Kidou Senshi VP Gundam - Os Vigilantes escrita por Moonlight Butterfly


Capítulo 9
Promessa sob as estrelas




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Depois da viagem, Daiya foi convidada para morar na Watchtower. Como nenhum Cyber-Guard tinha detectado até o momento sua presença no grupo (a organização de moradia era algo rígido em Arcadia, cada um devia morar no lugar que lhe era designado), Estel havia feito o convite. A moça sentiu-se desconfortável, principalmente porque não fora Karma, a pessoa quem ela havia conhecido primeiro, quem fez o convite para que ela entrasse no grupo. Então, novamente, sentiu como se estivesse invadindo um espaço ao qual não pertencia, apesar de querer muito aceitar o convite.

— Você quer, não quer? Se quer tanto assim, aceite – disse o rapaz loiro rispidamente, sem dizer mais nada além, quando Daiya tentou falar sobre suas dúvidas, tentando descobrir se seria algo incômodo ou não. Acabou aceitando, mas achou que havia resignação no tom de voz do amigo, como se ele estivesse um pouco contrariado, aceitando só para não contestar o pedido de seus colegas. E, de fato, com o tempo, começou a perceber certo desconforto nele quando ela estava por perto.

— Karma, estou te incomodando? Se sim, por favor, me diga.

— Quando pergunta isso, você está, sim. Comece por não perguntar mais isso, e você não irá me incomodar.

— Certo… desculpe, eu só…

— E pare de pedir desculpas o tempo todo, isso é um pouco irritante.

 

(Música – Tema de Arcadia)

Estel estava perambulando pela biblioteca Nea Alexandria à procura de algo novo para ler; entediou-se facilmente com os últimos livros que emprestara, e estava à procura de algo que lhe interessasse. Perambulando pelo lugar, acabou encontrando Rebecca fazendo a mesma coisa.

— R… Rebecca – exclamou ele, hesitante com a surpresa – o que… o que faz aqui?

— Você é sempre articulado assim? - retrucou ela, em tom de deboche. - E o que você acha que eu vim fazer numa biblioteca, Estel, morder todos os livros pra ver quais são mais gostosos e assar os melhores com marshmallow em uma fogueira com outros livros ruins?

— Sim, eu sei que você veio aqui para procurar leituras, isso é óbvio. Mas que tipo de leituras? Não sou nenhum Newtype pra ficar adivinhando.

— Bom, eu estou em busca de um tema novo para as minhas pesquisas, já que meu tema de TCC não foi aprovado. E não faço a mínima ideia do que eu posso escolher. Aliás… você pegou um monte de livros recentemente, e como é hiperativo, já se entediou facilmente, pelo que posso sentir.

— É… você sempre foi uma pessoa muito visceral, que coloca sempre seu coração acima de tudo. Deve ser difícil pra você escolher outro tema, pois você tem que se identificar emocionalmente com o que quer estudar. E agora suas emoções não te deixam pensar em nada além de jogar uma bomba na cabeça do Louis Anaheim, não é?

— Pelo que estou sentindo, você quer saber o porquê da minha escolha. Por incrível que pareça, o motivo foi racional, não emocional. Zonas Void sempre foram consideradas um estudo do campo da Psicologia, nunca houve estudos na área da biologia e medicina sobre este problema. O que eu quero, na verdade, não é tanto descobrir mais sobre Zonas Void, é descobrir o motivo pelo qual ninguém se interessou pelo tema… não é algo que minha intuição diz, mas é como se existisse algum motivo cabeludo por trás disso.

— Não há pesquisas médicas sobre esse tema, só tratados de psicologia? Que estranho…

— E somente tratados de psicologia baseados em observação de casos isolados, utilizando percepção Newtype como forma de mapeamento mental. Ou seja, não foram utilizadas todas as ferramentas possíveis para mapear o problema corretamente e com precisão de detalhes.

— Isso é algo que eu admiro muito em você, Rebecca, apesar de todos os problemas. Você é Newtype, mas mesmo assim ama o questionamento, o uso da razão e da pesquisa para desvendar os problemas do mundo… apesar de eu perceber um pouco de falta de empatia em você, pois parece que não se importa nem um pouco com as pessoas que passam por esse problema de bloqueio involuntário de memórias por conta de trauma, só quer satisfazer sua curiosidade. Como sempre, você me fascina e me repele ao mesmo tempo.

