Assassin's Creed: Omnis Licitus escrita por Meurtriere


Capítulo 36
Nala


Notas iniciais do capítulo

Olá! Mais uma dia de Thor com capítulo e um cap bem família. Veremos agora como Jenny tem se saído em meio a toda essa situação. Espero que gostem, boa leitura ;)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/661108/chapter/36

Quando eu vivia em Londres sempre debochava do costume de meu irmão manter um diário pessoal, afinal ele era só uma criança, que tipo de conhecimento ou vivência ele poderia ter? Vi Anne reservar algum tempo para escrever e não tenho certeza se eram todas cartas para Adewale ou Ah Tabai. E agora vejo Sexta-feira todo bobo a escrever em um pedaço de couro de animal sobre a minha gravidez. Não vi outra alternativa se não fazer o mesmo e tenho certeza que Haythan estaria me lembrando de todas as vezes que zombei dele. Enquanto Sexta-feira estampa seu lindo sorriso estou cercada de dúvidas e temores. Ah Bonny, como eu desejaria ter você ao meu lado agora... Os enjoos aliviaram graças a uma mistura que a Velha me dava diariamente. Além disso, ela me proibiu de comer certas coisas e para aliviar o calor: frutas e mais frutas. Todos os dias Sexta-feira trazia-me frutas de cores e sabores diferentes e é claro havia o desafio para o bebê.

— Matar um leão? Você enlouqueceu?

Fiquei estupefata e levantei-me de imediato após ouvir os detalhes a respeito da tradição comum ao seu povo quando um bebê está para nascer. Ele tinha uma lança afiada em uma das suas mãos, trajava vestes comuns ao grupo de caça e tinha algumas pinturas pelos braços e também no rosto. Havia determinação em seus olhos que me encaravam sem fraquejar por um instante se quer.

— Leões jovens costumam andar solitários até vencerem algum leão mais velho e os mais velhos derrotados também seguem o fim de suas vidas sozinhos. – Suas mãos rendiam uma lâmina afiada na cintura para logo após jogar uma jarda de flechas por sobre o ombro, até que ele me fitou novamente. - Irei fazer um colar com os dentes dele é lhe dar para que a ferocidade dele esteja em nosso filho.

— Seu pai fez isso?

— Provavelmente. – Ele sacou o arco e o prendeu às costas.

— E você não acha isso muito arriscado? Quero dizer, minha mãe não ganhou nenhum colar e veja como nasci.

Ele se aproximou de mim com seu sorriso suave e encantador, ajoelhou-se diante de mim, tal qual um nobre cavalheiro e tomou minhas mãos por entre as dele.

— Acredite em mim. Sei que não acredita nas mesmas coisas que minha tribo e que está com medo, mas eu lhe prometo voltar.

Eu quis argumentar e dizer qualquer coisa inteligente para lhe convencer, mas eu simplesmente chorei. Chorei feito uma menina chorona. Eu já havia perdido muitas pessoas queridas a mim antes e ele era tudo o que me restava. O que seria de mim se eu perdesse Sexta-feira por causa de uma estúpida tradição? Mas não pude de forma alguma convencê-lo do contrário e ele partiu naquela manhã.

Foi quando comecei a escrever tentando não enlouquecer. Em primeiro lugar eu não sabia o que iria ser de mim dali pra frente, pois muito mal sei cuidar de mim, imagine de um ser indefeso? Confesso que nunca me imaginei casando-me e tendo filhos, não era minha ambição em Londres e muito menos quando parti, mas havia nesse meio tempo alguém que fazia tudo parecer melhor, Sexta-feira.

Não sei o que meu pai diria ao me ver junto a um ex-escravo sem um tostão no bolso e vivendo no meio da África, isolada do resto do mundo. E minha mãe? Bem, ela se casou com um caipira criador de ovelhas e aceitou viver como uma de bom grado, talvez eu seja mais parecida com ela do que imaginava.

A vida ali não era ruim, mas seria mentira minha se dissesse que não sentia falta do mar, do Gralha, de Bonny e dos Assassinos. Minha vida agora tomava um rumo que me distanciava mais e mais daquele objetivo que tinha quando deixei Londres. Estou longe de saber dos outros assassinos de meu pai e menos ainda de encontrar Haythan.

