Mais uma PORCARIA de dia em que sou iludida pelo pirralho arrogante do Will!

Estava tudo às mil maravilhas por causa daquele beijo, eu estava me sentindo a última estrela do céu, me sentindo amada e talvez até desejada. Como se finalmente fosse me casar. Crendo nisso que nem uma criança ingênua.

Ninguém que desobedecesse me fazia ficar brava, estava em outro mundo. Quem eram aqueles servos inúteis e insignificantes? A Rainha iria ter enfim seu conto de fadas.

Mas acho que rainhas más não tem contos de fadas felizes, não é?

Odeio seguir tais regras. Regras. Destino. Deus? Ah, eu sou só uma Rainha má. Se não posso ter meu final feliz... a culpa é minha?

— Will! – o vi e saí correndo feliz da vida, sem pensar em modos, em confusões, em como isso era infantil. Essa pureza... isso é meio puro demais.

O abracei.

— Que está fazendo, Alteza? – ele ficou tão surpreso que estranhei.

Pra quem me beijou, receber um abraço não deve ser grande coisa.

— Estou abraçando meu futuro marido, espero – falei como uma burra envergonhada e embaraçada. Por que ele fazia isso? Talvez quisesse ouvir de mim um “eu te amo” ou algo assim.

— Marido? – o coelho quase engasgou com o espanto – Do que está falando?!

— Ontem... – fiquei toda envergonhada, rindo de nervosa – Aquele beijo... você realmente me surpreendeu, sabe?

Ele ficou realmente encabulado, mas se afastou ao invés de retribuir o abraço. O que queria? Que eu ficasse quieta depois de meu primeiro beijo?

— Não é o que você está pensando – disse com uma mistura de pena e confusão – Foi uma forma de agradecimento.

— Chama aquilo de “agradecimento”?! – me irritei. Ele foi meu primeiro beijo só pra agradecer?! – Você...

— Olha Scarlett, eu gosto de você, mas não desse jeito – tentou se defender.

— Ah, e a empregada suja você quer?! – supus provocando.

É, isso me veio à cabeça sem querer. Mas só podia ser, não é? Ele não estava no quarto dela por acaso, ele gostava daquela garota.

— Não...

— Pare de mentir! – minhas mãos começaram a suar, por algum motivo, eu queria ir até a garganta dele e apertar. Mas, algo me impedia. Como poderia machucar alguém que eu amava?

— Eu só não quero casar! – me cortou, pirralho sem respeito – Isso é deixar a liberdade!

— Mas eu deixaria você fazer o que quiser, poderia ser até mais livre que agora – falei sem entender.

— Mas não poderia amar quem eu quisesse – choramingou o pirralho.

Entendi tudo. É claro que ele não me amava, é claro que foi me beijar só pra iludir ainda mais a rainha burra. Aquele sonho fantasioso de estarmos juntos, só um sonho. Como sou ingênua, mas ainda que essa criança...

Como eu consigo ser mais ingênua que uma criança? Eu sou um monstro, não?

— Você poderia não ter tocado meus lábios – murmurei fervendo de ódio, mas ódio de mim mesma – Poderia não ter me enganado com sua inútil ingenuidade! Poderia não ter chegado perto de mim! Quem sabe... poderia ter me deixado morrer...

Não sei o que ele pensou nessa hora, com essas declarações. Será que foi até Marianna? Será que chorou? Será que apenas ficou confuso ou se remoeu pelo erro de me beijar?

Saí correndo de lá, sem alternativas, porque se eu chorasse, ele teria pena. Ele me beijaria, ele me iludiria mais.

De alguma forma, parei numa sala que eu nunca tinha ido. Estava à beira de um colapso, queria gritar e quebrar as coisas. Queria matar alguém, ver sua cabeça rolar. Porque minha cabeça girava tanto...

Nem percebi onde eu estava ou quem estava lá, até ouvir o piano.

— Quem está aí?! – indaguei irritada.

— Vossa Alteza?! O que faz aqui?! – ouvi um estrondo de voz, quase me apavorei com o tamanho ódio em seus olhos vermelho rubi.

Um homem que eu não conhecia, nunca havia visto em minha vida dentro ou fora do castelo. Estava sentado com uma roupa um pouco simplista demais pra alguém do País das Maravilhas, usava óculos e tinha uma careta feia no rosto pra mim. Com seus cabelos ruivos caindo sobre os olhos vermelhos.

