Choque de Tempo escrita por Miss Krux


Capítulo 10
Capitulo 10 – Um café quente.




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Marguerite adentrou o quarto do caçador; a única luz que havia vinha dos poucos raios de sol que deixavam o local ainda na penumbra. Ainda assim, foi possível enxergar John em pé, ou melhor, tentando ficar em pé se apoiando em seu rifle, que costumava deixar ao lado da cabeceira da cama. Ela logo depositou a bandeja na cômoda próxima e foi segura-lo, dar-lhe o apoio para que retornasse para a cama.

M – Mas o que pensa que está fazendo? Onde acha que vai nesse estado?

John estava ansioso, nervoso, principalmente depois que ouviu os disparos – tinha certeza que eram da arma de Marguerite – e logo em seguida silêncio; ninguém descia, ninguém vinha lhe falar nada. Isso estava o torturando, então ele decidiu saber por si mesmo o que tinha acontecido, porém, seu estado não estava colaborando.

J – Ora, o que penso que estou fazendo?! Eu estava indo saber o que tinha acontecido. Ouvi os gritos e disparos mais cedo, fiquei esperando alguém aparecer e nenhum de vocês veio, tinha que saber por mim mesmo o que aconteceu.

M – E a parte que está ferido e precisa de repouso? Não se recordou, pelo visto. John, eu não lhe prometi que se algo acontecesse chamaria? Eu sei me cuidar sozinha, obrigada. Não posso depender de você o tempo todo. Sempre me cuidei antes de você e vou continuar me cuidando com ou sem você. Além do mais, estava dando um jeito em toda essa bagunça e arrumando a bandeja de café para tomarmos juntos.

John já estava sentado na cama e Marguerite estava de pé com os braços na cintura, olhando-o nos olhos como só ela sabia fazer. Agora que ele havia percebido que a herdeira estava com os longos cabelos cacheados soltos e com seu hobby lilás da sua blusa branca que costumava usar por baixo de suas camisas. Provavelmente, ela não tivera tempo de se arrumar após o que deveria ter sido uma maneira muito abrupta de acordar. Mas ela estava linda, parecia que cada dia a deixava mais bonita; e como ele amava vê-la desse jeito como estava, principalmente porque se recordava das vezes em que dormiram na mesma cama, quando acordavam mais cedo que os demais e corriam em fuga para seus próprios quartos - ora ele, ora ela.

J – Sim, eu sei que me prometeu; assim como sei muito bem, Marguerite, que nunca precisou de ninguém para se proteger, que sabe se cuidar sozinha, mas agora não precisa mais, você tem a mim. Eu posso fazer isso por você o que, aliás, seria um prazer. Mas também admito estar surpreso, não achei que iria aparecer tão cedo para me ver depois da nossa discussão de ontem.

M – Você bem que não merecia depois daquela cena desnecessária de ciúmes de ontem; eu deveria aparecer aqui somente amanhã, mas se eu fizesse seria bem capaz que morresse de fome. E eu já te falei que se você morrer minha vida seria muito entediante; quem eu iria perturbar?

John percebe o tom brincalhão de Marguerite, era uma de suas artimanhas para esconder sua irritação e ao mesmo tempo lhe dizer que não havia gostado. Ele acaba por soltar uma gargalhada que logo contagia Marguerite fazendo-a também começar a sorrir alegremente. O belo caçador estende sua mão para a mulher que delicadamente deposita a sua própria, tão pequena perto da do homem que estava a sua frente ainda rindo.

J – Concordo; sua vida sem a minha presença seria muito sem graça. Mas devo lhe informar, Milady, que os homens normalmente não sentem ciúmes, apenas não gostamos de alguma cena que presenciamos.

Marguerite não podia acreditar no que estava ouvindo; ele estava com ciúmes, tinha ficado bem claro, e agora estava negando. Como poderia ser tão orgulhoso? A herdeira logo se irrita com o caçador e tenta tirar sua mão, porém, ele a segura mais forte, apertando a mão dela e atraindo sua atenção para ele antes que ela agisse por raiva.

J – Eu disse que homens normalmente não sentem ciúmes, mas, minha querida, nós dois estamos longe de sermos um casal normal. Este lugar onde vivemos nos reserva uma surpresa a cada dia e eu a amo tanto que acredito ter perdido meu juízo no momento em que te vi. Portanto, não posso dizer que estou no meu estado normal. E se quer uma admissão: sim, senti ciúmes de você ontem, assim como senti em todas as outras vezes que vi outro homem chegando perto demais de você. Será que pode desculpar seu futuro marido que por instantes deixou-se cegar pelo ciúme?

