Os Mistérios de Ethan Quinn escrita por Nathalie Alves


Capítulo 12
Culpado ou vítima?


Notas iniciais do capítulo

Após a noite do baile, o medo é suscitado outra vez entre os habitantes de Fort Woods. Uma forte evidência surge para alterar o andamento das investigações. Uma figura inusitada entra no jogo e representa uma ameaça para a vida do jovem lobo.



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"Como diz em uma frase de Mazzini, político italiano do século XIX, 'o segredo da força está na vontade'. Se eu não tivesse tido a determinação para encarar as forças inimigas, não faço ideia do que poderia ter acontecido naquele dia.

Depois da noite fatídica, em que o baile foi inteiramente arruinado, a tensão e o pânico se instalaram de novo na atmosfera, dessa vez mais avassaladores do que nunca, ressuscitando o medo que parecia ter sido enterrado. Naquela noite, nenhum de nós conseguiu controlar o choque que latejava por dentro. Ninguém esperava que aquilo acontecesse. Foi a coisa mais repentina e imprevisível, como uma tempestade em pleno dia de sol. Pensei que não conseguiria deter o lobo negro antes que cometesse mais uma loucura. E ainda havia o outro lobo, o de pelo cinzento, que surgiu de forma inesperada. Sem dúvida algum membro de sua alcateia.

Quando a polícia chegou, eles foram em busca dos lobos, mas não os encontraram. O negro havia desaparecido de alguma forma, misteriosamente, mesmo depois de ter inalado a fumaça paralisante que o Drake lançara contra ele. O cinzento deve ter ajudado-o a escapar. O caçador foi embora no mesmo instante, para não ser visto pelos policiais. Eles fariam perguntas e a última coisa que ele queria era atrair atenção para si mesmo.

Ao sair da escola naquela noite, encontrei Isobel e Bridgit praticamente em choque. Elas tremiam muito, as pupilas dilatadas. Não conseguiam esconder a aflição e o pavor em seus rostos. As aulas foram canceladas no dia seguinte ao desastre. Agora, caminhando pelos corredores, de volta à rotina, não consigo deixar de pensar na noite apavorante. As cenas da correria, dos gritos, do corredor escuro e sombrio que parecia não ter fim, dos rugidos ecoando por toda parte... tudo isso ainda está bem vivo em minha mente. Antes do ataque, alguém havia cortado os fios do gerador, deixando todo o colégio na escuridão total. Temos certeza de que foram os lobos.

Andando no corredor, olho para as pessoas passando e vejo a dor estampada em seus semblantes decaídos. Sonhos e expectativas destruídos por um episódio trágico. Elas caminham como se todas as suas forças tivessem sido sugadas."

Na aula de história, a atmosfera preenchia-se com uma voz sensual e feminina que entoava sobre a Revolução Americana, e palavras como Thomas Jefferson, Guerra da Independência, exército, George Washington e algo sobre o território do Canadá ser incorporado pela Grã-Bretanha flutuavam livremente no ar, confundindo os pensamentos do garoto-lobo. Sua mente ainda vagava pelos corredores sombrios da escola, revivendo uma e outra vez aquela noite soturna do baile.

Estiveram a pouco de capturar o lobo negro, pensava Ethan. Mas, de alguma forma, ele sempre conseguia escapar. Parecia mais astuto, mais inteligente. E sem contar o fato de que ele contava com sua própria alcateia, sua corja de lobos atrozes, fiéis e dispostos a executar seus planos brutais. Era bastante evidente que Ethan se encontrava em desvantagem. O garoto chegou a pensar na ínfima possibilidade de conseguir a sua própria matilha. Mas desde que se transformara ele não havia conhecido nenhum homem-lobo como ele, além do adversário. Parecia que estava sozinho contra os lobos inimigos. Até quando teria que travar essa guerra injusta?

A senhorita Angela Ramirez esbanjava suas curvas e seu corpo esguio, vestida de maneira bem casual com uma calça jeans azul-claro e uma camiseta lisa e branca. Seus cabelos macios e castanhos escorriam pelos seus ombros e sua pele morena cintilava sob os raios do Sol que entravam pela janela. Sua beleza latina refletia-se em seu rosto, e seus olhos pareciam sempre estar à espreita. Ela levantou bem alto um dos braços para escrever em um espaço vazio no topo da lousa.

