Anjo Mau escrita por annakarenina


Capítulo 27
Luz


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo é narrado por Emily Foster



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Depois de tempos de agonia, agora tudo finalmente passou. Quer dizer, parte dela.

Assim que abri os olhos, algo ordenou dentro de mim que o empurrasse para longe, e só assim ele soltaria finalmente a minha mão. E quebraria a conexão — ou o seu suicídio. Porém, eu não sabia com certeza se eu o havia salvado. E para meu desespero, Philip ainda estava desacordado.

— Ele vai ficar bem — dizia uma garota que se identificou como Susan. Susan me disse que era médium e costumava ajudar e ser amiga de Philip quando ele ainda era um anjo que pertencia aos céus.

Susan aparentava ter trinta e poucos anos, tinha cabelos negros e olhos marcantes escuros. Ela parecia cansada, meio grogue quando eu acordei, e nesse momento, não havia muita diferença. Ela estava bebendo água constantemente, e já estava no sexto copo cheio.

— A água restabelece parte das nossas forças — ela disse meio rouca. — Mas não acho que irá resolver o meu problema. Talvez só o tempo.

Problema?

Nesse momento, eu estava com a mão na testa de Philip. Ele parecia calmo, mas eu queria poder ajudá-lo mais. Ele dormia, segundo Susan.

— Não tente — disse ela, acendendo um cigarro. Ela parecia ridiculamente exausta. — Sério, deixe-o aí. Me decepcionei com ele — disse ela por fim, bufando. — Como um anjo que tinha tudo lá em cima de repente resolve largar tudo? Por que?

Ela revirou os olhos, mas depois, me fitou por um longo segundo.

— Você é mesmo a guardiã? — Perguntou-me ela.

— Eu não sei nada sobre isso — respondi, e a mulher ficou surpresa. — Eu nem sei que poderes são esses, ou porque os tenho. E nem sei o que aconteceu comigo.

— Você possui esses poderes porque é a guardiã dos poderes divinos. São poderes baseados nos quatro elementos, o fogo, a terra, o ar e a água. Cada elemento é constituído por um ou mais poderes, por exemplo, quem domina o fogo tem uma força física sobrenatural, ou também pode controlar o próprio fogo com a palma das mãos. Quem domina o elemento terra, normalmente consegue promover o crescimento de plantas, árvores, a natureza do geral. E também controlam objetos pela telecinese — lembrei-me da última vez que movi um objeto e o que isso resultou. — Quem controla o ar tem uma mente rápida e ágil, estratégica e excelente para planejamentos. E também controla parte do vento, embora nunca tenha conhecido algum anjo que controlasse totalmente o vento. E com a água é a mesma coisa, quem domina esse elemento tem controle da água em algumas quantidades, normalmente são poucas e consegue curar outra pessoa.

De repente, a sensação que eu tive era que eu possuía diversas dessas características, mas não todas.

— Eu possuo todos esses poderes? — Perguntei.

Ela balançou a cabeça positivamente.

— Eles estão dentro de você, mas acho que você ainda não os evoluiu completamente.

— Evoluir?

— Sim. Toda vez que um novo poder evolui dentro de você, você sente seu corpo inteiro mudar. Isso ocorre porque a nova magia está tentando adequar-se no seu corpo. É como se eles estivessem se conhecendo pela primeira vez. Esse é o preço pago.

— Eu sinto… uma dor imensa. E dias depois, algo mudou em mim. Nem que seja a aparência física.

Ela assentiu, colocando o cigarro na boca. A fumaça estava se acumulando no cômodo.

E então ela apontou um dedo para Philip rapidamente.

— Como o conheceu? — Perguntou ela.

Na verdade, ele é quem me conheceu.

— Na escola.

Ela franziu o cenho.

— Escola? O que um anjo caído fazia na escola?

Dei de ombros.

— Eu não faço ideia. Mas foi assim que nos conhecemos.

Ela ainda estava com o cenho franzido, como se sua mente pensasse em inúmeras coisas ao mesmo tempo. A mulher era magricela, tinha cabelos escuros e um rosto cor de café com leite. Seus olhos eram grandes e escuros, e a forma como ela me analisava tornava sua expressão um tanto confusa. Eu não sabia se ela estava gostando do que estava vendo.

— Fala pra ele que ele está me devendo uma porta. E que eu não sou amigas de demônios.

