Underground escrita por Isa


Capítulo 4
4 de abril de 2011




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4 de abril de 2011 – 22:00

  

         É o melhor horário que encontro para escrever, não costuma haver nada acontecendo e já estou louca para dormir, o que faz com que escreva com rapidez. Pensamos que é provável que o estranho comportamento daquelas pessoas seja contagioso. Deduzimos pelo fato de todos terem os mesmos sinais, na verdade alguns filmes assistidos ajudaram um pouco, mas é uma teoria válida.

 

         Se saíssemos corríamos dois riscos: sermos mortos ou infectados. Se ficássemos havia o tédio e a impotência naquela situação toda.

         Johnny já está dormindo.

 

         Ontem antes de dormirmos tivemos uma conversa um tanto inusitada. Ele dizia não estar bem como antes com Blake, mas que queria tentar salvar a relação, embora não tivesse muitas esperanças. Estamos nos tornando amigos, conto coisas de minha vida e ele me conta da dele. É inevitável a amizade numa situação dessas, mas nunca fui de discutir o relacionamento dos outros.

 

        Hoje quando acordamos começamos a conversar, sem nos levantar. Nenhum dos dois estava com disposição depois de tudo que acontecera. Estávamos deitados olhando para o teto, aposto como ele também pensava na saudade que sentia da superfície.

 

         - Estou começando a pensar como você anteontem, Kate. – ele virou a cabeça para olhar para mim – Não vamos sair daqui.

 

         - Eu disse aquilo da boca pra fora. – continuei olhando para o alto antes de virar-me para ele. – Vamos conseguir, afinal... não posso morrer solteira. – sorri, como se realmente me preocupasse com aquilo.

 

         - Está realmente preocupada com isso? – perguntou ele também sorrindo.

 

         - Não, só sou péssima piadista.

 

         - Está melhor do que eu no momento. Não tenho mais frases tranqüilizadoras, nem confiança, e se sairmos daqui só consigo pensar no que aquele cara deve dizer. Inclusive no que Blake deve dizer.

 

         - Tente esquecê-los, está bem? Se concentre no aqui e agora. – acho que consegui soar confiante.

 

         - Você é uma pessoa incrível, Kate, só não percebeu ainda.

 

         - Jura? O que te faz pensar isso? – perguntei, com um meio sorriso. Eu, incrível. Ainda nem conseguira ser uma repórter famosa.

 

         - Numa hora está em desespero, mas depois consegue se controlar e passa a acalmar a situação. Você não age antes pra depois surtar, faz o contrário, em situações assim isso até é bom.

 

         - Foi um raciocínio estranho, um dia vou compreendê-lo... Eu acho. – falei. Então ele, para minha surpresa, passou uma das mãos pelo meu rosto. Senti um arrepio pelo corpo, e fechei os olhos por um momento. Quando os abri novamente, Johnny tirou a mão de minha face e disse:

 

         - Teremos que arriscar. – ele levantou-se e em seguida eu também. – Eles devem ter ido embora, certo? Não fizemos nenhum barulho que chamasse a atenção deles para cá novamente. Eu vou na frente, se não houver nada digo para você vir, mas se tiver... Veremos no que dá, qualquer coisa te empurro pra dentro.

 

         - Aham, mas estou preocupada mesmo assim. Já pensou que pode acontecer algo com você, principalmente se for na frente sozinho? Já nos demos mal por fazer algo sozinhos, na verdade é o motivo de estarmos aqui.

 

         - Não precisa ficar preocupada assim, Kay. Eu me viro. – Kay, até gostei do apelido. Não queria que Johnny saísse assim, sem proteção. Não queria ficar ali sozinha caso algo acontecesse, e, principalmente, não queria que nada acontecesse com ele. Querendo ou não eu me afeiçoara a Johnny, ele fora o primeiro a falar comigo quando cheguei, mesmo não sendo quem me salvara e agora um apoiava o outro na situação em que nos encontrávamos. Era amizade, ou mais que isso, não sei. Só queria que ele ficasse bem.

 

         - Ou vamos juntos, ou ficamos aqui. – falei firmemente.

 

         - Sabe que posso arranjar um jeito de mantê-la aqui.

 

         - E me deixar pra trás? Não, acho que não tem como fazer isso. – cruzei os braços.

