Guardião Celeste escrita por Larissa Irassochio


Capítulo 3
Capítulo 2 - Estranho do Céu




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Ela se sentou e esfregou um dos olhos com uma expressão de dor, mas tudo pareceu melhorar quando o café chegou. Ela bebericou e olhou para ele, esperando que falasse algo.
– Então, quem é você? E ah, o que você quer? - ela perguntou com arrogância, mas sua mão foi a centímetros do rosto dele com um sinal de pare - Eu lembro seu nome. Jace?
– Jamiel, e você? Quem é você?
– Alycia - bebeu mais um gole do café e voltou a falar - Então, o que você quer? Porque me salvou e porque foi atrás de mim?
– Muitas perguntas - sorriu - Porque tentou se matar?
Então, ela se fechou, recuou e manteve o olhar no café.
– Se isso for responder as minhas perguntas: meu irmão morreu.
Jamiel sentiu como se uma golfada de ar tivesse sido tirada dele. Sentiu-se culpado.
– Desculpa. Eu... eu sinto muito. - disse como se toda dor que ela sentia fosse ir embora.
Ela deu de ombros tentando parecer que não se importava, mas no fundo, se importava. Tudo o que sentia era dor, solidão, mas queria parecer forte o bastante para aguentar isso.
– Ah, é. Tudo bem - ela dava o máximo de si para parecer arrogante - Quando é que vai me contar o porque de tudo isso?
– Você vai me achar louco se eu te contar - o olhar dele se abaixou para a xícara.
Ela riu sarcástica.
– Já te acho louco.
Então, ele olhou para a rua e viu apenas como a cidade parecia triste e cinza no inverno. Pediu, pediu com sua maior fé.
– Me ajude. Me ajude a mostrar para ela que isso é real.
A chuva que caía lá fora tinha parado, as pessoas a sua volta paralizadas, menos ele e Alycia. Ela olhou ao redor assustada. Seus olhos se arregalaram para Jamiel perguntando o que estava acontecendo e depois, soltou um gritinho ao ver a criatura de asas sentado junto com eles.
– Quem... o que... você é? - perguntou se encostando ao máximo na cadeira.
Jamiel parecia se divertir ao ver as reações dela. Imaginou então como seria se ela visse um demônio, teria um infarto, provavelmente.
– Eu sou um anjo. Um anjo do Senhor. Assim como Jamiel é - Casper respondeu com calma, cruzando as mãos na mesa.
Ela levantou a mão trêmula e tocou o rosto do anjo, os olhos interessados nas perfeitas feições. Casper fechou os olhos ao receber o carinho da moça, sorriu e colocou a própria mão sobre a dela.
– Jamiel está aqui para ser o seu Guardião, Alycia. Ele o ajudará sempre e em tudo o que precisar. Ele será sua luz quando as coisas estiverem difíceis. Jamiel cuidará muito bem de você, ele te protegerá a partir de agora.
Ela retirou a mão com calma e olhou para o rapaz ao lado dela, o tal Guardião, então, tudo voltou ao normal. A chuva voltou a cair e as pessoas a falar, e o Anjo Casper não estava mais lá.
– Isso foi um sonho, não é mesmo? - ela perguntou com uma risada nervosa.
– Não - ele foi frio.

Ela o seguiu pelas ruas úmidas e sujas da parte mais pobre da cidade. Ele de certa forma, temia que ela sentisse nojo após isso, mas não. Alycia tinha crescido em um bairro tão pobre quanto aquele, e a pensão que Jamiel vivia era muito melhor que a casa que ela morou quando criança.
O quarto do rapaz estava desarrumado. Ele abriu a janela para que os dois não morressem sufocados ali, juntou as poucas peças de roupa que tinha e alguns pertences e colocou-os em uma mochila que mais parecia uma mala.
Ela o encarou incrédula quando ele disse que já estava pronto, mas de certa forma entendeu o porque de ele ter poucas coisas, mas continuava a se sentir insegura em colocar um estranho no próprio apartamento e a briga que eles tiveram logo a pós a saída de Casper sobre isso não tinha sido boa.
O apartamento dela não era tão diferente do quarto dele. Era uma bagunça de telas e tintas, papéis e lápis de cor. Jamiel encarou aquilo maravilhado: eram tantas pinturas e desenhos magnificos que por um momento desejou ser um deles, mas logo reprimiu o sentimento, queria voltar a ser um Anjo, e anjos não tinham sentimentos tão humanos.
– É um pouco difícil se é o que está pensando - ele a encarou com um olhar de quem perguntava o que ela estava falando - Você estava pensando como eu ganho a vida, né? Sim, é com a venda da minha arte. É difícil, tem meses que não tenho o que comer - ela sorriu envergonhada com aquilo.
Ele apenas balançou a cabeça reflexivo. Não sabia se devia conforta-la ou não. Não sabia nem ao menos o que um Anjo Guardião fazia. Sempre foi um Anjo Guerreiro, tinha nascido pra lutar e não proteger.
– Bom, eu não tenho um quarto sobrando, então... - ela mordeu os lábios preocupada com onde iria colocar um garoto - Você pode dormir na sala, ou no meu quarto - levantou as mãos para o alto depressa - Não estou insinuando nada, apenas... quis te ajudar - ela parecia mais embaraçada a cada vez que tentava explicar.
– Tudo bem, eu entendi - ele riu baixinho - Não me importo em dormir na sala. Acho que seria mais... apropriado e não iria lhe encomodar - tentava dar o máximo de si para ser simpático sem demonstrar reações humanas.
Ela acenou com a cabeça e seguiu para o quarto.

