Caderno de ideias escrita por Benihime


Capítulo 19
Amor Predestinado




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Grécia, 425 a.C

— Se não quiser ser deixada para trás, é melhor manter o passo. — Agenora disse bruscamente para a garota loira atrás de si que, devido ao cansaço, tropeçava desajeitadamente por entre as árvores.

A outra guerreira, chamada Abnara, estendeu a mão para a loira.

— Venha. Daqui meia hora, pararemos para acampar. Precisamos nos distanciar o máximo possível de Corinto antes do pôr do sol.

A garota aceitou a ajuda, ainda um tanto receosa.

— Obrigada. — Sussurrou, enquanto era conduzida pela floresta.

As três mulheres caminharam mais algum tempo antes de finalmente pararem e montarem acampamento.

— Gostaria que pudéssemos acender uma fogueira. Dessa forma, pelo menos dormiríamos algumas horas. — Agenora reclamou em tom jocoso, balançando os longos cabelos ruivos que brilhavam como fogo à luz dos últimos raios de sol.

— Não reclame, foi você que decidiu saquear a estalagem. Agora, come tranca! — Rebateu Abnara, ocupada em verificar se nada nos alforjes se danificara.

— E você deixou que eu o fizesse. Onde estava sua "luz da sabedoria" naquele momento, minha amiga? — Provocou a outra, parecendo decidida a começar uma briga.

— Não vou responder a esse comentário. Acho melhor tentar caçar alguma coisa, enquanto há luz do dia. — Replicou a morena, já de arco na mão e aljava no ombro. — Venha comigo, garota, vou precisar de uma ajudante.

Sem dizer nada, a garota capturada por ambas levantou-se e acompanhou Abnara para dentro da mata.

— O que vocês vão fazer comigo? — Perguntou, num sussurro que delatava seu medo.

— Quanto a Agenora, não sei, mas de mim não precisa temer nenhum mal. Eu não a machucarei.

Ambas caminharam mais alguns metros antes de avistarem um cervo. Abnara fez sinal para que a garota continuasse onde estava e preparou uma flecha, que cortou o ar e alojou-se, certeira, no coração do animal.

— Onde aprendeu a fazer isso? — A garota impressionou-se.

— Meu pai me ensinou. — Abnara já tirava a flecha do animal morto e limpava a ponta com um pouco de musgo. — Você ainda não me disse seu nome.

— É Aagje.

Apesar da luz quase inexistente, Abnara pôde ver que ela corara. Analisou-a rapidamente, pensando que o nome combinava perfeitamente.

— Vamos voltar logo, ou Agenora virá atrás de nós com uma espada. — Disse, e acabou rindo de sua própria piada, porque sabia que seria mesmo provável que a companheira fizesse algo do tipo.

Abnara e Aagje mal haviam iniciado a caminhada para o acampamento, quando ouviram um grito. A guerreira preparou seu arco, agarrou a mão da garota loira e começou a correr. Quando chegaram, encontraram os soldados já esperando. Ficaram um momento nas sombras, pensando se deveriam lutar ou tentar uma fuga.

— Temos que ir. Pegue seu cavalo e ainda podemos fugir. — Disse Aagje, analisando rapidamente a situação.

— Não. Eles mataram Agenora, e não posso deixar de vingá-la. — Respondeu a guerreira. Ela tirou uma adaga das vestes e colocou-a na mão da loira. — Vá embora. Fuja.

— Não vou deixá-la lutar sozinha.

A morena esboçou um sorriso perante aquelas palavras.

— Ao menos sabe usar isso? — Perguntou, em tom de zombaria.

Aagje arremessou a adaga em uma árvore com pontaria letal, e Abnara sorriu.

— Ótimo. — Rendeu-se — Pegue os cavalos e me encontre perto do rio ao amanhecer. Vou distraí-los.

Abnara subiu em uma árvore, de onde poderia alvejar os soldados sem ser vista. Primeiro emitiu um sibilo assustador, alto o suficiente para ser ouvido pelos homens, que gelaram de medo, em seguida disparou uma flecha, atingindo o capitão na garganta. Ele caiu, agonizando em uma poça de sangue. Os soldados mantiveram-se em formação, obviamente bem treinados.

Suas flechas continuaram, tão mortíferas quanto a primeira, mesmo na semi escuridão. De repente, um grito de vitória soou.

— Olhem só o que eu encontrei aqui. Uma das assassinas. — Disse um soldado, aparecendo na baça luz das tochas, trazendo Aage pelos cabelos.

