Um Cupido Nem Tão Perfeito escrita por Vivs


Capítulo 24
Capítulo 24


Notas iniciais do capítulo

Oii Pessoas!

Voltei com mais um capítulo que vai gerar motins, aushaushaushuash. Ou não. Veremos.
Em depressão profunda por este ser o último sábado de férias ♥ Não está sendo fácil lidar. Se você está sofrendo por isso também, deixe ai nos comentários e vamos chorar juntos, aushauhsuahsua

Enfim, esse é para ler ouvindo: Afire Love do Ed Sheeran ou Secrets do OneRepublic, vcs decidem ♥

Chega de enrolação,
Boa leitura! ♥



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*Ivye


Depois de um tempo, eu descobri que o pior não foi Cupido ter me aprisionado com as correntes, e sim ter me livrado delas.

Eu tentava me convencer de que ele havia apenas se cansado de me ver jogada no chão, olhando feio para ele da outra extremidade da sala, tentava me convencer de que ele não havia me soltado por bondade ou pena, mas não havia outra explicação. Afinal, ele não tinha ficado nem um pouco incomodado em me ver assim nos últimos dias, mas quando eu não consegui suportar mais a dor que as correntes de ferro antigo e encantado me traziam, quando não consegui mais fingir que o sangue que escorria lentamente dos meus pulsos e tornozelos não importava, e quando finalmente chorei... Ele me libertou.

Eu sentia seu olhar em mim o tempo todo, mas nem Cupido e nem eu fizemos qualquer tentativa de começar outra conversa, com a exceção de alguns palavrões murmurados da minha parte. A última conversa tinha ido perigosamente bem, e isso não era bom para os meus planos de odiá-lo, ou para os deles de me fazer sofrer. Ele só recomeçou a falar quando ouviu os soluços baixinhos que eu tentava sufocar, mas não tinha forças para tanto. 

Cupido deu um suspiro exaurido, caminhou até mim e se abaixou para ficar a minha altura.

Liberte-a. –disse ele, para as correntes. E elas simplesmente emitiram um brilho fraco e caíram ao meu redor, inofensivas. Eu estava livre. Aquela era a minha chance, podia tentar fugir ou dar uns bons socos em Cupido, mas o choque de surpresa me impediu. Levantei meu rosto em direção ao seu, e minha expressão devia mostrar o quão pasma eu estava, porque Cupido disse:

—Ei, eu nem sempre quero arruinar sua vida. Só 99% do tempo. E aliás, não consigo me concentrar com você chorando aí no canto.

—Eu não estava chorando! –exclamei, tentando me defender. Era essencial não demonstrar fraqueza na presença de Cupido. Tentei parecer furiosa, mas não deu muito certo. Ele riu e me deu um olhar sarcástico, do tipo que diz “sério mesmo?”.

—Isso não significa que você está livre. –ele acrescentou, voltando a ficar sério. –Meus outros 99% ainda estão dedicados a te irritar. Só vou providenciar um prisão melhor para você.

Ele agarrou meu braço e um onda de poder gélido trespassou meu corpo. Soube na mesma hora que não podia me transportar para fora dali. Cupido tentou me fazer levantar, mas na mesma hora minhas pernas fraquejaram e eu caí de joelhos no chão.

—As correntes tiravam mais que seu sangue, elas sugavam sua força vital pouco a pouco também. –ele explicou. –Vai levar um tempo até você se recuperar.

Então passou seus braços ao redor de meu corpo e me ergueu do chão, sem esforços, me carregando. Ter meu arqui-inimigo me ajudando a me erguer levaria uma nota onze se existisse uma escala de 1 a 10 no quesito estranheza.

Meio me segurando em Cupido e meio apoiando todo meu peso em seu corpo, ele conseguiu chegar até uma de suas enormes estantes, onde ele passou a mão por um livro especifico, fino, de couro maleável, e o puxou. A estante se dividiu ao meio, como uma porta e um pequeno compartimento, como um armário ou uma cela imediatamente surgiu.

Sério? Um esconderijo atrás da estante? Você não é lá muito original, não é mesmo? –consegui murmurar, com o mínimo de forças que me restavam.

—Você é impossível. –ele disse rindo em resposta, enquanto me largava ali. Em seguida, voltou a selar a estante e eu me vi no escuro total, até que Cupido voltou a abrir a passagem minimamente, deixando apenas uma fresta, não maior que três centímetros aberta.

—Para passagem de ar, apenas. –ele se explicou, e eu tentei copiar a sua expressão de “sério mesmo?”. Pensei ter visto uma sombra de sorriso em seu rosto, mas ela desapareceu rapidamente. –Até porque, mesmo assim você ainda não conseguiria escapar daqui. –ele acrescentou e voltou para sua mesa.

Examinei minha nova prisão. Atrás de mim não havia nada a não ser paredes, mas a segurança não era lá das melhores. Explorei a pequena passagem que Cupido deixou aberta e tentei forçar a prateleira a se abrir, mas ela era extremamente pesada. Era como tentar empurrar todas as rochas do planeta de uma só vez, logo eu estava exausta. Continuei empurrando até meus pulmões arderem, clamando por ar, e as feridas de meus pulsos sangrarem ainda mais. Consegui mover pelo menos alguns centímetros, mas o esforço consumiu todas as forças que ainda restavam em mim. Com um estrondo, desabei no chão.

