CAPITULO TRÊS
A proposta

Eu costumava ver as estrelas quando era pequeno.

Não se tratava apenas de um hobby ou um lazer. Era como um pequeno manual de sobrevivência. As figuras, os formatos e seu brilho, sua localização distinta nos trópicos e o modo como algumas apareciam no inverno e sumiam no verão... Tudo, poderia se tornar um indicativo para me encontrar no mar ou na terra.

Suspirei, enquanto as observava distraído. Mesmo com a modernidade que esse estranho mundo poderia oferecer ainda não me adaptara a ele, preferindo o que a natureza me oferecia.

No momento elas me mostravam que o centro da noite já havia se despedindo, dando lugar a uma madrugada abandonada. Mesmo com a esperança minguada, ainda me apegava a esse sentimento, como um nômade sedento no deserto se agarrava a um cantil vazio. Era tolice, mas era a única coisa que fazia com que não desistisse da vida naquele instante.

–Admirando as estrelas, Capitão?- Indagou uma voz atrás de mim.

Vir-me-ei atento. O tom vocal era insinuante e feminino, um sopro sonoro. Tinha certeza que nunca havia ouvido nada semelhante antes, pois tratava de algo que um humano jamais esqueceria.

–Pensei que não viria- Confessei, enquanto observava com cuidado minha nova convidada. Jovem e esbelta, pele álgida embora possuísse o fulgor sutil do sol e do verão. Os cabelos louros e longos escorriam numa cascata reta e sem ondas estas, porém, impregnadas no tom marítimo dos seus olhos grandes e demarcadas com uma maquiagem leve e rosácea. Mas, o que mais me chamava à atenção era o odor de sal e umidade, que fluía como um perfume de conchas e rochas pela superfície corpórea e fina da donzela.

–Nunca esperei ser visitado por uma sereia- Comentei, erguendo uma sobrancelha.

Ela enrugou os lábios, atenta e curiosa pela minha rápida dedução.

–Perdoe-me minha demora, Sir- Desculpou-se num tom eclético e singular- Tive motivos pertinentes para meu atraso.

–O que você quer?- Odiava conversas prolongadas. Queria ir direto ao ponto.

–O que você daria para ter Emma de volta?

A pergunta foi como um tapa. Forte e dolorido. Ela havia acertado meu ponto fraco, um coração estilhaçado.

–Qualquer coisa- Respondi, sem mesmo pensar no peso daquela resposta. Não havia porque ponderar nas considerações ou como iria dizer aquilo. Era uma resposta direta que eu daria de qualquer forma.

–Acho que chegamos ao ponto principal.- Ela sorriu, um sorriso travesso.

–O que uma sereia quer de um pirata?

A sereia encarou-me.

–Nem eu ou minhas irmãs necessitam de um serviço de um pirata.-Murmurou com escárnio e acidez- Não é o que faz ou roubou que nos interessa. Não sacrificaria meu sangue nem ao menos daria o que você quer, caso se tratasse disso- Ela suspirou, uma mecha de cabelo loiro caindo sobre sua face- È quem você é e o que você conhece.

–Mas...

–A Terra do Nunca está morrendo.-A tristeza tornou-se impar em sua voz melodiosa- Sem Peter, depois de sua terrível e inesperada morte, o nosso mundo... O único que alguém com nossa linhagem e de tantas outras poderiam sobreviver... Está se desmoronando. Incapaz de se alto sustentar sem uma fonte pura e jovem de conhecimento e juventude completa e eterna.

–Peter era um jovem cruel e assassino. Ele merecia morrer- Murmurei, sem conseguir conter aquela afirmação.

–Não estou falando que suas atitudes eram corretas- Interpôs à jovem –Mas sua morte causou muitos prejuízos. Dezenas já perderam sua vida. Inocentes estão caindo pela fraqueza de nossa ilha- Ela se tornou mais rígida, seus ombros mais tensos- Não posso deixar isso continuar.

–E qual é o seu plano?

–Precisamos de uma nova alma jovem e eterna para assumir o lugar de Peter. Alguém que possua uma sincronia impar com a Terra do Nunca.

Segurei a respiração para não rir loucamente.

–Desculpe, mas... –Pigarreei, tentando voltar a compostura- Acho que ressuscitar os mortos...

–Não- Ela interrompeu-me- Eu... Preciso de outro para essa tarefa, de preferência alguém vivo.

–Alguém que possa substituir magicamente Peter... Uma alma jovem...- Falei em voz alta, notando o quão maluco aquilo ressoava-E esse alguém existe?- Estava me segurando para não dar meia volta e sair saltitando para longe daquela lunática.

–Sim- Ela acenou- Você