— Quem é você? – me surpreendi tanto que cheguei a esquecer Will por um tempo.

— Vamos nos apresentar depois, espere eu terminar de tocar – ignorou ele.

Fiquei incrédula. Como ele fazia a temida Rainha esperar? Por que estava no meu castelo?! Por que estava simplesmente me ignorando?!

O encarei irritada sem dizer nada enquanto tocava a música, não era uma melodia ruim, mas eu queria dar um tapa na cara.

— Pronto, já acabei – paro despreocupado, aí eu dei o tapa – Ei! Mas o que é isso?!

Ele realmente ficou bravo. Comigo?! A temida Rainha louca por cabeças rolando?!

— Não faça essa cara! Eu sou a Rainha! – reclamei.

— E daí? O que vai fazer? Não pode sair batendo nos outros por isso, sua nanica! – isso  já me revoltou.

— Quem você pensa que é?! Cortem-lhe a...

— Corta essa! – sua voz realmente cortou a minha, até me assustou – Pensa que pode matar qualquer um que se opõe a você? É mesmo uma perdedora! Uma criança mimada e chorona!

— Mas o quê?! Quem é você? – questionei incrédula.

— Hah, eu sou o incrível, maravilhoso, cavalheiro, lindo, Antony! – pose de idiota, e dei-lhe um chute bem no meio.

Vem se fazer de idiota pra mim e o que acontece?

— Sua bastarda...

Paralisei, era o que o rei dizia. O REI! Mas eu não conseguia me mover.

— Meu irmão está incomodando? – um homem exatamente igual à Antony apareceu num sofá lendo um livro.

— Quê? Dois? – fiquei confusa.

— Ah, sempre pensam que somos gêmeos – resmungou Antony.

— Oi, eu sou o irmão mais novo dele. Meu nome é Julian – sorriu piscando pra mim docemente.

— Tem certeza que não são gêmeos? – me surpreendi pela semelhança, mas era verdade que Julian é um pouco mais baixo e fofo que Antony.

Depois de apresentações e blá blá blá que eu esqueci:

— Nós meio que moramos aqui agora – contou Julian tomando chá.

— Por quê? Este é meu castelo – falei.

— Ah, ele não quer trabalhar – xingou Antony – Esse bastardo!

De novo. Parece tanto com o rei.

— Ora, não sou seu irmão mais novo? Quem devia trabalhar é você – disse o outro.

— Onde vocês moravam antes? E há quanto tempo estão aqui? – perguntei curiosa – O que estão comendo?

— Ah, perdemos nossa família – contou Julian.

— Por sua causa! – o irmão se alterou me olhando com um horrível desprezo – Você os matou!

A aura ameaçadora e cheia de ódio me atingiu em cheio mesmo. Eu sou tão odiada por meus atos insanos.

— Acalme-se irmão – pediu Julian envergonhado – Vossa Alteza nem têm matado mais.

— Você não tem raiva Ju? Não tem raiva e ódio por ter perdido nossa vida por causa dela?! Você tocava tão bem... e agora não pode mais...

Não consegui falar nada diante daquilo, ao ver do que ele falava. Julian tinha uma das mãos toda enfaixada, a esquerda (necessário para tocar violino) não me deixou ver direito, apenas escondeu envergonhado. Eu fiz aquilo à ele.

— Mas eu até agradeço a rainha – me surpreendeu – Papai me machucava muito...

— Cale a boca! – ordenou Antony – Não fique revelando p passado pra essa bastarda!

Não aguentei ficar lá e me levantei pra ir embora.

— Estou indo, deixo vocês ficarem em meu castelo, não tem importância.

— Não iríamos sair mesmo que não permitisse! – respondeu Antony.

— Espera, Vossa Alteza! – Julia me segurou e sorriu se ajoelhando em minha frente – Eu te acho uma Rainha maravilhosa. Obrigado.

Não sabia o que dizer daquilo. Seria mentira? Ele tentava me comprar? Estava brincando? Como eu poderia ser uma maravilhosa rainha se matei sua família? Se o feri de forma que ele perdeu algo importante? Como?

Antony começou a reclamar e gritar como louco. Então corri novamente.

E mais um presente para a maravilhosa rainha: Will e Marianna sorriam, juntos num corredor vazio, tão vazio quanto meu coração. Eles se beijaram. Will nunca havia me beijado assim;

Mesmo assim, sou a maravilhosa rainha.

Não é?