Caçadora da Meia-Noite escrita por Ginger Bones


Capítulo 27
Capitulo 27


Notas iniciais do capítulo

E a historia já ta quase no capítulo 30! ♥



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–Isso ainda não acabou.-aviso Adam. Ele assente concordando.
–Nós ainda temos muito para conversar.-completo.
Liev continua ao lado da minha mãe, as duas conversam próximas uma da outra e eu não posso escuta-las daqui. Minha mãe diz algo a ela com um meio sorriso e então aponta em nossa direção. Minha irmã se vira na mesma hora e sua expressão é de total surpresa quando me reconhece.
Vejo uma lágrima escorrer de seus olhos e então ela corre em minha direção, apertando-me em um abraço forte demais. É bom saber que nisso ela continua a mesma.

–Você voltou de verdade?-ela pergunta em uma voz embargada. Ela se afasta apenas o suficiente para conversarmos normalmente. Algumas lágrimas escorrem dos seus olhos claros.

–Sim, mas é por pouco tempo-respondo-lhe.-Estou em missão, não posso me demorar muito.

Olho rapidamente para Adam, espero que ele entenda meus motivos para mentir. Pelo menos, ele continua em silêncio. Vou interpretar isso como um bom sinal.

–Que tipo de missão?-Liev questiona.

–Desculpa, Liev, não posso de responder isso.-falo pondo uma das mechas brancas de seu cabelo por trás da orelha. Faz tanto tempo que parti que não imaginei que minha irmã mais nova fosse lembrar de mim. Afinal, ela só tinha 6 anos. Acho que o fato de sua memória ser tão boa pode ser tanto um dom quanto uma maldição, e ainda não decide se isso é um bom sinal. Ela já tem muito das minhas características. De alguma forma, a licantropia também a afetou. Por isso sinto por ela.

–Liev, antes que eu me esqueça...-começo a dizer e aponto para Adam sentado ao meu lado.-Esse é Adam, meu parceiro e melhor amigo.

Ele se levanta e se aproxima dela, estendendo-lhe a mão. Com os dois frente a frente, consigo perceber a diferença gritante entre eles, o quanto Liev ainda parece uma criança aos olhos de quem não a conhece.

–É um prazer conhecê-la, Liev.-ele diz em tom cordial. Formal demais, Adam, penso.-Sou Caçador também, se é o que quer saber.

Ela me olha com uma expressão de curiosidade no rosto, uma pergunta muda que eu entendo bem demais. Quando seu olhar volta para Adam, ela se aproxima ainda mais dele e o abraça. A surpresa no rosto dele me diz que ele não esperava que eu tivesse uma família tão fã de contato físico, eu o entendo. Sempre fui bem mais fechada do que todos eles.

–Se você é amigo de minha irmã, então também é meu amigo.-ela diz.

Ela se afasta dele sorridente e puxa um dos meus pulsos para que eu levante. Não sei o que ela quer, então apenas permito que ela me leve até a mesa.

–Por favor, Saphira, se senta.-ela me pede.-Temos dez anos de histórias para botar em dia. Tenho tanta coisa para te contar.

–E tem mesmo.-minha mãe nos interrompe.-As coisas não foram as mesmas depois que você entrou para a Caçada e se mudou para Londres.

–Mudaram para o bem ou mal?-pergunto a ela.

Antes que minha mãe possa responder, Adam interrompe-nos com uma expressão culpada. Ele não faz o tipo de quem tenha o costume de intrometer-se nas conversas dos outros. Pelo contrário, ele sempre foi muito educado.

–Detesto ter que interrompê-los, mas creio que não podemos perder mais tempo.-ele tenta se explicar.-Digo, não que vocês sejam perda de tempo. Longe disso. Mas ainda temos um caminho longo para percorrer e acho que não vale a pena correr o risco de não cumprirmos os prazos certos. Você entende o que quero dizer, certo Saphira?

Faço menção de respondê-lo, mas minha mãe se interpõe e não me permite ter a chance de falar antes dela.

–Compreendemos sua preocupação, Adam.-Ela diz em um tom um tanto condescendente. Sua forma de falar na primeira pessoa do plural me lembra daqueles casais jovens apaixonados que falam sempre "nós" como se fossem uma pessoa só, no entanto, não quero discutir com ela.-O trabalho de vocês tem regras como qualquer outro, mas pelo menos fiquem para o jantar. Vocês podem viajar amanhã cedo.

Nenhum de nós encontrou algo bom o suficiente para que a convencesse do contrário.