Uma fúria ainda maior queimou no peito da guerreira empoleirada na árvore. Ela pulou do galho onde se encontrava, sem se importar com a dor que sentiu ao atingir o chão.

— Deixem-na ir. É a mim que vocês querem. — Disse, mostrando-se aos soldados.

— Vejam quanta sorte, homens! — Disse um deles, que já era o algoz de Abnara há algum tempo — A famosa ladra aparece.

— Soltem a garota e venham lutar comigo, se tem coragem. — Rosnou, largando o arco e cerrando as mãos em punhos.

Sabia que poderia vencer a luta. Era bem forte, e não precisava de arma alguma para matar alguém, apenas dos próprios punhos.

— Quanta petulância. Acho que devemos dar-lhe uma lição. — Riu o segundo oficial, Bianor, cheio de malícia.

Dois homens tentaram agarrá-la, mas ela girou e agarrou os braços de ambos, torcendo-os até que quebrassem com um estalo audível. Outros vieram para tentar capturá-la, o que permitiu que Aagje se livrasse de seus captores e ajudasse na luta. Ela era surpreendentemente forte, o que deixou Abnara feliz. Se ela não soubesse se defender, acabaria morrendo. A luta foi feroz e no fim as mulheres venceram.

— Vamos embora, Abnara. Podem chegar mais homens a qualquer momento.

Abnara assentiu e ambas correram para os cavalos. Um grito repentino cortou o silêncio da noite. Abnara virou-se para ver Aagje parada, com uma mancha de sangue crescendo em seu peito.

— Armadilhas! — Exclamou, finalmente compreendendo tudo.

Os malditos haviam cuidado para que ninguém escapasse vivo dali. Ela correu para a companheira ferida, ajoelhando-se ao seu lado. A loira moveu fracamente a mão e, entendendo-lhe a vontade, Abnara segurou-a.

— Que nos encontremos nos Campos Elíseos, Abnara.

Aagje tossiu mais um pouco de sangue. Abnara sentiu as lágrimas correndo-lhe pela face. Sem pensar no que fazia, curvou-se e beijou os lábios de Aagje, que conseguiu sorrir, e então seu coração parou de bater.

Em desespero pelo sentimento que nascera há tão pouco tempo, porém já era tão forte, Abnara pegou a adaga que estava nas mãos da garota morta em seus braços.

— Isso acontecerá mais cedo do que imagina. — Disse para a noite, cravando a adaga no próprio peito, vendo o sangue escorrer em um filete vermelho. Sorriu consigo mesma. Finalmente, a paz.

Estíria, 1.200 d.C.

Johanne ajudou Elena a subir no cavalo e fez esforço para não rir. A amiga nunca conseguia montar sem ajuda. Parecia até uma daquelas damas da corte, que sempre precisavam de seus serviçais para fazerem tudo por elas, mesmo que sua personalidade fosse o mais distante possível daquele tipo de mulher.

— Não entendo a dificuldade de subir em um cavalo. — Riu.

Elena dirigiu-lhe uma careta bem humorada. A sólida amizade entre as duas permitia aquele tipo de liberdade.

— E eu não entendo a sua dificuldade em usar vestidos — Rebateu.

Johanne revirou os grandes olhos azuis.

— Não são bons para lutar, e você sabe disso. — Respondeu, montando em seu cavalo e instando as duas montarias a um meio galope pela trilha que daria no castelo.

Quando chegaram, foram recepcionadas pela condessa Laura, mãe de Johanne, que não parecia nada feliz ao ver a filha naqueles trajes masculinos.

— Johanne, quantas vezes eu terei de lhe dizer? Você é uma condessa, não pode sair pelos campos vestida como um homem e lutando contra desordeiros.

A morena cruzou os braços e ergueu o queixo teimosamente.

— Tenho idade o bastante para decidir o que quero, mamãe. Não sou mais uma garotinha. E o que quero é ser uma guerreira. A senhora sabe disso.

— Venha comigo, mocinha. — Ordenou Laura, agarrando o pulso da filha e puxando-a para dentro do castelo com impaciência.

Em vez de se zangar, a morena sorriu e, pelas costas da mãe, dirigiu uma piscadela à companheira, que ainda a observava, prendendo o riso. Por mais que gostasse de Johanne, Elena sempre gostava de vê-la em maus lençóis.

[...]

Elena acordou com uma batida em sua janela. Ficou um momento deitada, incrédula. Ela não se atreveria ...

