Sam gritou e Rick também, mas foi Chase quem agarrou o braço de Linn e afastou a arma de sua cabeça, o tiro acertando a esquerda de Sam e quase a atingindo.

A garota não percebeu, apenas pensava em Linn, no quanto ela estava abalada para tentar algo assim, quando Sam sabia que ela podia ser forte o bastante para suportar muito, principalmente no mundo atual.

Chase arrancou a arma de sua mão e entregou a Rick, depois abraçou Linn e a ergueu levando para dentro do veículo, com Sam se levantando e olhando para os dois, ainda ofegante pelo susto.

“Você está bem?” Rick perguntou tocando seu ombro.

“O quê?” Ela questionou sem entender.

“O tiro quase acertou você.” Ele disse um pouco pálido, por ela e por Linn.

“Não percebi.” Sam olhou para o lugar onde estava no chão, ainda desorientada. Ver Linn tão indefesa e desesperada a abalava como  poucas coisas. “Não acredito que ela fez isso.” Sam murmurou observando como Linn escondia o rosto no ombro de Chase e chorava.

Chase parecia assombrado e Sam sabia por que. Ele se aproximara de uma jovem chamada Kelly no começo de tudo aquilo. A garota também tinha sido abusada e acabou por se suicidar. Talvez por isso, ele tenha compreendido quais as intenções de Linn antes que todos.

Glenn ofereceu seu lugar a Sam no veículo e esta o agradeceu por aquele pequeno gesto, ainda mais quando sabia que ele teria que viajar com o tal Merle.

A viagem durou pouco, depois de todo o drama, mesmo que para seus ocupantes o tempo custasse a passar.

Chegaram a prisão com as faces contritas o bastante para que Hershel e os demais não fizessem muitas perguntas.

“Rick.” O ancião chamou.

O xerife queria seguir com Linn, saber que ela estava bem acomodada, mas recuou e se aproximou do velho fazendeiro.

“Todos bem?” Preocupou-se.

“Sim.” Hershel deu um sorriso. “Judith está mais forte e Lori conseguiu se levantar e dar uma volta pelo bloco.” Houve um instante de hesitação, e muito de constrangimento no amigo, para que Rick notasse que algo não ia bem.

“Mas?” Rick olhou para a entrada do bloco de celas.

“Temos novos convidados.” Hershel começou a explicar.

Alguns minutos depois Rick entrou e conheceu as pessoas que Carl tinha salvo de errantes na área administrativa.

“Sr. Grimes.” Um gigante negro se aproximou.

“Não podemos conversar agora.” Rick disse após descer a escada e encarar os quatro novos personagens.

“Tudo há seu tempo.” O homem concordou.

“Tyrese, não?” Rick quis confirmar.

“Sim.”

“Vocês podem ficar por aqui agora, mas precisaremos conversar com calma sobre se poderão continuar ou não.” Rick disse e se afastou.

“Charmoso ele, não é?” Sasha murmurou para o irmão.

“Não brinque.” Ty olhou para os rostos tensos de todos os que tinham entrado. “Algo muito ruim aconteceu com aquela ruiva, ou você não notou?”

“Algo ruim acontece o tempo todo, com todos nós.” Sasha respondeu voltando a sentar e continuando a comer.

Rick ficou feliz em rever todos ao passar pelas celas. Aproveitou e deu um beijo carinhoso em Carl e Judith, um acenar de cabeça para Lori, até se aproximar dos aposentos de Linn.

Esperava encontrá-la encolhida na cama, mas apenas Sam estava lá, andando de um lado para o outro, colocando alguns objetos em uma sacola de ferramentas, no que Rick pode notar um arpão e uma faca. Limpando o quarto de qualquer objeto cortante ou afiado.

“Ela está tomando um banho.” Sam apenas disse, como se não precisasse perguntar.

A garota parecia ler e compreendê-lo além das palavras. De todas as coisas que lhe atraía nela, essa era uma das mais marcantes.

“Precisamos mantê-la sempre acompanhada por enquanto.” Rick falou entrando e tomando a sacola de ferramentas das mãos dela.

“Ela não vai tentar novamente.” Sam parecia convencida disso, apesar de não estar disposta a arriscar, mas Rick não tinha o mesmo pensamento.

Com as mãos livres ela arrancou as cobertas da cama e forrou com uma nova. Fez o mesmo com o travesseiro e recuou passando a mão no cabelo, afastando para trás da orelha algumas mechas soltas do rabo de cavalo.