Conforme a tarde se arrastava, tediosa e estranhamente quente e ensolarado para para um dia de inverno, as coisas foram voltando a um padrão. O padrão dos Cartwright, pelo menos. Minha irmã adentrou a casa para arrumar seu quarto recém-adquirido e eu levei Adam até a oficina do meu pai a fim de apresentá-lo ao resto da família. Meu irmão mais velho, Maksim, foi o único que ficou com a família com exceção de Liev e agora passa o dia com o nosso pai nas fornalhas da sua oficina, aprendendo o oficio. Metal sempre foi o negócio da família e meu pai ficou feliz em ter a chance de ensinar o trabalho a um de seus filhos, como ela mesma tinha dito ao me atualizar das informações mais básicas. Com Belka casada e com Misha em serviço militar, a casa havia esvaziado muito nos último anos. Ao apresentar Adam como meu parceiro ao meu pai, ele apenas apertou suas mãos e o cumprimentou com algumas poucas palavras e um sorriso discreto escapando-lhe do rosto, o que não é o feitio do pai que eu tinha aprendido a notar. Talvez as coisas tenham mudado mais do que eu pensava. Por outro lado, Misha o olhou com uma expressão de desprezo e não se deu ao trabalho de largar seu trabalho nas fornalhas para olhar para Adam por mais do que alguns segundos.

–Quando você pretendia nos contar que tinha um amente, maninha? Você não escreveu isso em suas cartas.-ele comentou com certo desdém enquanto alimentava a boca da fornalha com algumas toras recém cortadas.-Ah, espera. Você não mandou nenhuma.

–Maksim Cartwright!-meu pai o advertiu.-Nunca mais volte a repetir isso.

–Tudo bem, pai.-eu digo.-Não costumo dar ouvidos a idiotas.

Maksim nem sequer nos olhou enquanto meu pai olhava Adam envergonhado tentando se explicar, mas nós já estávamos saindo da oficina.

–Me desculpe pelo meu irmão.-eu o digo quando já estamos do lado de fora.-Ele nunca foi do tipo que consegue segurar a língua, não desde que me lembro.

–Tudo bem.-ele me tranquiliza.-Na verdade, acho que eu deveria voltar lá. Ajuda-los no trabalho. Já vou comer e beber da comida da sua mãe de graça, não me sinto bem se não fizer nada para retribuir. Eles com certeza tem muito trabalho e acho que não é algo tão difícil que eu não possa entender.

–Adam, isso é ridículo!-eu suspiro diante de seus princípios. Ele é bom demais para a Caçada, de qualquer forma.-Você não tem que fazer isso...

–Eu sei.-ele sorri.-Mas eu quero. Você devia voltar, vá conversar com sua mãe ou tente descobrir para onde vamos depois que sairmos daqui. Nos encontramos no jantar.

–Adam...

–Não, sério.-ele insiste.-Vá.

Eu assinto me dando por vencida, afinal. Eu devia uma conversa com Liev mesmo.

Nós duas ficamos conversando amenidades por muito tempo, trocando histórias de nosso passado desde que parti coma Caçada, tanto tempo atrás. Não conversarmos sobre nada que pudesse nos tirar nossos sorrisos enquanto nossa mãe estava por perto. Não conversamos sobre o treinamento pesado da Caçada, não conversamos pela pressão por que os recrutas passam assim que chegam lá, não conversamos sobre sua própria pressão para casar e ter filhos como Belka tinha feito há não muito tempo, não conversamos sobre minha partida e principalmente, não conversamos sobre minha licantropia e sua estranha força sobre-humana que tornavam-na ainda mais peculiar, mais peculiar do que apenas o fato de que minha irmã mais nova era albina.

No entanto, quando minha mãe sai da cozinha para dar comida aos animais e escolher a galinha certa para preparar para o jantar, permito que Liev desvie o assunto para o que nós duas queríamos conversar, mas tínhamos receio demais para perguntar. Eu lhe expliquei que eu era, sim, lobisomem, mas que já sabia controlar totalmente as transformações para que respondessem às minhas necessidades e ela me contou que sua força também aumentou de maneira considerável nos últimos anos, que quebrar as coisas agora era corriqueiro. Liev sempre fora muito forte para idade, mas com o passar do tempo, a força se tornou algo tão sobrenatural que não pudesse ser explicado com nada além de magia ou algum dom. Muitas pessoas diziam que era uma maldição, mas eu sabia que era algum tipo de efeito causado pelo gene da licantropia desativado no sangue da família. Eu mesma não sabia sobre a linhagem lobisomem da minha família até me transformar e me ver obrigada a descobrir como isso tinha acontecido. Depois, o assunto passou muito drasticamente para os temores da minha irmã com o futuro. Como eu, ela queria liberdade, queria poder escolher seu próprio futuro, como eu tecnicamente tive. Ela não passou pela seleção de recrutas quando os Caçadores vieram e nunca teve a oportunidade para ir embora, não como eu tive. Mal sabe ela que eu não escolhi me juntar a Caçada já que camponeses não tem esse direito, que eu experimentei o que ela chama de liberdade e é pior do que ela espera.