— O que?

— Ele é um anjo caído, Emily.

Suspirei. Ele se rebelou contra o céu. Mas de alguma forma, não era ruim. Não era um demônio.

— E ele está apaixonado por você.

As palavras da mulher tentaram sair normais, como se não tivesse ocorrido algum efeito no ambiente. Mas no ambiente dentro de mim, o efeito aconteceu de forma profunda e sedutora. Meu coração disparou, e minha respiração tornou-se mais rápida.

E então, olhei para o ser angelical na minha frente, deitado no sofá. Ele estava com olheiras profundas. Sua pele era pálida, gelada. Mas seu coração estava claramente bem calmo. Sua respiração era lenta e eu conseguia ouvir bem baixinho sua inspiração e expiração ocorrendo de forma leve. Os seus cabelos da cor do bronze estavam amarrotados, mas que o deixavam terrivelmente sensual. Ele era lindo. Desenhado à mão. Era um anjo.

— Por que diz isso?

Eu perguntei, ainda o observando.

— Porque se você não acordasse naquele instante, ele estaria morto nesse momento. Ele pretendia segurar a sua mão até o seu último suspiro.

Quando Susan disse isso, ela largou o cigarro no chão e o pisou. Mas em nenhum momento ela tirou os seus olhos dos meus. E eu engoli em seco com sua resposta. Philip iria mesmo morrer por mim? Será que ele falava a verdade quando disse que estava apaixonado por mim?

Mas a verdade estava exatamente na minha frente. Da mesma forma que eu sentia algo ridiculamente forte e inevitável dentro de mim, com ele não parecia ser diferente. Mas o que eu não entendia eram os meus próprios sentimentos. Como em tão pouco tempo consegui sentir algo tão forte e tão indestrutível por ele? O que diabos estava acontecendo dentro de mim que o menino conseguiu me atrair de forma inexplicável desde o primeiro dia na Stohenthill?

— Você perdeu seus pais, não foi? — Perguntou Susan, e sua pergunta despertou-me dos meus devaneios. E a pontada de dor mais conhecida por mim ultimamente apareceu novamente.

Eu a olhei estranho.

— Como sabe? — Perguntei, nervosa.

— Senti algo do tipo quando nossa energia se conectou.

— Tem como saber essas coisas? — Engoli em seco — Tipo, tudo?

— Tudo não, mas sou uma médium. Nasci com esses dons.

Tínhamos algo em comum, embora a mulher fosse extremamente mais experiente. Porém, isso não mudava o fato de termos poderes sobrenaturais. A questão é que a mulher parecia saber de muitas coisas que me ajudariam a entender quem eu sou por completo. Ela era como um livro raro, cheio e informações valiosas e únicas.

De repente lembrei-me da tia Celeste, que muito provavelmente estaria dormindo — assim eu espero. Eram 2:45 da manhã e tudo o que eu menos precisava agora era de uma idosa perambulando pela cidade com seu Chevrolet 1988 à minha procura. Mas era melhor pensar mesmo é que ela estava em um sono profundo por calmantes.

— Susan… — chamei-a depois de alguns minutos em silêncio.

Ela me olhou, e ainda parecia grogue.

— O que aconteceu comigo?

Mas então, a noite pareceu mais escura do que já era. O ambiente tornou-se mais frio, escuro — mesmo com a luz acesa. O rosto da mulher tornou-se completamente sério e sombrio, quase fatal. Susan colocou o copo de água em cima da mesa, como se aguardasse ansiosamente o momento certo de falar, e finalmente, cruzou uma mão com a outra, não deixando de me olhar nem por um instante.

— Você foi envenenada por um ser espiritual.

— O que diabos é isso?

— Por um Anjo caído, ou um demônio, chame do que quiser.

Apertei meus olhos, confusa.

— Philip me envenenou? — As palavras eram pra sair normais, mas o que era pra ser apenas uma frase, tornou-se uma frase com dor.

— Não. Não faria sentido ele se arrepender tão rápido se fosse ele, certo?

Assenti em demasiado. Philip jamais faria isso.

— Foi Hedrick Bertrand.

Meu coração disparou. Era óbvio que aquele menino não era normal.

— Ele é um anjo caído também?

Susan assentiu.

— E por que fez isso?

— Talvez seja raiva, ou ódio, ou vingança porque você é a guardiã.