— E confesso que é mais ou menos isso. Não sou obrigada a ter empatia com o que não tem nada a ver comigo. Os motivos que me ligam a essa questão são outros, como eu já disse. E isso não me torna uma pessoa pior, nenhuma pessoa com Zona Void é prejudicada por conta disso. É suficiente eu me ligar ao problema da forma como eu me sinto melhor; o resultado é o mesmo, com ou sem empatia.

— Mas é que moralmente isso é… bom, deixa pra lá. Não quero começar a mesma discussão de novo.

— Sabe – disse a moça ruiva, aproximando-se mais do colega, de modo um tanto provocativo— você provoca a mesma sensação em mim. Seu jeito “bobo alegre moralista idealista Peter Pan escoteiro saltitante certinho raivoso Poliana porra louca” é irritante às vezes… mas confesso que eu até acho bonitinho.

Estel ficou mais vermelho que os cabelos de sua colega. Quando menos esperava, estava beijando-a. O beijo e os abraços começaram a ficar intensos, tanto que os dois deram alguns passos juntos. Estel foi gentilmente empurrado contra uma das prateleiras da biblioteca, fazendo com que alguns livros caíssem em sua cabeça. Rebecca riu e o ajudou a juntar novamente os livros que caíram. Observando os títulos de cada um deles, de repente Estel exclamou, quando passou os olhos por um dos exemplares:

— Isso! É ESSE o tipo de livro que eu estou querendo ler agora! Que sorte ele ter caído na minha cabeça, de outro jeito eu nunca ia achar!

— Só você mesmo pra ficar FELIZ e se achar sortudo porque um monte de livros caiu em sua cabeça – retrucou ela, em seu tom sarcástico usual.

 

(Música – O esplendor do espaço)

Os alunos de Astronomia, patrocinados pelas indústrias Anavel, principal concorrente da Anaheim Electronics, inauguraram sua mais recente criação: um planetário que simulava a visão que se tem da Terra dos dois hemisférios juntos, algo impossível estando no planeta (só se pode ver um hemisfério celeste de cada vez, ou o Norte ou o Sul). Era uma enorme esfera que continha todos os corpos celestes visíveis e catalogados da Terra; ficava do lado de fora das paredes da colônia, então dava a sensação de gravidade zero, como se você realmente estivesse flutuando no espaço sem o incômodo de precisar usar um Normal Suit, e quase pudesse abraçar as estrelas. Em alguns momentos, a Lua era mostrada, em suas várias fases. Uma a uma, as repúblicas de estudantes foram chamadas para conhecer o belíssimo lugar, e logo chegou a vez dos Vigilantes. Mais uma vez, Edward usou seu talento mental para ludibriar os Cyber-Guards e fazer com que Daiya conseguisse entrar.

Alguns até brincavam; Ilya e Keisha aproveitavam a gravidade zero para testar o efeito de golpes e empurrões no espaço. Kaori dançava, tendo ideias para seus próximos shows, rodopiando e balançando seus cabelos ruivos e longos, o que deixou Nix fascinado, esquecendo até mesmo de onde estava. Todos flutuavam suavemente e sem rumo pelo planetário, extasiados, deixando-se levar, desfrutando e tornando-se parte daquele Universo em miniatura. Ou, melhor dizendo, todos, menos Karma. Ele ficava parado em um lugar só, com os braços e pernas soltos como se estivesse acabando de se atirar na cama após um dia exaustivo. Daiya começou a prestar atenção nisso, pois toda vez que a flutuação acabava aproximando-a dele, ele estava do mesmo, jeito, na mesma posição. Depois da preocupação vencer o enorme medo de incomodá-lo, resolveu ir até ele e perguntar o que houve.

— Não é nada – retrucou ele, ríspido. - Só estou relaxando.

— Karma, eu… posso não ter intuição Newtype, mas consigo ver que você não está bem. Está de olhos fechados, e parece tenso. Será que eu… posso te ajudar?

“Estou invadindo o espaço dele, não tenho o direito de importuná-lo”, pensava ela, com um imenso sentimento de culpa. Quando, pensando nisso e aguardando uma resposta do amigo, pensou em se afastar, ouviu-o murmurando:

(Música – Ternura e promessa)

— Eu me sinto… inútil.

— Como assim, inútil?

O rapaz loiro suspirou, como se precisasse de uma enorme coragem pra desabafar o que queria.