O conceito pode parecer estranho, mas assim como os mortais, cupidos também dormem. Não temos sonhos, e não é exatamente um sono, é mais como uma pausa para fortalecer nossa energia vital. Não fazemos isso diariamente, normalmente acontece uma vez a cada quinze dias ou quando fazemos esforços enormes. Assim que meu corpo atingiu o chão, minhas pálpebras se fecharam pesadamente e eu murmurei algo como “Cupido idiota, tentando ser gentil” antes de cair no sono.


O barulho de portas sendo escancaradas e vozes alteradas me despertou. Levantei em um pulo e por um momento aterrorizante, não me lembrei de onde estava. Então os acontecimentos dos últimos dias invadiram minha mente e me sitiei. Corri até a pequena fresta pela qual entrava uma faixa de luz brilhante e percebi com surpresa o quanto eu estava forte. Não fazia ideia de quanto tempo havia dormido, mas sentia minhas forças completamente recuperadas.

—Eu já disse que estou fazendo o possível! –Cupido rugia em seu escritório. –Talvez se vocês me devolvessem meus poderes eu...

Você não está fazendo o suficiente! –gritou outra voz em resposta, e senti meu corpo se arrepiar por completo. Aquela voz irradiava um poder diferente do de Cupido, algo mais letal e antigo. Um Ser Superior.

Seu prazo está acabando. Você tem apenas três semanas para corrigir essa bagunça, e fazer as almas destinadas se encontrarem.—disse outra voz igualmente profunda e eu percebi com um sobressalto que ele estava falando de Ben e Kate.

Espiei pela fresta e vi duas figuras, altamente iluminadas em frente a um Cupido furioso. Elas pareciam flutuar, e a luz que elas emanavam me impedia de olhar para elas por muito tempo. Alguns cupidos podiam simplesmente confundi-las com um cupido Criado, mas olhando atentamente, eu podia perceber que suas imagens tremeluziam, como se movessem inquietos para ir para outro lugar.

Mensageiros. Seres celestiais que carregavam recados. Eles conseguiam se mover mais rapidamente que o próprio vento e não gostavam de ficar parados por muito tempo. Gritei pela fresta, pedi ajuda, socorro, mas se eles me ouviram não deixaram transparecer.

—Devolvam meus poderes e tudo se acertará! –Cupido gritou mais uma vez, fazendo as paredes vibrarem.

Você sabe que está sendo punido, Cupido. E te livrar de suas restrições não cabe a nós, somos apenas mensageiros e viemos apenas lhe entregar o aviso: seu tempo está acabando.—a primeira figura disse, num tom perigosamente contido.

—Mas os Seres Supremos também lhe enviaram algo. Algo para ajudá-lo a se lembrar de quem você realmente é.—o segundo mensageiro acrescentou, e os olhos de Cupido estampavam puro medo.

—Não, você não pode... –ele murmurou, mas o segundo mensageiro já havia erguido a mão num gesto e o escritório de Cupido desapareceu lentamente, tudo foi escurecendo até ficar completamente negro. Quando a escuridão se dissipou, percebi que não estava mais no escritório de Cupido.

Ao meu redor se erguia um pequeno vilarejo, de aparência muito antiga. O céu estava totalmente cinza e rufadas de vento derrubavam tudo o que encontravam, castigando a rua. A chuva caia violentamente do céu, encharcando o chão que era uma mistura de pedras e terra batida.

Não estava no escritório de Cupido, porém não estava tampouco livre. Eu não tinha corpo. Estava meramente observando.

Então finalmente entendi o que estava acontecendo. Aquilo era uma memória. Os mensageiros estavam fazendo Cupido reviver uma de suas memórias, mas a ilusão que seu poder supremo havia lançado era tão grande que eu acabei ali, assistindo a tudo acidentalmente.

Ouvi um choro agonizante e rapidamente identifiquei sua origem. Havia um garotinho, encolhido em uma calçada, a chuva fustigava seus cabelos negros, e seu corpo. Ele tremia violentamente de frio e batia os dentes. Os grandes olhos castanhos e o pequeno nariz estavam vermelhos de tanto chorar.

Uma onda de compreensão e choque tomou conta de mim quando percebi que aquele pobre garotinho, pequeno e indefeso era Cupido.

Duas mulheres passaram na rua, vestidas em roupas tão antigas que eu nem conseguia identificar. Seus casacos pareciam ser de pele crua, de caça, como se alguém houvesse acabado de abater o animal que as aquecia. Se protegiam da chuva com um guarda-chuva tosco e enormes chapéus mais toscos ainda. Uma delas torceu o nariz ao ver Cupido.

—Os pais do pequeno delinquente morreram, soubestes? O pai foi decapitado e a mãe enforcada na praça pública há uma quinzena. Queimaram até sua cabana maldita. Já não era sem tempo, se queres saber minha opinião. Aquela família miserável finalmente pagou por seus crimes, agora não irão mais roubar de ninguém.

