O Contador de Histórias escrita por themuggleriddle


Capítulo 2
O Bruxo de Yorkshire


Notas iniciais do capítulo

Deixo isso aqui para vocês com um feliz natal nesse 2015 que está demorando demais para acabar.



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Tom acordou com o som de passos. Na verdade, parecia que havia alguém pulando perto da onde estava e a cada som abafado contra o chão de pedra, o homem ia se lembrando das últimas coisas que haviam acontecido: seus pais mortos, seu filho, a cabana estranha, o homem estranho empunhando uma varinha como a de Merope, 1421, ele perdendo a consciência…

‘Mantenha a calma,’ pensou ao sentir o coração começar a acelerar de novo.

Respirou fundo uma, duas, três vezes, antes de abrir os olhos e encarar o teto de palha. Acima da cama onde estava deitado, havia diversos penduricalhos: penas de corvos presas em cordões, pedaços de madeira e vidro em móbiles esquisitos, algo que parecia ser o esqueleto completo de um pássaro... Era estranho e interessante ao mesmo tempo. Quando finalmente virou o rosto para ver quem é que estava fazendo aquele barulho quase irritante de passos, tudo o que Riddle pôde fazer foi arregalar os olhos e ficar estático por um momento, antes de sentar-se com muito cuidado.

Havia um caldeirão ali. Um caldeirão escuro e simples, mas com um pé que parecia brotar do fundo deste e que o mantinha em pé e saltitante. O objeto começou a pular mais rápido, como se estivesse animado com a atenção que tinha agora, e Tom, talvez em um lapso de insanidade, saiu de cima da cama e ajoelhou-se no chão, abaixando-se até conseguir olhar melhor o membro adjacente ao caldeirão.

Parecia um pé humano... Tinha pele e unhas e até a pele mais espessa nos lados, como se fossem calos formados ao longo dos anos. E, do ângulo que conseguia olhar, ele parecia simplesmente estar encaixado no fundo do caldeirão, a pele do tornozelo se estendendo mais um pouco como se estivesse agarrada ao metal.

“O que diabos...?” o homem murmurou, antes de se afastar e observar o objeto de longe novamente.

“Meu pai me deixou isso aí.”

Tom deu um pulo para se encostar o máximo que podia contra a cama e virou-se rapidamente, vendo o homem do qual se lembrava parado na porta da cabana. Ele usava um chapéu pontudo que seria o tipo de coisa que as crianças usariam no Halloween e tinha a túnica amarela suja de terra nas barras e nos joelhos. Parte de sua mente já gritava para ele tomar cuidado e sair correndo dali assim que tivesse a primeira chance.

“Como está o braço?” perguntou Evert, colocando a cesta que carregava em cima da mesa e analisando o conteúdo desta por um momento, antes de começar a tirar alguns cogumelos dali de dentro. "Desculpe, tive que apagá-lo por algumas horas depois que você se desesperou..."

“O braço...?” Tom olhou o próprio braço, ainda enfaixado. Nem havia se lembrado de que estava machucado, já não sentia mais nada. “Está melhor.”

“Ótimo.” O homem sorriu, antes de fazer uma careta ao olhar o caldeirão. “Deixe ele em paz, coisa velha.”

O objeto foi saltitando até Evert, antes de parar ao lado deste.

“Você é um bruxo,” murmurou Tom, depois de observar o outro homem por um longo momento, lembrando-se do que havia acontecido antes de apagar.

“Sou,” ele falou, antes de suspirar e tirar o chapéu. “E você não. Ainda assim, veio parar aqui por algum meio mágico... Quer falar sobre isso?”

“Não,” disse Riddle, automaticamente, enquanto se encolhia um pouco contra a cama. “Desculpe...”

“Está tudo bem.” Evert encolheu os ombros enquanto continuava tirando cogumelos e plantas de dentro da cesta. “Você vem de onde?”

“Little Hangleton,” ele murmurou, antes de tentar se corrigir. Não tinha idéia se aquele rapaz já havia percebido que ele viera de outro tempo (aquilo ainda parecia loucura), mas preferiu não falar nada sobre isso. “Digo, Hangleton.”

“E seu nome?”

