Depois da esperança - Peeta Mellark escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 2
Capítulo 2




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Eu sempre quis ser pai. Mesmo antes, quando as probabilidades de ter um filho e ele acabar indo morrer nos jogos vorazes eram altas, eu nutria esse desejo. Creio que é algo nato do ser humano essa necessidade de trazer outro ser humano parte de você, ao mundo. Mas mesmo partilhando desse desejo futuro, nunca entendi porque as pessoas tinham tantos filhos. Isso apenas aumentava a chance de um deles ser sorteado, e sem contar o fato da divisão de comida... Onde um come bastante, três comem pouco. Não que eu não gostasse dos meus irmãos, é que por algum motivo eles nunca demonstraram muito interesse por mim. Cresci absolutamente sozinho, oferecendo amor na mesma proporção que eu recebia hostilidade. Mas agora eu não posso mais fazer nada a respeito, nem tentar entender ou consertar as coisas entre nós. Pois todos estão mortos. Até meu pai, que era o único que demonstrava um pouco de sentimentos para comigo, está morto. E é por isso que a felicidade jorra pela fonte do meu coração, ao descobrir que eu serei pai. Que eu terei a chance de dar todo o amor do mundo á essa criança. Todo o amor que eu não recebi. E o melhor é que Katniss, a mulher que eu amo, esta gerando essa criança. E essa criança nunca vai se preocupar com o horror de uma colheita, graças a Katniss, e a cada um que deu a vida por nós, e pela causa. Então, ao pensar sobre tudo isso, não consigo imaginar porque Katniss está se debulhando lágrimas, aparentando desespero, e nenhum resquício de felicidade. Demora uma fração de segundos até todos perceberem a estranha reação de Katniss. Antes que eu peça para nos deixarem a sós, Effie toma frente da situação.

– Essa fabulosa notícia merece uma maravilhosa comemoração. Vamos, vamos, cada um vai fazer uma coisa, temos que ir, há muito a se fazer – ela diz, estridentemente, enquanto arruma sua peruca loira e empurra a todos para fora do quarto. Posy se desvencilha de Annie e me entrega um embrulho pequeno, e sussurra para que eu entregue isto a Katniss, porque é a coisa que ele mais gosta, e talvez ajude ela ficar bem. Sorrio, e vejo o menino com seus cabelos loiros e a pele dourada se afastar. Effie pisca para mim, e fecha a porta ao sair. Como a palavra de ordem é igualdade, as bizarrices da capital acabaram, e agora Effie tem que se contentar com algo muito próximo da normalidade. Mal sabe ela que sem aquela montagem toda ela fica muito mais linda. Faço um lembrete mental, de falar isso para ela mais tarde. E então respiro fundo, e seguro a mão ainda gelada de Katniss.

– O que foi Katniss? Essa notícia é maravilhosa. Era pra você estar feliz – eu digo, calmamente, e enxugo as lágrimas que não param de fluir em seu rosto.

– Eu nunca quis ter filhos... Você sabia disso. Você que sempre quis, desde o início. Eu... Eu estou apavorada, Peeta – ela diz, e me abraça trêmula.

– Calma... Está tudo bem. Nada de ruim vai acontecer á essa criança. Os jogos não existem mais. Se lembre disso. Nós vamos dar a ela amor, uma infância farta, uma vida que nós não tivemos – eu a tranqüilizo, sentindo meu coração doer por ver Katniss desse jeito.

– Eu sei. Eu sei que os jogos não existem mais. Mas mesmo assim... Só de pensar que há uma vida aqui dentro – ela diz e aperta sua barriga. – Por favor, me ajude a passar por isso, Peeta.

– Eu sempre estarei ao seu lado.

– E você promete que não vai deixar que nada de ruim aconteça? - ela sussurra sua respiração menos acelerada.

– Eu prometo. Nada de ruim vai acontecer nem a você, nem a mais ninguém que nós amamos.

– Eu estou com medo de amar essa criança e algo acontecer a ela. Eu não suportaria perder mais alguém que eu ame – ela diz, e fita o chão, parecendo envergonhada com tal revelação.

– Katniss... Pode dar todo o seu amor para nosso filho ou filha, pois eu te garanto que nada vai acontecer. Estamos a salvo. De verdade.

Katniss balança a cabeça, e me olha bem nos olhos. Em seguida, me beija, delicadamente.

