— Bom dia, Vossa Alteza! – cumprimentou Julian com seu amável sorriso pela manhã, dando-me um susto. Como assim? O que ele fazia no meu quarto?!

— Ah! – realmente berrei de susto na cara dele, mas somente sorriu – O que faz aqui? Quem disse que pode entrar no meu quarto?!

— Desculpe, não quis assustá-la – pediu ele – Eu só queria... ah, esqueça.

— O que você queria? – fiquei curiosa.

— Nada.

— Diga logo, idiota! – ordenei solene e meio birrenta aliás – Não pode esconder nada da Rainha!

— Por que você estava chorando? – indagou me irritando.

— Isso não é da sua conta!

— Eu não queria perguntar, mas realmente estou preocupado – disse com um ridículo olhar de pena.

— Tsc – achei irritante – Saia daqui, seu irmão idiota não está bravo comigo? Por que você não me odeia também e some da minha frente?

É, eu sei, quando acordo sempre sou uma grossa irritada. Melhor não estar perto de mim quando acordo.

— Eu não odiaria uma rainha tão linda e maravilhosa como você – disse com um olha infantil e confuso – Eu adoro você, e não gosto de vê-la chorando.

Fiquei paralisada com essa maldita declaração que me confundiu tanto. Por que diz isso? Depois de ser um monstro pra ele e pra um monte de gente, ainda me diz?! Por que ele me confunde tanto?

— O que você está fazendo aqui, bastardo?! – Antony se apavorou ao vê-lo perto de mim e o puxou pelo pulso, com raiva parecia até uma criancinha, parecia até eu.

— Ai, isso dói! – choramingou Julian, era o pulso machucado – E eu só queria dar bom dia à Vossa Alteza.

— Ela não é nossa rainha! – berrou Antony cheio de ódio, mas também parecia apavorado com algo, esse medo... de mim? – Ela... seu bastardo!

Saiu correndo empurrando o irmão pra longe, assustado com alguma coisa que não entendo o que é. Será que têm medo de mim? Depois do que fiz à sua família, não duvido. Deve ter muito medo de perder o irmão e ficar sozinho... sozinho como eu.

Vi a triste e confusa expressão no rosto de Julian e minha garganta se fechou, esqueci como falar. Havia tanta dor ali. Como ele pode ainda sorrir pra uma rainha tirana como eu? Mesmo que eu separe esses irmãos? Mesmo que eu tenha destruído milhares de coisas? Eu não posso voltar atrás, sou incapaz até de pedir desculpas agora.

— Meu irmão não entende o quanto amo ele – murmurou Julian com um sorriso triste e longínquo – Ele não entende nem sequer a si mesmo. Mas eu o amo demais, e vou fazer de tudo pra que ele veja.

Então saiu andando vagarosamente pelo corredor iluminado de algum lugar que nem notei, não reconheci meu palácio. Estava tão confusa, especialmente quando vi Will carregando alguns materiais de limpeza todo atrapalhado, rindo com a empregada que tentava esconder sua alegria nojenta.

Ódio? Eu senti ódio?

Não.

Eu senti vontade de morrer, desde aquele momento que nasci e o rei disse que a “bastarda deve ser executada”. Assim eu não teria visto o quão horrível ele poderia ser, o quão horrível eu poderia ser, não teria amado, odiado, chorado, matado... Eu seria mais pura, não?

Digamos que o destino não seja muito fã da pureza? Se eu me matar a pureza irá voltar ou só se acumulará mais dor e eu vou pro Inferno? Isso é tão confuso.

Will percebeu que eu estava observando, com aquelas malditas lágrimas escorrendo por minha bochecha. Derrubou alguns baldes e parou repentinamente, fazendo-me encher de vergonha e me esconder numa sombra de raiva. O que ele queria? Rir? Pedir desculpa? Que pirralho inútil e idiota! Eu gostaria de não tê-lo conhecido.

Bem, isso é uma mentira.

O retardado se aproximou enquanto a empregada me olhava com uma espécie de cara feia, tranquei a porta de uma sala e fiquei lá.

— Scarlett – se aproximou da porta.

— É Rainha Scarlett! Idiota! – reclamei tentando parecer forte e solene, “ele é só um pirralho, não me afeta em nada”.

— Por que está chorando? – perguntou inocentemente, que irritante. Até parece que era ingênuo assim, um anjo. Ele sabia muito bem que me feria com seu amor pela empregada.

— Decidi uma coisa – falei imprudentemente, mas queria acabar logo com essa angústia, queria ser livre – Vá embora.

— O que?

— Você e ela – tentei explicar – Podem sair do meu palácio juntos.

— Ah, tá, o que você quer? – debochou confuso.

— Quero que você vá, e pare de me fazer chorar – respondi sincera.

Ele suspirou e disse:

— Você não é um monstro, sabe?

— Só porque te deixei ir com sua namorada? – cerrei os dentes.

— Não – negou – Você nunca foi, eu é que fui um egoísta.

— E eu então? – discordei – Por minha causa...

— Por sua causa estou vivo – completou me surpreendendo – Por sua causa tenho dinheiro e comida todos os dias, por sua causa conheci ela.

— Grande coisa – zombei.

— Pode parecer pouco, mas não é. Por sua causa tenho uma grande amiga.

Lágrimas corriam sem parar, me deixando mais confusa. Por que ele sempre faz isso?

— Eu não consigo – suspirei me encolhendo no chão.

— Não consegue o que? – quis saber.

— Não consigo te entender. O que sou pra você? O que você é pra mim? É como num jogo de xadrez, há tantas peças que nunca sei qual vai atacar, há tantos sentimentos que nunca sei se vai machucar, se são mesmo verdade.

— Me desculpe, sou um coelho, você é uma Rainha – ele nem sabia o que falar pra minha confusão, ele também parecia que não me entendia. Por que será? É tão confuso – Eu sou um animal, você é só uma garota. Não se compare com peças de um jogo, a vida não é questão de quem perde ou ganha, a questão é quem é você e quem são os outros. O tempo que você tem com aqueles que ama, acaba muito depressa, portanto esqueça dilemas e confusões. Eu estou aqui, permanecerei aqui.

Por que esse coelho é tão confuso e irritante? Por que me dá uma falsa esperança e a tira? Por que diz coisas estranhas através de uma porta? Por que vive preocupado com o tempo que temos e mesmo me odiando nunca me deixa?

Aquela empregada não o merecia.

Ele não merecia tanta coisa que o fiz passar.

Eu não merecia tê-lo conhecido.

Não entendo, só sei que aquele idiota não foi embora. Por quê?