{#}

Passaram-se dias desde que Sexta-feira partiu e todos esses dias foram agonizantes para mim, mas então em um fim de tarde eu vi do outro lado do rio aquela imensa carcaça morta sendo carregada. Logo outras pessoas também notaram e assobios e gritos indecifráveis aos meus ouvidos foram expelidos. Alguns homens foram até ele para lhe ajudar a carregar o leão abatido e só quando ele estava perto o bastante vi suas feridas pelo tronco e pelo rosto. Grandes arranhões com sangue seco espalhado por todo o seu corpo. Ele veio até mim sorrindo, mas seus olhos denunciavam o cansaço e com tranquilidade pousou uma das mãos em meu ombro e disse-me.

— Eu disse que voltaria.

A Velha o chamou com um semblante zangado e ele a seguiu para sua cabana onde receberia tratamento. Quando a noite caiu um grande “banquete”, se é que posso nomear desta forma, foi feito com a carne do leão.  Quase como se fosse uma festa, havia música e alguns homens dançavam o que Sexta-feira contou-me se chamar Capoeira, inclusive ele próprio.

“Onde tem maribondo de zum zum zum

Onde tem capoeira tem zum zum zum

Ô Ô Ô capoeira mata um”

O ritmo da música e da dança eram ditados por instrumentos de cordas chamados de Berimbaus, que eram uma vara comprida com uma corda amarrada em ambas às extremidades e em uma delas havia uma cabaça oca. Além disso, havia uma pequena pedra a qual quem estivesse tocando segurava junto a corda e perto da cabaça. Essa pedra podia mudar o tom das notas.

A propósito, aquilo não era só uma dança e sim uma luta praticada pelos escravos tanto na Angola como no Brasil. As pernas eram usadas para chutes, saltos e desarmes enquanto os braços mantinham-se na maior parte do tempo na proteção do rosto no movimento chamando ginga.

Além do trio de Berimbaus, havia também pandeiros e atabaques espalhados por entre crianças e mulheres. Devo mencionar que as mulheres lutavam tanto quanto os homens e descobri porque Mabuba era a líder do grupo de caça. Ela movimentava-se quase como uma sombra e não pude deixar de recordar de Ah Tabai, ele certamente adoraria uma aluna talentosa como ela. Ela venceu Sexta-feira ou ele se deixou vencer, não fazia diferença, ele estava transbordando alegria de qualquer modo.

Por fim ele deixou a roda de capoeira e caminhou sorrindo até onde eu estava sentada apreciando de verdade sua apresentação de capoeira.

— Tenho um presente para nosso filho.

Arqueei a sobrancelha ao me virar e ficar frente a frente com ele.  - Por que sempre se refere a ele? E se for ela?

— Não faz diferença para mim. – Ele me deu um rápido beijo e achei pela primeira vez na vida que Sexta-feira estava bêbada com o que quer que a Velha tenha lhe dado para seus ferimentos.

Lembro-me dela me dizer o quanto ele fora forte em não gritar, e sim eu já sei algumas palavras em sua língua nativa, ainda que poucas. Descobri quando o vi sair da cabana que os “pontos” que ele havia tomado foram dados por formigas. As formigas eram postas uma a uma para morder o local do arranhão de forma que unia a pele cortada tal qual agulha e linha. Uma vez levei uma mordida dessas formigas gigantescas e sinceramente não sei dizer se a mordida doeu mais que a pequena dose de veneno que ela tem. Uma coisa horrível.

Ele chamou pelas crianças e um par delas correu para longe, mas não demoraram a retornar com a pele e a juba do leão sobre as pequenas mãos. Ele tomou para si a pelagem e estendeu-a para mim.

— Menino ou menina quando nascer estará sob a proteção desse leão.

Toquei no presente com cuidado e senti a pelagem curta e agora limpa do felino, mas a juba era fofa e amigável. Não pude deixar de sorrir e lhe abraçar com força, o que resultou em alguns resmungos de dor por parte dele.

{#}

Era meados de 1739 e minha barriga cresceu junto com  os desconfortos, logo eu estava sentindo dores para me por de pé e o calor insuportável me fazia a praticamente ficar nua quase o dia inteiro. Quando meus seios incharam ficaram pesados e sensíveis, mas a Velha dizia que era um bom sinal, pois eu teria muito leite. Andar distâncias curtas me deixavam cansada e dolorida e eu eu não me lembro de ter dormido tanto em toda a minha vida. Ah e o xixi, certas vezes eu simplesmente não conseguia me segurar. Nas últimas semanas as estrias apareceram e meus pés e pernas incharam e a Velha nos disse que a hora estava chegando. Ela não errou.

Era madrugada quando acordei com uma sensação estranha, senti minhas coxas molhadas e a cama não tardou a ficar encharcada, não havia cheiro e nem cor e quando dei conta de aquilo era o sinal as dores começaram quase que como uma confirmação.

