Anjo das Trevas escrita por Elvish Song


Capítulo 38
Surpresas


Notas iniciais do capítulo

Então, é isso: chegamos ao fim da primeira temporada. Espero que gostem desse capítulo, e agradeço muito a todos que chegaram até aqui, tanto antes quanto depois da conclusão desta temporada, comentando, recomendando, participando. Vocês são incríveis, e é por causa de vocês que essa história não apenas chegou até aqui, como irá continuar em uma nova temporada.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/662451/chapter/38

Três meses depois

Annika e os Garotos do Beco participavam ativamente da reforma do conservatório. Enquanto os rapazes realizavam trabalhos mais pesados, como demolir paredes e trocar o madeirame junto aos pedreiros contratados, as moças se ocupavam de lixar e raspar paredes com tinta manchada, consertar esquadrias de portas e janelas, trocar vidraças quebradas. Meg também participava, por ser seu dia de folga, e estava se divertindo bastante com atividades tão incomuns a sua rotina. Erik, por sua vez, estava no segundo andar, avaliando o trabalho já feito, determinando o que precisava ou não ser refeito, e montando sua própria “aparelhagem” – como alçapões e acessos secretos ao sótão, iluminação que se acendia sozinha e outras “surpresas” - nos locais que já estavam prontos.

— Annie! – chamou Charles, que acabara de derrubar uma parede – pode trazer uma escora para mim?

A moça largou imediatamente o formão com que desbastava as empenas de uma janela, e correu a pegar uma das escoras de madeira para o amigo; não era leve, mas a mulher não era fraca, e carregou a peça sem dificuldades, ajudando o garoto a encaixar o objeto em seu lugar. A parede não estava tão firme quanto haviam pensado – não havia vigas dentro dela - de modo que Erik precisaria fazer algumas adaptações naquela seção... Talvez planejar outro tipo de abertura no salão, em vez do grande vão de acesso.

— O trabalho ainda vai longe, mas estamos progredindo – disse o adolescente, satisfeito – quero muito ver este lugar pronto. Vai ser fantástico!

— Certamente vai. – sorriu a pianista, secando o rosto na manga do vestido. Mesmo sendo inverno, ela estava transpirando muito... Certamente por causa do trabalho.

Annie ia voltando à janela quando, de repente, sua visão escureceu e, mesmo tentando resistir, ela sentiu seus joelhos cederem. A consciência a abandonou, e ela teria batido com força no chão, se Renard não a segurasse a tempo.

— Annie! – chamou ele, deitando-a no chão e dando leves tapinhas no rosto dela. Meg e Gabrielle correram para junto da mulher, preocupadas, e o rapaz disse a elas – cuidem dela. Vou chamar o Fantasma.

O ruivo subiu aos degraus de dois em dois, muito preocupado: a única vez em que vira Annika desmaiar fora anos atrás, quando ela se encontrava profundamente desnutrida, e havia passado três dias sem comer! Claramente não era mais o caso... Mas ela não era uma moça frágil, que desmaiasse por qualquer coisa, tampouco usava espartilho no dia a dia, de modo que não desmaiara por falta de ar. Se sua amiga ficara inconsciente, havia algo de muito errado!

— Fantasma! – chamou ele, entrando como um tufão no corredor que dava acesso aos futuros quartos dos alunos. Erik se encontrava testando a instalação da iluminação, e voltou-se surpreso para o rapaz:

— O que houve, raposo?

— É Annika. Ela desmaiou e... – ele não teve tempo de terminar, pois, como um raio, o arquiteto já se lançara rumo às escadas. Menos de um minuto depois, ele se ajoelhava ao lado de Annika, que já recuperara a consciência:

— Como você está, meu amor?

— Estou bem – respondeu ela, ainda zonza – um pouco tonta, mas já vai passar...

— Vou levar você para casa. – afirmou o Anjo, erguendo a esposa nos braços.

— O quê?! – ela protestou – não vou para...

— Será que uma vez na vida, você pode não discutir? – interveio Meg – está pálida como um cadáver, e desmaiou do nada! Nós damos conta, aqui. Vá para casa, e descanse.

— Não posso ir embora. Não é justo vocês...

— Quietinha – disse Gabi, dando um beijo na testa da irmã – você trabalha demais, e está exausta. Vamos para casa, você descansa. Amanhã voltamos a trabalhar, quando estiver bem. – e para seu professor – vamos cuidar dela.

— Fácil dizer. – brincou o Fantasma, antes de carregar sua esposa para o teatro, acompanhado pro Gabi. Geralmente preferiam ir a cavalo, uma vez que ele lhe dera uma bela égua negra como presente de casamento; hoje, porém, ele preferiu alugar um coche, devido à palidez de Annie. Mas o que estaria acontecendo com ela? Aquele abatimento não era normal em sua mulher, e surgira subitamente!