Ethan estava destraído, mas ao bater os olhos no braço da professora ele se assustou com o que viu. A mesma tatuagem que havia no braço de Drake estampava-se na pele daquela mulher. O triângulo dividido em três menores com um pequeno círculo negro no centro. O emblema dos caçadores. Ele não acreditou no que viu. Seus olhos petrificaram-se, sem desviar-se daquele símbolo tatuado. Seria ela mais um membro da comunidade dispersa de caçadores? Ethan sentiu um calafrio por todo o seu corpo. Tinha um terrível presentimento sobre aquela mulher.

 

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Mais tarde, na biblioteca, o trio de amigos passeava entre as prateleiras enquanto Ethan revelava sua descoberta recente. Duas grandes estantes de madeira cor âmbar escuro flanqueavam os três. A luz do Sol brilhava no assoalho, depois de atravesar as amplas janelas de vidro. Atrás deles, mesas compridas da mesma cor e material que as estantes estendiam-se pelo salão. Estudantes pareciam concentrados em seus livros e anotações.

"Você tem certeza do que viu?", indagou Bridgit, sobressaltada.

Após Ethan confirmar com a cabeça, Isobel pôs uma mão na cintura, preocupada e impaciente. "Vocês não vêm o que tá acontecendo aqui?", perguntou, a testa levemente franzida. "Isso com o que estamos lidando... é muito maior do que pensamos!", ela deu um pequeno suspiro antes de continuar. "Era só o que faltava... a nossa professora de história é uma mulher sinistra caçadora de homens-lobo... a qualquer momento alguém na aula de ciências pode se transformar em uma criatura medonha e sobrenatural! Vocês têm noção disso?", apesar de estar sussurando, ela cuspia as palavras rapidamente.

"E o que você sugere que a gente faça?", perguntou Ethan, deixando de lado alguns livros que estava revirando na prateleira. "Ficar parados e observar a cidade ser destruída?", seus olhos pareciam brilhar.

A pouca distância dali, a professora Ramirez escutava atentamente a conversa. Seus olhos cor de mel estavam semicerrados, revelando sua personalidade fria e altiva.

 

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A polícia perambulava pelo quarto do garoto, em busca de pistas ou evidências que pudessem guiá-los ao misterioso assassino. Quatro policiais reviravam com cautela os objetos pessoais do menino, vestidos com seus uniformes negros e imponentes, e suas luvas de látex azul, enfiando em pequenos envelopes de evidências tudo o que achassem relevante para a investigação. Entre eles estava o policial Bryan Connor, parceiro do pai de Ethan. A mãe do Henry esperava do lado de fora do quarto. A equipe já tinha feito uma busca nas casas dos outros três adolescentes mortos, sem obter grandes avanços.

Agachado, o policial Connor analisava minuciosamente um pequeno canto no fundo do quarto, debaixo da janela, quando de repente algo chamou sua atenção. Ele havia avistado algo detrás do guarda-roupas, ao lado de uma mesinha de estudos. Ele franziu o cenho e esticou a cabeça em direção ao objeto encontrado. Ao estender um dos braços, alcançou uma pequena caixa quadrada de papelão. Dentro dela havia alguns folhetos com imagens de carros e folhas de papel soltas com uma caligrafia incompreensível, além de embalagens vazias de Trident. Porém o que mais despertou o interesse do policial foi uma agenda de capa vermelha. Ele a abriu e começou a folhear lentamente. Em meio a lembretes de tarefas de escola, o policial encontrou um grande desenho em uma folha, o que fez seu corpo desequilibrar-se ligeiramente para trás. A marca assinada do assassino brilhava diante dos seus olhos, desenhada com tinta preta em traços finos e agéis: o grande círculo com uma linha diagonal no centro e as letras gregas μ e φ gravadas no interior de cada semicírculo.

Ao voltar sua atenção para a caixa, Connor começou a apalpá-la por dentro, em busca de mais segredos. Ao tatear o fundo do objeto, ele escutou um som abafado e oco. Ao repetir o movimento um par de vezes mais, se deu conta de que havia um fundo falso. Por debaixo dele se deparou com um canivete suiço de cabo negro e lâmina cinza e brilhante. O policial estreitou os olhos. Ele enfiou a arma em um envelope plástico transparente, enquanto encarava a pequena faca com uma expressão pensativa e um olhar vago.