— Sexta-feira... Sexta-feira.

A dor passou, mas eu sabia que viria mais e precisava aproveitar esse intervalo para me preparar. Ele resmungou qualquer coisa, provavelmente ainda estava dormindo, então novamente a dor e eu tentei reprimi-la dentro de mim e foi quando ele percebeu que havia algo errado.

— Jenny... – Ele olhou para mim e depois a mancha em nossa cama com um semblante assustado.

— Acorde aquela Velha e diga que chegou a hora.

Ele deu um salto e no instante seguinte já não estava na cabana, mas pouco tempo depois ele retornou e ajudou-me a levantar e caminhar até a cabana da Velha. Assim que chegamos ela tocou em minha barriga e olhou-me firmemente.

— Me avise quando doer novamente.

Ela falou em português, língua que ela pouco utilizava, pois certamente lhe trazia más recordações, contudo eu dificilmente conseguiria entender uma palavra em sua própria língua eu já estava mais familiarizada à língua portuguesa, graças á Sexta-feira . Eu lhe assenti e ela me levou para junto da tora central que sustentava seu teto de sapê.

— Apoie-se aí. – Rapidamente ela se virou para encarar Sexta-feira e também lhe deu instruções. - Vá pegar água fresca no rio e ferva, peça para Mabuba lhe ajudar.

Fiz como ordenada enquanto a Velha remexia em suas coisas e Sexta-feira partia para fazer sua parte. Quando ela voltou a se aproximar de mim, havia em suas mãos algo que deduzi a princípio serem roupas, mas quando ela as abriu vi que eram apenas faixas. Uma destas faixas foi amarrada em volta da tora, outras duas foram amarradas na primeira de modo que faziam um círculo cada uma, semelhante a uma corrente de ferro com suas argolas abraçando umas as outras.

— Segure cada um desses laços com cada mão e aperte-os com força se precisar. Mantenha os joelhos dobrados e se se sentir cansada ajoelhe-se. Mas não deite ou sente.

— A dor... Está vindo de novo.

Minha respiração estava irregular e meus dentes trincados para suportar tudo. A Velha manteve a mão sobre minha barriga até a dor passar e depois com calma falou.

— Sua criança está abrindo caminho para sair, precisa ser forte e lhe ajudar. Na próxima vez que doer empurre até não conseguir mais.

Quando Sexta-feira e Mabuba retornaram eu gritava feito um animal abatido, sentia as lágrimas e o suor escorrerem pelo rosto e as palavras da Velha já estavam distantes demais. Não havia mais intervalos entre uma pontada de dor para outra e meus ossos pareciam estar sendo torcidos e separados um a um. Minhas pernas estavam bambas e meus pulsos doloridos pela força que apertava aqueles dois laços. Com incentivos de Sexta-feira e da Velha, ficamos nessa agonia por horas até que senti uma queimação entre as pernas e tenho certeza que minha pele se rasgou, mas minha consciência estava longe e meus olhos estavam quase fechados quando senti algo descer e aliviar a ardência. Quase como se algum órgão meu tivesse escorrido por entre minhas pernas, senti a leveza quando ouvi um choro estridente. E a última coisa que me recordo era de Sexta-feira se aproximando com a pele do leão envolvendo o pequeno ou a pequena e logo ele sanou minha dúvida.

— É uma menina, Jenny! Uma menina perfeita. Seu nome será Nala.

E ela tinha cor de ébano como o pai.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Vamos lá... Quanto essa tradição da tribo de Sexta-feira. Confesso que não posso afirmar como exatamente eram feitas essas caças por animais grandes, mas aconteciam e geralmente as peles eram dadas como presente.

Quanto a Capoeira... essa música não está exatamente com a letra correta, pois eu conheço apenas a versão da Capoeira Regional e Sexta-feira e sua tribo praticam a Capoeira Angolana.

Quanto a evolução da gravidez tudo é verídico, o calor, as dores, o sono, as choradeiras, enjoos etc. E o parto é baseado na verdade em um parto indígena, mas sendo a posição de cócoras a melhor posição para parir, então decidi facilitar as coisas para ela rs.

Bom é isso, o que acharam e Sextinha e Jenny sendo papai e mamãe? E quanto a Nala... Será que ela será tranquila feito o pai ou vai puxar os genes Kenways? rs

É isso! Espero que tenham gostado e nos vemos no próximo cap que se tudo der certo sai na semana que vem. Beijos!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Assassin's Creed: Omnis Licitus" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.