Anjo Mau escrita por annakarenina


Capítulo 29
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Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo é narrado por Philip Cambridge



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Susan estava sombria. Mas o correto não é essa palavra, e sim algo muito pior que isso. Ela me olhava como se esperasse mais que respostas. Eu não poderia negá-la explicações. Passei anos sem entrar em contato com ela, ou realizar missões. Mas o pior não era o fato de eu ter me afastado dela, e sim o que eu fiz durante essa ausência.

— Você sabe o que significa, Susan.

A vergonha me tomou, e mais do que tudo que havia acontecido, com Susan as coisas se intensificavam brutalmente.

— Essa é a marca do diabo, a marca de Lúcifer. Você fez um pacto com Lúcifer, Philip! — Sua voz aumentou bruscamente, e a energia do lugar caiu absurdamente.

Susan quase chorava. A expressão dela era de desapontamento e decepção, embora eu soubesse que uma parte sua estava feliz em me ver. Mas como médium, Susan sabia mais do que ninguém como era fazer um pacto — e o preço que se paga por ele.

— Me desculpe — eu abaixei a cabeça, arrependido e constrangido com minhas próprias palavras.

— Isso não há desculpas. Por que fez isso, Phil?

— Porque não queria mais regras.

Ela riu falso.

— Regras? Então você o que, cansou-se delas? Simplesmente do nada?

Eu fechei meus olhos, angustiado por ter que relembrar meu passado não tão distante assim. Enquanto isso, meu coração parecia chocar-se contra mim, arrebentando-me por dentro. Ainda me sinto feliz quanto à Emily, mas envergonhado quanto à mim mesmo.

— Qual o motivo, Philip?

Pressionou-me ela, notando-me pestanejar.

— Eu a queria — eu disse.

Susan franziu o cenho.

— Ah meu Deus — disse ela, segundos após entender minha frase. — Você queria a guardiã, os poderes da guardiã! E por isso fez o pacto com Lúcifer, porque precisava dele para o… — Susan engoliu em seco, apavorada com as próprias palavras saindo de sua boca. — Ritual.

Abaixei a cabeça, reconhecendo cada palavra, cada letra e cada sensação que saía de sua boca. E a veracidade delas tornava-se quase inacreditável conforme o som tornava-se mais nítido sob meus tímpanos. Eu não queria acreditar que tornei-me, mesmo que por pouco tempo, alguém com esse tipo de pensamento. Era duro e ridículo tornar Emily a minha caça. Era…

— Susan — segurei em seus braços, balançando-os levemente. Mantive nossos olhares conectados, de forma que ela conseguisse me entender. — Eu a amo, por favor, acredite em mim!

Seus olhos se apertaram, e dentro de Susan, eu quase conseguia sentir seu elemento fervendo. Eu entendia a sua raiva, mas sabia, de certo modo, que a Susan que eu conhecia, a Susan que me conhecia, estava lá.

Ela balançou a cabeça, e fechou os olhos.

— Que merda, Philip! Eu não consigo odiar você! Mas você foi um tolo! Como pôde se apaixonar por sua caça? Quem mais sabe do ritual da guardiã? Quem mais a quer?

Eu a olhei por alguns instantes, sem uma reação a princípio. Susan aguardava uma resposta, quase desesperada.

Eu também estava desesperado. Precisava a todo custo, proteger Emily. E ganhar a confiança de Susan.

— Gabe, Eric, Zack e Lisandra.

— Lisandra? A ex Serafim?

Susan colocou a mão na testa, nervosa.

— Ela planejou tudo, e roubou o livro sagrado. E nos convenceu de que teríamos poderes que comandariam os céus, e assim, libertaríamos os anjos. Mas para isso, precisaríamos do coração da Emily, porque você sabe…

— É onde encontram-se os quatro elementos unidos. A força maior…

— Tive que ir longe, mas não consegui. Desde que a vi, Susan… eu senti mais que uma força espiritual dentro dela. Senti tudo. Nossa conexão, nossas auras… foi como se as coisas entrassem em sintonia. É medonho, mas encantadoramente prazeroso. E toda vez que a vejo — parei e refleti, lembrando-me de seus olhos —, sinto como se nada mais no mundo importasse a não ser a presença dela, comigo. — E então, olhei para Susan. — Eu juro, Susan, eu estou completamente apaixonado por ela.