— Elena, sua tola, abra a janela agora mesmo! — Johanne ordenou, falando o mais baixo que conseguia.

Elena obedeceu, pulando facilmente para a relva macia do campo.

— O que veio fazer aqui? Já é noite alta, devia estar dormindo.

— Não conseguia dormir. Quero ir nadar. — Disse.

Elena cruzou os braços, desaprovando. A verdade era que tinha muito medo de ir ao trecho do rio em que Johanne gostava de se banhar. Era uma curva, não muito longe da cachoeira, com águas caudalosas que corriam rapidamente.

— À noite? Você só pode ser louca!

Ambas se encararam por um momento e então Johanne passou um braço pela cintura da melhor amiga, puxando-a contra si e descansando o rosto em seus cabelos loiros curtíssimos. Não sabia o motivo, mas tinha quase certeza de que, uma vez, em algum momento, haviam sido longos.

— Nada vai acontecer, Elena. Eu prometo.

— Está bem. Vamos logo. — Disse, e Johanne sorriu, satisfeita por conseguir o que queria. Ela sempre conseguia.

As duas amigas correram até o rio, que não ficava muito longe, e Elena sentou-se à margem.

— Não vai entrar na água? — Johanne inquiriu, já abrindo os cordões da camisola.

Elena corou e desviou o rosto quando a amiga deixou a peça deslizar para o chão. Somente voltou a olhar quando ouviu os esguichos de água que indicavam que Johanne entrara no rio.

— Não, obrigada. Prefiro ficar onde estou.

— Como quiser.

Elena ficou olhando o rio, preocupada. Quando era dia, podia ver a silhueta da amiga embaixo da água, sabia que ela estava bem, mas, com aquela escuridão, não havia como ver nada. Alguns segundos de agonizante espera se passaram, e então Johanne surgiu na superfície, ofegante.

— Pronta para ir? — A loira perguntou, conhecendo o hábito da amiga. Ela sempre dava apenas um mergulho, e em seguida voltavam para casa.

— Claro. Olhe para lá, pequena donzela.

Elena fez o que ela disse, e começou a impacientar-se. Quanto tempo Johanne levaria para vestir aquela camisola? Será que estava planejando alguma brincadeira?

Seu coração acelerou quando ouviu um grito abafado, um pouco além de onde estava. Arriscou olhar em volta, e nem traço de Johanne, a não ser a camisola jogada no chão, manchada de sangue. Um grito escapou de seus lábios ao ver aquilo e a loira precipitou-se a correr pela floresta, na direção de onde vinham os gritos abafados que agora tinha certeza pertencerem a Johanne.

Depois de correr pelo que pareceram horas, encontrou a amiga. Estava amarrada, deitada no chão, e um homem corpulento encontrava-se em cima dela. Havia sangue nos seios de Johanne, e mais sangue escorria por entre suas pernas.

— Johanne! — Elena exclamou, entrando na clareira como um raio.

Com um galho grosso que encontrara golpeou a cabeça do homem, que caiu atordoado. Elena libertou a amiga, que chorava copiosamente.

— Elena! — A morena choramingou, abraçando a amiga com sofreguidão.

A loira sentiu seus seios se roçarem através de sua fina camisola, e um estranho calor dominou-lhe o corpo. Totalmente entregues naquele abraço, não perceberam que o homem estava se levantando.

— Você me paga, sua vadiazinha. — Ele rosnou, avançando para elas com uma adaga na mão.

Antes que qualquer uma pudesse reagir, cortou-lhes os pescoços. Os corpos caíram na terra úmida, e os lábios ainda vermelhos com o último sopro de vida esboçavam um sorriso secreto. Morreram juntas, como verdadeiras amantes. Como sempre seria, até que alguém quebrasse o ciclo.

França, 1559

A criada muda ajeitou cuidadosamente a saia de sua senhora, que esboçava um sorriso satisfeito.

— Uma pequena obra de arte, como sempre, Gabrielle. — Elogiou.

A loira sorriu, contente com as palavras de Angeline.

— Não sei por que insiste em conversar com ela como se fosse uma de nós, meu bem. Ela nem ao menos pode responder. — Disse Anne, a irmã mais velha da jovem.

— Só porque não pode responder não significa que não possa me entender. Não é mesmo, Gabby? — A morena replicou pacientemente, ao que a jovem muda assentiu.

— Apenas lembre-se de colocar sua máscara. Os homens de Lorde Chamberlain estão apenas esperando uma chance para capturar uma de nós. — Recomendou a mais velha, ao que Angeline respondeu com uma careta.