Ela disse, mas eu não estava convencida.

— E porque ter ódio de mim? Ele teve esse trabalho todo de se matricular na Stohenthill e depois vir até mim só por vingança?

— Pessoas rancorosas fazem de tudo para conquistar sua vingança, querida. — Ela pareceu extremamente mais velha quando falou dessa forma. E então, ela pegou outro cigarro.

— Qual o elemento dele?

Ela pareceu surpresa, como se o que havia me ensinado serviu para algo.

— Terra e Ar. — Disse ela.

— Espera, ele possui dois elementos?

Susan assentiu, colocando o cigarro na boca.

— Raríssimo. Perigoso, manipulador… enfim, a cada um trilhão de anjos, um possui mais de um elemento. E como se não bastasse, ele era um Serafim antes de cair. — Ela tragou novamente.

— O que é isso?

Ela finalmente tirou os olhos de mim e se preocupou com o cigarro. Ela suspirou.

— No céu, há anjos, e esses anjos são separados para realizarem diversas tarefas que cuidem da Terra, não deixando que o caos tome conta. Essas tarefas são distribuídas para 9 hierarquias. São essas: Os serafins, o cargo mais privilegiado do céu, os protetores de Deus. Eles são muito fortes, são os mais temidos pelo mal e possuem seis asas responsáveis por proteger o Senhor; e então tem os Querubins, eles zelam pela ordenação do caos, pela sabedoria, e nos trazem o conhecimento. Os Querubins também possuem um senso de humor ridiculamente interessante; os Tronos que incentivam os homens à arte, poesia e música através da inspiração, além de protegerem o trono de Deus; os Dominações, que são excelentes para nos dar força e coragem para enfrentar os inimigos, e governam inteiramente o Universo; os Potências, que nos ajudam no equilíbrio do meio ambiente e na proteção dos quatro elementos. Eles são importantes pra você Emily. Na verdade, são muito importantes. Eles que cuidam mais de você; em seguida vem os Virtudes, que para mim são os agentes do destino, eles se certificam sempre de eliminar os obstáculos do caminho de acordo com as ordens que Deus quis que acontecesse. Se Deus quis que fosse daquele jeito, os Virtudes se certificarão de que não haja obstáculos para acontecer o que Deus quis que acontecesse; aí vem os Principados, que nos protegem, suas funções são basicamente dar a notícia aos humanos sobre os recados que Deus quis entregar; e depois deles, vem os Arcanjos e Anjos. Os Arcanjos são os verdadeiros protetores dos animais, e os diplomatas também, enquanto que os Anjos possuem a função de proteger um determinado indivíduo em específico. São mais conhecidos como os Anjos da Guarda. Milhares de pessoas rezam pelos seus toda noite antes de dormir.

Depois de uma enorme explicação da mulher, eu precisei de mais alguns segundos para refletir na imensidão de coisas que eu não fazia ideia que existisse. Então realmente existe o céu.

— Então eu devo temer muito o Hedrick?

Ela soltou uma risada.

— Até você conseguir se defender com seus poderes, sim. Ele era um Serafim, tem uma experiência sinistra no negocio, mas você é a guardiã, Emily. Você domina os quatro elementos únicos da natureza. Do universo. Claro, ele é mais velho e entende muito mais, mas você vai ficar bem. Tentarei protege-la com algumas ervas. Não é por muito tempo, só até você começar a praticar o que está dentro de você.

Olhei para Philip mais uma vez, lembrando-me da sua experiência de quase morte para me salvar. Quando finalmente acordei da minha experiência de quase morte, Philip sorria levemente, como se estivesse certo de que o que estava fazendo, era uma boa ideia. E agora, sua expressão ainda calma não mudara desde a última vez que não tirei os olhos dele. A não ser pelo fato de, dessa vez, eu notar uma pequena cicatriz no seu pulso. Havia um circulo profundo, como se fosse marcado com o fogo, e dentro dele, algumas pequenas coisas escritas, também marcadas com o fogo. Doía em mim só de olhar como aquilo foi feito.

— O que é isso? — Perguntei à Susan, pegando no braço esquerdo de Philip e lhe mostrando a cicatriz, que com certeza foi feita de propósito.

Susan levantou-se para olhar melhor, e quando seus olhos bateram na figura, senti uma súbita mudança de expressão. Ela pareceu não gostar nada do que via.