 

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Com a cabeça enfiada em um livro de biologia, Ethan fazia um enorme esforço para se concentrar. As duas amigas percorriam as prateleiras em busca de um título. A biblioteca estava quase vazia àquela hora da tarde. Jeffrey se aproximou e ocupou o assento vazio ao lado de Ethan. Ele puxou uns livros e cadernos da mochila e os apoiou sobre a mesa. Os dois segundos que se seguiram foram de tensão e silêncio.

"Então quer dizer que aquele monstro matou a minha irmã", declarou Jeffrey, olhando para baixo, a voz firme.

O jovem-lobo ficou pasmado. Ele foi pego totalmente de surpresa. Ele olhou para o colega com os olhos eletrizados. Os músculos de seus braços se contraíram, e podia-se observar algumas veias proeminentes.

"Não adianta se fazer de desentendido", Jeffrey virou o rosto de forma abrupta. Agora ele encarava firmemente o colega. "Eu vi tudo naquela noite. Os lobos, no refeitório...", Ethan percebeu que ele se referia à noite do baile. "Foi ele não foi? Aquele lobo negro. Eu vi a raiva nos olhos dele", falou pausadamente, os olhos fixos em algum ponto na mesa. Sua voz revelava uma mistura de indignação e furor. Seu rosto estava pálido e decaído. Um raio de sol iluminava seus cabelos loiros, dando-lhe uma aparência angelical.

Ignorando a presença de Ethan, Jeffrey prosseguiu: "Foi ele, eu tenho certeza. Aquele monstro atacou ela", ele apertava a mandíbula com força. Não conseguia mencionar o nome Stacy. Ele continuou falando, como se estivesse em uma espécie de transe. "Eu vi você naquela noite", a voz dele era pesada. Ele não tirava os olhos da mesa. Ethan sentiu os pelos de seu corpo eriçarem. Decidiu permanecer em silêncio. Não conseguia encontrar as palavras certas para falar.

"Vi você se transformar naquela criatura horrenda. Então você é um deles...", declarou sem levantar os olhos.

Ethan resolveu se manifestar. "Jeffrey, não é exatamente o que você tá pensando", afirmou, apreensivo. Suas pupilas dilataram.

"Como foi que aconteceu? Como você fez aquilo?", ele virou a cabeça abruptamente em direção a Ethan e indagou desafiadoramente. Sua voz tinha um tom levemente agressivo.

Nesse instante, as garotas apareceram.

"Tá tudo bem aqui?", desconfiada, Bridgit correu os olhos de Jeffrey para Ethan.

Seguiram-se dois segundos de um silêncio incômodo.

"Sim... a gente só estava... conversando", declarou Ethan, desconcertado.

Jeffrey encarou as duas colegas, se ergueu bruscamente — agarrando sua mochila e livros — e saiu.

"Isso foi...", falou Bridgit, os olhos ainda acompanhando Jeffrey enquanto ele atravessava a porta da biblioteca.

"Bizarro", completou Isobel. As duas se sentaram. "O Jeffrey Collins falou com você?", Isobel cochichava. Ela não conseguiu esconder o espanto.

"Ele não fala com ninguém há semanas, desde que...", Bridgit se conteve antes de terminar a frase.

"O que ele queria?", indagou Isobel, curiosa.

"Ele já sabe de tudo. Na noite do baile... ele viu quando eu me transformei", ele apoiou os braços na mesa e esfregou as mãos, inquieto. Seus olhos reviravam.

As duas amigas ficaram abismadas. "E o que mais ele disse?", perguntou Bridgit, atenta.

Nesse exato momento, o celular de Ethan vibrou. Ele agarrou o aparelho. Na tela apareceu uma mensagem de texto de seu pai.

"Quero que venha à delegacia agora. Preciso falar com você"

Ethan ergueu os olhos e encarou as amigas. "Eu tenho que ir. Meu pai quer que eu vá à delegacia. Falo com vocês depois", ele juntou suas coisas, enfiou na mochila e se levantou. As garotas assentiram.