Tom encarou o homem por um momento. Ainda não confiava nele e sabia muito bem que o principal fator para tal desconfiança era a varinha de madeira presa no cinto do outro. Sua mente lhe dizia que a qualquer momento algo ruim iria acontecer: ele iria lhe forçar alguma poção esquisita, iria enfeitiçá-lo… Até mesmo ameaças não relacionadas a magia lhe vinham em mente, como o soco que recebera de seu filho (ainda havia uma mancha arroxeada em seu rosto).

Antes que pudesse chegar a uma conclusão sobre falar o seu nome verdadeiro ou não, viu o rapaz ir até a mesa de madeira e enfiar uma mão dentro de uma bolsa. Quando voltou para perto de Tom, ele trazia em suas mãos um pequeno caderno com capa de couro preto.

“Isso estava no seu bolso,” disse Evert, dando a volta na mesa e se aproximando de Tom para entregar-lhe o caderno. “Perdoe-me, mas acabei lendo algumas coisas. Não entendi metade delas, mas o que entendi me diz que você realmente não está na melhor das situações.” Ele apoiou as mãos na cintura, observando o outro, que agora agarrava o caderno com toda a força possível, como se aquilo fosse a única coisa que lhe era real no mundo naquele momento. “Que tal Beedle?”

“Beedle?” perguntou Riddle, atordoado, enquanto finalmente erguia o rosto para olhar o outro.

“É. Parece com o nome de uma vila mais ao norte, Bedlam, e quase soa como o seu último nome,” o bruxo falou, encolhendo os ombros, antes de apontar para o caderno. “Riddle, Beedle... É quase como se você falasse o seu nome quando está com o nariz quebrado.”

“Pode ser…”

“E qual a sua idade?”

“Trinta e oito.”

“Vai querer ser um trouxa ou um aborto por aqui?”

“Como é?” perguntou Riddle, franzindo o cenho.

“Você me disse que não é um bruxo, mas... Ninguém aqui sabe disso, apenas eu e o caldeirão,” disse Evert. “Se vai continuar por aqui, vai ter que criar uma vida nova. Você não pode ser o homem que escreveu nesse caderno; vamos dizer que vai poder começar do início outra vez. Então, prefere continuar um trouxa ou ser um aborto?”

“O que é um aborto?” ele perguntou, tentando não prestar tanta atenção na parte em que, pelo jeito, voltar para casa não era uma opção. Bom, não era como se quisesse... Não queria voltar para a sua casa e lembrar-se de seus pais mortos no meio da sala.

“Alguém que é filho de bruxos, mas não consegue fazer magia. Eles são considerados bruxos também, mas... Incapacitados,” o homem explicou. “Na verdade, são praticamente trouxas, mas cresceram rodeados por magia. Tanto trouxas quanto abortos conseguem acessar algumas partes da magia, como poções ou divinação ou herbologia, mas não é como se os bruxos mais importantes por aí queiram que todos saibam disso... De qualquer forma, você pode passar facilmente por um aborto.”

“E por que isso seria bom? Quero dizer, fingir ser um bruxo sem magia.” Novamente, o homem se restringiu de falar que tudo o que queria era se ver bem longe de qualquer tipo de bruxo ou bruxa.

“Porque você veio parar aqui por meios mágicos e talvez consiga encontrar alguma resposta de como isso aconteceu se continuar interagindo conosco,” disse Evert. “Além disso, a vida perto de bruxos ainda é mais fácil... Eu posso lhe ensinar algumas coisas que vão lhe facilitar a vida mesmo mantendo-se um trouxa, mas, se algum bruxo passar por você e o reconhecer como alguém mágico, eles serão mais gentis com você.”

“Ter conhecimento sobre plantas e poções já não iria me fazer um bruxo aos olhos dos... Trouxas?”

“Às vezes. Se bem que, pelo que você coloca aí.” Evert apontou para o caderno nas mãos de Tom. “Você já seria considerado um bruxo ou algo assim.”

“Então me passar por aborto ou trouxa não faz muita diferença.”

“Como disse, só se você encontrar um bruxo pelo caminho, aí você pode ganhar a simpatia deles.” O bruxo inclinou a cabeça um pouco para o lado enquanto o caldeirão voltava para perto dele aos saltinhos. “Então, Beedle, um trouxa ou um bruxo?”