— Eu não sei — ela disse, quebrando todas as minhas expectativas. Porém, não foi isso que pareceu quando seus olhos bateram na cicatriz. Ela então largou o braço de Philip, que ainda dormia profundamente, e voltou para seu lugar, aparentemente angustiada com o que acabara de ver.

Eu não voltei a insistir, mas fiquei com medo do que aquilo poderia significar. De acordo com a minha intuição, era algo muito, muito ruim. Susan estava visivelmente exausta, como se há dias não dormisse nem um único segundo. E então eu entendi o verdadeiro significado de ter energia dentro de você, e como na sua escassez, pode derrubar facilmente um ser humano.

Duas horas depois, eu comecei a ficar com sono, porém Philip ainda não havia acordado. Susan sugeriu que eu a ajudasse a fazer o café para passar o tempo. Chegando em sua cozinha, o local estava preenchido completamente por plantas e outras ervas que ainda estavam em crescimento. Pela janela, consegui ver uma enorme cobertura de vidro com centenas de plantas dentro dele.

— Você ama plantas — eu afirmei, parecendo uma idiota.

Ela riu.

— Ah, sim. Claro, meu elemento é fogo, mas ainda acho que deveria nascer com terra. Eu sou louca por essas coisas — ela soltou uma risada estranha.

Ela pegou o pó de café e eu coloquei água na cafeteira. Enquanto derramava, observei sua casa. Ela era bonita, mas antiga. A decoração também era antiga, os móveis de madeira pareciam bastante desgastados pelo tempo e os azulejos estavam meio amarelados, provavelmente estavam ali há uns dez anos.

Cinco segundos depois, a cafeteira acendeu a luz vermelha que indicava que já estava em funcionamento. Eu não entendia muito bem de tecnologia, mas algo me dizia que já estava na hora de fechá-la e esperar.

Em seguida, distrai-me com uma pequena plantinha que ao meu ver estava muito fraca. Ela era bonita, possuía algumas flores brancas, mas de certa forma estavam murchando.

— Acho que não tem mais jeito pra ela — disse Susan descontraída. — Já fiz de tudo, ela quer mesmo a morte.

Eu franzi o cenho e analisei a planta.

— Usou fertilizante? — Perguntei.

— Umas três vezes nesse mês. Ela não está mais reagindo.

E então eu toquei na parte superior da planta, apertando a folha seca nos meus dedos. Em seguida, peguei um copo de água e a molhei de leve, deixando-a umedecida. Toquei em seu tronco, que também estava seco, mas novamente achei que deveria permanecer assim. A planta ficou mais verde por causa da água, e seu aspecto melhorou consideravelmente.

Quando virei, Susan me observava atentamente, como se tentasse aprender a minha técnica. Ela sorriu quando a olhei.

— Obrigada por salvá-la — disse-me ela.

Eu inclinei a cabeça em dúvida.

— Eu não sei se a salvei. Eu só dei-lhe um pouco de água.

Ela bufou brincando.

— Ela não ficou verde desse jeito em nenhum momento quando coloquei água nos últimos dias.

Eu sorri nervosa, não sabendo se era isso que queria.

— Você tem o dom do cultivo. — Eu fiz uma cara que não entendia, e ela completou — Você é terra também, lembra?

Os elementos. Ah, claro. Eu não podia esquecer que não era uma pessoa normal.

— Enfim, se quiser vir outras vezes aqui quando alguma planta estiver morrendo, posso contar com você?

Eu sorri.

— Claro que sim.

— Perfeito! — Susan bateu palmas rapidinho, como uma adolescente.

E então, poucos minutos antes da cafeteira avisar que o café já estava pronto, uma figura linda apareceu recostado na porta. Era Philip. Ele estava sem camisa, apenas de calça, como eu o vira no meu quarto. Seu cabelo estava amassado ainda, seus olhos penetrantes estavam semi abertos, mas eu conseguia ver a cor deles, como a da águia. Ele suava um pouco, o que deixava seu corpo meio brilhante. Ele estava deslumbrantemente lindo, mas muito cansado.

— Você — Susan apontou o indicador para ele. — me deve uma porta!

Ele sorriu lindamente. Mas eu sabia que não era para ela esse sorriso, era para mim.


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Notas finais do capítulo

O que acharam meninas? Divulguem, comentem! Beijos gigantes!!!!!



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