 

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No Departamento de Policia, Ethan aguardava na recepção. Sentado em uma das cadeiras acolchoadas com forro de couro preto, ele respirava um ar pesado. Um policial mal uniformizado trabalhava em um computador na pequena sala de espera. Ele segurava um copo descartável com café até a borda. Era a única forma que eles tinham para se manter despertos na jornada de trabalho. O cheiro nauseante de café empesteava o ambiente. O policial parecia ignorar a presença de Ethan. A sala estava escura e a única iluminação provinha da escasa luz de fim da tarde que adentrava pelas frestas das persianas. O assoalho era de madeira de carvalho escura e as paredes estavam decoradas com recortes de jornais, manchetes e fotos de casos antigos, soltos ou pregados em quadros. Uma pilha de papéis velhos amontoava-se num canto.

Quando Joseph Quinn chamou Ethan, o garoto jogou a mochila nas costas e entrou. Não lembrava da última vez que havia estado ali, mas tinha certeza que fazia muito tempo. Apesar disso, aquele lugar parecia não mudar há anos. Tinha a mesma atmosfera pesada de antes. O escritório era terrivelmente escuro. Parecia que seu pai esquecia de abrir as janelas durante todo o dia. A decoração não tinha nada de excepcional, era idêntica à da sala de espera, a não ser por alguns certificados ou condecorações pendurados nas largas paredes de madeira, recompensas depois dos muitos anos de serviço.

Sentado numa poltrona ordinária, Ethan observava seu pai do outro lado da mesa, a atitude imponente e o olhar desconfiado de Joseph faziam o garoto se perguntar qual seria o teor da conversa.

Joe Quinn foi o primeiro a falar. "Eu chamei você aqui porque preciso saber o que aconteceu exatamente na noite dos assassinatos", com uma expressão de seriedade, ele lançava um olhar penetrante a Ethan, como se dessa forma pudesse extrair informação do filho.

O garoto hesitou antes de falar. "Eu gostaria muito de ajudar mas...", ele organizou os pensamentos na mente, com medo de dizer algo suspeito. "Eu não sei de nada. A gente só chegou a tempo de ajudar a Stacy e o Henry e chamar uma ambulância... não vimos nada do que aconteceu antes", mentiu o jovem-lobo. Ele mesmo se deu conta de que não soou muito convincente.

O pai permaneceu sentado sem mover um músculo, o olhar cortante atravessando Ethan. "Ah é? Que conveniente... e você pode me explicar como foi que advinharam que os crimes estavam sendo cometidos e chegaram no momento exato a tempo de ajudar as vítimas?"

Aquela pergunta era capciosa. Ethan pensou bem antes de responder. "Estávamos na casa dos Collins naquela noite, fomos falar com o Jeffrey, irmão da Stacy. Foi então que ouvimos os gritos", confessou, o que não era mentira. "E na noite em que o Henry foi atacado... nós quatro íamos nos encontrar na casa dele... tinhamos uma festa às 9 naquele dia", ele mentiu outra vez.

Joe Quinn permaneceu em sua postura ereta e imutável. "Olha aqui garoto...", ele cuspiu as palavras, inclinando-se ligeiramente para a frente. "Você se acha muito esperto não é?" Ethan permaneceu calado, os olhos fixos no homem do outro lado da mesa, aquele homem importante e condecorado que estava muito longe de ser o seu pai. O policial prosseguiu. "Tem alguma coisa muito errada nessa história toda. E você deve ser muito ingênuo para pensar que eu não vou descobrir a verdade", declarou, convencido.

Ethan engoliu em seco. Seus olhos estavam tão abertos que dava a impressão de estar hipnotizado. "Se ajuda em alguma coisa...", ele se conteve por alguns segundos antes de continuar. "Nós vimos um lobo na cena do crime... ele estava fugindo quando chegamos. Era o mesmo lobo, de pelo negro bem escuro", ele decidiu revelar parte da verdade. "Pode perguntar à Bridgit ou à Isobel, elas vão dizer o mesmo. Pode ser que o crime tenha sido cometido por um animal...", ele sugeriu. "Talvez vocês devessem reconsiderar essa possibilidade". Ele já havia feito essa declaração à policia antes, após a morte da Stacy, mas eles não tinham dado muita importância.

