Guertena escrita por KyonLau


Capítulo 7
Os Mentirosos I


Notas iniciais do capítulo

Olá, como vão?
Eu peço perdão pela demora com esse capítulo. Tive diversos problemas com meu computador e então descobri que ele queimou e eu havia perdido o capítulo 7, que estava quase pronto. Quase morri, mas finalmente me recuperei e refiz ele. Acho até que ficou bem melhor que o primeiro, quem sabe? Auashauhsuahsa
Espero que vocês gostem e me perdoem pela demora ;-;

Soundtrack: "Inquiry"
https://www.youtube.com/watch?v=2ozvhM8ck7I



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Galli parecia estar prestes ou a correr descontroladamente, ou a deixar-se cair no chão e chorar. Qual dos dois ainda não era muito certo para Iza, que observava tudo admirada. Ela admitia que o rabisco era bastante sinistro e seria mentira se dissesse que não lhe causava calafrios na espinha, mas a garota era forçada a admitir que já encontrara coisas piores ali. E, pelos relatos, aquele menino também. Contudo, lá estava ele, tremendo dos pés a cabeça, sem se atrever a desviar o olhar.

Sentindo que precisava fazer alguma coisa, Iza puxou-o pela manga da blusa, mas não obteve resposta alguma da outra parte. Com um pouco mais de força, ela agarrou Galli pela mão e, sem se deixar atrasar, começou a praticamente arrastá-lo atrás de si.

Caminhando a passos rápidos, a menina se atreveu a espiar por cima do ombro. O boneco permanecia na parede onde fora encontrado. Parara de acenar.

Eles permaneceram em silêncio. Seus passos eram tudo o que ouviam. Iza ainda não soltara a mão de Galli, mas continuava puxando-o com força, sem olhá-lo. Seus pensamentos começavam a vagar para longe e logo a conhecida ânsia de se ver fora daquele lugar a dominou. Ela nunca sentira claustrofobia na vida, mas suspeitava de que fosse algo extremamente parecido com o que experimentava agora. Perguntava-se se alguém chegara a sentir a sua falta. Talvez Leo estivesse nesse exato momento em frente à Galeria de Artes, encarando as portas fechadas e se perguntando onde que a amiga fora parar. Ela nunca fora de sair, mas sentia que tudo o que mais queria na vida, naquele instante, era ver o céu se abrir para ela.

Dobraram o corredor mais uma vez e Iza deu de cara com uma pintura em uma moldura cinzenta. Ela retratava um céu escuro e pontilhado de estrelas.

No momento em que viu aquilo, a garota estacou, fervilhando de raiva, sem se importar de quase ter atirado Galli ao chão com sua parada súbita.

— O que foi?

Iza não respondeu. Não se deu ao trabalho. De repente, veio-lhe a ideia de que estava servindo de piada. Para quem, ela ainda não sabia.

A garota soltou rapidamente a mão do companheiro e levou-a ao quadro, passando os dedos pela inscrição da placa: Noite Admirável, e então subindo até agarrar os dois lados da moldura cinzenta.

Sem pensar, tirou-a da parede e a encarou. Queria quebrar aquela coisa ao meio e jogar os pedaços na cara de quem quer que a tenha colocado naquela situação.

— Iza, pare! — Galli berrou aterrorizado e arrancou a obra de arte das mãos da adolescente bem a tempo.

— Me devolve isso, Galli, que eu quero enfiar esse negócio goela abaixo do infeliz que fez isso com a gente!

— Não pode! Por favor, Iza...

Por um instante, a garota pensou em arrancar aquilo das mãos fracas de Galli e quebrar não só ao meio, mas em mil pedaços e depois dançar em cima, mas... Aos poucos, a raiva que queimava em seu peito foi se apagando, levando consigo as forças de Iza.

Ela finalmente abaixou os braços, que penderam do lado do corpo molemente e, desanimada, continuou a andar.

Aliviado, Galli repôs a pintura no lugar e saiu correndo atrás da mais velha, que ia desaparecendo depois de driblar uma pequena árvore que parecia ser feita inteiramente de madeira, repleta de maçãs, também de madeira.

Iza agora dava passos largos com toda a força que conseguia reunir nas solas dos pés. Não olhava e nem se importava se Galli estava conseguindo segui-la. De repente, sentia-se brava com o garoto também. Não entendia como ele podia manter-se calmo, depois de tudo. Ele quase colapsa quando vê um boneco palito rabiscado na parede e ela não pode se descontrolar quando alguém, ou algo, estava claramente debochando dela.

— Espera, Iza! — a garota ouviu Galli pedir ao longe.

Iza virou-se a tempo de ver o menino correr em sua direção. Estava a vários passos atrás dela e parecia meio desengonçado.

— O que foi? — perguntou sem nenhuma paciência.