–Saphira, minha irmã, você precisa entender.-ela repetiu a mesma frase pela sétima vez desde que comecei a contar.-Eu não quero, não posso continuar aqui! Isso é o fim do mundo. Tudo que temos é a oficina do papai e aquela cidade minúscula do Duque há alguns quilômetros daqui. E mamãe já está procurando um marido para mim! Ela já me botou nas aulas da velha, você sabe. Eu não quero me casar com um homem que provavelmente só vou conhecer a caminho do altar. Não quero acabar em alguma fazenda como essa, cercada de crianças e deveres ridículos. Quero poder escolher, Saphira, como você.

–Liev, eu não tive escolha. Eu também fui forçada a abrir mãos das coisas que eu amava.-eu disse tentando fazê-la me entender.-Eu fui selecionada, os patrulheiros vieram até aqui me buscar, eu tentei fugir e olha como acabou! Não há como fugir do destino. Tive tanta escolha quanto você teve. Não pense que mamãe não quer seu bem, ela quer. Só que seu conceito de felicidade é diferente do dela.

–Mamãe diz que nós fazemos nosso próprio destino.-ela retruca.

–E fazemos, mas ela quer dizer que devemos fazer nosso destino sem implicar a possibilidade de uma fuga da própria casa no process.-eu falo.-Você é a caçula, ela jamais vai deixar você se afastar demais. Quer você queira ou não, ela vai tentar fazer com que você siga seus passos já que eu não segui.

–Pra você é fácil falar, não mora mais aqui!-ela exclama.-Não mora há muito tempo, aliás. Já se passaram 10 anos, eu não sou mais uma criança, devia ter o direito de decidir o que fazer da minha própria vida, não acha?

–Eu sei, eu sei...-murmuro.-Mas você não vai conseguir isso aqui.

–Então me leve com você.-Liev pede.

–Eu não posso.-respondo.-Você não entende? Eu não posso te levar, não sou a mamãe, não posso decidir nada. E você é menor de idade!

–Que se dane minha idade!-ela reclama exaltada. Com um empurrão, afasta a cadeira da mesa e se levanta furiosa.-A vida é minha, eu decido! Se você não vai me ajudar, eu mesma terei que resolver o problema. Sozinha.

–Liev.-exclamo quando ela caminha até a porta praticamente tremendo de raiva.-Liev Cartwright! Me escuta.

Tento puxa-la pelos pulsos, mas ela me afasta com um empurrão firme. Sua froça me assusta e me desequilibra por alguns segundos.

–Me deixa em paz.-ela grita e fecha a porta com força às suas costas.

–Porra!-exclamo irritada. Pego a primeira coisa que vejo, uma das porcelanas da minha mãe e impulsivamente atiro o frágil animal contra a parede. No mesmo momento, a porcelana delicada se parte e milhões de estilhaços se espalham no chão a partir do ponto em que atingiram a parede.

–Jesus!-minha mãe exclama ao ver a cena diante de si. A porta está escancarada e uma galinha gorda pende inerte em uma de suas mãos finas, mas parece que ela não se importa, a julgar pelo choque em seu rosto.-O que aconteceu aqui?

Eu continuo a observando, no momento não me preocupo com a bagunça, eu vou arrumar tudo mais tarde e pagar pela porcelana, é claro. Tudo em que consigo pensar em minha conversa com Liev, na forma como ela agiu quando disse que não podia permitir que ela fosse embora como eu fui. Meus pais não merecem perder todos os filhos para o mundo. Eu gostaria de saber para onde ela foi, gostaria de saber que ela não vai fazer nada de errado. Mas infelizmente, ela está certa, estive fora por tempo demais. Eu não sei mais quem ela é. Não sei mais quem são as pessoas da minha família.

Levo alguns segundos para acalmar minha respiração, tentando manter todo meu autocontrole, ou o que resta dele. No entanto, meu coração continua acerelado como se tivesse corrido 20 quilômetros adiante e voltado. Quando falo com a minha mãe, sou expressão ainda é de total confusão parada na porta de casa.

–Nada. Não aconteceu nada.-digo.


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