O peso de uma escolha. escrita por Sazi


Capítulo 12
Uma trilha de dor.


Notas iniciais do capítulo

Mais uma vez venho agradecer aos comentários. São todos lindos e me deixam imensamente feliz com isso. Espero estar atendendo as expectativas de todos.



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 Carlos ficou extático, mas tinha de tomar imediatamente uma atitude, recolheu o filho nos braços. O sangue escorria de seus pulsos em um gotejar incessante.

— Lenny, Elisa, socorro. - ele gritou a plenos pulmões.

Os dois subiram as escadas o mais rápido que puderam e ao chegar ao quarto da menina se depararam com a cena agoniante. Elisa soltou um grito de pavor. Lenny ficou sem reação. Tinham de agir depressa se não o garoto morreria ali mesmo. Então tirando coragem, não se sabe de onde, a menina correu a uma gaveta e pegou duas meias. Amarrou nos pulsos do irmão, a fim de tentar estancar um pouco o sangramento. Carlos já mais refeito do susto, com o filho nos braços correu escada a baixo seguido pelos dois que estavam com os nervos à flor da pele. Rapidamente foram até o carro e rumaram para o hospital mais próximo, que por sorte ficava a poucos minutos dali. Ehtan já estava empalidecendo a ponto de começar a esfriar.

— Não meu filho, força, não desista, por favor, não desista. - o homem bradava. Lenny que estava no banco da frente, igualmente aflito, indicava atalhos para o local, enquanto Elisa tinha o irmão no colo.

— Por favor, Ehtan, não se rende assim. Por que você fez isso? - ela dizia baixinho perto do irmão.

Logo, chegaram ao local e os gritos entraram no hospital. Ao ouvirem as palavras, tentativa de suicídio, os prontonistas logo correram em socorro do garoto. O angue gotejava no chão branco, criando um rastro de dor e desespero. O pulso o garoto foi checado, por sorte, estava com vida ainda. Teriam como salva-lo. Um lampejo de esperança brotou no rosto dos que acompanhavam o rapaz. Logo ele foi levado, a fim de que o corte fosse fechado. Ehtan fizera um corte não muito preciso, mas o que realmente iria mata-lo seria a perda de sangue. Meia hora depois de ser levado, um enfermeiro veio até os familiares do garoto.

— Precisamos de doares, o tipo de sangue do seu filho está faltando aqui na unidade, ele precisa de três bolsas e infelizmente temos apenas uma.

— Eu sou o pai dele e ela é a irmã. - Carlos se pronunciou.

— Venham os dois.

Eles seguiram o homem enquanto Lenny ligou para seu pai contando tudo, desde a tentativa frustrada de estupro até a de suicídio. Uma hora depois os dois voltaram, apenas o sangue de Elisa era compatível com o garoto. O dele era A- enquanto o do pai era O+. Elisa estava um pouco mais aliviada, o seu sangue salvara o irmão. Apesar de tudo que ele fez, durante muito tempo ele foi o único consolo e alento. Enquanto a menina ia junto de Lenny comer alguma coisa o pai dela tentava ligar para Sarah. Sem sucesso. Tentou mais duas vezes, mas somente na quinta tentativa a mulher atendeu.

— O que foi? Sabe que eu odeio quem me ligue durante o tempo de expediente.

— Ehtan esta hospitalizado, ele tentou se matar. - silencio total do outro lado da linha.

— Ele está fora de perigo?

— Sim, está. Elisa salvou a vida dele.

— Como?

— Transfusão de sangue. Venha pra cá agora, preciso te contar mais coisas que por telefone não são possíveis de dizer.

— Certo qual hospital?

Carlos passou as devidas instruções para a esposa, que em menos de uma hora estava no local. O marido a chamou para a lanchonete do local e lá ele lhe revelou tudo o que estava acontecendo, mas também pontuou as surras desnecessárias que a filha levava.

Sarah nada dizia, apenas escutava tudo atentamente. Estava mais cansada do que o normal, mas naquele dia havia tomado seus tranquilizantes, assim sendo, não explodiu como sempre fazia. Elisa logo chegou próximo deles junto de Lenny.

— Eu vou voltar pra casa com ela. Ela troca de roupa e toma um banho e voltamos.

O senhor deveria ir também. - o rapaz se dirigiu a Carlos, que assim como a filha estava todo ensanguentado.