Mas, seja lá o que Galli estava prestes a falar, Iza não chegou a descobrir, pois, no momento em que a garota deu mais um passo, sentiu o pé afundar em algo que definitivamente não era o chão. Assustada, ela virou-se para frente e pode ver que acabara de meter o tênis sujo em um olho com o tamanho aproximado de um prato de almoço.

No mesmo instante que o olho ferido se fechou outros, incontáveis, se abriram ao longo do chão, teto e paredes à sua frente. Eles se arregalavam e giravam as pupilas, alucinados, procurando a criatura hedionda que ferira seu companheiro. Um ruído agudo se fazia ouvir, e forçou Iza e Galli a taparem os ouvidos com as mãos para evitar que machucassem seus aparelhos auditivos.

— Mas que droga é essa?! — gritou Iza, afastando-se alguns passos dos olhos.

— Eu não sei!

A resposta de Galli mal foi terminada quando o barulho abruptamente parou. Aos poucos, cada olho parou de girar sem rumo e começou a se fixar em Iza, que sentiu o chão faltar debaixo de seus pés. Por um instante, pensou se não seria melhor pedir desculpas, mas então, se tocando de como a ideia era ridícula, fez um sinal para o menino ao seu lado.

— Vamos.

Sua voz estava baixa e rouca, mas aparentemente Galli a entendera, pois foi atrás dela quando Iza começou a passar com todo o cuidado por entre os olhos, para não correr o risco de pisar em nenhum outro.

Agora ao menos a garota sabia o incômodo que era ser vigiada tão atentamente. Ela podia sentir, bem como ver, cada globo ocular que cravara o olhar em si, sem ousarem desviar-se nem por um segundo da figura da garota. Era como se alguém invisível estivesse grudado à ela, respirando em seu cangote, afastado por questão de milímetros de Iza. Ela praticamente podia sentir a respiração, agonizando-a.

Foi com muito custo e auto-controle que Iza prosseguiu. Sua vontade era de sair correndo na velocidade da luz, mas tinha a impressão de que se fizesse isso, o que quer que estivesse logo atrás dela a agarraria sem piedade e a arrastaria para algum lugar.

Demorou um pouco para que finalmente conseguissem passar por aquela parte e, assim que se viu longe dos olhos, Iza conseguiu respirar, aliviada.

Suas mãos tremiam descontroladamente e ela se deu conta de que prendera a respiração durante quase todo o percurso anterior. Suor gelado escorria por sua testa, e ela precisou limpar com as costas da mão para impedir que caíssem em seus olhos.

Por outro lado, Galli parecia muito menos abalado do que a adolescente e, portanto, já avançava um tanto que julgou não apresentar risco de se separar da companheira e olhava, curioso, para o que quer que poderia haver em frente.

Enquanto se recuperava, a garota mexia na mochila. Sem reparar, transformou aquilo numa espécie de hábito. Não que ela acreditasse nisso de verdade, mas se sentia bem fuçando no interior escuro e atulhado de papéis amassados, quase como se fosse capaz de encontrar algo que a tirasse de lá.

Seus dedos, ainda tremendo, se fecharam em torno daquilo que ela identificou como seu celular. Mais como reflexo do que qualquer outra coisa, a garota tirou o pequeno aparelho de lá e olhou-o. Como era de esperar, a bateria havia acabado, e ele não tornaria a ligar, visto que ela duvidava que encontrasse alguma tomada por ali. Tornou a jogar o celular lá dentro e fechou o zíper com algum grau de violência. Dando uma boa olhada na rosa negra, que repousava, tranquila e bela, na alça da mochila, Iza a jogou às costas novamente e foi até Galli.

— Certo — disse — Vamos, então.

Galli concordou e prosseguiram.

Os dois continuaram pelo corredor amarelo, que parecia que ia se estreitando à medida que caminhavam. Não demorou muito até desembocarem numa pequena saleta quadrangular. Na parede oposta à eles, cinco quadros estavam pendurados um do lado do outro. Eram quadros de silhuetas de pessoas, e cada uma usava uma roupa com uma cor diferente. Da esquerda para a direita, era verde, laranja, amarelo, azul e branco.

Nas paredes perpendiculares à dos quadros era possível ver duas portas de cada lado.

Bem ao lado de Galli, na entrada para a saleta, uma plaquinha indicava o nome da obra. Ou melhor, das obras.

Os Mentirosos — leu o garoto.

Iza foi até cada uma das portas e tentou abri-las, mas todas estavam trancadas.

— Nós não podemos voltar — disse — Temos que passar por uma dessas.

— Mas como? Nenhuma abre...

Uma risadinha abafada de zombaria se fez ouvir, sobressaltando os dois. Eles olharam ao redor, mas em vão. Não havia ninguém lá.

— O que foi isso? — perguntou Galli, erguendo uma das sobrancelhas.

— E não é óbvio? — veio a resposta numa vozinha feminina extremamente irritante, mas decididamente, não fora Iza quem a proferira.

Mais risinhos.

— Esses daí são burros mesmo — veio outra voz, dessa vez masculina, mas igualmente irritante.

