Dragões Dourados escrita por Gwen Sweetlux


Capítulo 7
Capítulo 7 – Lembranças




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A noite juntos deixara tanto o Cavaleiro quanto Selene com um misto de emoções inéditas para lidar. Porém, sabiam que antes de seus desejos pessoais vinham seus deveres como servos de Atena. Principalmente para Shiryu. Ele observava contente os progressos que os soldados faziam e recebia notícias animadoras do Santuário, que estava aos poucos se reerguendo.

            Ainda se preocupava com os amigos, especialmente com Seiya, que fora ferido por Hades. Saori não mencionava seu nome em nenhuma das correspondências enviadas aos Cinco Picos. Já era esperado o silêncio de Hyoga, que apesar de sentimental, preferia se resguardar e isolar em momentos como aquele. Tampouco esperava novas vindas de Ikki, que seguia seu próprio caminho. Shun estava com Saori no Santuário. Seu espírito amável não gostaria de afastar-se dela quando estava tão fragilizada. A imagem de Shunrei nunca abandonava seus pensamentos, apesar de tanto ter acontecido desde seu regresso ao lar.

            Seria um longo dia. Treinaria Hayato e sua nova armadura durante quase todo o andar do sol pelo céu. Selene ainda não sabia se era seguro permanecer no acampamento e treinar normalmente. Pressentia que ainda não tinha controle total de suas estranhas habilidades e temia ferir alguém com algum descuido.

            Contudo, a garota seguiu atando suas bandagens aos pulsos. Pensativa, não observou que alguém caminhava diretamente em sua direção. O impacto do encontro a fez cambalear alguns instantes, mas ela conseguiu se equilibrar em um único pé.

            Ao erguer o olhar, viu um estranho que ocultava seu rosto com um capuz escuro. Quem poderia ser? Selene colocou-se em guarda.

            - Diga seu nome e o que faz aqui! – perguntou, sem rodeios.

            O intruso apenas riu, um riso repleto de desdém e seguiu seu caminho. Trajava uma longa capa escura e o pouco que Selene pôde observar de seus pés era que suas botas eram cobertas por um metal amarelado, porém que não se assemelhava ao ouro. Sua figura evanesceu, envolta por uma névoa negra. 

            Algo na atmosfera havia mudado. Ao sondar os arredores, Selene não via mais Rozan. Estava em uma espécie de vácuo do tempo e espaço. No horizonte, ao invés das belas quedas d’água iluminadas pelo sol, um vórtice violeta circulava engolindo corpos celestes, sugando a matéria escura que recobria todo o ambiente. O que estaria acontecendo? Estava confusa, porém seu coração e Cosmo pulsavam antecipando uma batalha iminente.

            Alguém hostil preparara aquele passeio aos limites do Universo, ou quem sabe até mesmo para outra dimensão. Como poderia saber? Apertando as mãos, suas unhas cravaram-se nas palmas, causando uma dor leve que a manteria alerta e a certificaria de não estar sonhando.

            Um estrondo abalou o tecido que parecia compor aquela dimensão estranha. Selene viu quando o que pareciam estrelas e astros tremularem quando o objeto escuro se aproximou dela. Não queria ser pega desprevenida, logo, começou a acumular e a queimar seu Cosmo, fazendo com que uma aura esverdeada a envolvesse.

            Seus olhos cinzentos agora brilhavam como esmeraldas e miravam o objeto, agora distinguindo tratar-se de uma pessoa, erguendo-se do chão vagarosamente.

            - Ora vejam, a maldita está finalmente sozinha. – a voz falou.

            - Vou perguntar apenas mais uma vez: quem é você? Por que oculta sua face? Tem algo a esconder ou é apenas covarde? – Selene desafiou, sentindo seu Cosmo ferver.

            - Não achou suficiente roubar os poderes dele, não é mesmo? Precisava toma-lo para si, sua insolente! Não conhece Rozan, não o conhece de fato. Mal sabe tudo o que passou e a dor que deve estar carregando nesse momento. Atena, aquela garota egoísta ainda o sobrecarrega com mais obrigações, mesmo que todos tenham ido ao Inferno por ela! – a pessoa gritava, claramente fora de controle. A voz adquirira tons femininos e uma suspeita terrível caiu sobre Selene. Poderia ser ela? Não, não queria acreditar naquilo.

            - Refere-se a Shiryu? Pois sei que não importa o que ele tenha passado, ou quão pesado seja o fardo que carregue, seus deveres de Cavaleiro sempre estarão à frente de qualquer coisa em sua vida. Acho que conheço o que de fato importa. – Selene respondeu.