Marguerite não sabia o que pensar; John estava admitindo o ciúme, mas também estava lhe pedindo em casamento? Era isso mesmo, ele a estava pedindo em casamento. Quando John soltou sua mão, ela pôde ver que ele tinha depositado uma aliança de ouro com pequeninos diamantes cravejados. A herdeira, por um instante, sentiu como se o chão sumisse, o ar lhe faltasse e tudo havia parado no tempo. Ela obrigou-se a sentar ao lado de John na cama, ainda olhando para a sua mão, para o que segurava. John, por ver que a mulher ao seu lado parecia não ter palavras, decidiu prosseguir:

 J – Marguerite, me ouça. Não precisa aceitar agora, só me diga que irá pensar. Eu demorei dias pensando em como fazer isso, em como te falar isso, queria esperar o momento certo, queria que estivesse tudo resolvido entre nós; porém, ontem quando me vi com ciúme, por Deus, Marguerite, nunca em toda minha vida tinha sentido isso. Depois que saíram daqui, passei horas pensando e hoje, esperando por você, cada minuto parecia uma eternidade. Eu não estava brincando quando te falei naquela caverna que daria meu último ar para você. Eu a amo, mais do que minha própria vida, e não consigo mais ver como seria viver sem você, seu cheiro, seu cabelo (seja penteado ou apenas solto como está), suas broncas, até mesmo quando às vezes penso que não merecia, o jeito como sabe assumir a dianteira de uma situação e colocar tudo em seu lugar, seu sorriso, amo quando sorri para mim na mesa do café da manhã, seus olhos verdes – tão belos e tão profundos – quando me encaram como está fazendo agora. Eu amo tudo em você, minha Marguerite; até mesmo quando briga comigo e me trata com indiferença e não acho necessário lhe dizer sobre seus segredos. Sempre estarão seguros comigo.

Marguerite respira fundo, perdida em seus pensamentos. John estava mesmo lhe pedindo em casamento! Não tinha sido fruto de sua imaginação, nem uma frase mal interpretada, ele estava propondo casamento. A herdeira já havia se casado várias outras vezes, mas nunca, nunca tinha amado e confiado em um homem como em John. Ele era tudo o que poderia desejar e ainda mais. Ela não era merecedora de tanto amor e de um homem como aquele; John merecia alguém melhor, alguém sem segredos, sem dívidas ou tantos problemas como ela teria quando retornassem para Londres. Porém, por outro lado, ela já havia perdido tanto no passado: amigos que amava, uma família que nunca pôde conhecer, a chance de saber quem realmente era; e agora no seu presente tinha tudo o que um dia pôde desejar: tinha um lar, uma família e o homem por quem tinha se entregado de corpo e alma. John a olhava com tanta segurança, com tanto amor, tanta devoção, que seria incapaz de negar-lhe tal pedido, mas também tinha que ter certeza se quando retornasse a civilização ele iria permanecer ao seu lado ou apenas iria sumir de sua vida como outros já haviam feito.

M – John eu o amo, mas... Mas não mereço isso. Quando retornarmos a Londres faz idéia do que teria que enfrentar? Eu não posso, não posso arriscar lhe perder. Além disso, eu não sou nobre e gastei minha última libra nessa maldita expedição do Challenger, como irá me apresentar como sua mulher? Já pensou nisso?

J – Se confiar em mim, em me contar tudo o que lhe assombra, sobre os seus fantasmas do passado, iremos enfrentar tudo juntos como temos feito nos últimos quase quatro anos. Você não me perdeu aqui em meio a dinossauros e trogloditas e não irá me perder em Londres ou qualquer lugar que seja, assim como eu não vou lhe perder, não vou permitir que saia da minha vida. Não se esqueça que foi essa maldita expedição do Challenger que nos uniu. E sobre como irei lhe apresentar, ora, como minha primeira, única e última mulher, senhorita Marguerite Krux, ou melhor, Lady Marguerite Roxton. Com o que os outros irão pensar estou pouco me importando; é com você que quero passar todos os meus dias, até a minha morte.

Cada palavra pronunciada por John fazia com que o coração de Marguerite acelerasse. Era tudo o que ela esperou ouvir durante toda a sua vida, mas além de ouvir, ela esperava se sentir amada, amada como ela era; e John certamente a amava sem ressalvas, apenas a amava e estava disposto a enfrentar todos os seus problemas, todos os seus fantasmas do passado, todos os seus medos, todas as suas dívidas e, ainda que fosse um nobre como era, seu cavalheiro de armadura brilhante enfrentaria a ira de sua própria família ou de toda a alta sociedade londrina tornando-a sua, até que a morte os separe.