A outra mulher, que parecia ser mais jovem respondeu:

—Mas eles só furtavam para sobreviver, não é o que dizem? Eram muito pobres, não tinham o que comer.

A outra respondeu:

—Besteira! Agora estão mortos, e o pequeno vagabundo sozinho. Espero que tenha aprendido a lição, duvido que vá se atrever agora. Sua única felicidade eram os pais, e mesmo estes foram tirados dele. Espero que morra ao relento, de frio ou fome, o que o acometer primeiro. –e torcendo mais uma vez o nariz elas foram para longe. O menininho continuava chorando, mais violentamente agora. Outros flashes tomaram conta da minha visão: uma mulher, de olhos amorosos, e um homem de sorriso gentil, os pais de Cupido. Os vi brincando com o filho, lhe contando histórias, o aquecendo com o próprio corpo nas noites frias. Vi o homem chegar em casa com um pedaço minúsculo de pão bolorento nas mãos e abrir mão de come-lo para dar ao filho. Senti o amor que Cupido sentia por eles, tão profundo que era embriagante. Uma força tão profunda e poderosa que era desmedida. Mesmo em meio de toda a pobreza, o amor da família era incondicional e suportava até os tempos mais difíceis.

E agora a única fonte de amor que Cupido conhecera se fora. Voltei a ver o garotinho encolhido na rua. Um velho carregando uma carroça cheia de carvão lhe deu um forte chute entre as costelas praguejando “moleque miserável” e seguiu em frente.
E o menino continuava lá, sofrendo e chorando. Cheio de fome, dor, frio, mas acima de tudo, de pesar. De tristeza e a certeza de não haver mais esperança, espaço ou amor para ele naquele mundo.

A respiração do menino foi enfraquecendo, o soluço parando aos poucos, e ele morreu ali, encolhido na calçada, sujo de lama e encharcado até o último fio de cabelo. No dia seguinte os moradores descobriram o corpo e seguiram seus afazeres diários. Ninguém o olhava duas vezes, e todos demonstravam desprezo ou até mesmo felicidade. Alguém cavou uma cova miserável e jogou o corpo inerte dentro, sem nenhum cuidado. Nenhuma inscrição ou pedra marcava seu tumulo. Era apenas um miserável enterrado em um pedaço de terra descampada e revolta.

O ambiente foi escurecendo e desaparecendo aos poucos, e o escritório de Cupido foi reaparecendo. Me surpreendi ao ver seus olhos cheios de lágrimas, e me surpreendi ainda mais ao perceber que os meus também estavam. Eu havia acabado de presenciar uma cena tão triste que todos os meus outros sentidos estavam completamente entorpecidos. Meu peito estava apertado e um sentimento terrivelmente intenso de pena me assolava.

Você quer voltar a ser o garotinho desabrigado na chuva, ou vai ser um homem e consertar tudo isso, Cupido?—o segundo mensageiro incitou.

O rosto de Cupido, assim como ele todo, estava completamente desolado. Ele caiu de joelhos no chão e uma de suas mãos agarrou a mesa atrás de si numa tentativa de se apoiar. Meu peito se retorcia ainda mais ao vê-lo naquele estado. Independente das injustiças que Cupido já havia cometido, sua expressão era tão sofrida e desoladora que era impossível não sentir pena. Por um momento, eu o vi apenas como o pequeno garotinho que um dia ele foi.

Inconscientemente, percebi que os objetos brilhantes na estante do outro lado da sala, pararam de piscar. As pessoas no teto encantado pararam de se mover e os móveis da sala foram lentamente deixando de ser cor de rosa. Cupido estava tão abalado que sua magia na sala estava deixando de fazer efeito.

Tudo aconteceu em questão de segundos.

O primeiro mensageiro declarou: “Você foi avisado.”. Suas imagens tremeluziram e eu soube que eles iriam se transportar. Como eu esperava, as estantes mágicas se abriram sem esforço quando as empurrei. Corri o mais rápido que pude até o centro da sala, onde as imagens dos mensageiros já começavam a se desvanecer. Ergui uma mão e agarrei o braço de um deles e me senti ser transportada também, gradualmente. Em um intervalo de um segundo, ou talvez menos, o meu olhar e o de Cupido se encontraram. Seu rosto estava fustigado de lágrimas assim como o meu e eu só tive tempo de sussurrar “eu sinto tanto” antes de ser transportada para fora dali junto com os mensageiros.

Minha última visão foi de Cupido baixando a cabeça em derrota, e deixando toda a dor e pesar tomarem conta.


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Notas finais do capítulo

Aposto que você achava que o Cupido não tinha um lado humano. Quem diria ein?

Ashaushaushaus, deixem sua revolta, seu pesar, ou seu simples "Oi" ai embaixo!!! CO-MEN-TEM!!!!!!!!!!!!!

Você vai me deixar muuuito feliz e me dá a oportunidade de interagir com vcs! Nao vai levar nem 5 minutinhos, é de graça e faz bem pra saúde!

Muuito obrigado por ler até aqui e até o próximo!