“Quero ele morto, xerife.” Sam disse após um longo silêncio. Olhou para ele e continuou:  “Gostaria de matá-lo eu mesma se pudesse, mas me basta que alguém o faça.”

Não precisava que ela lhe dissesse que se referia ao Governador. Rick também queria o homem morto, não apenas pelo que fizera a Linn, como igualmente por sabê-lo uma ameaça a todas as pessoas que amava.

Notando seu rosto tomado pelo ódio, Rick se deu conta de que havia muito de selvageria em Sam, algo que só pode realmente compreender ao vê-la atacando Merle. Com aquele seu exterior calmo, reservado além da razão, ela escondia um temperamento muito mais violento e apaixonado que qualquer pessoa que a conhecesse poderia supor.

“Vou pedir a Hershel que venha dar uma olhada em Linn e em você, ok?”

Sam acenou que sim e sentou na cama, ainda desolada com todos os acontecimentos. Rick hesitou, mas saiu, precisava lidar com os recém-chegados.

Os novos convidados eram compostos por um par de irmãos, Tyrese e Sasha, além de Allen e Ben, pai e filho.

Rick não gostou muito do tal Allen, mas Tyrese fez um baita discurso, com tamanha sinceridade, sobre estar disposto a trabalhar para ajudá-los, bem como lutar contra o grupo que os tinha atacado, que Rick ficou tentado a lhes dar uma oportunidade.

“Vocês podem utilizar o Bloco D, por enquanto.” Falou e notou Axel se remexer incomodado.

O xerife sabia que o ex prisioneiro e Sam tinham limpado o local com intenções de mudarem para lá, mas não havia tempo de discutir o assunto com a garota e não permitiria que aqueles quatro ficassem no mesmo espaço que seus filhos e amigos.

“Não vai se arrepender senhor.” Tyrese sorriu aliviado, estendendo a mão que Rick apertou.

“Rick, me chame Rick.” Apontou para todos. “Terá chance de conhecer os demais com o tempo.” Fez um sinal para o prisioneiro. “Axel vai levar vocês lá.”

“Obrigado.” Tyrese e seu grupo acompanharam Axel e Rick se voltou para Daryl. “Precisamos melhorar as defesas desse lugar.”

“Carol e Axel cuidaram de colocar proteções na passarela.” Daryl informou. “Seri um bom lugar para colocar um vigia.”

“Precisamos cobrir outros pontos, não sabemos quanto tempo ainda temos até que eles nos encontrem.” Rick alertou.

“Estamos longe quase três horas de viagem de Woodbury, ainda temos muito tempo.” Merle se envolveu na conversa, o que fez Rick dar um esgar de desgosto e olhar para Daryl.

“Acho melhor você ficar no Bloco D com os novos.” Daryl chamou o irmão.

Hershel se aproximou e sentou cobrindo o rosto com as mãos.

“Como eles estão?” Rick perguntou.

“Glenn tem uma costela trincada, mas não vai precisar de pontos.” Balançou a cabeça. “O problema de Linn é mais grave, por que não é físico apenas.”

“Sam contou tudo o que aconteceu? Na estrada também?” Rick questionou.

Hershel acenou que sim.

“Triste. Ela está tão abalada que temo que tente novamente.” Hershel pensou em Beth, e em todo o seu medo durante aqueles meses na estrada, de que a filha fizesse uma nova tentativa também.

“Vamos cuidar dela.” Rick foi enfático.

“Esse Merle... Confia nele?” Hershel questionou pensando nas filhas.

“Nenhum pouco.” Rick respondeu. “Mas tenho certeza que Daryl vai ficar de olho no irmão.”

“Não acho que ela vá fazer nada que coloque o irmão em perigo.” Hershel pensou alto. Olhou para Rick e notou seu ar cansado. “Deveria deitar um pouco.”

“Vou dar a volta pelo local, avaliar o que podemos fazer para mantê-lo mais seguro.” Explicou.

“Deveria falar com Lori antes.” Hershel lembrou.

“Depois.” Rick não sentia disposição de conversar com a esposa.

Em verdade, cada vez mais estava ciente de que sua relação não passaria disso. Dessa constante ausência de amor ou preocupação de um homem por sua mulher. Algo quebrara no casamento deles e, por mais que se esforçasse, não encontrava um jeito de unir os pedaços e tentar fazer dar certo.

Em seu coração havia muito mais preocupação por Linn que por Lori, se fosse comparar o seu nível de ansiedade pelas duas mulheres. E havia Sam, e tudo o que estava sentindo por ela, ainda que não pudesse deixar nada daquilo crescer.

