Abel terminava de escrever seu discurso de coroação:

‘’E, neste fatídico dia, é com muita tristeza que assumo o trono. Queria que fosse diferente. Queria que meus pais estivessem vivos. Não tenho raiva de Miriam, mas preciso que ela pague pelo que fez. Prometo ser um rei bom como meu pai’’

Ele elaborava cada frase com um sorriso no rosto. Finalmente, seu dia chegou. Ele havia planejado a execução pública de Miriam logo depois de sua coroação, mas não contava com sua fuga. Tinha mandado um regimento inteiro de soldados atrás dela e dos gêmeos, e contava com eles para ver Miriam morrer.

Enquanto isso, Miriam despertava lentamente. Estava exausta emocionalmente. Ainda estava frio. Ela começou a pensar no que fazer. Tinha consciência de que estava sendo procurada, então precisava mudar sua aparência. Pegou duas pedras e afiou uma, até ficar cortante. Então, passou pelo cabelo, cortando com alguma dificuldade- a pedra, apesar de ser afiada, não era como uma espada ou faca. Quando terminou, seu cabelo estava um pouco acima do pescoço. Ela suspirou. Não era suficiente. Precisava garantir que ninguém a reconhecesse á primeira vista. Fez um leve corte atravessando o rosto, diagonalmente. Doía mais no frio, mas ela não se importou. Rasgou um pedaço do pijama e estancou o sangramento. Quando ele parou, ela tinha certeza de que agora poderia seguir em frente. Mas, por garantia, precisava de um capuz para esconder seu rosto.

Mudando seu jeito de andar, ela foi até a casa de um costureiro conhecido- Ele não estava presente, claro, tinha ido ver a coroação- Roubou um casaco com capuz, vestiu, abotoou- O casaco era quente e a ajudou no frio do inverno- Colocou o capuz, o máximo que pode, roubou um par de sapatos, e seguiu em frente, de cabeça baixa. Iria ver a coroação, mas não iria se revelar. Precisava de um plano. Seguiu até o castelo, entrou- Por sorte, não foi notada pelos guardas- Foi até a sala do trono e se misturou á multidão.

No momento seguinte, Abel apareceu, com um manto vermelho nas costas e uma roupa apropriada. Sentou-se no trono. Era seguido por Drian e Aley, que ficaram em pé ao seu lado. Em seguida, um homem carregando a coroa em uma almofada. Abel levantou-se, se agachou, e a coroa foi colocada na sua cabeça por esse homem. Ele ficou em pé novamente, enquanto o homem falava:

–Saúdem o novo rei!

Foi ouvido um coro de ‘’Viva Abel, nosso novo monarca’’, mas Miriam ficou quieta. O homem, Drian, e Aley fizeram uma reverência para Abel, que sentou em seu trono novamente e começou seu discurso. Quando ele começou a falar dos pais e de Miriam, ela travou os lábios e se controlou para não chorar. Falso. Por fim, ele completou instituindo uma semana de luto pela morte de seus pais. Assim que ele terminou, todos no recinto fizeram uma reverência, e Miriam foi obrigada a fazer isso também, para não ser notada. Em seguida, ela foi junto com a multidão que se retirava.

Ao se encontrar fora do palácio, ela começou a pensar no que deveria fazer. Mesmo tendo alterado sua aparência, ela poderia facilmente ser reconhecida.

Kevin e Kedson tinham ido para uma outra vila do reino. Eles também tinham consciência de que estavam sendo procurados, então mudaram sua aparência usando os mesmos truques de Miriam. Porém, naquela vila, era mais difícil que os reconhecessem, além do que a maioria dos soldados estavam concentrados em achar Miriam. Olharam um para o outro

–Ok, vamos mudar nossos nomes. Se alguém perguntar- Kevin começou- Eu sou Phillip Hans e você é Jonathan Hans. Entendeu?

–Sim- Kedson respondeu- Mas precisamos achar uma forma de ajudar Miriam.

–Não vamos conseguir achá-la antes de Abel. Mas você tem razão.

–Precisamos, antes, nos estabilizar. Emprego. Um lugar para ficar.

Kevin concordou. Foram em direção á uma estalagem. Kedson começou, forçando a voz para parecer mais grossa:

–Hum, eu sou Jonathan Hans e esse é meu irmão, Phillip. Estamos chegando de viagem e queríamos um emprego e um lugar para ficar.

A dona da estalagem, uma mulher idosa e míope, disse:

–Vocês dois são bem-vindos aqui. Podem trabalhar limpando o lugar, e em troca terão moradia, comida e algum dinheiro.

–Obrigado, senhora. Quando começamos?

–Vocês dois devem estar cansados, durmam um pouco- A senhora entregou uma chave- Quarto 32, último andar. Lá tem algumas roupas e um banheiro, além de duas camas. Mais tarde vocês dois começam o serviço. A propósito, sou Dorothy Arnold.

Os dois agradeceram e foram para o quarto indicado. Tomaram um banho, vestiram-se e deitaram-se, mas não conseguiram dormir, pelo menos não de imediato. Ficaram, cada um em seu silêncio, pensando em Miriam. E Abel. Seus pais. Tudo que aconteceu nas últimas horas. Eles sabiam que Abel estava, a uma hora dessas, sendo coroado. Por fim, adormeceram. Conseguiram recuperar as horas de sono perdidas antes que a senhora Arnold os chamasse para começarem o trabalho.

Abel estava no palácio, acompanhando o enterro dos pais- Uma cerimônia reservada apenas para a família real, amigos próximos e o coveiro. Ele assistiu os antigos monarcas serem sepultados em silêncio. Em seguida, ele começa a instituir uma série de decretos, que garantiam seu poder e seus benefícios pessoais, sem se importar com o povo.

Seu reinado estava apenas começando.

Enquanto isso, Miriam estava sentada num beco, cantarolando uma música que sua mãe havia lhe ensinado. Estava morrendo de fome. Não tinha uma moeda para comprar algo. Mas não podia ficar ali, definhando. Foi para o bosque, montou um arco e uma flecha- Sempre gostou de brincar com isso na infância, o que ajudou- E começou a caçar. Conseguiu pegar um coelho e, se sentindo mal(odiava ferir os animais), o limpou, acendeu uma fogueira e assou. Comeu lentamente, com a cabeça doendo.

Abel estava furioso.

–Como vocês ainda não a capturaram?

–Majestade, ela não apareceu para ninguém ainda.

–Bom, não importa. Se não a pegarmos, ela vai morrer, mais cedo ou mais tarde. Continuem procurando.