***

Os dias - que facilmente se aglomeravam em semanas e, depois, em meses - que se seguiram pareciam uma mistura de pesadelos e realidade. Conviver com um bruxo significava ter que ficar em contato com magia o tempo inteiro, fosse quando via Evert lançar um feitiço ou quando se deparava com alguma criatura mágica se esgueirando para dentro da casa… E conviver com magia, para Tom, era a mesma coisa que colocar um soldado para viver em uma casa cheia de bombinhas que explodiam nas mais diversas horas do dia.

No início, qualquer coisa desencadeava aquele pânico que tomava conta de si e só o deixava em paz depois de alguns minutos: o caldeirão aparecer saltitando ao seu lado, o estalo dos feitiços, a coruja trazendo ingredientes presos em suas garrinhas… Qualquer poção o fazia se lembrar do mal estar que sentira quando acordara ao lado de Merope e qualquer brilho de feitiço fazia com que ele achasse que logo veria a luz verde que matara os seus pais.

Evert tentava lhe ajudar nisso. O rapaz deixava a varinha de lado e lhe mostrava livros sobre magia e criaturas fantásticas, fazia pequenas magias bobas apenas para lhe mostrar como aquilo funcionava, lhe explicava como boa parte das poções beiravam uma mistura feita por um farmacêutico, etc. Com o tempo, foi ficando mais fácil ver uma poção borbulhando e não pensar em Merope ou ver um movimento de varinha e não achar que iria morrer no instante seguinte.

O que restou, no entanto, foram os pesadelos. Não era incomum acordar no meio da noite sentindo as mãos de Merope Gaunt em si, mas esse já lhe era um velho conhecido… Os pesadelos novos conseguiam ser tão assustadores quanto este: o garoto, seu filho, sempre aparecia com a varinha em mãos, sibilando da mesma forma que já ouvira Morfin Gaunt sibilar para as cobras. Ele sempre o matava e matava os seus pais diversas vezes. Tom nunca sabia o que era pior: Merope e suas mãos a procura de carinho ou o filho e as infinitas vezes que ele matava os Riddle.

Apesar da dificuldade para aceitar a magia e dos pesadelos, Evert insistia em lhe ensinar o que ele precisaria saber para sobreviver por ali: tinha que aprender a reconhecer em quem ele podia confiar, como se portar e muitas outras coisas, mas, no momento, o principal era aprender algo que pudesse usar para ganhar dinheiro. O bruxo sabia fazer diversas coisas: reconhecia quais plantas podia usar para curar alguém, o que podia usar como amuleto de proteção, como criar símbolos que continham magia, como prever o futuro... E isso eram apenas as coisas que, de acordo com ele, até alguém sem magia podia fazer.

Era engraçado como, para Tom, o conceito de magia acabara mudando, de certa forma. Antes, magia era um feitiço lançado ou uma poção que brilhava de uma forma diferente ou fazia coisas extraordinárias. Mas talvez uma das coisas que mais o ajudara a não temer a magia fora ver como havia um pouco de mágica em todos os lugares: ela estava ali na hora de colher as plantas, nos pequenos objetos que cada um carregava para se sentir mais seguro, nos chás que Evert fazia para acalmá-lo e até mesmo, de acordo com o bruxo, nos desenhos que Riddle fazia para conseguir se lembrar de todas as coisas que o outro lhe ensinava. Eram coisas que ele e seus pais, até mesmo o jardineiro, Frank Bryce, faziam.

As plantas foram as primeiras lições que Tom recebera. O bruxo passara dias fazendo com que o outro o acompanhasse, lhe explicando as propriedades de cada uma das flores e ervas pelas quais passavam no caminho, sem nunca arriscar-se a ir muito longe da sua cabana. Era interessante e, aos poucos, Riddle foi preenchendo um caderno que Evert lhe emprestara com desenhos e anotações sobre o que este lhe falava.

“Isso aqui é importante,” disse Evert, apontando para um arbusto com pequenas florzinhas rosas e roxas. “Sabe o que é?”

“Não...”

“Erva-de-pulmão,” ele explicou, abaixando-se para cortar um punhado da planta e guardar na bolsa de couro que estava amarrada em seu cinto. “Um pouco das folhas secas em uma caneca de água fervente, três vezes ao dia, melhora a tosse. Use ela com casco-de-potro em crianças com tosse convulsa.”