— Que venham todos! Eu lhes darei um tiro bem onde merecem. Eles não sabem com quem estão lidando.

Gabrielle apertou levemente a mão de sua senhora e amiga, indicando-lhe que medisse suas palavras, e a morena assentiu. Momentos depois, ambas estavam sozinhas no suntuoso quarto de vestir. Angeline tagarelava animadamente e Gabrielle a ouvia com um sorriso no rosto, achando graça na empolgação da amiga.

De repente um estrondo, gritos e o estampidos de uma arma. As duas mulheres assopraram a vela que iluminava o ambiente e esconderam-se em um dos muitos recantos do grande aposento. Gabrielle, assustada, chorava.

— Quieta, Gabrielle, por favor. Podem nos ouvir.

As duas se abraçaram, mas Gabrielle não conseguia parar de chorar. Num gesto impensado, Angeline tomou o rosto da amiga entre as mãos e beijou-a nos lábios. Isso surpreendeu-a o bastante para que as lágrimas cessassem, e ambas continuaram escondidas nas sombras, quietas, seus corpos unidos sem nem mesmo um centímetro que os separasse.

Depois do que pareceu uma eternidade, ouviram passos cada vez mais distantes e arriscaram-se a sair do esconderijo.

— Tem movimento na casa! Fogo, seus idiotas! — Gritou o comandante.

O estampido de uma arma se fez ouvir, e então Angeline tombou. Aos prantos, Gabrielle arrastou-se para perto da morena e acomodou a cabeça da amiga em seu colo.

— Gabrielle. — A morena sussurrou, abrindo um sorriso triste. Ela ergueu a mão e afagou o rosto delicado da criada. — Me desculpe.

O desespero de Gabrielle era o maior possível. Sem saber o que fazer para ajudar a amiga, sem poder dizer nada que a confortasse. Sentia-se presa, uma completa inútil. A mão de Angeline tombou, e sua cabeça pendeu para o lado. Gabrielle teria gritado, se pudesse.

Por favor, por favor. Fique comigo, Angeline. Eu preciso de você. Ela implorou em pensamento.

— Rápido, seus incompetentes. Querem que descubram o que fizemos? — Ouviu alguém esbravejar.

De repente o fogo começou, consumindo a casa. Gabrielle não se moveu. Já não mais se importava de morrer. Sua melhor amiga, aquela que a compreendia e aceitava como era, agora estava morta, e ela não queria enfrentar a escuridão do mundo sem sua luz. Delicadamente, ergueu um pouco a cabeça de Angeline e inclinou-se para beijá-la uma última vez, enquanto as chamas consumiam o que restava de sua felicidade.

Espanha, 1888

— Um brinde a mais um crime perfeito! — Riu Anita, erguendo o copo para que a companheira, Esperanza, batesse com o dela.

— Anita, você é um gênio! — A loira comemorou, brindando com empolgação.

Anita apenas deu de ombros, sem graça com o elogio.

— Obrigada, Esperanza. E prepare-se para deixar a cidade ao anoitecer. Não podemos ficar aqui nem um segundo além do necessário.

— Quer dizer que vou com você?

— Se quiser, obviamente.

— Sim, eu quero. É que ... Pensei que quisesse partir sozinha.

— Eu jamais deixaria você, Esperanza. Pode ter certeza disso. — Afirmou a morena, colocando a mão sobre a da amiga, que sentiu a pele esquentar onde era tocada. A verdade é que desejava Anita. Desejava muito, mais do que jamais desejara qualquer outra coisa ou pessoa na vida.

— Nesse caso, não esperaremos nem mais um segundo nessa vilazinha desprezível. — Declarou.

Anita riu da impaciência da parceira, mas também se pôs de pé, ansiosa para partir. De repente, o xerife entrou no bar.

— Esperanza González, você está presa por assassinato. — Anunciou o homem, erguendo o revólver e fazendo mira.

Anita pareceu surpresa.

— O que você fez? — Indagou.

A expressão traída em seus olhos foi todo o castigo de que Esperanza precisava.

— Eu precisava protegê-la. Eles descobririam. — Disse, baixo o bastante para que os outros não a ouvissem.

Anita ainda segurava a mão da companheira, e apertou-a levemente em agradecimento.

— Obrigada, minha amiga.

O xerife agarrou Esperanza pelo braço. Ela lutava para se libertar, segurando tão forte na mão de Anita que os nós dos dedos de ambas ficaram brancos.