— Cada uma dessas estrelas deve ter pelo menos um planeta orbitando em torno dela. E pelo menos uma pequena parte das estrelas deve ter algum planeta com vida. Em cada um desses inúmeros lugares com vida no Universo… devem ter pessoas sofrendo nas mãos de pessoas idiotas com poder. E o pior de tudo… é que eu consigo sentir tudo isso. Às vezes, não consigo dormir bem porque consigo sentir o clamor de pessoas desesperadas, sofrendo. É como se, para mim, cada uma dessas imitações de corpos celestes que vejo fosse um grito implorando por ajuda… como se a incandescência das estrelas fosse uma alma em chamas implorando para poder continuar brilhando e não cair no Vazio. Estou aqui… ouvindo e sentindo tudo isso… e não posso fazer nada. Sou só um grãozinho de poeira cósmica insignificante que um dia vai se desfazer em nada.

— Você não é só um grãozinho de poeira cósmica insignificante – retrucou Daiya – não pra mim, pelo menos. Não que minha opinião signifique muita coisa, não é nada perto de sentir a angústia do Universo inteiro… mas… estou aqui, querendo te ajudar, de qualquer forma.

Karma tentou sentir alguma segurança nas palavras dela, mas não conseguiu detectar, através de sua intuição, sinceridade no que era dito pela amiga.

— E é por isso – declarou ele, dando um leve soco na palma da sua outra mão aberta – que um dia eu quero dominar o Mundo. Eu não estava brincando quando disse isso a você semanas atrás. Quero ter tudo, tudo, sob minha vigilância, não deixar que mais ninguém se sinta desamparado, abandonado, sem esperanças. Quero que todos possam ter um futuro. Possam viver… e não apenas sobreviver, viver sem horizonte. Irei lutar para conseguir isso… até que eu não ouça em minha mente mais nenhum eco de desespero vindo de nenhum lugar do Universo.

Após hesitar por alguns instantes, temendo qual seria a reação do amigo, Daiya colocou a mão em seu ombro e exclamou:

— Eu quero te ajudar.

O rapaz loiro a olhou nos olhos, surpreso.

— Faz muito tempo, Karma, que vejo em você muita bondade e gentileza. O fato de você ter feito amizade comigo, sendo que sou apenas uma vendedora clandestina de bolos, confirma isso. Jamais irei esquecer seu gesto. Confio em você e em suas intenções… então eu vou te ajudar a “dominar o mundo” para que você consiga fazer todos felizes. Posso não ter muitas habilidades agora; nunca consegui usar o simulador muito bem, precisaria treinar bastante… mas irei me esforçar para lutar a seu lado da melhor maneira que eu puder. E, se por acaso você sair do caminho correto, corromper-se, eu estarei lá para neutralizar suas fraquezas, fazer cessar os possíveis desvios de objetivo que você tenha, e irei fazê-lo retornar aos seus verdadeiros propósitos. Mesmo que para isso eu tenha que te enfrentar algum dia, ou mesmo me tornar sua inimiga por um tempo.

Abraçou-o.

— Eu prometo que farei tudo isso… em nome de todos os verdadeiros corpos celestes representados neste planetário. Estas estrelas que vemos são falsas… mas meu juramento é verdadeiro.

Karma não retribuiu o abraço; fechou os olhos e tentou sentir a energia do que foi dito, bem como a energia da pessoa que estava ali, tentando ampará-lo. Não sentiu nada, absolutamente nada, nenhum sinal de que podia confiar na moça. Era como se estivesse sendo abraçado por uma coisa sem vida, sem energia, como se não fosse uma pessoa que estivesse ali. Não conseguia sentir Daiya, mesmo que de maneira remota, em nenhum ponto das sensações vagas que tinha sobre o seu futuro. Desvencilhou os braços dela gentilmente, e disse:

— Não acha que é um pouco… prepotente da sua parte achar que é a pessoa certa para lutar a meu lado?

(Música – Tema melancólico de Daiya)

— Sim… talvez, mas eu só… eu só queria…

— Deixe-me sozinho, por favor.

Afastou-se, e ficou parado em outro ponto do planetário, na mesma posição em que se encontrava antes. “Falsas estrelas, falsas promessas”, pensava ele. Ela encolheu-se em posição fetal, fechando os olhos, flutuando de modo errante pelo local. Perdeu a noção do tempo; foi avisada por Nix quando o tempo de visita acabou.