            - Ficou confortável em meu quarto, ladra? – a mulher perguntou com ironia e malícia na voz. Num gesto raivoso, puxou o capuz e revelou sua cabeleira longa e negra.

            - Não posso acreditar! Não! – Selene ficou atônita diante de Shunrei. A bondosa e altruísta Shunrei? Aquela que orara por Shiryu e o salvara de tantas adversidades, que cuidara do Mestre Ancião e esperara pela volta do Dragão inúmeras vezes? Não poderia crer que estivesse ali, e ostentando um olhar tão maligno.

            - Suas negativas são pela surpresa em me ver ou por não suportar que eu esteja viva, de volta? Já contava como certa sua vitória, espalhando seus feitiços sobre os pobres guerreiros em Rozan, não é mesmo? – ela olhava para Selene, enojada.

            - Não sei do está falando, Shunrei. Por que desapareceu e resolveu retornar dessa maneira? Acha que Shiryu não ficará entristecido ao vê-la tomada pelo mal? E, se esteve observando por tanto tempo, não viu o quanto sofri sendo a única mulher dentre tantos guerreiros, nem todos de boa índole? Você, mais do que qualquer pessoa deveria compreender. – Selene tentava argumentar, mesmo que em vão com uma aparentemente ensandecida Shunrei.

            - Vi como tentou seduzir, primeiro os soldados e depois meu pobre Shiryu. Passei anos ao seu lado, derramei inúmeras lágrimas por ele. Sei que o que Atena e você estão fazendo estão corrompendo sua natureza pura e pacífica. – Shunrei dizia, entredentes, sua revolta gotejando ódio.

            -  Sempre se rebaixando em relação aos homens, Shunrei. Tenho pena que pense assim. Somos tão capazes de lutar e temos tanto direito a compor exércitos e trincheiras quanto eles. Sabe que existem Amazonas notáveis como Shina e Marin. Não entendo a razão para ter se resignado ao papel de mera espectadora enquanto tinha Mestre Dohko a sua disposição para ensina-la, como fez com Shiryu. Sua rebelião contra Atena o faria derramar lágrimas por você. Algo deve ter acontecido para tê-la mudado tanto...

            - Cale-se! – Shunrei a interrompeu. – Não é de sua conta o que me aconteceu! Já se intrometeu em demasia em nossas vidas. Sua presença, uma cobra sedutora e ímpia e a corja de soldados rasos invadindo Rozan é uma afronta ao Mestre e a vida pacífica que Shiryu almejava construir aqui. Vocês e Atena nos roubaram essa oportunidade. Pagarão por isso.

            - Shunrei, não desejo machuca-la. Creio que deve encontrar-se com Shiryu e levar suas queixas até ele. Desfaça esta ilusão ou o que for esta dimensão para onde nos trouxe. – Selene pediu, na esperança de dissuadir a moça sem precisar apelar para a força. A amiga de infância de Shiryu era conhecida por sua fragilidade.

                Shunrei, cujos olhos eram de um azul profundo faiscaram para ela. O tecido do espaço se distorceu novamente e mais alguém juntou-se ao embate.

            - Conhece Dimitri, não é, Selene? – perguntou Shunrei para uma estarrecida Selene. Dimitri saltou jogando a túnica com capuz para trás, exibindo nada menos do que uma armadura. Então, havia sido ele quem aparecera ainda em Rozan e cujos pés calçados Selene tinha conseguido notar antes de ser transportada até ali. Mas, como alguém como Dimitri poderia ser digno de uma armadura? Qual era a relação que tinha com Shunrei?

            Dimitri a olhava triunfante, com uma armadura um pouco diferente daquelas concedidas aos Cavaleiros de Atena. O seu traje de guerra não tinha a elegância ou a graciosidade das Armaduras conhecidas, nem mesmo as de Ouro. Era grande e grosseira, deixava Dimitri muitos centímetros mais alto e largo. Lembrava a aparência de um tanque, mas feito de rochas. Enquanto os guerreiros normalmente protegiam-se com metais resistentes, aparentemente aquela armadura tinha uma origem muito diferente e, pior, desconhecida.

            - Dimitri? O que significa isso? Que... armadura é esta? – perguntou a moça, balbuciando.

            - Uma muito melhor do que de seu Shiryu, concedida por um deus muito melhor do que Atena e aquela que dará um fim à sua existência patética. Conseguiu compreender o que disse, garotinha? – ele zombou, abaixando o corpo, como se falasse à uma criança.

