta.

— Eu também, Dumbo — Ela retribuiu o abraço, um tanto constrangida, embora estivesse feliz por vê-lo tão forte. — Mas se não me soltar, eu quebro suas pernas.

— Você sempre quebra!

 

 

~*~

 

 

Quando os relógios marcaram, em sincronia, meia noite, e os sinos da Catedral de St. Patrick tocaram, os nova iorquinos, em suas casas, salões de festas, igrejas e na única pizzaria aberta àquela hora, desejaram uns aos outros os votos de feliz Natal.

A data que representa tantas coisas, entre elas, a esperança de um mundo melhor, seria marcada para sempre no coração da Pocket Girl.

Ela pôde enfim realizar seu mais impossível e bizarro sonho, mesmo que não tenha durado. Ou durou?

Tudo o que Alice queria, assim como Jared e Meredith, era ver a família reunida. Mas, o que é família?

Família, para Alice Harper, era o seu recém-descoberto irmão e a mãe dele. Era seus alunos favoritos, seus melhores amigos e até um desconhecido para ela, chamado Max. Todos ali, reunidos ao redor de algumas pizzas, mostravam, sem qualquer palavra, que ela não estava sozinha. Ela sempre teria uma família, enquanto tivesse as pessoas que amava, próximas de si.

E eles também a amavam. Mais do que poderia imaginar.

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

ACABOU!
Acabou, embora não seja o fim. É, queridos. Ainda teremos um epílogo antes de Pocket Girl ser marcada como finalizada. Aguardem.

Mais uma vez quero agradecer a todos que me acompanharam até aqui, mas meu agradecimento mais do que especial vai para você, Gus. Achou que eu ia deixar de fazer uma dedicatória? Haha
Gus, você foi meu anjo durante esse projeto, assim como em todos os outros. Muito obrigada por estar sempre ao meu lado. Você tem um lugar especial no meu coração.
E a todos do HL, vocês são a minha família. Aquela que eu escolhi. Amo todos vocês.

Mil beijos da Mini e até o próximo =*



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