— Sim, eu vou depois que vocês voltarem. - os dois concordaram. A menina não disse uma palavra sequer a mãe. Era como se a mulher nem estivesse presente. Pegaram o carro do pai e foram pra casa. O caminho foi em total silencio. Ela estava cansada e um pouco fraca. Doara muito sangue pro irmão e no seu intimo torcia para que ele ficasse bem. Queria que o rapaz fosse tratado do que possuía sua mente e que pudesse ser o mesmo de antes. Ser o irmão que ela amava. E não o monstro que tornava seus dias uma prisão sem muros.

Chegando ao local se deparou com a trilha de sangue que se estendiam pela casa, seus olhos marejaram e ela se permitiu chorar. Lenny assistia ao pranto da menina em silencio.

— Deixa que eu limpo. - ele disse tomando a dianteira. Fechou a porta atrás de si e foi até a sala. Ficou pensando por onde começar.

— Não precisa se incomodar. É o sangue dele. Eu limpo.

— Aceite ajuda. - ele hesitou. Não queria dizer que havia muito sangue no local, tanto quanto nas escadas e mais ainda no quarto dela. Onde todo aquele pesadelo se tornava real.

— Certo. - ela foi a ate uma pequena área de serviços, pegou dois baldes, sabão, detergente, rodos, pano e álcool líquido. - Deve servir.- disse ela voltando com o material.

O rapaz assentiu que sim e pegou a sua parte.

— Eu cuido do seu quarto, você limpa aqui em baixo. - ele disse, sabia que no quarto da garota seria a maior concentração de dor. Ficou pensando por quantas coisas ela havia passado nesse tempo. Quanto sofrera. Quis desviar o olhar dela, para que não fosse notado o pesar que ele sentia por ela. Elisa percebeu isso. Sabia que precisava encarar ela mesma a realidade. Olhou para si e viu a roupa que usava suja, sentiu nojo mais uma vez, pelo corpo dele ter provocado o dela. Sentiu raiva de si mesma.

— Eu limpo, aproveito e tomo um banho. - ela subiu sem esperar a resposta do professor. Nas escadas, as gotas rubras traçavam uma linha, linha essa do destino que a esperava. Suspirou e adentrou o quarto. Seu tapete era cor de creme com bordas lilás. Estava rubro. Fora nele não havia sangue em nenhuma outra parte do quarto, a não ser a linha que se formara quando o pai socorrera o garoto. Com muito esforço ela dobrou o tapete, jogando-o no bande, que continha um pouco de água. O remanescente da sujeira foi logo limpado, depois álcool. Não levou muito tempo naquele trabalho. Depois foi ao banho merecido. Ia tirando as peças de roupa com as mãos trêmulas e depois quando a água morna caia sobre seu corpo ela chorou. Mais uma vez a dor preenchia sua alma. O sentimento de ser impotente invadiu sua mente. Quis gritar, mas sabia que Leonny escutaria. Quis sumir e nunca mais voltar. Acabar com aquela agonia que se engrenhava dia a dia. Quando desligou o chuveiro notou algo que passara despercebido. Uma lâmina de barbear estava coberta de sangue, jogava no canto no vaso sanitário. Um enjoou tomou seu corpo, então aquele objeto fora responsável pelos cortes do irmão. Compassadamente a menina pegou a lâmina. Estava hipnotizada pelo seu brilho. Colocou-a rente a sua barriga, onde havia muito volume proveniente da gordura acumulada. Ela quis cortar aquele peso fora ali mesmo, naquele instante. Mas parou quando ouviu Lenny a chamar.

— Elisa, eu acabei aqui. Posso tomar um banho também?- ele gritava ao pé da escada.

A voz melodiosa do rapaz rompera o seu surto de loucura momentânea. Ela parou e balançou a cabeça espantando o mal que se assolava e respondeu por fim.

— Sim, claro. Eu saio já.

Minutos depois ela estava no andar de baixo, trazia nas mãos umas roupas do irmão. No seu guarda roupa sempre havia uma parte inteiramente dele. Leonny era um pouco mais alto do que o Ehtan serviria bem.

— Troque de roupa e fique a vontade, vou preparar um lanche pra nós. - ela não conseguiu lançar aquele sorriso. A noite estava minguando. O telefone do rapaz toca.

— Alô. Oi Carlos.

— Eu vou ficar aqui, Ehtan está fora de perigo, mas precisará ficar de observação. Mais tarde a psicóloga do hospital vai precisar conversar comigo e Sarah. Vou passar a noite aqui, já minha esposa disse que iria para a casa de uma amiga.