Já estava na hora da janta quando ela saiu do quarto, as mãos sujas de tinta e o cabelo preso embaraçado. Sorriu ao ver o garoto na varanda observando o final do dia, um final de dia comum.
Ele só foi notar a presença da Alycia quando ela disse que o jantar estava pronto. Era macarrão e eles comeram sentados no sofá, tentando ao máximo não se encarar.
– Porque você está aqui? Quero dizer, na terra, como um humano - ela perguntou afastando o prato e cruzando as pernas como um índio.
– Não acho que isso te diga a respeito - respondeu vidrando o olhar em um dos quadros. Era uma mistura de cores e rabiscos que formava um rosto.
– Você fez algo tão ruim? - o olhar dela era provocante - Um Anjo do Senhor, vocês deviam ser tão certinhos... Não é? - sorria maliciosa.
Ele fechou os olhos e tomou todo o ar que pode. Tinha que se controlar.
– Você pecou? Isso te torna um Anjo Caído...
Tinha que se controlar.
– Se rebelou contra o Pai? Matou alguém no Céu?
Tinha que se controlar.
Um Anjo do Senhor, vocês deviam ser tão certinhos... Se rebelou contra o Pai?
– EU ME APAIXONEI POR UMA HUMANA, TÁ LEGAL? - berrou - EU SENTI ATRAÇÃO POR UMA HUMANA. EU FIZ O QUE ERA PROIBIDO. PROVEI SENTIMENTOS HUMANOS.
Ela o olhou com pena. Sabia que estava errada, sempre errava, não era uma novidade. Ele apoiou o rosto contra a palma das mãos e quis chorar, porque tudo o que sentia eram sensações humanas.
– Tá tudo bem, você apenas... fraquejou - ela se ajoelhou na frente dele.
Ela tinha grandes olhos escuros e um cabelo que parecia um emaranhado de ratos, mas isso a deixava mais bonita. O toque dela, a forma que ela o tratava era tão... pessoal, próximo, como se conhecessem a anos.
– Eu pequei - os lábios tinham se tornado uma linha fina - Não quero pecar novamente - e se afastou da garota, no mesmo momento ela recuou.
– Sinto muito. Não quis ser chata - ela se sentou e entrelaçou as próprias mãos.
O silêncio era cortante. Agonizava os dois.
– Não acho que seja a parte mais difícil de eu voltar para o céu. Quero dizer, não acho que cuidar de você seja a parte mais difícil - disse em um tom monótono.
– Tem algo a mais que isso? - ela perguntou como se adivinhasse.
– Tenho que recuperar minhas asas - ele levantou uma sobrancelha para Alycia, ela retribui entendendo o quanto devia ser complicado achar o que ele queria.
Ela ficou impaciente, ansiosa e nervosa após a briga que teve com o rapaz. Não demorou muito para que ela se despedisse dele e fosse se deitar, o olhar de Jamiel seguiu ela até o quarto por onde ela ficou trancada até o outro dia de manhã.
Aquela noite Alycia demorou a dormir. Todos os seus pensamentos tinham sido para Jamiel. Ela sabia que ele era um Anjo, mas a forma que ele a olhava a deixava intrigada. Ela queria toca-lo, senti-lo, ter ele... Balançou a cabeça ao perceber as impurezas que pensava, ele era um criatura celestial que estava ali por um motivo semelhante(senão igual) ao dela.
Para Jamiel, aquela noite não tinha sido muito complicada em questões humanas. Dormir sempre tinha sido um desafio para ele, mas agora estava pior: Alycia. Era nisso que ele pensava, a forma que ela falava, andava, ria... Tudo isso parecia um furacão que destruia as chances de ele ir para o céu.


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