Haymitch não estava mais lá quando ela acordou. Os raios de sol que penetravam as frestas da barraca banhavam seu rosto, despertando-a. Effie  percebeu que o despertador não tocara o que significava que ela havia se esquecido de programar na noite anterior. Trinket esfregou os olhos, ainda sonolenta, conferiu o relógio e levantou imediatamente, ciente de seu atraso. Eram nove e meia, mas ela ainda tinha um monte de coisas para fazer.

    É claro que adiantara mais da metade dos compromissos na semana passada, quando a equipe de preparação visitou doze, mas isso não significava que Peeta e Katnnis tivessem feito o mesmo. Sendo assim, Effie precisava bancar a “babá”, verificando se cada um deixara as coisas em ordem. Ela estava tão mergulhada em aproveitar cada momento no distrito, que esquecera completamente de que estava ali a trabalho.

   Effie guardou o cobertor, vestiu o casaco e arrumou a mochila; não podia se dar o luxo perder mais um minuto. Quando saiu da cabana, ficou surpresa ao ver que todos estavam reunidos em volta da fogueira, apreciando chocolates quentes e pãezinhos.

   “Bom dia!”, disseram em uníssono.                                                                            

  Ela percebeu que eles estavam arrumados, isto é, vestiam seus melhores casacos, jeans e botas de inverno; o acampamento já estava quase desfeito - a não ser pela barraca dela e a fogueira. Effie olhou em volta, estava tudo impecável. Ela sorriu, sem conseguir conter seu alivio por estar tudo em ordem.

   “Por que não me acordaram?” Ela sentou em um pedaço de madeira, perto dos vitoriosos. “O trem chega ás doze, estamos tremendamente atrasados.”

   “Achamos melhor deixar você descansar”, murmurou Haymitch.

   “Você merece um folga Effie, vai ser uma semana muito cansativa.”, Peeta deu um tapinha em suas costas. “Ah, a ideia de arrumar o acampamento foi do Haymitch.”

  Ele e Katnnis trocaram um olhar e sorriram ao perceber que a informação a afetara. Mais uma vez, Effie não conseguiu conter o sorriso.

   Ela olhou para Haymitch e sussurrou um obrigado, de forma que só ele pudesse escutar. Ele deu uma piscadela em resposta, em seguida colocou uma porção de pãezinhos na tigela, pegou uma caneca de chocolate quente e entregou-a.

  “Bom apetite”, Haymitch sentou-se ao lado dela “O garoto de pão que fez o café da manhã.”

   Peeta cruzou os braços e fez uma careta de reprovação, sentindo-se ofendido.

   “Quantas vezes eu vou ter que te dizer que não é para me chamar assim?”, ele levantou, aproximou-se de Haymitch e anunciou: “Eu sou um padeiro!”

  Effie precisou mordeu o lábio para não rir.

   “Está bem, não precisa ficar alterado garoto do pão.”, Haymitch colocou a mão no peito e arregalou os olhos, fingindo estar assustado.

   Todos gargalharam sem parar – exceto Peeta.

   “Ah, Haymitch.”, Trinket não conseguia parar de rir. “Você é terrível”

  Eles conversaram animadamente enquanto terminavam de tomar café, Effie contou um pouco sobre a loja, Peeta sobre o seu sonho de reconstruir a padaria da família e Katnnis sobre a temporada de caça. Haymitch permaneceu calado, observando a dinâmica do grupo. Juntos, eles pareciam uma verdadeira família, ele percebeu pelo o jeito como conversavam e sorriam uns para os outros. Haymitch flagrou-se emotivo, momentos como aqueles eram o que mais ele ia sentir falta.

   Ás dez horas, Katnnis apagou a fogueira, Peeta guardou as sobras e Abernathy foi ajudar Effie a desarmar o resto do acampamento. Com tudo pronto, eles pegaram seus pertences e seguiram a trilha de volta á aldeia dos vitoriosos. Quando chegaram à quase a metade do caminho, Everdeen anunciou:

  “Eu e o Peeta vamos na frente, nos queremos dar uma volta por ai antes do trem chegar.”

   Effie olhou para vitoriosa, hesitou um pouco, mas assentiu. Quem ela era para tirar aquilo de Katnnis? Pensou.