“Certo,” murmurou Tom, inclinando-se mais para a frente para poder olhar melhor as flores e tentar decorá-las. Iria desenhá-las depois, quando chegassem na cabana.

“Crianças com tosse são uma das coisas que mais irá ver. Junto com gente se desfazendo em diarréia... O que você usaria para isso?”

“Amoras negras e... Lacre-de-ouro?” o homem arriscou, antes de sorrir ao ver o outro concordar. Evert brincava que Tom tinha apenas duas expressões: concentrado ou distraído. Era estranho pensar que estava começando a se sentir a vontade para deixar-se sorrir perto de um bruxo. “E dizer para qualquer um que estiver mal tomar muita água.”

Os dias fora da cabana passavam mais rápido. Quando parava para pensar e percebia que já havia se passado pelo menos dois meses desde que chegara ali, tudo o que Tom podia fazer era agradecer à Evert por este nunca lhe encher de perguntas sobre de onde ele viera e o que havia acontecido. Sempre que voltavam para casa, o bruxo se ocupava em preparar as suas poções e ervas, explicando o que podia ao outro, antes de lhe dar mais aulas sobre outras coisas.

Foi apenas depois de dois meses que Riddle viu outra pessoa.

Um homem apareceu na porta de Evert, pedindo ajuda enquanto agitava a mão ensanguentada na frente do bruxo. O caldeirão saltitante pareceu ficar em polvorosa, pulando enlouquecidamente até o desconhecido entrar e o objeto ficar quieto, como se nunca tivesse dado um salto sequer em sua vida. Tom adotou uma atitude parecida com a do objeto: encolheu-se na cama, tentando ao máximo passar despercebido contra a parede.

“Como conseguiu fazer isso, Duncan?” perguntou Evert, enquanto levava o homem para dentro de casa e o fazia se sentar à mesa.

“Fui subir em uma árvore para tentar pegar o ninho de um pega-rabuda,” disse Duncan, esticando a mão sobre a mesa enquanto sacudia a cabeça para tirar o cabelo loiro suado da frente do rosto. “Escorreguei e tentei me segurar em um galho. Quebrou e rasgou a minha mão.”

“Por isso que não deve se meter com pássaros,” disse o bruxo, estreitando os olhos, antes de acenar para Tom. “Venha cá.”

“Quem é esse?” perguntou Duncan.

“Um amigo que está passando um tempo comigo,” Evert falou, dando um passo para o lado para que o homem pudesse ver o corte que atravessava a palma da mão do outro. “Você cuida disso.”

“Precisa fechar,” disse Riddle. Até mesmo sem as aulas do bruxo era possível saber que aquilo precisava de uma boa sutura. O problema era: eles nem tinham com o que suturar. “Mas não tem com o que fechar...”

“Claro que tem.” O bruxo jogou sobre a mesa um novelo de fios finos e uma agulha. “Não está esterilizado,” o homem falou, franzindo o cenho.


“O que?” perguntou Evert e Tom pôde ver que o homem, Duncan, também pareceu confuso.

“Limpo.”

“Claro que está. Vamos lá, apenas costure o corte para que Duncan possa voltar a trabalhar.”

“Você me mostrou uma planta esses dias... Cânfora? Ainda tem?”

O bruxo sorriu, antes de ir até uma prateleira e pegar um potinho de metal para entregar ao outro. Tom torceu o nariz ao sentir o cheiro forte que saía do creme guardado ali dentro, antes de pegar um pouco com os dedos e colocar no corte, vendo Duncan fazer uma careta.

“Alivia a dor,” disse Riddle, enquanto se levantava e procurava pela bacia de água e sabão que eles mantinham por ali. Depois de lavar as mãos - sempre ouvindo a voz quase desesperada de sua amiga, Ellen, em sua mente, lembrando-o de como todo o ambiente era horrível para aquele tipo de coisa -, voltou para a mesa, sentando-se ao lado do homem e limpando o creme.

