Anjo Mau escrita por annakarenina


Capítulo 46
Conversa


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo é narrado por Emily Foster



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Ezandriel afastou-se, num súbito movimento, como se temesse cada palavra dita por Sam. Ele olhou para Philip, e depois para Sam. E por último, para mim, demasiado assustado, aturdido e nervoso. Eu poderia dizer que sua cor mudara bruscamente — de um esbranquiçado anormal porém normal para anjos, até um anormal assustador para anjos. É claro que ele estava no corpo de um humano, embora eu não entendesse com exatidão como ele poderia ser humano e ainda pertencer ao reino dos céus como um ser espiritual. A verdade é que eu não sabia quase nada sobre esse assunto — o que me deixava com mais temor ainda do desconhecido.
— Isso é alguma piada? — Perguntou ele, lançando uma risada nervosa no ar, que desaparecera conforme o silêncio persistia em falta de uma resposta.
Sua cabeça girava como o de uma criança perdida — e sua aparência não facilitava as coisas para ele. Ezandriel era um cópia perfeita e angelical de uma criança que parecia ter sido desenhada à mão.
— Desculpa, Ezandriel, mas se pretende, de alguma forma ajudar a guardiã — disse Sam, estendendo uma mão para mim referindo-me sem escapatória —, esse será o seu dever. Ajude-a, Ezandriel, e ela será eternamente grata.
Eu sabia que o que Sam estava fazendo era algo que soava como uma chantagem entre as entrelinhas. Sua intenção maior era fazer com que Ezandriel se sentisse culpado — visto que sua intenção em ajudar-me foi evidente desde sua chegada até aqui. E Sam só se aproveitou dessa boa vontade. Mas a expressão do Ezandriel era confusa e desajustada, como se todas as características de alguém que não fazia ideia de como iria começar a fazer algo estivessem presentes neles. Seus olhos dourados haviam escurecido, e sua aura parecia cansada e fraca — quase como a de um humano. A energia que antes eu havia sentido com sua presença parecia falha, insegura — e de fato, sua expressão combinava com tudo isso.
— Vocês são loucos… esse livro é proibido… eu posso cair caso alguém descubra! Eu não quero ser como ele!
Ele franziu o cenho, apontando um indicador para Philip.
— Não se atreva, Ezandriel! — Grunhiu Philip.
— Entenda, Ezandriel… a Terra corre perigo, precisamos da sua ajuda. Deus está colocando temporariamente todos os anjos do céu aqui, e Lúcifer tem enviado demônios à Terra em busca da guardiã. Se ele a encontrar será o fim… — Explicou Susan.
— O fim?
Desta vez, foi Sam quem respondeu:
— Sim, o fim. Deus pretende extinguir a raça humana e todos os seres sobrenaturais se Lúcifer tiver acesso à guardiã.
Ezandriel engoliu em seco, e fitou Sam como se perdesse em seus pensamentos.
— Eu sou fiel à Deus, eu não posso traí-lo — Ezandriel franzia o cenho como numa dor profunda. — Eu não posso fazer isso — e então ele olhou para mim. Seu olhar me dava pena, e sua expressão profunda demonstrava a aflição em seu ser.
— Ezandriel, por favor — pediu Sam, num tom longe de tornar-se uma súplica. Sua voz soou dura, quase como uma ordem direta à ele. É claro que Ezandriel se intimidaria — embora ambos fossem Serafins, Sam aparentava ter uma experiência muito superior à de Ezandriel.
A expressão de Ezandriel não mudara, e nem seus olhos que me fitavam retornaram à Sam. Suas desculpas omitidas pareciam caminhar diretamente à mim, apenas com suas bilhas grandes e douradas. Era evidente que Ezandriel possuía um respeito muito surpreso por mim. Ele parecera o único que embora soubesse quem eu era, demonstrou respeito.
— A população inteira?
Perguntou ele, franzindo o cenho.
— A população inteira. — Desta vez, Susan quem respondeu — Ezandriel, a terra está um caos, precisamos desse livro.
— O que pretendem fazer com esse livro? — Perguntou Ezandriel, num rompante.
Eu não soube dizer se a forma rude de falar fora porque Susan é uma bruxa — e anjos as odiavam —, ou porque ele estava nervoso por causa do nosso pedido.
— Entregaremos Emily à Lúcifer.
— O que?
— É isso que queremos que ele acredite, que terá Emily. Mas isso não acontecerá, porque na verdade eu serei a Emily. Se você conhece bem este livro, Ezandriel, entenderá perfeitamente que nele existe um feitiço de ilusão. Serei a guardiã por poucos minutos.
— E depois? Você o matará? — A forma como Ezandriel manifestou-se sobre Sam deixou clara a desconfiança em sua capacidade.
— Não me subestime garoto. Não duvide da minha capacidade...
