Sabiam que no momento que chegassem em terra firme, os caminhos de cada um se separariam. Mesmo que fosse para que pudessem ter a atenção necessitada de um hospital, alguns desesperadamente precisando mais que outros, e o que eles não sabiam era se a comunicação entre o grupo continuaria a mesma depois disso, nem ao menos se queriam. Confianças foram quebradas, feridas haviam sido deixadas sem nenhuma chance de voltar atrás e consertá-las. Mas haviam duas duplas em questão que não queriam se separar ao todo mesmo quando escutaram que tinham que descer. Chris e Josh, Matt e Jessica. 

Para Emily só faltava a vontade de querer morrer quando ouviu que a próxima parada não era exatamente um hospital, e sim um interrogatório com a polícia que os resgatou. O que ela iria falar? O meu namorado me deixou para morrer e depois o meu ex apontou uma arma na minha cabeça? Ah, não. Eles não estariam livres da mão dela. Definitivamente falaria isso. E provavelmente os mencionados sabiam disso também. 

A vontade de falar era o que mais faltava no grupo. Mas precisavam avisar a alguém sobre os monstros, sobre.. Os Wendigos. Agora parando pra pensar nisso, realmente precisavam? Não é como se um dia voltariam para a montanha e fazer um passeio por lá, pra dar um oi pro mesmo lugar onde suas vidas foram arruinadas completamente! E como acreditariam neles também? Bom, qualquer coisa não poderiam dizer que foi falta de aviso. Alguns tentariam, outros só culpariam Joshua.

Porque afinal, foi ele que fez aquela pegadinha. Ele é o psicopata. O culpado.

Realmente deveria pensar assim? 

Não seja tão duro com Joshua. Ele passou por muita coisa. 

Mas você já sabe disso, certo?

E em cada entrevista, um ponto de vista traumatizado, irrelevante, foi confessado. Nenhum deles foi na verdade relevante. Muito menos a de Jessica, pobre Jessica! Mal conseguiu se pronunciar direito, mas não foi porque lhe faltou oportunidade. Recebeu muitas, mas sua voz apenas não saía. Murmurou algo sobre Mike ter vindo para a ajudar, e perguntou para onde ele iria depois disso. Porque alguma parte dela sentia que ele fugiria da própria namorada depois do acontecido. 

Ashley teve o que falar de Joshua. Quem não teria, depois de duas armadilhas com a menina de alvo principal? Em sua cabeça, seria o certo que Christopher o denunciasse também. Aquele garoto estava louco! Mas quando foi perguntado sobre, ele evitou o assunto com tudo que podia. 

Na verdade, era o que o garoto estava fazendo, no exato momento.

— Ashley mencionou que Joshua envolveu vocês dois em específico na grande parte do seu esquema. Tem algo a acrescentar sobre isso? 

— Bom, sim, mas- Você tem que entender. Josh está doente- 

— Sabemos disso, Christopher. A pergunta foi-

— É sério. Ele precisa dos remédios dele e de um hospital, agora. O que vocês vão fazer com ele? Onde ele tá? 

— Não vamos fazer nada com um sobrevivente de uma noite dessas. Seus amigos disseram que não foi ele quem os machucou.

Ao menos isso, Chris pensou. — Não, não foi ele. 

— Eles mencionaram que foi uma espécie de monstro, os.. 

— Os Wendigos. 

— O que eles são, exatamente? 

— Olha, eles são monstros canibais que- ah, cara- não dá pra explicar. Eu só preciso ver o Josh. 

— Tem certeza? Eu não sei se você deveria-

— Eu deveria sim. — Botou ênfase nas últimas palavras. — Eu disse que ficaria do lado dele. 

O policial suspirou, levando o polegar e o indicador para o espaço entre os olhos, fechando estes e pensando no que faria. Não havia ponto em uma entrevista assim. Os policiais que resgataram Josh reportaram algo de estranho nas minas, e ele se lembra da garota Samantha ter comentado sobre o mesmo local. Cansado, apenas usou a mesma mão que antes estava ocupada, para mostrar a porta pra Chris. 

— Acabamos aqui. 

Chris engoliu seco. — C-Certo. Onde tá o-

— Vão te levar pro mesmo lugar. Você precisa de cuidados também, Christopher. Só verá ele amanhã. Ele não vai sair, não se preocupe. 

Não era com isso que Chris se preocupava, mas suspirou e assentiu. 

Quando saiu, todo seu caminho pareceu controlado. Não se lembrava de ter dito nada que não fosse o seu nome para as pessoas do hospital que chegavam a o perguntar isso. De resto, usava sua cabeça para informar os sim e não que tinha de dizer. 

Não podia mentir, o tratamento do hospital realmente o agradava. Queria poder pensar mais nele e no fato de que finalmente estava bem depois da madrugada de horrores, onde quase morreu o que, no mínimo, cinco vezes? Mas simplesmente não conseguia. Ele pensava em Josh, no que aconteceria no dia seguinte, na situação dos outros, e... Ele deveria falar com Ashley, não deveria? Depois do que passaram juntos, depois do que ela passou a ter que aguentar sozinha depois de terem prometido terem a guarda do outro durante a madrugada.. 

Mas simplesmente não conseguia sentir vontade de falar com ela. Não ligaria pra ela ou mandaria mensagem por enquanto, e se fosse escolher alguém pra fazer tal coisa, seria Sam. Sabia que podia confiar nela, principalmente quando o assunto era Josh ou o que tinha acontecido na montanha. Sam tinha sido provavelmente a mais corajosa entre todos eles, e definitivamente teria que ver como ela estava, assim que liberasse a culpa do caso Josh de suas costas.

Josh.. A dor de cabeça voltava rápido só de pensar bastante em como ele estava, se carregava o peso de todo mundo junto consigo, ou se alguém o atacou enquanto Chris não olhava. Ele prometeu que estaria por perto de Josh, e cumpriria isso. Ele já deixou Josh pra trás uma vez, não cometeria o mesmo erro de novo. Não com o seu melhor amigo. 

Era isso, não é? O significado de todo esse aperto no peito?

A culpa, obviamente.

Olhou o relógio e não estava de noite nem nada, mas ele definitivamente precisava descansar. Marcavam três da tarde, e provavelmente acordaria de noite. Tinha então o que faria quando acordasse em sua mente. 

Procuraria Josh, mesmo que o policial tivesse recomendado só o procurar no próximo dia. O dia vira pra quem dorme, seria sua desculpa.

Comeria algo. A comida que o hospital ofereceu não ia ser tão suficiente assim. 

Ligaria pra Sam. 

Não é muita coisa, mas são planos. 

Tirou os óculos e coçou a testa, respirando fundo e virando de lado para a cama. Pediu para quem quer que esteja aí em cima ou em baixo para que não lhe dê pesadelos sobre sua madrugada infernal, e se pôs a dormir.