 

         - Você é terrível. Certo, pode vir comigo. – dei um sorriso e ele balançou a cabeça em desaprovação, enquanto ia até a porta do banheiro. – Prepare-se. – acenei com a cabeça e ele abriu as trancas, com o cuidado de não fazer nenhum barulho.

 

         Eu estava ansiosa, e podia sentir que ele também estava. Eu mordia meus lábios buscando evitar qualquer som que pudesse sair alto demais. Finalmente Johnny abriu a porta e, cautelosamente, fomos andando para fora, eu me segurando no braço dele por via das dúvidas.

 

         Olhamos até onde estava a nosso alcance e não parecia haver nada no vagão – no qual, graças a Deus, as luzes ainda funcionavam -, ou ao menos algo vivo. Os corpos ainda estavam lá, inclusive um que, de onde eu via, parecia ter algo de muito útil para nós.

 

         - Johnny, - sussurrei, sacudindo o braço que segurava – olha.

 

         Apontei para o corpo de um homem de uns trinta anos, afro-americano, tinha na cintura o que parecia ser um distintivo e, além deste, uma arma. Ao mesmo tempo em que o olhávamos, ouvimos um ruído vindo do lado de fora.

 

         - Fique aqui. – ele sussurrou – A arma pode ser útil, tenho que pegá-la rapidamente, pelo visto não está seguro lá fora.

 

         - Não vai sozinho. – falei quando ele se desvencilhou de mim. O segurei pelo ombro por um momento.

 

         - Precisamos da arma. – Johnny estava certo, ele tinha que ir e arriscar. Foi quando, devido à apreensão, fiz algo impensado. Puxei Johnny para mim e o beijei. Não me importava se ele era noivo, se aquele era um ato completamente idiota, só sei que o fiz, porque podia ser a última vez que o viria e nem sabia direito o que sentia por ele.

 

         - Tenha cuidado. – falei por fim, e, um pouco aturdido, Johnny andou cautelosamente para o corpo do policial, que estava a uns dois metros de nós. Johnny andava e olhava à sua volta, para as janelas e a porta do vagão. Quando, finalmente, ele chegou ao homem e pegou as chaves, o barulho de um corpo jogando-se contra o lado de fora do vagão foi ouvido. No instante seguinte uma daquelas criaturas, um dos adolescentes do dia anterior, pulava por uma das janelas quebradas.

 

         - Johnny! – gritei. No mesmo instante ele pegou a arma de qualquer jeito, trazendo até o coldre junto, e voltou correndo para a porta. Quando o ser estava prestes a nos alcançar fechamos a porta, nos jogando contra ela, conseguimos trancá-la antes que ele a empurrasse. Por um tempo a criatura ficou chocando-se contra ela do lado de fora, Johnny e eu continuamos encostados à porta, fazendo a maior força possível para que o outro não conseguisse entrar. Depois de um minuto ou dois ele se foi.

 

         Ficamos parados por um instante, ofegantes. Meu Deus, e nem havíamos ido tão longe.

 

         - Conseguimos a arma, hã. – disse Johnny, então nos abraçamos – Vamos usá-la amanhã se a munição for o suficiente, então sairemos daqui. – depois nos sentamos no chão para descansar, ele deixou a arma num canto por um tempo.

 

         - Kate... – eu sabia que viria a pergunta – por que fez aquilo?

 

         - Só estava preocupada. – falei sem olhar para Johnny, que me encarava.

 

         - Se cada vez que eu ficasse preocupado beijasse alguém... E nem era tão arriscado assim.

 

         - Nem tão arriscado... Olha, a situação aqui é diferente. – o encarei – Sabia que algo poderia acontecer com você e não queria que se ferisse, não queria ficar sem você aqui, entende?

 

         - Talvez.

 

         - Só não fique agindo diferente comigo, certo?

 

         - Se considerar isso como diferente. – e dessa vez foi ele quem me pegou de surpresa, puxando-me para um beijo, que foi mais intenso e mais demorado que o anterior. O puxei pelo pescoço mais para mais próximo de mim, até que paramos de nos beijar.

 

         - Por favor só... esqueça. – falei, e, já que não tinha nenhum lugar mais distante para ir, apenas me afastei dele. Esperando que mais tarde aquela situação fosse esquecida ou guardada no fundo de nossas mentes, encostei na parede e, depois de um tempo de silêncio constante, acabei dormindo.                


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Notas finais do capítulo

Deixe seu review, os 'zumbis' não arrancarão seus dedos - se arrancarem foi maus aí xD