— Posso ficar aqui com Elisa se quiser. - a menina fitava o rapaz sem entender nada. Por que ele teria de ficar com ela?

Depois de mais uns dois minutos de conversa Leonny desligou o celular. Fitou a menina.

— Seu pai vai precisar ficar no hospital com seu irmão. Já sua mãe, bem, ela vai dormir na casa de uma amiga hoje.

Elisa não disse mais nada, apenas estendeu as roupas ao rapaz que as pegando se dirigiu ao banheiro. Enquanto isso Carlos estava impaciente. Os médicos disseram que ele estava fora de perigo, mas como fora uma tentativa de suicídio os psicólogos precisavam conversar com a família do rapaz.

— Senhor Dicksen? - uma senhora chamou o homem, nessa hora Sarah disse que estava indisposta o homem nem insistiu que ela ficasse e deixou-a partir. Depois se entenderia com ela. Carlos foi levado para uma sala. Lá estava mais duas mulheres fora a que lhe conduzira. Eram uma assistente social e duas psicólogas.

— Senhor Dicksen, poderia me contar o que realmente aconteceu? Como o senhor encontrou ele, como também se suspeitava de algo que pudesse leva-lo a querer acabar com a própria vida.

Ele respirou fundo, sabia que o filho precisava de ajuda e procurou omitir algumas coisas, assim como a tentativa de estupro a irmã.

— Creio que tudo começou quando eu perdi o emprego, minha esposa teve de arcar com muita responsabilidade sozinha. Isso a modificou como também a mim. Fui fraco e acabei caindo nas bebedeiras. Fiquei irresponsável e muitas vezes fechava os olhos pro que acontecia na minha casa.

— Onde esta sua esposa? - a assistente social pontuou.

— Ela não quis ficar aqui e foi dormir na casa de uma amiga.

— Continue, por favor. - a mulher pediu.

— Meu filho é muito apegado a irmã, ela por sua vez, sofria muito...

Carlos contou a elas tudo que ele achava necessário. Disse que os irmãos eram apegados, contou do seu emprego novo e da tentativa de ser um bom pai. Tinha medo que a justiça quisesse lhe tomar os filhos. Mas precisava de ajuda, precisava fazer alguma coisa. No fim da conversa ele disse que achava que o garoto fora rejeitado por uma garota que eles não conheciam. Tudo correra bem, pelo menos essa parte. Depois da conversa Carlos concordara

em colocar o filho em um tratamento psicológico e também levar a filha para uma avaliação. Mais ou menos uma hora e meia se passou desde que ele fora conversar com os profissionais. Perguntou se podia ver o filho. Disseram que ele iria passar a noite inteira sedado. Ele entendeu. Após algumas explicações de onde ele poderia dormir, Carlos foi a lanchonete do local. Pediu um café e se sentou-se à mesa mais reclusa do local. Começou a chorar. Um choro de desespero queria ter sido um pai melhor, queria ser um esposo melhor. Olhava pros lado como quem procurasse uma saída, um rumo. Tinha de mudar e melhorar. A que ponto tudo chegara? Desejou urgentemente que ainda não fosse o fim.

...

Elisa preparava uns sanduiches, estava um pouco nervosa e ao mesmo tempo preocupada. Não conhecia Lenny direito. Então não sabia bem o que esperar dele. Pensou onde ele iria dormir e a ideia de que ele usasse o quarto do irmão veio como um lampejo. Agora que o rapaz não estava em casa, ela queria ver o que havia lá. Depois de colocar os lanches nos devidos locais, viu que o professor ainda tomava banho. Caminho até o quarto do irmão e parou em frente  a porta. Respirou fundo, aquele era um momento em que ela estava esperando. Ao girar a maçaneta se surpreendeu por a porta estar aberta. Isso era raro, já que todas as vezes em que tentara estava trancada. Quando abriu a porta tudo estava escuro, mas sabia que assim como o quarto dela, o interruptor ficava próximo a porta. Quando ascendeu a luz não acreditou no que os seus olhos viam.

— Meu Deus! - era Lenny quem dizia. O rapaz a vira entrar no quarto e a seguiu. - Eu não acredito que estou vendo isso.

Elisa não sabia o que dizer nessa hora, mais uma vez, as palavras lhe faltavam.


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Notas finais do capítulo

O que acham que há no quarto de Ehtan?