— Que merda! Essa vadia é um pé no saco! — Disse um dos homens.

O xerife soltou Esperanza, que correu para os braços de Anita.

— Venha com a gente de livre e espontânea vontade, ou mato sua amiga. — Ameaçou, erguendo novamente a arma.

Esperanza ainda continuou abraçada à amada mais um momento, mas depois deu um passo à frente.

— Está bem, eu me entrego. Apenas deixe-a ir.

Ele assentiu e gesticulou na direção de Anita.

— Vá, garota. Fora daqui!

Anita lançou um último olhar para Esperanza e então retirou-se do bar. O xerife virou-se para a condenada, que já sabia seu destino.

— Seja rápido, por favor. — Pediu, fechando os olhos.

Ouviu o clique da arma sendo engatilhada e, em seguida, o estampido do tiro. Esperou pela dor, mas ela não veio. Ousou abrir os olhos e viu Anita caída em uma poça de sangue.

— Não! — Berrou. — Anita, sua louca! Por que?

Ajoelhou-se ao lado da companheira e observou o local do disparo. No peito. Não havia como salvá-la.

— Eu precisava ... Por você. — Sussurrou, segurando sem forças a mão da loira, que a ergueu nos braços.

— Eu te amo, Anita. Você é a melhor coisa que aconteceu comigo.

Um sorriso cruzou os lábios da morena.

— Você é minha luz, Esperanza. — Sussurrou em resposta, e então sua cabeça pendeu para trás.

Anita estava morta. Esperanza ergueu novamente a cabeça da amada e deu-lhe o beijo que sempre estivera destinado a ambas: o beijo da morte.

Pensilvânia, 2014

Aileen Davies acordou com algo gelado passando por seu rosto. Até que era bom. Atenuava o calor da pele, que parecia em chamas. Uma mão macia afastou os cabelos de seu rosto, e ela começou a sentir-se melhor.

Abriu os olhos e viu-se na sala branca já familiar. Nem mesmo dignou-se a olhar para o lado, sabendo que uma das enfermeiras estaria ali.

— O que aconteceu dessa vez? — Perguntou.

— Você reclamou de dores no peito, e desmaiou. Um colega seu te trouxe para cá faz umas duas horas. — Respondeu alguém.

Aileen imediatamente virou-se para ver a dona daquela voz tão angelical. Era uma garota loira, mais nova do que ela, e que parecia realmente um anjo. Os cabelos loiros eram a moldura perfeita para seu rosto delicado. Compridos de novo, pensou, embora não entendesse a sensação de familiaridade daquele rosto. Sabia que já a conhecia, mas não conseguia lembrar-se de onde, assim como tinha certeza de que aqueles cabelos lindos haviam sido curtos em algum momento do passado.

— Quem é você?

A loira sorriu, e o coração de Aileen disparou.

— Sou Lilian Gray, a nova médica. — Respondeu, estendendo a mão.

Aileen sorriu, aceitando o cumprimento. Lilian alcançou-lhe um copo de água, que estava na mesinha ao lado da cama.

— Obrigada. — Respondeu, bebendo um longo gole. Estava surpresa por sentir tanta sede. — Quando terei alta?

— Logo. Seu desmaio foi causado por anemia, então vai ter que ficar em observação até amanhã de manhã. — Aileen acabou bocejando, e Lilian sorriu. — Não se preocupe, são os remédios que lhe demos. Você vai ficar meio sonolenta por algum tempo.

Aileen fechou os olhos e sentiu o sono chegar quase imediatamente. Algo, porém, impediu-a de dormir, e a morena ficou vagando entre o sono e o despertar, totalmente satisfeita pela sensação de paz que a tomava.

Havia um perfume no ar que lhe lembrava algo, mas era uma memória nebulosa, como uma recordação de infância que vai se esvanecendo com o passar dos anos.

Sentiu mãos pequenas em seus cabelos, fazendo carinho. Aos poucos, adormeceu realmente, sem saber que Lilian ainda estava ali, observando-a, e que assim ficaria pela hora seguinte.

Finalmente as duas almas gêmeas se reencontravam, e desta vez, quem sabe, as estrelas estivessem diferentes e elas tivessem uma chance de viver seu amor. Um amor puro como orvalho, tão doce como mel, poderoso como a luz do sol. Um amor que atravessara séculos sem jamais morrer, e que, em um momento derradeiro, sempre conseguia se impor a todo o ódio existente no mundo.


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