A única coisa que Tom conseguia pensar enquanto passava a agulha através da pele do homem diversas vezes, dando vários pontos e amarrando pequenos nós para que o corte ficasse fechado tempo suficiente para a ferida fechar, era que a pele da mão de Duncan era quase tão dura quanto a pele de um cadáver. Lembrava-se de como ele e Ellen geralmente ficavam para fechar os cadáveres que usavam quando estudavam anatomia, nas tardes em que se esgueiravam para as turmas de futuros médicos apenas para conhecer mais sobre o corpo humano. Lembrava-se de como era preciso fazer força para conseguir perfurar a pele negra e rija de um cadáver, e como não era preciso fazer nada muito bonito... Ali, no entanto, tentou ter o maior cuidado possível.

“Ficou bom,” disse Evert, ao fim, enquanto inspecionava o resultado final, antes de Tom enfaixar a mão do outro homem.

“Tente limpar sempre que puder,” Riddle pediu, dando um último nó na atadura. “E, se conseguir, tente não usar muito essa mão por uma semana pelo menos.”

“Mas eu tenho que ajudar na lavoura...”

“Ele quis dizer que, sempre que puder, descanse essa mão,” disse Evert. “Volte aqui daqui uns sete dias para tirar os fios.”

“Muito obrigado!” Duncan falou, sorrindo largo enquanto se levantava. “Ah! Minha esposa pediu para ver se o senhor tem algo para melhorar os enjôos que está tendo.”

“Ah, sim...” O bruxo voltou à sua prateleira, pegando uma garrafa de vidro cheia de folhas secas. Despejou um punhado delas em um saquinho de tecido, antes de entregar este ao homem. “Folhas secas de amora. Diga para ela tomar a infusão delas todos os dias até o parto.”

“Obrigado, senhor!” o homem agradeceu novamente, segurando o saquinho entre as mãos como se fosse a coisa mais preciosa do mundo, antes de virar-se para Tom e fazer uma pequena reverência com a cabeça.

***

“Não foi a primeira vez que costurou pele.”

O caldeirão saltitante parecia estar em êxtase enquanto Evert o polia com cuidado. Era um ritual interessante de se ver: todas as noites, o caldeirão pulava para cima da mesa e esperava para que seu dono sentasse ao seu lado e o polisse por alguns minutos.

“Não foi,” murmurou Tom, do seu lugar na cama enquanto tentava não derramar mais tinta nas cobertas enquanto desenhava uma erva-de-pulmão ao lado das anotações que fizera sobre a planta.

“É algum tipo de barbeiro-cirurgião?” o bruxo perguntou, fazendo o outro rir. “Não.”

“Já foi?”

“Nunca,” disse Riddle. “Eu tinha uma amiga que era enfermeira e me ensinou algumas coisas.”

“O que uma ama poderia ter lhe ensinado sobre costurar pele?” perguntou Evert, arqueando uma sobrancelha.

“Não esse tipo de enfermeira.” O homem riu, sacudindo a cabeça. “De qualquer forma, eu acabei estudando mais sobre anatomia humana por causa dela... Sabe, com cadáveres.”

“Você estudou cadáveres?” O bruxo arregalou os olhos enquanto o olhava e até o caldeirão pareceu ficar atiçado.

“Sim...”

“Como conseguiu!? Quero dizer, é proibido.”

“Magia também é proibida,” disse Tom, encolhendo os ombros.


“Você roubou corpos do cemitério?”


“Claro que não! Nós... A escola tinha seus cadáveres, de gente que morreu na rua e não teve família para o reconhecer,” o homem explicou. “Indigentes. Eles teriam sido enterrados em alguma cova comunitária e apodreceriam por lá, esquecidos por tudo e todos. No laboratório, eles continuavam sendo desconhecidos, mas acabaram ajudando muita gente.”

“Jeito bonito de falar, não é?” Evert perguntou ao caldeirão, que deu um pulinho. “Então você abriu cadáveres e olhou dentro deles. Interessante... Nem mesmo na escola de magia nós fazemos isso. Acho que necromancia não é algo muito bem visto até mesmo entre os bruxos.”

“Espere um pouco... Escola de magia?”

“Sim, onde acha que nós aprendemos tudo?” O bruxo riu. “Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. Fundada há mais ou menos 400 anos por duas bruxas e dois bruxos... Pelo que nos ensinam, ela era, na verdade, um abrigo para os mais novos que ainda não conseguiam controlar a magia, mas acabou realmente virando uma escola.”