Saiu para cuidar de verificar as cercas, seguido por Hershel, ainda pensando como tudo de ruim vinha em três ondas, e em como as mulheres que seu coração se dividia em amar, mesmo que não se desse conta disso, acabavam levando a maior carga desses golpes.

Primeiro: Sam se machucara. Depois: a esposa quase morrera. Agora: Linn sofrera aquela brutalidade. Os demais padeceram com os perigos, mas fixava a maior dose de sofrimento nas três mulheres, como se amar qualquer uma delas as colocasse em perigo.

Deu a volta nas cercas e conferiu que tudo estava em ordem. Havia alguns errantes do outro lado, mas ainda eram poucos. Hershel se afastou verificando o outro lado e acenou que tudo estava bem.

Rick imaginou que deveria sair e conferir o lado administrativo. Analisar o estrago na cerca e no muro daquele lado para evitar que mais errantes invadissem as galerias.

Parado olhou para a prisão, imaginando que defesas implantar. Viu Daryl e Merle na passarela e não pode deixar de pensar que trazer o Dixon mais velho para o seio de sua família era procurar problemas, mas Daryl valia dez Merles e não podiam perder um amigo.

Suspirou quando viu Lori, Axel, Carol e Carl surgirem no pátio. A esposa carregava o bebê e parecia muito firme sobre as pernas. Recuperava-se muito bem nos últimos dois dias e estava fora de perigo.

Ela lhe sorriu, mas Rick não sorriu de volta. Prometera que iria tentar, mas sabia que não conseguiria. Ela não merecia o pouco que podia lhe dar e ele também não podia ser infeliz pelo resto de sua vida. Mesmo assim, ergueu a mão e retornou o aceno que ela lhe deu.

Não registrou o som do tiro, mas percebeu, como em câmera lenta, quando Axel se afastou para falar algo com Carol e Lori, que estava logo ao lado deste, girou o rosto e caiu.

“Lori!” Gritou.

Começou a correr, sendo detido por mais disparos, no que só teve tempo de se jogar no chão, um pouco distante da cerca, onde o mato estava alto. Hershel teve a mesma ideia.

Sacou seu rifle de assalto e revidou o ataque. Tudo não durando mais que alguns minutos, até um veículo invadir o campo e soltar uma leva de errantes.

Rick sabia que não era um ataque completo. Tinha visto apenas um veículo do lado de fora e alguns poucos atiradores não dariam conta de tomar o lugar. Aquilo era uma prévia, uma amostra do que estava por vir.

Sua mente estava a mil, não só por estarem sendo atacados ou por que vira Lori cair e não sabia a extensão de seus ferimentos, ou os de sua filha que ela carregava, cujo choro era possível ouvir mesmo com todo o barulho, mas sim por que não entendia como o maldito Governador conseguira encontrá-los em menos de um dia.

Os tiros cessaram e Rick viu o carro se afastar.

“Rick!” Hershel chamou sacando a automática e derrubando um e outro errante.

Levantou-se no mesmo instante em que Michonne corria acertando os errantes com sua espada, se aproximando de Hershel e procurando ajudá-lo a ficar de pé.

“Você está bem?” Perguntou a Hershel.

“Machuquei a perna.” Ele respondeu.

“Eu levo ele, limpa o caminho.” Rick ordenou a Michonne.

Mais errantes se aproximavam pela entrada principal, onde os portões tinham sido abertos pelo veículo atacante. Daryl, Merle, Sam e Tyrese se acercaram deles e começaram a abater os errantes para abrirem caminho até o pátio.

“Desgraçado.” Sam exclamou olhando para um errante.

Rick reconheceu Thomás. Estava sem o macacão da prisão e tinha um curativo pendendo do braço e do ombro. Avançou em Sam e esta fez questão de acertá-lo com o facão, em um golpe tão preciso, que arrancou metade se sua cabeça.

Rick soube então como eles tinham descoberto o local.

Entregando Hershel aos cuidados de outros se aproximou de Carl que deitado sobre a mão chorava desconsolado. Rick se ajoelhou ao lado dele e o abraçou, sem conseguir conter as lágrimas. Lori tinha levado um tiro na testa.

“Pai.” O menino se encolheu contra o peito de Rick.

“Judith?” O xerife sussurrou.

Olhou ao redor e viu que Beth se aproximava com a menina. Seu bebê ainda chorava. Rick fechou os olhos e também chorou, não por si, mas pelas suas crianças.