Uma vez que chegaram ao sobrado, ela quis se banhar para tirar a poeira de tijolos e madeira do corpo, e Erik aproveitou-se disso para mandar sua aluna buscar um médico. Quando Annika saiu do banho, já vestida, o Dr. Fronçois acabara de entrar.

— Erik! – protestou ela – eu estou bem!

— Então, não vai se incomodar em ser examinada pelo doutor. – embora geralmente deixasse sua esposa agir como bem entendesse, dada a inutilidade de suas “broncas”, agora ele estava impassível. É verdade que a palidez e o abatimento haviam melhorado com o banho, mas ele não deixaria aquele desmaio passar em branco. – Isso eu não vou discutir, Annika. Uma vez na vida, você vai me obedecer.

E, pela primeira vez na vida, ela realmente o fez. O médico examinou seus olhos, ouvidos, auscultou os pulmões e os batimentos cardíacos; olhou as palmas das mãos dela, e mediu seus reflexos. Parecia tudo em ordem, mas algo incomodava o senhor, que pediu à jovem para se deitar na cama, e palpou-lhe o abdômen; ela não reagiu com dor, mas ele encontrou algo suspeito. Tirou os sapatos de Annika, e confirmou que os pés dela estavam levemente inchados. Endireitando-se, dirigiu-se a Erik:

— Senhor, preciso fazer algumas perguntas a sua esposa. Poderia aguardar lá fora, por favor?

Erik olhou para sua amada, numa pergunta muda; ela anuiu e respondeu:

— Pode ir, meu amor.

Uma vez que o Fantasma deixara o quarto, ela se sentou outra vez e ouviu as perguntas do médico:

— Annika, podem ser perguntas um pouco constrangedoras, mas são necessárias... Quando foi que suas regras vieram pela última vez?

Ela realmente se sentiu levemente constrangida, mas não era nenhuma mocinha ingênua que fosse paralisar por falar sobre o assunto. Ele era médico, e precisava saber, então a moça respondeu, tão naturalmente quanto pôde:

— Há dois meses. Mas meus ciclos são muitos irregulares, e é comum que se interrompam até por meses.

— Entendo... São irregulares desde sua menarca, ou se tornaram irregulares de algum tempo para cá?

— Bem, eu... – certo, agora se tornara MUITO constrangedor – eu sofri quatro abortos entre os doze e os catorze anos. O último quase me matou... Fiquei doente por semanas, e foi depois disso que meus ciclos se tornaram irregulares.

— Ficou estéril, depois disso? – uma vez que fora ele quem examinara Annika, quando de sua chegada ao sobrado, o Dr. Ailler não precisava fazer mais perguntas indiscretas para compreender “en passant” o passado da dama. Escolhendo as palavras com cuidado, explicou:

— Menina... Eu não sei como dizer isso de outro modo, então serei bem direto: você está grávida.

— Grávida?! – perguntou ela, em choque – não, doutor. Não pode ser! Eu sou estéril!

— Existem casos onde uma mulher passa anos sem conceber, e depois se recupera. Além disso, sejamos sinceros: seu estado geral melhorou muito, desde que a conheci. É possível que isso tenha permitido uma concepção, mas não vou lhe mentir... É uma gravidez arriscada. – ela o fitou com medo no olhar, fazendo o médico sentir-se mal por sua paciente. Mas ela tinha de saber dos riscos - Com o número de abortos que você teve, é bem provável que seu útero possua cicatrizes. O mal-estar que sentiu é comum em muitas mulheres grávidas, mas pode ter salvado sua vida, pois não recomendo nenhum tipo de esforço físico. – ele segurou a mão da moça – pois o risco de uma ruptura uterina é muito grande. Você precisa de cuidados, para ter essa criança de modo saudável. Compreende isso?

— Sim. – ela sentiu sua garganta travar com o choro que o orgulho não lhe permitiria derramar – doutor, o senhor pode explicar isso a meu marido? Perdoe-me, mas eu gostaria de ficar um pouco a sós.

— É claro, Madame Destler – o médico fez uma breve mesura e deixou o quarto, enquanto a mulher se deixava cair de lado no leito, agarrada a um travesseiro. Eram tantos pensamentos e emoções, que não sabia o que sentir. Estava grávida! Essa informação, por si só, lhe causava diversas emoções: espanto, pois até então pensava-se estéril. Alegria, pois tratava-se de um filho de Erik, seu grande amor! Apreensão, pois vira o quão desagradáveis podiam ser os sintomas de uma gravidez... E ainda por cima, ouvi que se tratava de uma gravidez de risco! Ela, que nunca tivera medo de nada, agora tinha dois: medo de morrer, e um medo maior ainda de perder seu bebê. Agora, que experimentava a felicidade plena, não queria morrer; não podia deixar seu Anjo outra vez sozinho, nas trevas. Mas também não imaginava se suportaria a dor de perder outro bebê... Desta vez, uma criança que ela já amava, por ter sido concebida com amor, e não com ódio, medo ou vergonha.