“Vocês tem uma escola de magia,” o homem murmurou, ainda maravilhado com o fato. Imaginar um lugar onde ensinavam magia e feitiços era... Incrível (e pensar que achara aquilo incrível era estranho). Imaginava algo parecido com Eton, mas com salas de aula onde os professores usavam chapéus pontudos e ensinavam como fazer poções ou transformar xícaras em sapos. “Como ela é?”

“É uma escola... Bom, sei que muita gente não tem chance de ir para uma escola, mas você parece ser o tipo de homem que foi para uma. É um castelo, fica na Escócia, na beira de um lago, no topo de um rochedo.”

“Deve ser bonito,” murmurou Tom, antes de se perguntar se Merope estudara nessa tal Hogwarts. Tal pensamento fez sua animação em relação à escola diminuir. Será que eles ensinavam os alunos a controlarem os outros como Gaunt fizera com ele?

“É bonito... Mas só vou lhe falar mais sobre Hogwarts se você me falar sobre os cadáveres!” disse Evert, rindo.

“Não tem muito o que falar sobre os cadáveres,” resmungou Riddle. “Eles são frios e duros, com a pele tão dura quanto couro e o cheiro deles fazem você chorar como viúvas no enterro do falecido marido.”

“Mas como é por dentro?”


“Fascinante,” disse Tom, automaticamente. “É... Perfeito em todos os aspectos.”

“O que tem aqui?” o bruxo perguntou, apontando para o próprio abdômen, no canto inferior do lado direito deste.

“Ahm, intestino e apêndice.”

“Apêndice?” O homem estreitou os olhos.

“É uma parte do intestino, parece uma minhoca... Por quê?”

“Já encontrei duas pessoas com dor nesse local,” disse Evert. “Dei todas as poções que conhecia, mas as duas acabaram morrendo. Por sorte nenhuma das duas foi por aqui, assim ninguém podia associar as mortes à mim.”

“Apendicite,” disse Tom. “O nome da doença. O apêndice fica inflamado até o ponto de se romper. Você tem que abri-las e tirar fora o apêndice antes que ele exploda.”

“Eu tenho cara de barbeiro-cirurgião?” perguntou Evert, fazendo uma expressão indignada.

“Quer que eu fale a verdade?” perguntou Riddle, sorrindo de lado.

“Eu sou um curandeiro,” o bruxo se empertigou e o caldeirão o imitou. “Abrir os outros para tratar uma doença é coisa de trouxas...”

“Mas suas poções não curaram um apêndice inflamado,” disse Tom. “Talvez, da próxima vez, seja melhor usar o modo trouxa de cuidar das coisas.”


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Notas finais do capítulo

Tcharam, nós temos um Beedle!

1) Tosse convulsa: coqueluche;

2) Algumas ervas tiveram que ser traduzidas livremente porque... Não têm nome por aqui? Espero não ter feito muita besteira com esses nomes ( Erva-de-pulmão = lungwort / gênero Pulmonaria; Lacre-de-ouro = goldenseal / Hydrastis canadensis L.; Cânfora = Cinnamomum camphora);

3) Antigamente, os cirurgiões/barbeiros-cirurgiões não eram bem curandeiros. Eles eram meio que os açougueiros que se arriscavam a tratar gente. Esse estereótipo meio que persiste até hoje, não? Alguns cirurgiões realmente fazem jus ao 'sou cirurgião e não um curandeiro"... Não todos, plmmds, tem muitos cirurgiões ótimos por aí, eu só tive algumas experiências muito boas com alguns, apesar de adorar cirurgia;

4) Como antigamente era proibido dissecar cadáveres porque você era considerado um necromante ou algo assim, muita coisa que hoje é simples era um mistério... tipo a apendicite;

5) Cadáveres de dissecação realmente fedem a formol de um jeito que, até você se acostumar, você fica chorando em cima deles... E eles são realmente fascinantes. Se alguém aí tiver interesse em histórias sobre a medicina medieval, indico muito o filme/livro O Físico/The Physician do Noah Gordon... E, do século XVIII, os livros/série Outlander da Diana Gabaldon (além de muita timetravel legal);

Muito obrigada as meninas que favoritaram/acompanharam a fic. Espero que estejam gostando. Novamente, reviews são muito importantes... Eu sei que é um saco ficar lendo N/A de autor pedindo review, mas a diferença que eles fazem na hora de 'ter vontade' de continuar é imensa. :3

Feliz Natal :D



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