Kian.

Eu me sentia vazio, meu coração martelava dentro do peito, parecendo que eu estava apanhando por dentro. O nó na garganta voltou e eu abaixei a cabeça, controlando as lágrimas, que insistiam em cair.

Era a última vez que eu viria aquele jardim. É difícil dizer adeus. É difícil aceitar a partida. É difícil conviver com a ausência que algumas pessoas deixam em nosso coração. É difícil conviver com a falta da luz. É difícil conviver com o que te machuca te fere. É difícil não poder sentir o doce sabor do amargo, o forte cheiro do perfume. É difícil se despedir quando você queria manter perto. É difícil viver na solidão de um canto, em um cômodo, jogado. É difícil depender da boa vontade de alguém pra sobreviver. É difícil olhar para o lado e não ver nada, nem sequer uma viva alma. É difícil seguir um caminho cheio de pedras, e ainda por cima descalço. É difícil viver sem saber se amanhã poderá comer. Se ainda estará vivo. É difícil chorar por algo sem solução, pela dor que jamais pode ser curada, pelo amor que jamais retornará. É difícil suportar a ideia de que chegará um momento em que viver, não será mais possível. É difícil você olhar para sua face e não enxergar seu rosto. É difícil viver sem esperanças, sem saber onde você vai chegar. Por fim, é difícil ter que desistir quando o que mais você queria era continuar lutando.

Levantei a cabeça novamente e me deparei com Annelise. A encarei e parei de andar. Quando percebi que ela me olhava, neguei com a cabeça e ela parou de me observar. Sua boca entreaberta e suas bochechas coradas, juntamente com o rosto molhado devido as lágrimas. Ela sabia o que estava sentindo, por mais que quase fossemos namorados, ela sabia o quanto eu ainda a amava. Parou ao meu lado, passou seu polegar gentilmente, secando minhas lágrimas, era clichê, e eu provavelmente riria disso depois.

— Kian, não chore - pediu baixinho. - Calma, vai ficar tudo bem. 

O silêncio caiu sobre nós. Fiquei algum tempo escutando as vozezinhas desesperadas na minha cabeça.

— Sua mãe está na ala hospitalar... A Alice está ajudando muito. Ela me mandou avisar que o seu cavalo já está pronto. Eu suspeito que vocês combinaram algo. - Annelise murmurou.- Você vai fugir?

Minhas entranhas doíam de preocupação acumulada.

— Covardemente eu vou fugir. O quanto mais longe é melhor para mim - disse com a voz carregada de magoa.

Ela me cravou. Seus olhos jaziam marejados de lágrimas. O Oceano azul transbordou...

— Eu te amo - disse-me com a voz tremula. - E se você me amar nós dois não precisaremos da aprovação de ninguém para ficarmos juntos, como também não precisamos assinar nenhum papel ou aceitar qualquer espécie de jogo. Vamos ficar juntos até onde der.

— Amar não é só beijar e abraçar. - disse com a voz rouca - O amor é muito mais que dizer um "eu te amo". 

— Não dá pra escolher se você vai ou não se ferir... Eu aceito minhas escolhas. Aceito todas as possíveis consequências. Por favor permita-se aceitar as suas...

(...)

Há um ditado popular que diz: "Se um cavalo selado passar perto de você, suba porque pode ser que ele passe apenas uma vez". Annelise não quis me deixar. Eu sou grato por ela ter escolhido me seguir. Sou eternamente grato pois, onde quer que eu vá, teria uma companhia... E mesmo que a vida venha a tomar novos rumos, serei eu para sempre parte dela, um tipo de amor único que pertence aos Céus.

(...)

Estávamos prestes a montar o cavalo, quando escutamos Sean gritar chamando por mim. Me viro vagarosamente  e me deparo com ele e a Alice,  correndo em nossa direção, com as mãos dadas.

"- Kian, - ela gritou. - Me espera, eu vou com você!"

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E eles vivem felizes para sempre? Não se sabe...