Acertei a cabeça do estranho em cheio. A lâmina do facão enterrou-se bem no meio de sua testa, deixando o cabo do lado de fora. O estranho parou e arregalou os olhos, depois caiu de costas no chão. Levei dois segundos para correr até o quarto onde Babi ainda dormia. Acendi a luz, mas depois apaguei. Procurei o celular e acendi a lanterna. Peguei a maior mochila que consegui achar - a do Titio Avô - e corri para a cozinha. Joguei ali todos os biscoitos e miojos que tinham no armário num lado da mochila e facas no outro. Peguei também produtos de limpeza, produtos de dedetização e os dois isqueiros que estavam em cima da mesa e fechei a mochila. Voltei ao quarto e procurei no guarda-roupa calças e casacos. Separei-os para Babi e para mim. Fui até a cama dela.
—Babi. Babi, acorda.
Ela abriu os olhos, sonolenta.
—O que...?
—Babi veste isso aqui rápido!
—Mas...
—Meghan, anda logo! Não dá pra explicar.
Ela arregalou os olhos e abriu a boca para argumentar quando ouvi um barulho. Abri a mochila e peguei uma faca.
—Fica aqui e não se mova, ouviu bem?
Ela apenas assentiu.
Caminhei na ponta dos pés, silenciosa como um gato. A faca já estava erguida para o ataque. Me agachei e fui em direção a sala. Me encostei na parede e escorreguei olhando bem rapidamente para a sala. Uma figura alta e esguia estava com um facão na mão. Constatei que era o meu. Esses...negócios sabem lutar é?, pensei em dúvida. A figura tropeçou em algo, pois xingou baixinho. Vi a sombra da figura bem próxima da onde eu estava, então eu me preparei. Surgi na frente da figura e por sorte - muita sorte mesmo— a ponta da faca só encostou na sua testa quando o reconheci. Xinguei todos os palavrões que lembrei enquanto contemplava a face assustada do meu vizinho.
—Porra, Dante! Eu ia te matar seu sem noção!
Ele riu. Que grande babaca.
Deixa eu explicar. Dante é o meu vizinho. O mais completo babaca da face da Terra. Quando nos conhecemos, eu trazia as caixas da mudança para dentro do apartamento. Ele não me ajudou, pelo contrário, observou enquanto eu pegava as caixas e as levava para dentro de casa. Quando uma caixa caiu, ele riu. Você está rindo porque sabe fazer melhor?, foi a minha resposta. Então ele foi para casa. Nós tínhamos dez anos.
—Parece que a fracota sabe matar não é?-Ele disse e riu.
—Cala a boca.-Resmunguei e peguei o facão da mão dele.
Retornei ao meu quarto com Dante atrás. Babi suspirou de alívio ao nos ver. Ela realmente não se mexeu. As vezes esqueço de como Babi é obediente. Eu teria ido atrás, certeza absoluta.
—Presenciamos a mesma coisa Corrie?-Dante perguntou.
—Não sei. Alguém com a pele roxa, veias enormes e olhos negros invadiu a sua casa?
—Sim.
—Peraí o que?-Babi perguntou.
—Meghan, vista-se, e seja rápida. Você, vem comigo.
Dante sorriu sedutoramente. Fiz uma careta e peguei sua mão. Paramos em frente a sala.
—O que é isso Dante? Um apocalipse zumbi?
—Eu acho que sim.-Ele suspirou.-A sua mãe tá em casa?
—Não, ela saiu com as amigas pra fazer coisas de adulta. Se não voltou agora, não vai voltar tão cedo se for voltar.
—O que você vai fazer?
Olhei em seus olhos verdes e preocupados.
—Eu não sei.-Passei os dedos nos olhos.-Eu não quero a Babi em perigo. Eu preciso por a gente em segurança.
—Vamos fugir.
—Fugir, mas para onde?
Dante se inclinou sobre mim como se fosse falar um segredo.
—Eu ouvi na rádio sobre corrermos para um lugar com bastante gente.
—Eu não confio nessas rádios malucas que você ouve Dante.
—Eu sei, mas em mim, você confia?
—Não.-Suspirei e ele revirou os olhos.
—Corrie, você tem que confiar em mim. Nós queremos sobreviver. Eu me importo com vocês. Dez anos não são dez minutos. E você é boa com facas.
—Eu te odeio, você sabe disso não sabe?-Falei.
Dante sorriu.
—E eu te amo.-Revirei os olhos ele sorriu.-Vamos fracota. Vamos roubar um carro.