A Maldição Silenciosa escrita por Dama das Estrelas


Capítulo 4
Investigação




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Por um caminho mais quieto e vazio o casal passou pelas ruas do vilarejo. Uma fresca manhã debatia-se com o seco clima entre os dois. Por um bom tempo ambos não referiram quaisquer palavras. Estavam com medo de começarem a discutir e piorar a relação.

Maria, por sua vez, já não aguentava mais ficar daquele jeito. Eram noivos, e em breve se casariam! Qualquer ponta de medo ou dúvida deveria ser colocada por terra.

A caçadora olhava algumas vezes para ele enquanto andava. O rosto do meio-vampiro estava sério, quase frio, como de costume. Mas daquela vez era diferente; algo que Maria percebia nele incomodava intensamente a caçadora.

— Fico feliz que resolveu andar ao meu lado.

— Sim... – Alucard mal prestou atenção às palavras da noiva.

Alguns segundos sem resposta. Maria persistiu na conversa:

— Você ainda está chateado, não é?

O meio-vampiro olhou para a noiva balançando a cabeça negativamente.

— Não, só estou preocupado. – disse sem reservas.

— Sabes que sei cuidar de mim mesma.

Ele disse sem pensar direito em seguida. As palavras, por causa da emoção, saíram de sua boca:

— Disse o mesmo antes de... de...

A caçadora virou-se para Adrian, já sabendo o que ele falaria:

— Morrer? – falou desafiadoramente.

Alucard ficou em silêncio.

— Então era por isso. – a mulher jogou um sorriso sarcástico.

— “Isso” não é qualquer coisa, Maria. – levemente o meio-vampiro franziu a testa – é de sua vida que estamos falando.

— Adrian, eu estou bem, veja! – ela fez um gesto com as mãos mostrando a si mesma – Já conversamos sobre isso antes.

— Sei disso! Mas... – balançou a cabeça e disse baixo – você não sabe o quanto... o quanto és importante para mim, mais que tudo...

Mais que tudo. Poucas palavras, mas que tocou e sempre tocaram o coração da caçadora. Alucard nunca havia se apaixonado por alguém antes, e Maria foi a pessoa que seu coração sempre buscava, mas que sua natureza vampírica persistia em afastar. Ele zelava demais pela vida da amada, mas também era demasiado protetor.

Quase inconscientemente a caçadora entrelaçou sua mão esquerda a dele, e os dois pararam de caminhar. Ficaram frente a frente, e só assim puderam observar os rostos com melhor precisão. Era notável que estavam emocionados, e por pouco a discussão não ficou mais densa; se tinha algo que um casal de apaixonados odiava fazer era brigar, isso era óbvio. Mas por causa da situação que se encontravam era quase impossível evitar aquilo.

— Você também é importante para mim, Adrian. – ela o puxou carinhosamente pelo pescoço e lhe beijou os lábios. Mas antes que ele pudesse responder o gesto, Maria se afastou e sorriu, deslizando as mãos sobre seu rosto – Sei que gostaria de mais, porém, precisamos ir.

Ele entendeu sua atitude, mesmo querendo puxá-la para si e beijá-la ainda mais.

O casal prosseguiu para norte, rumo ao local onde as crianças foram, e de acordo com a freira, o último lugar que foram antes de passarem mal.

 – Espero que consigamos achar algo relevante. – Adrian comentou no caminho.

— Por que diz isso?

— Será que a freira tinha completa certeza do lugar onde possivelmente foram infectados era realmente essa feira ao norte? Em todo o trajeto que fizemos, a chance de terem adquirido aquela enfermidade em qualquer outro lugar também são grandes.

— Droga. – ela parou de andar bruscamente – Você está certo.

Maria olhou para todos os cantos, tentando buscar alguma resposta. Brigou consigo mesma por não ter pensado nos detalhes antes. Estava tão nervosa e preocupada com as crianças que partia para o primeiro lugar relevante que ouvira.

— Maria. – ele disse, mas a caçadora não prestou atenção – Perdoe-me, não queria lhe deixar mais preocupada. – Então deu dois passos ao seu encontro, e percebendo que estava distraída, pôs a mão em seu ombro. Quando o fez, Maria reagiu assustada ao toque, movendo rapidamente seu braço por impulso.

— Desculpe, meu amor. – disse, dando um suspiro por arrependimento. – Esses últimos acontecimentos me pegaram de surpresa. Primeiro a decisão de Richter em não nos dar sua bênção... depois esse... problema com as crianças.

— Tem certeza de que não é melhor retornares e descansar?

— Isso está fora de cogitação. – ela balançou a cabeça – Eles precisam muito de nossa ajuda.

Ele a encarou intensamente. Sabia que Maria não era uma mulher que desistia facilmente e viu que suas tentativas de convencê-la a não prosseguir falharam. Como não tinha outra escolha terminou acatando a seu desejo.