            - Olhe, a falação de ambos já me cansou. Pouco me importam seus motivos, suas mágoas ou alianças. Já disse à Shunrei que me levasse de volta. Ainda há tempo de fazerem a coisa certa. Sabe que já o feri uma vez, Dimitri. – Selene ameaçou, sentindo mais uma vez o Cosmo crescendo dentro dela.

            - Selene, este lugar será seu túmulo. Claro, é uma força de expressão, já que não sobrará uma molécula sua. Vamos apagar sua essência até não restar qualquer traço de sua passagem pela Terra. Depois, vamos demover Shiryu de sua lealdade cega à essa deusa fraca e egoísta que é Atena. Quando vi que Hades estava prestes a destruir o mundo, resolvi parar de orar inutilmente e procurei pela ajuda do maior dos deuses: Zeus. Entretanto, Shiryu conseguiu retornar com vida antes que eu retornasse do monte Olimpo, onde me encontrei com o Pai dos Deuses. – Shunrei enfim contava com orgulho sua misteriosa jornada.

            - Certo, resolveu seguir essa entidade que supostamente é Zeus. E por que aliar-se a Dimitri, um dos menos honrosos homens em Rozan? – Selene perguntou, já exausta daquela loucura que Shunrei estava armando. – Bem, não me importa. Já até Shiryu e diga a ele o que está me contando. Verá o quão insana sua mente se tornou. Creio ser a menos indicada para tentar mostrar a você e ainda menos a Dimitri. – ela bufou, demonstrando toda sua impaciência. 

            - Eu lhe mostrarei o que é insanidade, Selene. – Dimitri se postou a frente de Shunrei. Ela exibiu um sorriso de aprovação e assentiu para que ele prosseguisse.

            - Agora já basta. Quer lutar? Esconda-se atrás de rochas, armaduras e o que quiser, Dimitri. O que determina a vitória são os Cosmos dos Cavaleiros e não seus trajes. Pode vir! – ela assumiu sua postura de batalha.

            - Ouviu, Srta. Shunrei? Ela se denomina Amazona! Você me surpreende com o potencial que tem para ser ridícula, Selene. – dito isso, ele ergueu o punho gigantesco recoberto por pedras irregulares e pontiagudas. – Conheça o poder da Armadura de Titã! Punhos de Zeus!

            Dimitri socou o que parecia ser o solo em que pousavam os pés. A reverberação jogou Selene para trás. Contudo, ela aprendera a cair. Apoiando uma das mãos no chão, ela girou o corpo agachada e com um impulso das pernas, já estava em pé novamente. Seu Cosmo a envolvia e crescia metros acima dela. Era incrível que o golpe que recebera não a despedaçou.

            - Já lhe disse que não adianta, criatura baixa! Seu coração é impuro e corrompido, não há como vencer. – ela correu em direção a Dimitri, o que poderia ser considerado um ato suicida, se a garota não soubesse exatamente o que fazia.

            Selene pulou, impulsionada pelo Cosmo forte que possuía. Apoiou-se no ombros de Dimitri e agarrando-os com força. Descendo as pernas para baixo, ela puxou o Cavaleiro inimigo consigo. Dimitri foi ao chão, tendo seu traje rachado nos ombros onde ela havia tocado e uma fenda abrindo-se por seu peito expondo seu tórax. Selene avançou sobre ele com um sorriso no rosto. Dimitri arfava, em busca de ar. Fechou os olhos quando percebeu o que seu peitoral receberia.

            - Rozan Sho Ryu Ha! (Cólera do dragão)! – ela gritou, baixando o punho no derradeiro golpe contra o tão odioso adversário.

            O sangue jorrou do corpo de Dimitri. Talvez estive morto, Selene não se preocuparia com aquilo agora. Ela se voltou para Shunrei. Caminhando para ela, Selene respirava pesadamente e seu Cosmo brilhava resplandecente.

            - Vá, em frente, me ataque. – Shunrei provocou.

            Selene a ergueu pelo pescoço. Ambas tinham quase a mesma altura, porém a força de uma delas fazia seu tamanho parecer muito maior.

            - Cesse a ilusão. Nos leve de volta, Shunrei. Não quero, porém a matarei se preciso. – Selene falou, a voz ecoando e reverberando por causa de seu Cosmo.

            - Seus atos a levarão por... caminhos irreversíveis... Selene. – Shunrei conseguiu articular, mesmo sendo quase estrangulada.

            Como num piscar de olhos, a luz do sol voltara a brilhar e os ventos de Rozan batiam contra os cabelos e o rosto de Selene.

            Ela ainda questionava se aquilo tudo seria um sonho. Mas percebeu que havia terra e pequenos pedaços de rocha entre seus dedos. Tudo havia sido real. Devastador e real.


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