M – Sabe, John... Até que a morte nos separe é muito tempo. Agüentar meu mau humor todos os dias ao acordar e, até mesmo às vezes durante o dia inteiro, ter o dever de me preparar café pela manhã – até porque você sabe que café é uma necessidade, dividir a cama com uma ladra de jóias procurada em todos os continentes, uma espiã tripla e ainda por cima falida; tem certeza que é isso mesmo que quer?

John sorriu diante de Marguerite que estava com seu ar irônico costumeiro e não pôde deixar de notar o belo sorriso que se espalhava pelo rosto de Marguerite, um dos mais belos sorrisos que ele já tinha visto.

J – Não é nada que eu já não saiba lidar. Nada em que o grande caçador branco não possa se aventurar, uma aventura para toda vida. Se aceitar. Ainda não me deu a resposta formal ou irá preferir que eu aguarde?

Marguerite levantou-se, devolveu o anel para John, que se sentia como se estivesse congelado, pensando na possibilidade dela negar novamente.

M – Bem, então em qual mão vai optar por colocar a aliança?

John sorriu de canto a canto. Aquele era, sem dúvida, o dia mais feliz em sua vida. Ela tinha aceitado... Depois de todos esses anos, ela o aceitou.

J – Bem, noivado costuma ser na direita, mas eu não a quero como noiva; a quero como esposa, portanto, será na esquerda.

Dito isso, John segura a mão esquerda de Marguerite com suas duas mãos, colocando a aliança no dedo dela e logo deposita um beijo carinhoso, como se ali estivesse depositando também todo o seu amor.

J – Não é um casamento formal, Marguerite, como sei que gostaria, nem mesmo agüentando ajoelhar eu estou, mas eu lhe prometo que independentemente de voltarmos ou não para Londres você terá toda a cerimônia formal, como toda mulher sonha. Eu prometo, Marguerite, lhe amar, respeitar e proteger por todos os dias de minha vida até a eternidade, porque até a morte seria muito pouco tempo ao seu lado.

Marguerite estava quase chorando, segurando uma lágrima insistente que teimava em descer pelo seu rosto, mas o seu sorriso não escondia a felicidade tamanha. Finalmente, ela e John haviam se acertado e depois de anos ela se permitia amar John sem ressalvas e ser amada. Permitia-se ser feliz.

 M – Eu... Eu também prometo, John. Na verdade, eu não sei o que dizer. Quanto à cerimônia que toda mulher sonha, acho que meu sonho você acaba de realizar: me amar como eu sou.

J – Bom, não precisa me dizer nada, acho que já ouvi tudo o que precisava saber. Aliás, e meu beijo?

Marguerite se aproxima de John, se abaixa deixando seu rosto perto do dele, os lábios já se tocavam, os olhos mirando profundamente nos do outro, ambos com sorrisos nos lábios e uma alegria sem medida estampada no rosto.

M – Eu amo você... Meu futuro marido.

E ela o beijou. Um beijo carinhoso, cheio de amor, profundo, misturado com algumas lágrimas que ela não conseguiu segurar. Suas mãos, uma apoiando na cama e a outra acariciando o rosto de seu amado. John também mantinha umas de suas mãos apoiadas, para ajudar a sustentar seu peso, e outra enrolada nos cabelos de Marguerite mantendo-a mais perto. Depois de um tempo, quando separados, mas ainda mantendo-se com os rostos próximos, John passava sua mão pelo rosto de Marguerite enxugando suas lágrimas e a herdeira coloca sua mão por cima da de John, quando percebe algo errado.

M – John, cadê o seu anel?

John levanta a mão esquerda de Marguerite e mostra a aliança.

J – Está aqui. Eu derreti meu anel e fiz a aliança com o ouro. Também consegui levar até os Zanga para que cravejassem estes pequeninos diamantes nas duas voltas em troca de algumas caças e de um relógio de bolso. Um dia antes de eu sair escondido do seu quarto roubei um de seus anéis para poder obter o tamanho certo. Acho que não é a única a ter segredos, minha querida, e levar jeito para ser uma ladra.

M - Estou vendo, Milord, estou vendo... Acho que tenho sido uma péssima influência para você.

John a abraça jogando-a na cama ao seu lado e olhando nos seus olhos.

J – A melhor, minha Marguerite, a melhor.

M – John, só tem uma coisa que esquecemos.

J – O quê?

M – O café esfriou.

E os dois logo estavam gargalhando juntos, enchendo o ar de felicidade e de esperança por tempos melhores.


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