— Está bem. Mas não se esforce demais.

— Bom. Pensei bem e acho melhor começarmos a investigar essa feira. Como a irmã disse que esta ela é nova por aqui não será ruim que nós, pelo menos, fizermos uma visita. Não creio que os meninos tenham ido a outro lugar; eu os conheço e sei que são crianças honestas.

Continuando o caminho, ainda era notável a peculiar ausência de pessoas. Ainda não era final de semana, então aquelas ruas deveriam concentrar uma boa porção de gente trabalhando ou fazendo qualquer outra coisa. Se já não bastava o que houve com os jovens, agora isso.

Os ventos da brisa semi fresca deslizavam livremente por aqueles lados do vilarejo. Era quase melancólico o clima que era percebido. Os animais sem dono corriam e voavam solto, como se soubessem que ninguém iria à sua busca. Era quase que uma cidade fantasma.

Então chegaram ao destino. Quase no limite do vilarejo, entre construções temporárias feitas de madeira o casal viu uma espécie de balcões dispersos de modo que era possível agrupar diversos tipos de alimentos. Finalmente havia movimento de pessoas. Os momentos anteriores já começavam a deixara caçadora angustiada.

— Até que enfim. – disse aliviada.

— Veja. – Adrian disse, apontando para que Maria pudesse analisar o local mais precisamente.

— Hã? O que está acontecendo?

A mulher não esperou e caminhou rapidamente para onde haviam alguns homens recolhendo caixas com alimentos e levando-os até uma carroça.

— Ei, com licença. – disse, parando próxima a eles, sem incomodar o fluxo de passagem.

— O que foi, menina? – um deles disse um pouco intrigado. Parecia não gostar que Maria estivesse perguntando e incomodando-os.

— É... eu... eu gostaria de algumas informações. Se importam em responder?

— Ah... – disse irritado.

Aproximando-se dela, uma mulher aparentando ter quarenta anos, de cabelos grisalhos e olhar profundo veio e falou:

— Ollie não gosta de conversar enquanto está trabalhando.

Maria olhou para ela um pouco assustada.

— Perdão?

— Oh, desculpe. – a velha deu uma leve risada. – Meu nome é Loren Azaen. 

— M-muito prazer. Sou Maria Renard.

— Renard? – ela disse um pouco surpresa. – Do clã Renard?

— Sim. – Maria corou um pouco envergonhada. – Ah, – ela virou-se para o noivo – Esse aqui é meu companheiro, Adrian.

— Lisonjeado. – disse unicamente e baixando a cabeça.

— Pelo visto não vieram aqui para comprar nossos alimentos. Infelizmente já estamos de partida. – Loren apontou com a mão os diversos homens recolhendo as caixas.

— Vieram de muito longe? – a caçadora perguntou um pouco intrigada. – Já que nunca os vi antes.

— Um pouco. Viemos em busca de novas oportunidades para vender as mercadorias, mas não tivemos muito sucesso, por isso estamos retornando.

— Bem... – ela não queria ser direta ou grossa demais, então disfarçou com mais conversa. – Que estranho. As pessoas daqui gostam de novidades em relação a isso. Estão sempre comprando nas feiras locais. Admira-me que vocês não conseguiram um bom resultado.

— Parece que não tivemos sorte dessa vez.

Maria e Adrian se entreolharam. Precisavam de algo mais para se certificarem que não havia (ou havia) algo incomum no local.

— Podemos conversar em um lugar mais... reservado?

Loren encarou Maria nos olhos. Viu que ela parecia preocupada e que não gostaria de perder tempo.

— Sim. – respondeu ainda confusa. – As caixas estão quase no fim. Continuem com o trabalho que em breve irei retornar. – Loren disse aos homens fortes que não paravam por um segundo.

Em seguida, a mulher levou Maria e Adrian para um lugar mais precisamente a oeste, num ponto mais afastado do local anterior.

— Pelo seu olhar, creio que não é algo bom, certo?

— Eh... – antes que começasse a falar sobre o caso das crianças, Adrian disse primeiro:

— Notou algo peculiar no tempo que permaneceu aqui?

Instantaneamente a caçadora olhou para ele. Viu que o meio-vampiro preferiu que a conversa não fosse direta.

— Peculiar? A única coisa estranha que vi foi a ausência de pessoas para comprar nossa mercadoria.

— Além disso... – Maria completou – Não viu ou notou algo incomum?

Loren levou a mão ao queixo, tentando buscar algo que achou que fugiu à mente.

— Perdoem-me. Não me lembro de coisa alguma que pudesse se encaixar em suas descrições. – ela ajeitou a barra de seu vestido, tirando vestígios de poeira.

