Amor Pleno escrita por Lola


Capítulo 4
Capítulo 4: Demônios




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"Aquele menino foi internado numa clínica, dizem que por falta de atenção dos amigos, das lembranças, dos sonhos que se configuram tristes e inertes, como uma ampulheta imóvel, não se mexe, não se move, não trabalha. E Clarisse está trancada no banheiro e faz marcas no seu corpo com seu pequeno canivete"

 

O castigo que James recebia por perturbar a paz dos pacientes, fora ter que se manter longe de Mia. Por Deus, eles não tinham uma sala de tortura? Tratamento de choque, ou qualquer coisa do tipo? Tinham que tirá-lo de perto da única coisa boa que já havia lhe acontecido em sua vida? Estavam apenas se divertindo juntos... por que isso era tão errado por ali? 

— Eu quero ver a Mia. - James dizia, socando a mesa de Amanda com uma força ameaçadora. A mulher apenas suspirou, retirando seus óculos e os colocando em cima da mesa, enquanto se levantava. 

— James, eu já te expliquei que a Srta. Saltzman está no isolamento. Ela quebrou uma das regras e você sabe o que acontece...

— Estávamos só nos divertindo. Qual o problema de vocês? - Ele não fazia por querer, mas acabou acertando com a mão, um vaso que estava em cima da mesa, fazendo-o se espatifar no chão. - Por que estão fazendo isso comigo?

— Não é sobre você, James. - Amanda tentou controla-lo, já prevendo que ele teria mais uma crise. - Você precisa se acalmar. 

— Eu não quero me acalmar. Eu quero a Mia, quero ela agora. - Gritou, socando novamente a mesa. 

Amanda já o havia visto descontrolado uma vez, em seu primeiro dia naquele lugar, sabia sobre o temperamento instável do rapaz, sobre as dificuldades que tinha para controlar a si mesmo e sobre o perigo que ele era para as pessoas, quando agia daquela maneira. 

— James, se não se acalmar, eu vou ser obrigada a sedá-lo. - Ela disse, mas o garoto não parecia escuta-la, já que se ocupava quebrando tudo o que encontrava em sua frente, machucando a si mesmo. 

Os gritos de James eram ouvidos por todo o hospital, naquele momento, seguranças e enfermeiros corriam para a sala de Amanda, assustados e confusos, afinal, nunca haviam presenciado barulho semelhante, digno de um filme de terror, como se aquele garoto estivesse exposto ao pior tipo de tortura, como se a dor fosse um alívio perto do que estava passando. 

Ele já não enxergava mais nada, além da escuridão. Sua mente estava bagunçada e repleta de vozes conhecidas que ele não conseguia reconhecer, estava perdido em sua mente, se afundando dentro de si mesmo. 

— O que está acontecendo? - Era a voz da doutora Quinn, que acabava de entrar na sala. - Amanda...

— Levem ele para a sala acolchoada. - A mulher ordenou, quando dois seguranças foram para cima dele. 

Doutora Quinn olhou horrorizada o momento em que o garoto partiu para cima de um dos seguranças, depositando vários socos contra seu rosto, enquanto o outro tentava acalmá-lo. Sabia sobre os problemas dele, mas nunca havia presenciado aquilo, nunca o tinha visto em um acesso de raiva e, pelo seu estado, repleto de fúria, era pior do que ela pensava. O garoto só parou de atacar o outro homem, quando um dos enfermeiros injetou um sedativo nele. No minuto seguinte, James estava jogado no chão, olhando para ela com olhos marejados... ela via as cicatrizes através daqueles olhos azuis tão doces e gentis, e foi a última coisa que ela viu, antes deles se fecharem. 





Agonia era o que Mia sentia, a cada segundo que passava dentro daquele cubículo branco, longe de qualquer contato humano além dos enfermeiros que iam alimentá-la. Não sabia se havia contado bem, mas já fazia, pelo menos, dois dias que estava trancada ali. Pela primeira vez na vida sentiu falta do sol e de alguém. Acabava de se dar conta do quanto as perguntas incessantes e extremamente irritantes de James lhe faziam falta.

Suspirou, se levantando da cama -que era o único móvel naquele lugar- e ficando de frente para uma das paredes. Geralmente se imaginava olhando para os recortes e pôsteres de bandas e filmes colados na parede de seu quarto, em sua casa, mas naquele momento estava pensando na cela aonde ela dormia a noite, antes de jogarem-na naquele buraco. Deveria ter a pintura de um sol azul naquela parede, ao lado das pinturas que havia feito dos olhos dele, e do rosto dele. 

