Remus estava inquieto.
Desistindo de focar na leitura do capítulo 7 do livro de Poções, fechou-o de maneira brusca e, agachando-se, empurrou-o para baixo da cama. Sabendo que não podia perder tempo e precisava ocupar sua cabeça para não pensar demais nas bobagens que estavam lhe atormentando, tratou também de puxar um pergaminho e uma pena, colocando o tinteiro sobre o peitoril da janela próxima à sua cama. No entanto, durante o ato, as escuras nuvens acabaram lhe prendendo a atenção e novamente sua concentração, que já não se encontrava nas melhores, foi pelos ares. O âmago do rapaz estava uma bagunça.
Naquele dia, havia ido à Hogsmeade. No entanto, no lugar da companhia dos outros marotos, como era de costume, Remus foi acompanhado por uma garota da Corvinal. Chamava-se Morgaine e, assim como o grifinório, sustentava sobre sua capa um pequeno distintivo com um “M”. Há pouco mais de uma semana, em uma das usuais patrulhas noturnas pelos corredores de Hogwarts, a corvina perguntou, já ciente da resposta, se Remus iria à Hogsmeade na próxima visita. O rapaz não entendeu o recado subentendido, e Morgaine, que não era do tipo tímida ou nervosa em excesso (na verdade, era bem segura de si), decidiu então ir direto ao ponto, perguntando se o grifinório gostaria de lhe acompanhar.
Embora tenha sido pego de surpreso, e não tenha sido capaz de disfarçar como sua boca se entreabriu num gesto automático em sincronia com um mínimo arregalar de olhos, Remus aceitou sem pensar direito. A princípio, apenas por educação; e só depois, quando a corvina sumiu de seu campo de visão, deu-se conta do que havia aceitado. E com isso na cabeça, demorou-se mais do que o normal na patrulha, andando de um lado para o outro tentando organizar seus pensamentos.
Há certo tempo, Remus havia passado a nutrir sentimentos — a seu ver — estranhos por Sirius, um de seus melhores amigos. Passou a perceber — isto é, a estranhar o próprio comportamento — quando se viu encarando o Black por mais tempo que o normal e desviando sua atenção ou dando uma risada amarela quando seu olhar era percebido; ou quando começou a se sentir desconcertado quando Sirius trocava de roupas na sua frente, embora fosse algo normal entre os marotos; ou quando passou a atentar ao nome e ao rosto das meninas com quem o amigo vez ou outra se encontrava ou simplesmente fazia um comentário sobre.
Desde então, Remus lutava consigo mesmo para rechaçar aqueles sentimentos. A ideia de se ver apaixonado por Sirius lhe era inconcebível, ainda que real. Lupin não queria estragar os anos de amizade com os marotos. Tinha perfeita ciência de que uma ruptura na amizade com o Black iria afetar os marotos como um todo. Não, não, não — Remus balançava a própria cabeça em negativa, apavorado, ao vislumbrar tais coisas. Definitivamente, não queria e não iria estragar tudo.
Logo, alguns longos minutos após aceitar o convite de Morgaine, chegou à conclusão de que seria uma boa oportunidade perante à confusão sentimental que enfrentava. Ainda que tivessem conversado pouquíssimas vezes, sabia que a corvina era uma garota bonita, inteligente e gentil. E, bem, Lupin não conseguia enxergar em si motivos para alguém querer sair consigo, então... Ah, também era a primeira vez que recebia um convite. Na realidade, a primeira vez que iria sair com alguém, pois também nunca havia pensado em o fazer. E ao se dar conta disso, abriu as portas para que a insegurança, somada a suas companheiras características, lhe consumisse.
Retornando à Torre da Grifinória, passando pelo buraco do retrato e a deserta sala comunal, encontrou Sirius e Peter dormindo e James virando de um lado para o outro na cama, aparentemente com insônia. Deu boa noite ao Potter, vestiu o pijama e decidiu se privar de mais pensamentos, entregando-se ao sono.
Lupin não saberia explicar, mas só na manhã do dia destinado à visita que contou para seus amigos que não iria acompanhá-los daquela vez. Vendo a confusão no rosto dos rapazes, prontificou-se para explicar da forma menos embaraçosa possível, mas, antes que o fizesse, Morgaine surgiu ao seu lado na fila para sair do castelo. Observando as expressões confusas cederem espaço à diversão, Remus fugiu dos comentários, permitindo que a corvina lhe puxasse para longe.