— Perguntamos isso, pois, soubemos de alguns jovens que vieram aqui comprar alguns alimentos. – Adrian disse. Ele já sabia como abordar o assunto sem ser ofensivo.

 – Jovens? – alguns segundos se passaram e ela logo arregalou os olhos – Ah, sim! Lembro-me deles. Sim, sim, eles compraram algumas verduras.

— Eles apresentaram algum comportamento estranho?

— Não... – apenas vieram aqui e compraram como qualquer gente normal. Estavam sorrindo, até.

— Chegaram a comer algo daqui, ou vieram comendo? – o meio-vampiro era persistente. Queria saber de respostas ou pistas sem citar o incidente.

— Não, não sei. Mas... por que está perguntando tantas coisas? Aconteceu algo que eu deveria saber?

— Negativo, minha senhora. Sei que deve estranhar isso, mas queríamos apenas saber se eles estavam falando a verdade. – as palavras de Adrian eram firmes, mesmo omitindo a verdade. – Queremos lhe pedir desculpas por qualquer transtorno à senhora e aos homens.

— Oh... – o meio-vampiro parecia ter convencido a mulher, que disse um pouco surpresa. – Não se preocupem. Estou aqui para ajudar.

— Querida. Nós podemos ir; aquelas crianças terão a lição que merecem por ter mentido para nós. – Adrian disse, tocando no braço de Maria. A caçadora estava atônita após ouvir toda a conversa.

— E-está bem, concordo, meu amor. Melhor irmos.  – disse sem saber ao certo.

— Muito obrigado pela compreensão, senhora Loren. – Adrian lhe beijou a mão.

— Eu agradeço por serem tão cordiais. É uma pena que não nos conhecemos em momentos melhores. Voltaremos em tempos melhores, eu espero. Também torço para vê-los novamente.

Maria deu um sorriso.

— Igualmente. E pedimos desculpas mais uma vez pelo incômodo.

— Vocês não incomodaram.

Então o casal despediu-se da senhora. Enquanto se afastavam, Loren olhou-os por alguns segundos e depois retornou aos seus afazeres.

— Não esperava aquela sua... atitude. – a mulher disse com olhos surpresos enquanto caminhava com ele.

— Desaprova-me, então?

— Não, não! Você foi incrível! Viu como aquela – ela olhou para trás, tentando ver se Loren ainda pudesse vê-los – mulher ficou impressionada com sua fala? Achei até que ela estava gostando de lhe dirigir a palavra. – terminou com uma fala forçada, tentando maquiar o ciúme.

— Perdão, mas não entendi.

— Ah... esqueça. – Maria deu uma leve risada, tocando em seu braço – Você irá aprender sobre isso com o tempo. Mas, trocando de assunto, não achas que deveríamos investigar mais um pouco?

Os dois pararam numa esquina. Precisavam, agora, decidir qual seria o próximo caminho a tomar. Adrian tinha plena certeza de que nada maligno vinha de nenhuma das pessoas presentes naquele espaço. Só que aquilo soou mais como uma decepção que alívio, pois nem mesmo ele conseguia sentir alguma ameaça.

— Creio que não. No tempo em que estivemos ali, sequer notei algo maligno. Até mesmo em Loren. – Adrian olhou para ela, trazendo um sorriso.

— Bem... – ela ergueu uma sobrancelha, notando a zombaria do noivo – talvez ela não seja tão suspeita, aparentemente. Mas ainda assim tenho minhas dúvidas sobre ela e os outros. Principalmente em Ollie, viu como ele olhou para nós?

Alucard estava prestes a se pronunciar. Continuaria com o assunto, mas ainda estava inseguro sobre como falar a ela sobre sua incerteza.

Quando abriu a boca para dizer algo, um grito rápido, mas tenso, foi ouvido por ele. Maria também ouviu, mas não com a mesma intensidade que o meio-vampiro sentiu, já que este tinha a audição aguçada.

— Um grito...! – ela disse em alerta.

— Veio do local da feira! – Adrian caminhou alguns passos em direção ao lugar donde estavam.

O casal retornou correndo até a feira. Talvez Maria estivesse certa sobre aquela mulher? Ou será que foram atacados? Um acidente, quem sabe? Os pensamentos da caçadora foram a mil. Mas o que se viu na cena seguinte foi tão ruim quanto se imaginava, até pior; para o choque da caçadora e o alerta do meio-vampiro.

No chão, um homem caído, desacordado. E não apenas isso; com sua possível queda, uma aparente caixa pesada estava em cima de seu corpo. A queda foi brusca. Vários se reuniram em sua volta em pânico, tentando ajudar ou saber o que havia acontecido. E outro detalhe que se percebia era Loren, a mulher que, antes, mostrava uma serenidade em seu rosto, apresentava um profundo desespero ao gritar de Ollie a todo o momento.


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