Eu estou aqui

“Tinha lágrimas nos olhos e estava infinitamente feliz por ouvi-lo respirar a seu lado.” Milan Kundera

“Precisamos conversar” foi o que eu ouvi ela dizer, de fato isso me surpreendeu, esperava ouvir isso de Aaron e não da minha jovem filha, mas esta era Ariane Hotchner, sempre cheia de surpresa e cuidando dos outros. Pergunto-me a quem ela puxou, isso me faz sorrir.

“Pois bem, comece” eu disse incentivando a falar. “Bem, você e papai tinham razão está sendo bom para mim conversar com a doutora Cranston” Eu assenti e percebi que ela queria falar algo, mas não sabia se devia “O que está te incomodando querida?” Ela mordeu o lábio, “Mãe, você está bem?” franzi o cenho “Claro que sim querida” Minha resposta pareceu não convence-la, já que ela me olhava desconfiada. “Aconteceu algo. A senhora está de licença e está diferente” Será que estou perdendo minhas habilidades em compartimentação? “Diferente como?” Ela deu de ombros “Desde que você e papai chegaram do último caso estão diferentes. Ele está sempre ao seu redor, mas ele está quieto e a senhora está um pouco distante” A observei atentamente “Distante?” Ela assentiu “Mais quieta, olhando para o nada as vezes” “Oh querida, me desculpe. Eu apenas tive um dia ruim” ela me olhou como se não acreditasse naquilo, sentei mais próxima a ela e a abracei. “Foi um caso ruim Anne, mas eu não quero falar sobre isso. Não se preocupe, eu vou ficar bem” ela murmurou “Eu só quero que você saiba que estou aqui mãe, se precisar de algo...” sorri para ela, quando é que ela cresceu tanto? “Certo, e a mesma coisa vale para você”.

Enquanto eu a abraçava tão forte quanto podia, sinto os braços de alguém me envolver. “Pai” ouço Anne dizer, “Aaron” eu digo com um leve sorriso. Ao nos afastarmos pergunto então “Por acaso você não esqueceu nada?” Ele observa as sacolas que havia deixado no chão “Acho que não” ergui a sobrancelha e Anne entrou no jogo “Então o que aconteceu com os três garotos que te seguiram? Não me diga que os trocou por comida” Ela estava sorrindo. Ele sorriu antes de responder “Encontramos JJ que os convidou para jogarem um novo jogo com Henry, por incrível que pareça, até mesmo Alex parecia interessado”.

Depois disso, Anne me ajudou a guardar as compras e ao terminar disse que iria ler um livro. Cerca de dez minutos após ela sair, Aaron aparece na cozinha. “Precisa de ajuda?” ele pergunta, “Não obrigada, já terminei” disse guardando a última caixa de cereal. Ele se senta em um dos bancos em frente a bancada e eu faço o mesmo, percebo então que uma conversa desconfortável se aproxima.

“Você se lembra daquele acordo que fizemos?” franzi o cenho, havíamos feito muitos acordos ao longo dos anos “Qual exatamente?” “Aquele que se um de nós tivesse um dia ruim iria falar com o outro” eu assenti e o silêncio caiu entre nós. “Hoje não foi um dia ruim” eu disse e ele me observava de tal maneira que parecia que ele podia ler minha mente. “Na verdade foi até interessante, descobri que minha filha está crescendo e pode ter herdado o meu talento nato em ler as pessoas” ele ergueu a sobrancelha “Seu talento nato?” assenti e ele riu “Que foi?” “Desculpe-me querida, mas nós dois sabemos que eu tenho o dom nato em ler as pessoas” olhei para ele seriamente e cruzei os braços “Querido, eu me tornei uma profiler primeiro que você” ele então soltou uma gargalhada, Aaron rir é somente em casa, mas Aaron gargalhar é mais do que raro. Contagiada pelo som de sua gargalhada, eu tive que sorrir. Ele então se levantou e pegando minha mão me guiou até o sofá, onde nos sentamos bem próximos. “Faz muito tempo que você não fazia aquela cara de senhorita Prentiss” rolei os olhos e sorri ao me lembrar da primeira discursão que tivemos quando ele trabalhava para a minha mãe. “Você ainda lembra disso?” Perguntei encarando seus olhos escuros “E como eu não lembraria? Eu sabia que você era teimosa, mas aquele dia em que você se negou a usar o meu guarda-chuva e preferiu ir andando na chuva eu soube que você tinha atitude” dei de ombros “Juro que ouvi você dizer que era teimosia” eu disse. “Engraçado, não me lembro disso” ele disse e agora era minha vez de erguer a sobrancelha “Que conveniente”.

A noite, após JJ trazer as crianças para casa e eu garantir a ela que estava bem, comecei a preparar o jantar. As coisas estavam no ritmo novamente, os gêmeos brincando, Alex e Anne tendo uma disputa de encarar e Aaron... bem sendo o pai.

Após jantarmos, Anne me ajudou com a louça e os garotos se encarregaram de escolher o filme. Quando o filme terminou os gêmeos já estavam cochilando, Aaron os levou para o quarto deles e eu me encarreguei de limpar a pipoca que havia sido derramada.

Quando finalmente estamos sozinhos em nosso quarto, ele me dá um beijo de boa noite e não muito tempo depois, percebo que ele está dormindo. Em minha casa, com minhas crianças, ditada em minha cama, ao lado do homem que eu amo eu percebo o quanto sou sortuda. Tenho uma família maravilhosa e sorte por poder estar aqui essa noite. Se Aaron não tivesse chegado a tempo, há algumas noites, certamente eu não estaria aqui agora. Esse pensamento faz com que minha visão embora no escuro, fique embaçada pelas lagrimas, lagrimas essas que eu estava segurando há muito tempo. Faço o melhor que posso para limpa-las, coloco a cabeça no peito de Aaron, me agarro a ele o máximo que consigo, pois aqui nesta posição, ouvindo seus batimentos e sua respiração regular, é o suficiente para que eu saiba que estou viva.