— Ahh, pudinzinho... - Suspirou, passando a mão na parede branca e lisa, sentindo um grande vazio ao se dar conta de que preferia estar com James, em qualquer lugar do mundo, ao invés de estar ali. Não simplesmente, em qualquer lugar, mas em qualquer lugar com ele. 

Olhou para os braços descobertos, sem suas luvas as cicatrizes ficavam tão visíveis quanto qualquer parte de seu corpo. Ela simplesmente odiava aquelas marcas nela, simplesmente odiava ter que olhar para elas e odiava mais ainda o fato de estar trancada ali, sem suas luvas, sem suas tintas e sem James. 

Estava usando aquelas roupas ridiculamente brancas, aquilo à irritava de tal maneira, que a fazia querer quebrar todos os ossos de seu corpo tentando quebrar aquelas paredes, queria sair dali, queria suas roupas e queria estar nos braços da única coisa boa que lhe havia acontecido... Nos braços daquele garoto repleto de perguntas e com todas as respostas, certas e erradas, de tudo o que ela nunca soube entender.




Os ruídos começavam a surgir em sua mente, logo se transformando em sons de passos e conversação e, em seguida, na voz da doutora Quinn. 

James?— Ele abriu os olhos, lentamente, incomodado com a luz forte daquele lugar. Olhou ao seu redor, reconhecendo aquela sala... Já havia estado ali, mas nunca estivera com as mãos presas. - Querido, você sabe quem sou eu? 

Desviou os olhos das mãos presas, para a mulher a sua frente, reconhecendo os óculos meia lua e o cabelo loiro preso em um rabo de cavalo. 

— Doutora Quinn. - Ele disse, a voz rouca e fraca por conta da garganta seca. Tossiu, sentindo uma dor desconfortável. - Eu estou com sede.

— São os efeitos do sedativo. - Ela disse, sem quebrar o contato visual com ele. - James, você sabe por que está aqui? 

Ele olhou para ela, sua visão ainda turva, sentia-se mole. Tentou lembrar-se dos últimos acontecimentos, mas a única coisa que vinha a sua mente era ele abrindo a porta da sala de Amanda, perguntando por Mia. 

— Você sabe? - Ele perguntou, os olhos fixos nos dela. - O que eu fiz? 

— Você teve um acesso de raiva... Acabou se tornando um perigo para as pessoas. - Ela pôde ver o garoto erguer uma sobrancelha, inclinando um pouco a cabeça para o lado. 

— Eu machuquei alguém? - Ela viu a sombra de um sorriso no rosto dele, os olhos sombrios. - Eu fiz alguém sangrar? 

— Você bateu em dos seguranças. - Ela disse, interrompendo as perguntas do garoto. - Como se sente em relação a isso? 

— Queria que fosse você. Quero fazer isso com você assim que sair daqui. - Ele disse, o sorriso surgindo no canto dos lábios, quando viu a médica olhá-lo assustada. - Não se preocupe, doutora. Eu não vou te matar, eu só vou te machucar... Muito. 

Um som mais aterrorizante do que os gritos de James, era a sua risada. Alta e sonora, aumentando a medida que via o rosto quase apavorado da doutora, debatendo-se contra as amarras, rindo insanamente. 

Demorou um bom tempo, até que ele finalmente parou. Doutora Quinni se mantinha sentada, com uma perna cruzada por cima da outra, observando-o e anotando cada comportamento. Após o que lhe pareceram eternos minutos, o garoto parecia sair de um transe, os olhos azuis voltando a sua habitual doçura e inocência.

— Preciso vê-la... - Ele sussurrou, como se fosse uma súplica. - Preciso ver a Mia. 

A médica o encarou com firmeza, tentando decifrar aquele olhar sofrido e melancólico, entendo que era ela, a garota de cabelos azuis, o que mantinha a sanidade de James. Finalmente entendeu o que ele havia ido fazer na sala de Amanda e o que o havia levado à um surto tão profundo e psicótico. 

Ela se levantou, afastando-se do garoto e indo até a porta. Soltou um longo suspiro, antes de finalmente dizer;

— Não se atrase para a terapia em grupo. Você e a srta. Saltzman tem muito o que falar. 

Ele respirou fundo, encostando a cabeça na parede acolchoada, dando um pequeno sorriso quando, depois de alguns segundos, dois guardas entraram para soltá-lo e levá-lo dali. Finalmente, ele iria ver a única cor de sua vida. 


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Notas finais do capítulo

*u*



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