O policial Quinn permanecia em sua pose impassível, o olhar cético, as pálpebras levemente caídas.

Sem aviso prévio, o policial Connor abriu a porta repentinamente e entrou no escritório. Ethan girou para trás na poltrona. "Chefe, encontramos a provável arma do crime no quarto do garoto Benson", soltou. Ele direcionava os olhos para o piso, por isso não notou a presença de Ethan na sala. Bryan segurava dois envelopes transparentes, um contendo a agenda vermelha e o outro, o canivete. Ele escondeu rapidamente as evidências. "Desculpa... não sabia que tinha visitas", ele desculpou-se humildemente, constrangido pela sua indiscrição.

"Agora ele já viu!", bradou Joe, remexendo-se na poltrona.

Ethan estava em choque. Ele não acreditou no que acabava de escutar. "Como é que é? Pai, isso é impossível! Como o Henry poderia ter feito aquilo? Ele é uma vítima como os outros três!", decretou o jovem-lobo. "Vocês não podem incriminar ele!", eufórico, o garoto corria os olhos de Bryan para Joe.

Após um ou dois segundos de silêncio, o policial Quinn se manisfestou. Ele se inclinou notavelmente em direção ao filho antes de falar. "Presta bem atenção garoto... tudo o que você escutou ou viu nessa sala não sai daqui, você me entendeu?", ele exigiu com severidade, o olhar obscuro. "Isso não foi uma visita formal... mas a qualquer momento eu posso fazer um interrogatório e você vai ser obrigado a comparecer por ser uma das testemunhas. Quando isso acontecer, você e suas cúmplices vão se arrepender de não ter me contado a verdade antes", ele se referia ao filho como se fosse um criminoso.

Ethan apertou a mandíbula, os olhos vidrados. Ele sentiu um aperto em sua garganta.

 

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Já era quase meia-noite quando Drake chegou em casa depois do serviço. Ele tomou uma ducha, preparou um sanduíche e devorou-o enquanto descia as escadas para o porão. Ascendeu a luz e como de costume, abriu uma das caixas que estava em uma bancada ao lado do pequeno armário, puxou algumas armas e apoiou-as sobre a grande mesa de madeira no centro. O espaço inteiro tinha um aspecto bastante rústico, com tons amadeirados, o que se intensificava com a iluminação escasa.

Ele puxou uma flanela e começou a limpar a poeira das armas. Primeiro, uma espingarda negra. Depois o arco e flecha. Até que ficassem bem lustrosos. Ele repetia esse procedimento uma vez por semana, já havia se tornado parte da sua rotina. Drake continuou seguindo essa prática mesmo depois de seu pai ter partido e apesar de haver desistido da vida de caçador. Nunca soube ao certo o que o motivava a fazê-lo. Era como se, no fundo, ele pressentisse que um dia o dever o chamaria de volta e ele precisaria retornar à sua antiga vida, apesar de sua resistência.

Mas na verdade ele o fazia em honra e respeito ao seu pai. Uma das frases preferidas do velho senhor Bennett ainda estava bem viva em sua mente. "Uma arma mal cuidada perde sua utilidade". Seu pai havia dedicado boa parte de sua vida àquele serviço e para Drake era injusto não honrar toda a dedicação de seu pai. Seria como uma espécie de desprezo e falta de reconhecimento. Por isso ele cuidava de todos aqueles instrumentos de trabalho com todo o esmero, instrumentos que um dia também foram seus e que o introduziram naquele mundo sobrenatural, regalando-lhe uma adolescência muito incomum.

Um rangido ecoou pelo porão. Ele viu uma sombra mover-se do outro lado, perto da escada. O ex caçador agarrou a espingarda e apontou na direção de onde provinha o ruido. "Quem está aí?", bradou com uma voz densa e autoritária. Não houve resposta. Caminhando lentamente, a pessoa misteriosa tomou coragem e emergeu das sombras.

"Angela?!", exclamou Drake, apesar de que sua expressão tinha mais um tom de pergunta. Ele permaneceu atônito, a sobrancelha franzida, completamente espantado com a figura diante dele.