Cerca de meia hora se passou, antes que Erik entrasse no quarto. Gabrielle apenas olhou da porta, e fez um sinal de cabeça para seu mentor, antes de sumir no corredor. O Fantasma se aproximou de sua mulher, que agora chorava silenciosamente, e se sentou ao lado dela, tomando a mão delicada na sua.

— Annie – chamou ele, carinhosamente – o doutor já me contou tudo. Quer falar sobre isso?

A moça fechou os olhos e começou a soluçar – talvez tivesse descoberto o porquê da maior sensibilidade que vinha enfrentando, há algumas semanas – o que fez seu marido se deitar atrás dela, abraçando-a e fazendo-a deitar a cabeça em seu ombro. Ela se virou para ele e escondeu o rosto em seu peito, murmurando:

— Estou com medo, Erik... Não quero morrer... Não quero perder nosso filho!

— Hey, hey! – ele a fez erguer o rosto para encará-lo – que bobagem é esta?! Você não vai morrer! Ninguém aqui vai morrer. – havia uma força enorme nos olhos dourados, força que ele agora passava para Annika. – eu lhe fiz uma promessa, lembra-se? Prometi que estaria sempre ao seu lado, que seria sua força nos momentos de fraqueza, que estaria sempre aqui, quando precisasse. Vamos enfrentar isso juntos, e você vai ficar bem. – ele se ajoelhou ao lado dela e beijou o ventre da mulher, acariciando sua barriga ainda lisa – vocês dois vão ficar bem.

A jovem conteve o choro, e forçou-se a dar um sorriso para seu amado: Deus, como era grata por ter aquele homem em sua vida! O mínimo que podia fazer era mostrar-se forte, também, e encarar dignamente aquele desafio. Em meio ao medo e ao choque, ela se agarrou a um sentimento bem melhor: alegria. Alegria por estar carregando em seu corpo o filho de um amor com o qual nunca sequer sonhara, mas que agora era sua realidade. Sentando-se na cama, ela abraçou seu esposo e falou baixinho:

— Não importa o que aconteça. Vamos passar por isso, juntos, por nosso bebê.

— É claro que vamos! Escute, você me deu uma surra em nosso primeiro encontro... O que é uma gravidez, diante disso? Você é uma guerreira, Annika. Vai lutar, e vencer, mesmo porque não lutará sozinha. Estou aqui, com você.

Com um sorriso que visava esconder o próprio medo, também o Fantasma se agarrou à alegria da ideia de um filho; um filho seu e de Annika, para fazer companhia ao pequeno Alain, que no momento estava com “Vovó Giry”, no teatro. Sim, eles passariam por aquilo. Dariam um jeito, e tudo ficaria bem. Tentando consolar sua mulher, Erik começou a cantar ao seu ouvido:

(Por ti seré – Il Divo)

Cuando me vi desnudo y sin aliento (quando me vi despido e sem alento)

Parando al mar desierto y sin amor (Perdido num mar deserto e sem amor)

Cuando pensé que mi alma había muerto (Quando pensei que minha alma havia morrido)

Llegaste tú como la luz del sol (você chegou como a luz do Sol)

Por ti seré más fuerte que el destino (Por você serei mais forte que o destino)

Por ti seré tu héroe ante el dolor (Por você serei seu herói diante da dor)

Yo sin ti estaba tan perdido (Sem você, eu estava tão perdido...)

Por ti seré mejor de lo que soy (Por você serei melhor do que sou)

Annika ergueu os olhos, e um sorriso escapou não apenas de seus lábios, mas de seu olhar quando disse:

— Eu te amo, Erik Destler. Amei desde o primeiro momento em que o vi, mesmo que ainda não soubesse disso, na época.

— Eu sei. – respondeu ele, aninhando-a em seu colo. Não sabia em que momento seu coração deixara o peito e fora se alojar na alma daquela mulher, mas agora, já não lhe pertencia. Seu coração era de Annika, e apenas dela.

Pouco depois, Gabrielle entrou no quarto, e veio se juntar aos dois. Erik envolveu as duas mulheres em seus braços, e ambas deitaram a cabeça em seu peito; eram uma família, e como tal enfrentariam aquilo: juntos, até o fim.

 

FIM DA PRIMEIRA TEMPORADA


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Oláááááá, pessoal! Então, chegamos ao fim da primeira temporada. Logo, logo, nos veremos na segunda, ok? Ah, gostaria de pedir que, se gostaram e acharem que a fic merece, por favor recomendem, ok?
Beijos enormes de uma escritora ultra-agradecida!