– Obrigada Peeta – ela sussurra, com seus lábios ainda colados aos meus.

– Pelo que? – eu pergunto, e a puxo para mais perto de mim, sentindo seu corpo antes gélido, se aquecer.

– Por tudo.

Eu sorrio, e a beijo mais fortemente.

– Eu que tenho que te agradecer – digo a beijando cada vez mais.

– Pelo que? – ela pergunta, sorrindo, e ficando arrepiada ao toque dos meus lábios em seu pescoço.

– Por me amar. Por deixar eu ficar ao seu lado. E por manter minha sanidade – eu respondo, e sinto a tensão em meu corpo. – Se não fosse você, Snow teria ganhado seu ultimo trunfo, e eu teria me perdido para sempre naquele veneno.

– O veneno nunca teria te dominado, Peeta. Porque você é bom. Bom de verdade.

– Vocês não podem esperar esse aí nascer, para depois tentarem fazer outro filho? – Johanna grita, escancarando a porta, e nos encara, estreitando os olhos.

– Não estávamos tentando fazer outro filho – Katniss diz na defensiva.

– Essa poderia até não ser sua intenção desmiolada, mas com certeza era isso que ia acabar acontecendo, não é mesmo, padeiro? – Johanna pergunta, e gargalha.

Eu decido a ignorar e ajudo Katniss que já esta bem melhor, a se levantar. Johanna sai na nossa frente, deixando bem claro que ela só queria atrapalhar. Céus, ela sim é louca. Sorrio com esse pensamento e então me lembro.

– Quase me esqueço. Posy pediu para te entregar isso. Ele disse ser a coisa que ele mais gosta e que talvez te ajudasse a ficar bem – eu digo e entrego o embrulho para Katniss.

Assim que ela o abre, vejo lágrimas se formando em seus olhos cinzentos novamente. Ela segura entre seus dedos, um pequeno cubo de açúcar.

– As pessoas que se foram, estarão sempre conosco. Em nosso coração. E coisas como estas – eu digo, e pego o cubo da mão de Katniss – servem para não deixar que nós nos esqueçamos delas.

– Eu nunca me esquecerei. De nenhum deles – Katniss diz, e caminha em disparada. Ando atrás dela, temendo o que ela irá fazer. Mas para minha surpresa, ela chega até a sala, e abraça Posy, e os dois ficam ali, abraçados com um sorriso maior que o outro. Annie caminha até o meu lado, e segura minha mão.

– Ela será uma ótima mãe – ela sussurra.

Sorrio, e enxugo meus olhos úmidos com as costas da mão.

– Eu sei disso, ela só precisa de um tempo. Para entender que nada mais pode nos machucar – eu digo, e continuo observando, enquanto Katniss senta no sofá ao lado de Posy, e começa a mostrar o livro de memórias que construímos. O livro que Posy tanto adora.

– Sabe Peeta. Eu não sinto mais a presença de Finnick, como eu sentia antes – Annie diz, com o olhar perdido no filho.

– E desde quando você deixou de sentir?

– Acabou de acontecer – ela se vira para mim, e me olha com seus lindos olhos, refletindo seu sorriso.

– E porque você acha que isso aconteceu? – eu pergunto, sem entender se isso é necessariamente uma coisa boa.

– Porque agora ele sabe que tudo vai ficar bem. De verdade – ela diz, e se junta a Katniss e Posy. Eu observo as duas e o belo menino, sorrindo, apontando desenhos no livro... Observo Effie orquestrando a execução da nossa comemoração, dando ordens a uma Johanna muito brava e a uma Carolynn um pouco assustada. E então, num canto da sala, olhando com um ar de cumplicidade para mim, eu vejo Haymitch e um inseparável copo em sua mão. Ele levanta o copo, num gesto de brinde, e eu levanto a mão, também brindando, com um copo imaginário. Ele dá risada, e eu sinto uma conexão com seus pensamentos. Pois pela sua expressão, é como se ele dissesse: Quem diria que um dia estaríamos aqui, celebrando a vida, sem nenhuma preocupação? Olho pela janela, para o enorme jardim de Prímulas noturnas que faz frente a nossa casa, e me pergunto o mesmo. E com o monstro dentro de mim, totalmente adormecido como nunca esteve depois desse banho de felicidade, de lavar a alma, eu me junto às meninas na cozinha, e começo os preparativos para um lindo bolo. Pois hoje a noite será de festa. Vamos celebrar a vida.


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