"Surpresa! Sentiu minha falta querido?", ela disse num tom bem irônico.

Drake não conseguia esconder seu espanto. "O que você tá fazendo aqui? Como você entrou?", indagou rispidamente.

A mulher deu um passo adiante. "Ah não Drake, subestimando minhas habilidades?", ela o encarava com o olhar sedutor. "Pensei que ficaria feliz em me ver, depois de tanto tempo... faz o quê? Dez anos?", ela caminhava em direção a ele enquanto falava. Usava um jeans claro, uma bota de couro escuro, uma camiseta negra de alça fina — que ressaltava os seus seios — e uma jaqueta de couro.

"Você desapareceu sem avisar... pensei que tinha saído da cidade", Drake lançava-lhe um olhar de desconfiança e desprezo.

"Eu saí...", respondeu ela. "Mas agora estou de volta. Ninguém pode fugir do seu destino", falou, chegando mais perto. Ela colocou os braços em volta de seus ombros e acariciou seu rosto sensualmente, tocando de leve na sua barba. "Sinto falta daquele tempo", ela sussurrou em seu ouvido.

"Você traiu a minha confiança da forma mais desprezível", bradou de forma áspera, aumentando o tom de voz. Ele permaneceu estático, imune à sua estratégia de sedução.

"Você ainda tem ressentimentos?", falou, de uma maneira sarcástica e provocativa. Depois de um curto tempo de reflexão, ela continuou: "Por que não deixamos o passado de lado e focamos no que realmente importa?", sua voz era suave e envolvente. Ela desceu as mãos pelos braços do caçador, acariciando-os levemente com os dedos.

De repente ela mudou seu semblante e olhou para o rapaz com uma expressão severa no rosto. "Eles estão de volta, Drake."

O caçador não reagiu. Ele só escutava.

"Precisamos agir, recrutar os outros... precisamos fazer algo, não podemos ficar parados e fingir que nada está acontecendo", seus olhos reviravam, eufóricos. "Eles invadiram nosso território. Temos que mostrar a eles quem somos. Já chega de se esconder!", ela decretou com firmeza e autoridade.

Drake permanecia calado. Angela levou uma das mãos ao bolso da jaqueta e retirou um frasco minúsculo que continha um líquido azul-turquesa que parecia brilhar. Ela ergueu o frasco à altura de seu rosto. "Mal vejo a hora de usar essa belezinha contra o mais poderoso deles", ela tinha o semblante rígido.

Drake olhou para o frasco e se afastou ligeiramente, dando um passo para trás. "Como você conseguiu isso?"

Ela balançava o líquido de um lado a outro dentro do frasco, ignorando a pergunta do caçador. "A última mostra do veneno de lycoctonum. A arma mais poderosa contra um homem-lobo. O veneno mais raro... todas as outras mostras já foram usadas e agora só resta uma, e ela está bem aqui nas minhas mãos", ela admirava o líquido com o olhar vivido. Depois virou-se para Drake. "Preciso usar isso contra ele!", ela tinha um furor estampado em seus olhos.

"De quem você tá falando?", perguntou o caçador, assustado.

"Ele é muito poderoso Drake! O mais poderoso de todos. Como você não enxerga isso? Não entendo porque está protegendo ele..."

O caçador não sabia a quem ela se referia.

"Mas isso acabou. Quando eu lançar esse veneno sobre aquele pelo castanho, eu vou destruí-lo", os olhos dela ardiam em fúria. "Eu vou destruir Ethan Quinn!"

Drake estremeceu. Ele franzia a testa enquanto encarava aquela mulher.

"Mas vou precisar de sua ajuda", ela olhou fundo nos olhos do rapaz. "Você sabe que não posso usar o veneno sem as instruções corretas. Por isso preciso que me dê o livro!", exigiu.

"Eu não tenho o livro", respondeu Drake prontamente.

"Você acha que eu sou ingênua? Está dizendo isso só para proteger ele", retorquiu, impaciente. "Com ou sem a sua ajuda, eu vou fazer o impossível para capturar aquele garoto-lobo. Fazê-lo sofrer... Nada nem ninguém vai ser capaz de me impedir. Com ou sem o livro, eu juro que vou acabar com ele."


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