Já estava com os braços cansados quando chegaram. Após passar pela segurança reforçada na portaria do prédio em que vivia, Silver entrou no elevador com Lyra em seu colo. Morava no último andar, o décimo oitavo. O elevador era lento e ele já estava realmente cansado.

Estava tarde, provavelmente estavam todos dormindo agora e ele não aguentava mais. Apoiou as costas na parede do elevador e permitiu-se escorregar suavemente até que sentasse com a pernas dobradas e Lyra encaixada ali. Pela forma que ficou, ela estava mais para cima, o que fez com que seu rosto estivesse apoiado contra o pescoço do garoto.

Sua temperatura ficava cada vez mais alta, era claro que estava com febre, e ele sabia disso. Mesmo assim se distraiu por um momento com sensação agradável da respiração dela contra seu pescoço. Era lenta e morna e movia os lábios levemente para que respirasse por entre eles, fazendo cócegas leves. Um arrepiar o percorreu enquanto ele a segurava. O perfume da menina também estava mais próximo e evidente, e juntando com toda a situação ele voltou a sentir o próprio rosto esquentar. Respirou pesadamente e olhou para o outro lado, embora não conseguisse se convencer de que precisava afastá-la de seu pescoço.

Décimo sétimo. Ele olhou para cima e viu onde estavam, forçando o pensamento de que precisavam levantar sobre as sensações que tivera há pouco. Com dificuldade ele levantou, apoiando Lyra sobre seu ombro desta vez de forma que seu peso ficasse concentrado no corpo de Silver, não em seus braços. Segurou-a pela parte de baixo das pernas, uma de cada lado de seu corpo e a carregou até a porta.

Havia um leitor biométrico logo na entrada, um dispositivo que identifica a pessoa pelo seu contato e libera a passagem. Ele pressionou o polegar contra o local indicado e a porta do apartamento se abriu, para se fechar às suas costas logo que entraram.

Não era particularmente grande, tampouco era pequeno. Uma sala confortável surgiu diante deles com móveis em vermelho escuro, embora não aparentasse ser usada há algum tempo. Andou com ela até uma porta que, por sorte, estava entreaberta e ficava ao lado da porta de seu próprio quarto, e entrou. Era o quarto de hóspedes.

Simples, um armário escuro, uma cama com criados mudos, um banheiro que tinha a porta fechada e um carpete vinho macio no chão. Atravessou o lugar em passos mais apressados e, enfim, a depositou na superfície macia. Ajeitou a cabeça dela no travesseiro, aproveitando o momento para sentar ali e relaxar brevemente os músculos exaustos. Havia carregado a menina por muito mais tempo do que achava que fosse capaz, precisava descansar. Mas ainda havia coisas para serem feitas.

Espreguiçou e esticou os braços, sentindo os músculos abusados protestarem. Balançou os ombros quando abaixou os membros e levantou de frente para a menina. Tirou o chapéu dela o deixou sobre o criado mudo, e percebeu que em hipótese alguma conseguiria tirar qualquer outra coisa que não fossem os sapatos dela, que ele logo tirou também.

Parou e a encarou ali, pensando no que poderia fazer para aliviar seu desconforto. Ela estava febril, decidiu começar por isso. Puxou as cobertas que estavam sob ela e a cobriu, esquecendo-se do fato d'ela estar vestindo sua blusa. Saiu do quarto e pegou água fresca e algumas toalhas, além de um copo d'água e remédios.

Os remédios que trouxe consigo eram antitérmicos para que sua febre fosse contida, além de um remédio para dor, mas este ele deixaria para ela tomar quando acordasse. Quando ela acordasse não seria mais problema dele. Suspirou e olhou para janela. Podia ver as fracas luzes da rua refletirem no vidro vindas de baixo, impedindo o breu de preencher o quarto. Não sabia por que a estava ajudando.

Pegou-a pelos ombros, erguendo Lyra e desviando o olhar. Pressionou os próprios lábios desconfortável, franzindo o cenho antes de voltar sua atenção para sua tarefa. Precisava que ela tomasse o remédio. Ergueu a mão que tremia quase imperceptivelmente, embora a intensidade fosse crescente. Tocou o rosto dela e tentou se concentrar, apertando levemente para abrir sua boca. Não foi difícil, a parte difícil seria que ela engolisse. Silver engoliu seco a pouca saliva que tinha na boca. Encostou-a sentada na cabeceira da cama e inclinou para cima o seu rosto. Soltou o comprimido de forma que foi direto para garganta e suspirou aliviado, agora apanhando o copo. Inclinou-o o mais devagar que pode, fazendo escorrer pela língua dela um pequeno fio de água. Graças a essa água, ela acabou engolindo por reflexo. Um problema a menos.

Esperou que ela realmente engolisse para deitá-la de vez, cobrindo até seus ombros e arrumando o travesseiro sob sua cabeça. Molhou uma toalha pequena na água fresca e torceu o excesso, colocando sobre a testa de Lyra.

Sabia que teria que ficar ali para cuidar dela até que a febre baixasse, então puxou a poltrona que ficava no canto do quarto até o lado da cama e sentou próximo, trocando a toalha por uma mais fresca de tempos em tempos. Momento ou outro ele secava a testa dela e sentia sua temperatura, até que finalmente o fez e constatou que havia baixado. Seus ombros relaxaram e ele encostou na poltrona com certo alívio, fechando os olhos por um momento e se deixando ocupar com alívio.

Embora Silver não sorrisse, era inegável que ele parecia melhor que há algumas horas atrás.

Levou a mão ao cabelo dela, soltando-o para que ficasse mais confortável. Os fios castanhos claros se espalharam por sobre o travesseiro e ele os ajeitou atrás dela. Arrumou a coberta novamente, preparando-se então para sair do quarto.

– T... Ty...

Ela murmurou enquanto dormia. Silver já havia se levantado, então apenas parou e a observou. Parecia preocupada, mas pelo menos estava melhor. Pegou as pokébolas dela e as deixou na cama próximas à menina para que ao acordar ela não se assustasse. Então ele deixou aquele cômodo e fechou a porta.

Foi para sala e se jogou no sofá, se espreguiçando e virando de lado. Estava exausto... Talvez dormir fosse o mais indicado. Puxou uma coberta que estava apoiada no encosto do sofá e se dormiu, decidido a tirar um cochilo e descansar um pouco.