— Ela precisa de todas as habilidades dos quatro elementos para que o ritual aconteça.

— Como sabe desse ritual? — Perguntei.

— Porque já tive acesso ao livro do Vaticano.

Arregalei os olhos.

— Por que nunca me contou?

— Porque isso é estritamente secreto. Porque isso não poderia cair em mãos erradas. E o que mais me assusta é o fato de Lisandra ter esse tipo de informação.

— Erick invocou um livro que dizia isso.

— Invocou? E desde quando invocar um livro é habilidade dos anjos? Imagine anjos caídos! Isso é magia negra, Philip! Eu espero que você não esteja envolvido nessa prática...

— Não estou. Só soube de Emily por terceiros.

Ela fechou os olhos e respirou fundo, como se estivesse aliviada. Mas por um instante, ela abriu os olhos de novo, segurando sua respiração.

— Como eles te ouviram? Como os seres espirituais ouviram você, Phil?

Vendo minha expressão de dúvida, a mulher não insistiu.

— Susan, eles fizeram isso por ela. Eu não sou mais aceito no céu, e os anjos me odeiam.

— Se eles te odiassem, você estaria morto.

Eu pensei um pouco a respeito. O que Susan disse fazia todo o sentido. Quando nos conectados com outra pessoa, os seres espirituais nos apoiam e suportam enquanto ocorre a transferência de elementos e o desgaste de nosso chakra. Eles tomam controle de parte — ou às vezes completamente — da nossa energia, o que significa que se eles quiserem nos matar, só precisam quebrar a conexão, tomando para si toda nossa energia. Mas eles não o fizeram. E de fato, havia um certo mistério do porquê não o terem feito, até porque, mesmo se me matassem, a guardiã seria salva por Susan, e eles sabiam disso.

— Não posso negar — afirmei. — Mas deve ter acontecido algo de errado com a guardiã para eles terem me salvado. Eles sabem que eu caí, e o que sou agora.

— Você sabe que não pode quebrar o pacto, não sabe?

Seus olhos sombrios voltaram novamente, e o silêncio permaneceu na sala, um silêncio angustiante e ao mesmo tempo, medonho. Ela sabia que eu receava que algo ruim pudesse acontecer com Emily, mas sabia também, que o caminho que escolhi, era um caminho sem volta.

— Ele irá cobrar o poder, Philip. Será isso... Ou sua morada antecipada ao inferno.

Lembrei-me de quando o pacto foi realizado. Tempos depois de sermos expulsos, ficamos provisoriamente em um lugar que não era nem o céu nem o inferno. Conhecido como Purgatório, lá é onde as almas estão em estado médio. Ou seja, quando não há uma verdadeira razão para estar no céu e nem para estar no inferno. Lá, possuem tanto almas boas quanto pecaminosas, porém de pecados mais levianos. E naquele lugar, era o lugar dos espíritos, e não de Ex Anjos. Muito provavelmente Deus fez essa escolha porque não queria nos lançar na Terra, mas acabou fazendo por fim após Lisandra conseguir conjurar Lúcifer e lhe fazer a proposta. Com isso, todos nós fomos marcados por ele, e seu sangue, compartilhado conosco — o que nos ajudou a cair com certa quantidade de poderes, já que são raros os anjos caídos que ainda chegam à Terra com algum tipo de habilidades pertencentes da época celestial.

Mas o que mais me intriga, é a minha habilidade de cura ainda estar enfatizada mesmo após a queda. Digo, é claro que está muito, mas muito fraca agora que caí, porém, não existe o acaso, e um motivo muito importante desse poder prevalecer em mim como principal, deve existir. Até porque, as chances de um Anjo cair e acordar sendo um humano com o tipo de poder que mais usava na época celestial, são mínimas, ou quase nulas. As regras são claras. Todos os Anjos que caíram e conseguiram o poder principal de quando pertenciam aos céus, é porque ou fez algum tipo de pacto específico, ou porque o destino atuou desta forma. E o destino sempre tem outras intenções além das quais sua mente consegue entender. No final, é onde tudo se conclui, e é aonde as coisas se clareiam.