— Faça-me o favor, Sammuel! Você é só um Serafim. Se Deus teve suas dificuldades para prendê-lo no inferno, imagine você, que possui alguns milênios de idade.
Por que para mim, milênios de idade soavam tão velhos? E por que isso não era muito para eles? Existiam seres com bilhões de anos além de Deus?
— A questão é que Lúcifer já não está no inferno há muito tempo. E a maior questão é que se ninguém tentar fazer algo A POPULAÇÃO UNIVERSAL, CELESTIAL E INFERNAL ACABARÁ PARA SEMPRE! E voltaremos a ser partículas flutuadoras de uma vasta imensidão escura e assustadora, submissas para sempre da vontade Dele para que retornemos um dia a esta dimensão. — As palavras de Sam saíram rápidas, urgentes e perturbadoras. O término de sua frase persistiu num eco por um segundo de atraso, o que tornava tudo mais ainda assustador.
Ezandriel permaneceu intacto, sem mover nem seus cílios. Sua dura expressão enfatizava, com evidência, o efeito que as palavras de Sam lhe causou.
A sensação era que o anjo estava amedrontado, pelos dois motivos. Se ele pegasse o livro, poderia nunca mais ser um anjo novamente, e se ele não fizesse nada, poderia nunca mais existir. Mas não era isso que mais me instigava: era o fato de Sammuel realmente conseguir matar Lúcifer, ou até mesmo, trancá-lo no inferno para sempre. De acordo com Ezandriel, se Deus teve dificuldades em fazer isso, como é que Sammuel conseguirá chegar perto dele? Digo é claro que eu serei uma isca, eu serei o motivo — talvez — que deixe Lúcifer extasiado. Mas ainda assim, o feitiço só durará alguns minutos — o que será impossível de conseguirmos alguma coisa.
Uma hora depois, ninguém se falava. Susan carregara consigo um livro, e o lia continuamente, atenta a cada frase, a cada palavra de cada página, não deixando nada escapar. Ezandriel estava sentado numa pedra alta, suas asas já estavam escondidas, e sua expressão séria e pensativa dava a impressão de que uma escultura minuciosa e rara havia sido esquecida ali. Philip buscava novos materiais para a proteção da gruta, visto que a entrada estava tornando-se visível pelo desgaste do que a tapava.
Estava frio, muito frio, e meus nervos não ajudavam. Meu coração estava em constante aceleração, e o temor fazia meu estômago roer — eu não sabia se era de nervoso ou fome.
Avancei mais para dentro da gruta, que já havia sido checada e iluminada por Philip. A curiosidade como sempre atrelada e unida à mim falava mais alto.
Ao chegar ao fundo, para a minha surpresa, havia uma pequena e estreita lagoa. Ela era escura, talvez pelas rochas e areias ao fundo. Mas embora eu estivesse há umas cinco horas sem beber água, neste lugar eu não sentia sede — ou vontade de ir ao banheiro. Eu também nem deveria sentir fome. Esse lugar anulava a maioria da minhas necessidades humanas.
— É linda, não é?
Eu sobressaltei com a voz de Sammuel atrás de mim. Ao virar-me, deparei-me com uma expressão que não havia visto nele desde então. Ele parecia uma pessoa fragilizada — e com medo.
— Você me assustou — eu disse, tentando não ser rude.
— Peço perdão, guardiã.
E então ele se voltou para a lagoa, observando-a e em seguida perdendo seu olhar no nada.
— Estou com medo — eu disse, abraçando-me.
Sam levantou a cabeça, olhando para mim.
— Sabe que não conseguirei, não sabe?
Eu respirei fundo, ainda o olhando nos olhos.
— Mas você disse...
Ele balançou a cabeça.
— Isso não depende só de mim, ou de Ezandriel. Isso depende de você, Emily.
Engoli em seco, eu já sabia o que estava por vir: o que o meu instinto me alertou o tempo todo.
— Você é quem deverá matar Lúcifer. Seu namorado não pode saber disso, ou então estragará tudo.
A responsabilidade é e sempre foi minha. Eu fui a escolhida nisso tudo, e fui a escolhida por Sammuel também. Ele contara comigo porque talvez soubesse que eu já imaginava onde isso tudo iria dar.
— Como farei isso?
— Você possui dentro de você poderes inimagináveis, Emily. Você precisa entendê-los sozinha. Não sou eu, ou Philip, ou Susan que lhe ensinarão como utilizá-lo, como entendê-lo. Será você mesma. Somente você. Eles são incapazes de ajudá-la porque eles não conhecem a capacidade destrutiva do seu poder.
— E se eu não conseguir?
Sammuel fechou os olhos.
— Não estaremos aqui para lamentarmos.


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Notas finais do capítulo

Espero que gostem! Contem-me nos reviews! Beijos enormes!!!!



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