Cyberpunk escrita por Einhasad


Capítulo 2
Os Grounders




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 Blizzard já estava há algumas milhas quando olhei para trás, naquela tarde. Caminhávamos em um ritmo calmo. Gus estava atrás de nós e tinha o passo mais lento, parando para olhar para trás mais do que uma vez. Ele estava com saudades.

— Vai ficar tudo bem. Vamos voltar – tentei consolá-lo. - nossa mãe está segura, por enquanto. Sabe disso.

Não, ele não sabia. E nem eu. As coisas estavam terríveis… quanto mais demorávamos, menores ficavam as chances de sobrevivência dela. E o caos em Blizzard poderia estourar a qualquer momento. Guerras civis eram mais comuns que resfriados naqueles tempos sombrios em que viviamos.

— Leah… - meu irmão disse, com a voz baixa, retomando os passos – você acha que… papai sabe de tudo isso? Do que Blizzard se tornou? De como estamos?

— Não seja bobo. Se ele soubesse, seria o primeiro a vir nos ajudar. Ele não nos deixaria dessa forma – respondi. Nosso pai foi um homem muito bom para nós. Foi graças a ele que tivemos uma ótima vida enquanto Blizzard ainda estava em harmonia. Ele nos deu todo estudo que precisávamos, nos alimentou e… sempre amou nossa mãe. Ele não poderia ter nos abandonado, e o único motivo para não ter voltado até agora é que definitivamente não sabe o que está acontecendo.

A cidade atrás de nós tornava-se cada vez menor.

— Por que ele se foi? - perguntou Gus. Meu coração apertou-se. Eu não sabia responder aquilo. Gus tinha só seis anos quando papai se foi. Eu tinha dezesseis. Lembro-me que alguns soldados do império bateram em nossa porta. Ouvi uma conversa sobre algum assunto urgente, e o levaram. Minha mãe chorava bastante. Papai sorria, acariciou os cabelos castanhos e atrapalhados de Gus, sussurrou algo no ouvido da mamãe e, para mim, deu um colar que ele usava com o símbolo do corpo de engenheiros do governo. Disse que ficaria tudo bem, e que eu deveria cuidar de todos ate que voltasse. Mas… ele não voltou.

— Bem, não importa. Vamos encontrá-lo. E vamos conseguir uma cura para a mamãe – respondi, finalmente, reconfortando Gus.

A noite estava caindo. O sol já desaparecia aos poucos no horizonte, e o vento começava a apagar nossas pegadas na areia. Blizzard, atrás de nós, já não passava de um mero ponto brilhante, refletindo toda a luz elétrica da cidade. De onde estávamos, não era possível sequer imaginar que haviam tantas pessoas ali, em um pequeno pixel solitário de luz no meio do deserto. Nossa meta era encontrar o povoado de Ground, um grupo ancião que rejeitou a segurança oferecida pelo império e vive ao seu próprio modo e costume.

Os boatos eram que eles tinham a cura para todos os males conhecidos até então. Razão esta que explicaria o fato de viverem tanto em um mundo caótico. O único problema é que, ao que tudo indicava, eles era nômades. Não sabemos ao certo onde encontrá-los. Existem alguns registros aqui e ali de onde foram vistos pela última vez, e só. Estávamos perdidos.

— Devemos descansar. Está ficando escuro. Em alguns minutos não vamos mais conseguir enxergar nada se não montarmos um acampamento agora – disse, parando de andar e virando-me para observar o local onde estávamos. Não havia muita coisa de especial. Haviam dunas por todos os lados, ossos de animais há muito levados pela natureza e areia. Por toda a parte.

— É – concordou Gus, tirando a mochila das costas e abrindo-a, retirando um pequeno bastão com um orifício na extremidade. Funcionava como um fósforo, mas acendia com um clique e permanecia aceso enquanto houvesse oxigênio no ar. Bem útil, se quer saber – acho melhor acender isso logo – disse, pressionando o botão e acendendo uma fogueira bem agradável, tirando-nos do frio provocado pelos ventos da região. Sentei-me próxima a fogueira e me deitei, olhando para o alto. Gus pegou algum armamento dentro da mochila e encostou-se em mim – durma um pouco, Leah, posso cuidar de você se alguma coisa aparecer. Depois podemos trocar.

— Sim, obrigada, Gus – respondi. Gus havia crescido tanto em tão pouco tempo. Não… o mundo o obrigou a crescer, na verdade – boa noite, Gus – precisávamos descansar, de fato. No dia seguinte faríamos de tudo para encontrar os Grounders. Suspirei e, depois de dar uma última olhada em direção ao ponto brilhante no horizonte, fechei os olhos.

 

* * *

 

Leah…

Consegue me ouvir?

Quando o sol escurecer

Quando o último pássaro da manhã cantar

Quando nenhuma flor florescer

Quando a noite eterna cair

Tudo estará acabado…

Encontre-me.

Encontre-me.

Encontre-me.

Antes que seja tarde.

Leah…

 

* * *

 

— LEAH! ACORDE! - meus olhos saltaram com o grito de Gus para me acordar. Havia se passado quanto tempo desde que adormeci? E que sonho foi aquele? Foi mesmo um sonho?

— O que foi, Gus? - sussurrei, ainda sonolenta e abrindo os olhos aos poucos, quando uma imagem pouco distante de mim se formou. Havia um homem mascarado montado a um cavalo segurando Gus pelo braço, levantando-o. Saltei imediatamente – Quem é você? Solte ele, agora! - gritei. O mascarado pareceu não se importar. Procurei alguma coisa que servisse como arma por perto, mas a mochila havia desaparecido.

— Você não precisa de uma arma – respondeu o mascarado, mantendo a mesma postura de antes. Meus olhos se apertaram em direção a ele e meu coração batia ainda mais rápido. Eu não podia perder o Gus – quem são vocês? - ele perguntou.

— Somos de Blizzard. Por favor, solte meu irmão. Não temos assunto nenhum com você – respondi, temerosa.

— E porque duas crianças de Blizzard estão tão longe da cidade imperial? - perguntou, ignorando meu pedido.

— Buscamos por ajuda. Para nossa mãe. Só… isso. - respondi, novamente.

— Ajuda?

— Sim. Ela está doente… e não há cura até então. Procurávamos os Grounders.

— Os Grounders? - o homem riu escandalosamente, colocando Gus de volta ao chão, que afastou-se rapidamente em minha direção – ora, menina, os Grounders...

— Eles ainda existem. E estão por aqui, sei que estão! – gritou Gus antes que o mascarado terminasse de falar. Ele provavelmente diria que não existem mais, que já estão mortos há tempos. Era o que todos acreditavam. Ele pareceu não se importar. Parou de rir e fitou-me através da fenda em sua máscara de pano.

— Eu ia dizer que vocês tem sorte, crianças – ele respondeu em um tom satisfatório. Arregalei os olhos enquanto o mesmo puxava a máscara de pano para baixo, revelando um rosto com tatuagens de símbolos estranhos em seu rosto – você acabou de encontrar o último Grounder.


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Notas finais do capítulo

Peço desculpas pela demora (4 meses pode ser considerado demora?) Eu precisava de um pouco mais de inspiração. Todos os capítulos já estão escritos, mas vivo revisando eles e mudando coisas aqui e acolá. Anyway, eu espero realmente que gostem desse. =^-^=



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