  “Vá em frente, mas esteja de volta ás onze e meia no máximo. Você ainda precisa se arrumar.”

   Everdeen sorriu agradecida, pegou a mão de Peeta e seguiu a trilha a esquerda. Trinket observou o casal desaparecer no meio da mata,  não tinham tempo a perder, eram jovens e felizes.

   “Foi muito gentil da sua parte abrir mão da sua pontualidade perfeita para deixa-los se despedir” , disse Haymitch.

   “Eu não pude evitar, eles vão passar tanto tempo fora..” , Effie sentiu um aperto no coração ao lembrar que ficariam um mês na capital. Depois disso, os vitoriosos poderiam voltar para casa, já ela ficaria na capital, sem nem saber se um dia voltaria ao doze.

  “Ah, é mesmo.” , ele suspirou, sabendo exatamente o que ela quisera dizer. “Ás vezes eu me esqueço de que vocês vão viajar.”

   “É..”, ela pigarreou. “Vamos andando, ainda tem muita coisa para fazer.”

   Effie pegou as sacolas e seguiu a trilha, caminhando muito mais rápido que Haymitch, para que ele não percebesse que ela estava prestes a desabar. Sempre que ele tocava no assunto a “despedida”, Trinket se afastava. Era como se aquilo fosse um pesadelo que ela tentava a todo custo evitar, talvez se ignorasse bastante, não se tornasse realidade. Infelizmente, isso era impossível.

  Haymitch correu até alcança-la, Effie estava com a cabeça baixa e os olhos marejados.

   “Você não vai mesmo, não é?”

  Ele parou correr, forçando-a a parar também. Haymitch olhou para ela, queria lhe dizer quanto sentia muito, mas não encontrou palavras.

   “Bem, eu acho que você já fez a sua escolha”, Effie voltou a correr, só que dessa vez mais rápido, para que ele não pudesse alcançá-la.

   Abernathy observou-a se afastar, não havia nada que pudesse fazer - o estrago já estava feito. Ele sabia que a havia magoado e decepcionado-a, não era a primeira vez. Se não ir á aquela viagem era a coisa certa a se fazer, porque ele se sentia tão mal ao fazê-lo?

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     Effie chegou á aldeia dos vitoriosos exausta, seus pulmões queimavam, suas pernas doíam, seus pulsos estavam marcados pelas sacolas pesadas que carregara e sua cabeça latejava. Quando enfim conseguiu se afastar de Haymitch, não conseguiu evitar e correu cada vez mais rápido - como se aquilo afastasse a dor.

   Trinket andou um pouco até chegar a casa dele, ela sentou-se na escada. Se não parasse para descansar, era provável que despencasse ali mesmo. Ela respirou fundo, tentando recuperar o fôlego. A mesma ficou alguns minutos assim, olhando para céu nublado, na expectativa acalmar-se. Effie remexeu as sacolas a procura das chaves da casa, depois de verificar em todos os lugares, lembrou que as deixara com Haymitch.

   Ela praguejou em voz baixa e deu meia volta, lembrando que a porta dos fundos estava sempre aberta. Effie cruzou os dedos e girou a maçaneta, por sorte estava aberta. Ela sorriu, nunca pensou que ficaria tão feliz ao ver aquela cozinha, Trinket aspirou o perfume de lavanda – sua limpeza havia feito milagres. Como ia sentir falta daquela casa... Daquele bêbado e até mesmo das bagunças.

   “Você corre bem rápido para alguém da Capital”, Haymitch fechou a porta e despejou as sacolas no canto do cômodo.

   “E você corre muito bem para alguém que bebe há anos”, Effie respondeu com rispidez.

   “Fico lisonjeado”, ele abriu a geladeira e pegou uma garrafa de vodka.

   Effie arrancou a garrafa da mão de Haymitch e tomou um gole, sentiu o liquido queimar sua garganta, era uma sensação horrível, mas agradável ao mesmo tempo. Ele arqueou as sobrancelhas surpreso, mas preferiu não comentar.

   “Se me der licença, eu vou tomar um banho. Tenho trabalho a fazer”, Trinket subiu as escadas, deixando-o sozinho na cozinha.  

   Haymitch decidiu segui-la, dessa fez ela não ia escapar.