— Não é? Nem o Garry demorou tanto para sacar, e ele era muito burro naquela época — riu-se outra voz em resposta.

Iza finalmente entendeu. Virou-se para os quadros e viu as silhuetas se moverem. Umas seguravam a barriga, outras agarravam-se à moldura de suas telas, mas todas estavam obviamente caindo na gargalhada.

Atrás de si, ela ouviu Galli soltar uma exclamação de surpresa, e ela não poderia culpá-lo. Estava tão surpresa quanto o garoto, pois não imaginava que aquilo fosse possível. Já os vira tomar vida, mas era a primeira vez que os via falar, de fato.

Mais risadas se seguiram às expressões estúpidas nos rostos dos dois companheiros.

— Como vocês podem falar? — perguntou Iza, sem conseguir se conter.

— Ué, da mesma forma que você, acho — a silhueta num vestido branco respondeu enquanto todas as outras ainda estavam ocupadas demais rindo — Com a boca!

Mais risadas.

Iza e Galli se entreolharam.

— Se era para contar piadas idiotas assim, seria melhor que nem falassem — comentou Galli, mordaz.

Isso fez com que a hilaridade morresse de um minuto para o outro. Em vez disso, cochichos irritados, ou constrangidos, encheram o ar. A silhueta de blusa azul foi a primeira a se recuperar.

— Ah, é? Bom, mas se fosse assim, vocês ficariam presos aqui para sempre, não é?

— É verdade!

— Exatamente!

— Seus burros!

— O que quer dizer com isso? — perguntou Iza, dirigindo-se para a silhueta com blusa azul.

— Significa, meu bem, que nós somos os únicos que podemos abrir essas portas, para vocês passarem.

— Isso mesmo!

— Como ele disse!

— Não há chave!

Iza tentou controlar a vontade de ser mal criada. Sentia que jamais sairiam dali se começassem a bater boca. Respirando fundo, prosseguiu.

— Então... Vocês podem abrir para nós? Só queremos passar, sem causar problemas.

Agora todos desataram a rir de vez. Foi preciso muito tempo para que se recuperassem minimamente, e foi a silhueta de vestido marrom que respondeu:

— Claro que podemos abrir, xuxu — disse — Mas não podemos fazer isso de graça, ou podemos?

— Claro que não!

— Loucura!

— Nem sonhando!

A silhueta de vestido marrom anuiu, concordando com os companheiros.

— Certo, e qual o preço? — insistiu Iza.

— Ah, não é nada de mais! — respondeu a silhueta.

— Nada, não!

— Preço de banana!

— Nós queremos... Essa bela rosa branquinha nas mãos do menino ali.

Galli se sobressaltou e, dando alguns passos para trás, como se receasse um ataque, agarrou com força sua rosa junto ao peito. Iza fez um pequeno sinal para que ele se acalmasse antes de voltar-se novamente para os quadros.

— Não podemos dar isso a vocês — respondeu, tentando manter a voz firme — Não tem outro jeito? Faremos qualquer outra coisa.

As silhuetas se agitaram, pensando sobre o que fazer.

— Bom... Se é assim — respondeu o de blusa verde — Há outra maneira.

— Basta vocês adivinharem qual a porta certa, e nós a abriremos para vocês — continuou o de blusa amarela.

— Mas se por acaso escolherem uma porta errada — prosseguiu a de vestido branco.

— Vocês morrem.

A sentença composta apenas por duas palavras, proferida pelo de blusa azul pairou por algum tempo na mente de Iza, fazendo-a sentir um aperto no coração. Como que de repente, a sala ficou ligeiramente mais fria.

— Não fique com essa cara — a de vestido marrom quebrou o silêncio num tom de voz espirituoso que em nada combinava com o que a situação exigia — Nós também não somos tão cureis assim. Nós somos tão bonzinhos, que até vamos te falar qual porta você deve escolher.

— Isso mesmo! — concordou a de vestido branco, maliciosa — Mas é claro... Você vai ter que descobrir quem está falando a verdade.

O coração da menina disparou.

— Como assim?

— Ora... Vivemos num mundo tão falso, não é mesmo? — respondeu o de blusa verde — Não seja tão pessimista... Considere isso, vejamos... Um treino para a vida! Estamos lhe fazendo um favor!

— Apoiado!

— Sem sombra de dúvidas!

— Eu não saberia dizer melhor!

E calaram-se, esperando a resposta de Iza, que podia jurar que era possível ver sorrisos curéis idênticos em cada silhueta obscura à sua frente.


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Notas finais do capítulo

Bom, esse capítulo ficou um pouquinho maior, talvez para compensar a demora? :D Não me matem, tá? A tia ama vocês. Mas sério, eu ainda ia continuar, mas quando vi o tamanho, achei melhor ficar por aqui... O bom disso é que a continuação já tá na minha cabecinha maravilhosa, então já até to começando a escrever :D
Até o próximo capítulo s2