— Eu… vou dar uma volta, quero andar um pouco. Vou para a Watchtower sozinha depois – disse ela, assim que todos já estavam de volta ao interior da colônia. Afastou-se a passos rápidos.

— Está tudo bem com ela? - indagou Kouga.

— Está sim – respondeu Nix – não senti nenhuma energia de tensão, tristeza ou angústia nela. Chamei-a quando a sessão acabou, e segundo minha percepção, não há nada de errado.

— Eu… lembrei que preciso voltar para a oficina – mentiu Siren – tenho um conserto para terminar.

Afastou-se, também movendo-se rápido. Tinha receio que alguém detectasse suas intenções, mas felizmente ninguém detectou que na verdade ele sabia que Daiya estava triste, e queria ver como ela estava. “Se ela não disse nada a ninguém, provavelmente não se sente segura em falar com todo o pessoal… preciso fazer isso sozinho”, concluiu o rapaz baixinho de cabelos pretos. Encontrou a amiga sentada à beira do lago da colônia, chorando muito.

— Daiya? - chamou ele. - Quer conversar?

— Como você sabia que eu estava aqui?

— Esse é um dos lugares onde você mais gosta de ficar, não é? - comentou ele, sentando-se ao lado da amiga. - Deduzi que você havia vindo para cá para tentar espairecer. Posso não ser Newtype, mas eu sei identificar um olhar de tristeza quando vejo um.

Após alguns instantes de silêncio, Daiya murmurou:

— Eu… só faço mal a ele, não é? - fizeram-se mais alguns segundos de silêncio. A moça prosseguiu: - Eu não devia ter ido morar com vocês na Watchtower. Aliás, nunca devia ter encontrado o Karma e vendido bolo de chocolate para ele. Fui egoísta, quis me juntar ao grupo para afastar um pouco minha solidão… algo me dizia que ele iria se sentir desconfortável com isso, mas eu ignorei. E agora eu vejo que essa sensação era verdade, e sinto uma culpa enorme por estar ocupando um espaço que é dele, espaço em que eu não devia ter entrado.

— Mas não tem só o Karma na Watchtower – retrucou Siren – os que estão lá gostam de você. A maioria, pelo menos, acredito eu.

— Podem até gostar de mim… mas acima de tudo, vocês são amigos dele, não meus. Eu só estou… pegando vocês “emprestados”. Aliás, estabelecer relações com o grupo social que ele frequenta foi outro equívoco, outra forma de importuná-lo indevidamente. É como se eu tivesse, entrando no grupo dos Vigilantes, impondo minha presença incômoda a ele.

— Ué, então você não gosta de nós?

— Sim, eu adoro todos vocês. Mas eu devia fazer o que é certo… e ir embora. E o pior de tudo é que eu me sinto culpada por estar triste, pois não consigo ajudar Karma. Ele não é obrigado a me achar importante ou significativa. E mesmo assim, eu fico triste, mesmo com ele já tendo feito tantas coisas boas para mim… sou um monstro egoísta... eu não devia… eu… não devia…

Começou a chorar novamente. Siren colocou um dos braços em seu ombro e ficou em silêncio até que ela se acalmasse um pouco.

— Olha, nunca fui muito bom com essas coisas, não faço a mínima ideia de como ajudar… nem me considero uma boa pessoa, na verdade.

— É sim, Siren. Foi você quem veio até mim para ver como eu estava. É quem está sempre por perto para me ajudar. Mostra sua preocupação com atitudes, não apenas com palavras, é leal, prestativo… um dia, será um grande engenheiro, um dos mais conhecidos da História. Sou eternamente grata a tudo o que fez por mim até hoje. Não só a você, mas a todos vocês… principalmente ao Karma.

 


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Notas finais do capítulo

Siren é obrigado a tomar uma decisão radical para salvar sua família das dívidas e recuperar a casa da sua mãe. E, para isso, precisará abrir mão do seu sonho de estudar engenharia mecânica.
Daiya e Karma tentam se entender melhor, mas o fato do rapaz não conseguir ter nenhum acesso à mente dela deixa-o inseguro e dificulta a confiança mútua.
Phillip finalmente toma sua decisão... mas o vazio de não saber qual é seu passado não o abandona.
Não perca o próximo episódio de Kidou Senshi VP Gundam! A sombra do Caos está à espreita.



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