E ainda havia Hedrick. Hedrick, o vilão Serafim. Ou mais conhecido como o pior tipo de inimigo que alguém poderia ter — fora Lisandra e os anjos que caíram comigo, que se possuem algum tipo de alma naquele corpo, entenderá que será necessário a aniquilação de Hedrick. Mas o pior é que eu não sei se Hedrick entrou no purgatório. As coisas acontecem diferente por lá. O purgatório não é uma caixa gigante e quadrada em que seres em processo de admissão no céu ou inferno são jogados. O purgatório pode ser o inferno ou o céu, dependendo da dimensão que você esteja. São milhares e infinitas dimensões, e o cenário, nada mais é que a formulação da sua consciência, e embora o espirito não tenha controle delas, elas se baseiam na época em eram humanos. Lembranças ruins, dor na consciência, medo, e etc. produzem cenários distintos, baseado em dimensões distintas de acordo com cada ser. Com os anjos, não foi diferente. Lembro-me do que Lisandra me disse caso fôssemos lançados no purgatório, precisaríamos pensar igual, nas mesmas coisas e formular lembranças iguais para que nossa dimensão fosse igual. E só assim não nos perderíamos na imensidão da Terra. E foi exatamente o que aconteceu.

— Seus outros amigos… sabem sobre você e Emily?

A temperatura caiu. E a sensação de que eu posso ter prejudicado para sempre a vida da Emily aumentava a cada pergunta de Susan. Ela esperava uma resposta, e como sempre, pressionava-se com suas enormes bilhas negras.

— Não, e nem podem saber, ou desconfiar.

— Então você precisa contar a verdade à Emily.

— Ela já está com muita coisa na cabeça. Ela perdeu os pais não tem nem uma semana. Como posso simplesmente chegar e lhe contar tudo?

Ela franziu o cenho.

— É sua obrigação. Vocês se envolveram. Eu sinto o poder dela em torno de você, o que eu acho severamente impossível, já que os elementos dela não deveriam, nem por um momento, deixar você se aproximar tanto dela.

— Hedrick se aproximou dela e nada lhe aconteceu.

— Hedrick era um Serafim. E ele tem contatos, e muita experiência. Como ele fez eu não sei, mas se eles não se tocaram, pode ter sido através do sonho.

Bati a mão na testa.

Susan entrou para a cozinha, deixando-me sozinho na sala minutos depois. Enquanto isso, eu refletia como deveria contar à Emily sobre o risco. É certo que a reação de Emily seria um mistério, até porque a menina acabou de passar por duas perdas brutais, mas estava lidando bem com isso. Mas fazê-la decepcionar-se comigo desse modo — direto e doloroso — era de mais para ela. Ela não merecia, ela não podia passar por isso — pelo menos não até eu encontrar uma forma de quebrar o pacto com Lúcifer e garantir a segurança dela.

Quando olhei para Susan, ela estava parada na entrada da cozinha com um livro antigo em mãos.

— Do que se trata?

Ela me olhou de relance.

— Anjos, demônios, paganismo, poderes, magias, religião… tudo o que é antigo e sobrenatural.

— Fala algo sobre pactos?

Ela me olhou de novo, mas não respondeu.

Dez segundos depois, ela disse:

— Você acha que conseguirá quebrar o pacto com ele?

— Eu posso encontrar uma forma.

Susan revirou os olhos e veio apressada até mim. Quando chegou próximo, pegou no meu braço esquerdo e mostrou meu pulso.

— Vê isso aqui? Como acha que pode reverter isso aqui? O sangue dele corre em suas veias, Philip. O sangue do mal. Como pretende fazer isso sem sair perdendo?

Levantei-me do sofá, cansado de tantas demonstrações e nenhuma ação.

Beijei o alto da testa de Susan, e embora sua face carrancuda estivesse completamente irritada, eu a entendia completamente. Era o mínimo que eu podia fazer.

— Me desculpe — eu disse, dando-lhe um abraço.

A resposta pareceu não melhorar muita coisa.

— Não há como voltar atrás, Philip. A sua alma já pertence à Lúcifer.


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Notas finais do capítulo

O que acharam meninas? Espero que gostem!!! Comentem ou divulguem ^^ Beiiiiiiiijos



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